quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Para “Veja”, vale tudo contra a democracia na Venezuela

Nessa linha, “Época” foi atrás e fraudou até foto

Jornal HoraDoPovo


Há algum tempo, a “Veja”, sempre na vanguarda de tudo o que não presta, falsificou uma foto de João Pedro Stédile, líder do MST, manipulando-a por computador para apresentá-lo com feições sinistras e algo diabólicas. Pois a “Época”, da Globo, resolveu imitar a sua congênere. Foi exatamente o que fez com a imagem do presidente venezuelano Hugo Chávez, na capa da semana passada.

Verdade seja dita, nesse terreno – o da falta de escrúpulos, da canalhice, em suma, do fascismo editorial – a “Veja” continua sem competidores. Haja vista a matéria de capa desta semana, cujo assunto - de surpresa nós não vamos morrer - é o presidente Hugo Chávez.

POPULAÇÃO

Quem revelou a falsificação na capa de “Época” foi nada menos que o diretor de arte da revista, Marcos Marques (v. suas declarações em nossa primeira página). Não estava fazendo uma denúncia. Pelo contrário, estava expondo a competência do departamento que dirige. O incrível é que o diretor de arte e seus comandados parecem achar absolutamente normal esse procedimento. Parecem achar que a profissão é uma licença para fazer qualquer coisa que o patrão mandar, inclusive, ludibriar os leitores.

Chávez não falsificou nenhum retrato – e nenhuma história – da família Marinho. No entanto, os Marinho acham que podem chamar Chávez de ditador, falsificando a foto e os fatos...

Quanto à matéria, é de uma estupidez garrafal. Quem pode acreditar que Chávez está reaparelhando as forças armadas da Venezuela para atacar o Brasil, e não para se defender dos americanos? É preciso uma mente asinina para crer em tamanha estultice. Mesmo assim, não é qualquer asno que consegue achar que o Brasil, 9 vezes maior - e com uma população que é 7 vezes a do país vizinho – está ameaçado pela Venezuela.

Quanto à “Veja”, é outra coisa. Nesta semana, em 11 páginas de xingamentos, a prova de que Chávez é um ditador se resume a 7 artigos da Constituição – entre os 350 que a compõem. Os artigos são os seguintes:

1) O artigo 11, que dá poderes ao presidente para estabelecer regiões militares especais em qualquer parte do país.

“Veja” sabe perfeitamente que este é um dispositivo que existe em qualquer Constituição – inclusive na dos EUA e na do Brasil.

2) O artigo 16, que estabelece o Poder Popular baseado nas comunidades locais.

“Veja” quer passar a idéia de que trata-se de um poder paralelo ao do Estado, quando é apenas uma forma, que não se sobrepõe ao poder federal, estadual ou municipal, de complementar e democratizar o poder político em comunidades localizadas.

3) O artigo 115, que define que, por utilidade pública ou interesse social, poderão ser desapropriados determinados bens.

O Civita, americano que o é, não deve ter lido o artigo 5º da nossa Constituição, incisos XXIII e XXIV. O Estado brasileiro tem o mesmo poder e o nosso texto constitucional tem quase a mesma redação do venezuelano. Mas o Civita & matilha querem ter o monopólio da expropriação dos bens de outros...

4) O artigo 153, que propõe que a Venezuela envide esforços para construir na América um projeto supranacional.

Desde que o presidente Sarney fundou o Mercosul, o Brasil está envidando esforços exatamente no mesmo sentido, o que foi retomado pelo presidente Lula, inclusive com a CASA (Comunidade Sul-americana de Nações). Mas o Civita prefere a Alca, ou seja, em vez de um projeto supranacional, um de submissão nacional.

5) O artigo 230, que acaba com as restrições a que o povo possa reeleger o presidente.

Até Eisenhower, apesar de republicano, era a favor desse direito democrático. Disse ele que “o povo americano deve eleger quem ele quiser, quantas vezes quiser”. As restrições à reeleição consistem em limitações à democracia, cuja essência é a vontade do povo, não o impedimento à vontade do povo.

6) O artigo 318, que estabelece que a política monetária deverá ser estabelecida em conjunto pelo Executivo e o Banco Central.

O presidente Chávez é um homem moderado. O Brasil é mais radical: constitucionalmente, é o Executivo que estabelece a política monetária. O BC é um mero aplicador. Até o Meirelles sabe disso, pois vive citando o conteúdo desse dispositivo.

7) O artigo 337, que estabelece que o presidente poderá decretar estados de exceção no país.

Pois é, aqui também (artigo 21 da nossa Constituição).

Muito interessante, também, são os conceitos emitidos sobre democracia, pela “Veja”. Por exemplo: “Hugo Chávez foi escolhido em eleições democráticas em 1998. O partido nazista teve um terço dos votos em 1933. Á frente de sua milícia, Mussolini impôs sua nomeação como primeiro-ministro. Para todos eles, isso foi a etapa inicial da ditadura”.

Logo, a democracia é a etapa inicial da ditadura e não há outro jeito de evitar as ditaduras, senão acabando com a democracia. Não é brincadeira, leitor. O problema de Chávez não é que ele seja um ditador, o problema é que ele é um democrata, logo, segundo a “Veja”, é inevitável que ele seja um ditador. Por isso, ela coloca no mesmo saco as eleições democráticas da Venezuela e as eleições de 1933 na Alemanha, realizadas depois da proibição do Partido Social-Democrata e do Partido Comunista e da prisão em massa dos dirigentes e militantes de ambos os partidos. Da mesma forma, a “marcha sobre Roma”, de Mussolini, cujo objetivo era passar por cima das instituições - inclusive, e sobretudo, das eleições – virou exemplo de democracia. Mas, realmente, essa é a democracia do Civita, isto é, o fascismo.

DIAS

O resto é um besteirol de mesmo teor:

a) Chávez “arrancou do parlamento a autorização para governar sem o parlamento”. Parece até que as medidas provisórias e as ordens executivas dos EUA são alguma novidade.

b) A “milícia” da Constituição da Venezuela não são de Chávez; são a reserva do exército, isto é, todos os reservistas, organizados e comandados pelo exército.

c) Chávez não fez expurgo algum do Judiciário. Apenas, como qualquer presidente, inclusive o nosso, cumpre a ele nomear juízes de determinadas instâncias.

d) O que “Veja” chama de “lavagem cerebral” da juventude é que a educação deixou de ser privilégio dos brancos e ricos, e o ensino passou a ter algo a ver com a realidade do país.

Por último, não há perseguição aos opositores, que continuam proprietários da maioria dos órgãos de comunicação do país. A oposição é que tentou dar um golpe, rasgar a constituição, fechar o Congresso e o Judiciário, no que foi efusivamente saudada pela “Veja”. Mas a esbórnia durou apenas dois dias.


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