terça-feira, 29 de abril de 2008

O bushismo depois de George W. Bush


Os três pré-candidatos que disputam a indicação do seu partido para a eleição presidencial de novembro, nos Estados Unidos, têm pelo menos um ponto em comum: eles prometem se empenhar no sentido de mudar as relações do seu país com o restante do mundo. Se forem verdadeiras as afirmações tanto de John McCain, que já tem garantida a candidatura republicana, quanto de Barack Obama e Hillary Clinton, que seguem disputando entre si a candidatura democrata, o futuro presidente, quem quer que ele seja, estará empenhado em virar a página da era Bush.


Por Patrick Jarreau, para o Le Monde, reproduzido do Universo On Line.



Mas, será que está promessa se confirmará para valer? É difícil fazer tal previsão. No caso de John McCain, um herdeiro reticente da presidência que está se encerrando, a continuidade prevalece em relação à ruptura.


Vale reconhecer que desde 2001, o senador do Arizona tem sido um dos parlamentares republicanos mais críticos das ações de George W. Bush e da sua equipe, só que, ainda assim, ele nunca mostrou qualquer discordância em relação às decisões mais importantes que foram tomadas por este, e principalmente com a invasão do Iraque.


Na realidade, a atitude do antigo rival de George W. Bush para a candidatura republicana foi a de um membro do mesmo partido, que, se estivesse no seu lugar, teria conduzido a mesma política, mas empregando outros métodos e montando uma equipe diferente.

Por ocasião da eleição primária de 2000, McCain havia despontado como o candidato predileto dos neoconservadores, que só passaram a apoiar Bush quando este se tornou o candidato republicano, e só chegaram verdadeiramente a exercer uma influência sobre a sua política apenas depois dos atentados de 11 de setembro.


A respeito do Iraque, o senador do Arizona compartilhou as queixas dos neoconservadores, criticando o então secretário da defesa, Donald Rumsfeld, por este não ter empenhado força suficiente nesta guerra. Foram necessários mais de três anos de fracassos no terreno e inúmeras batalhas internas no campo republicano para que o presidente Bush concordasse em demitir Rumsfeld, em novembro de 2006, e para que McCain, junto com os seus aliados, conseguisse impor uma nova estratégia, conhecida como a do "surge", o envio maciço de reforços.


Atualmente, John McCain afirma a sua candidatura à presidência está associada ao sucesso desta estratégia. O senador do Arizona exclui toda retirada do Iraque, a qual seria, segundo ele, uma iniciativa irresponsável, pois ela equivaleria a deixar este país entregue a "uma violência aterradora, um processo de limpeza étnica e, possivelmente, um genocídio".


Ele avalia que os Estados Unidos estão fadados a permanecerem por muito tempo no país — "cem anos", disparou o senador, no estilo provocador que ele gosta de adotar —, da mesma forma que eles permaneceram na Alemanha e no Japão depois da Segunda Guerra Mundial. Em sua opinião, assim como aos olhos de Bush, o Iraque permanece no "front central" na luta contra o "extremismo islâmico", um conflito no qual ele enxerga o "desafio essencial do nosso tempo".


Um antigo prisioneiro de guerra, que foi torturado em Hanói (após ter participado, sem nunca ter mostrado qualquer espécie de conflito de consciência a esse respeito, dos bombardeios contra o Vietnã do Norte), ele se insurgiu contra os maus-tratos que estavam sendo infligidos aos prisioneiros dos americanos na prisão de Abu Ghraib, em Bagdá, em 2004.


Ele tomou posição contra toda forma de tortura durante os interrogatórios conduzidos pela CIA (Central de Inteligência Americana), embora, de maneira pouco gloriosa, ele tivesse recorrido a subterfúgios espertos, por ocasião das suas últimas participações nas votações do Senado, com o objetivo de não perder o voto dos eleitores republicanos mais à direita.


Ele prometeu fechar a prisão de Guantânamo. Ele também busca marcar as suas diferenças em relação à presidência Bush quando anuncia, tal como os democratas, um engajamento claro dos Estados Unidos na luta contra o aquecimento climático.


De maneira geral, embora a paciência não seja a qualidade que os seus simpatizantes e os observadores lhe atribuem com maior freqüência, John McCain tem declarado abertamente a sua vontade de ouvir com maior atenção os aliados dos Estados Unidos.


Contudo, a sua posição para como o Irã é a da confrontação. Os seus detratores vêm compartilhando com medo, na Internet, o vídeo de uma reunião de eleitores durante a qual ele brincou de cantarolar "Bomb, bomb, bomb Iran!" ("Vamos bombardear o Irã!") com a melodia de "Barbara Ann", dos Beach Boys, um sucesso pop dos anos 1960.


Em relação ao Iraque, os candidatos democratas adotaram uma posição que se opõe frontalmente àquela de McCain. Eles não acreditam nem por um instante sequer que a América possa fazer deste país uma Alemanha ou um Japão do Oriente Médio.


Em sua opinião, a retirada das tropas americanas é necessária não apenas para o bem dos soldados, das forças armadas e do orçamento federal, como também para obrigar as facções iraquianas a se entenderem entre si e a assumirem o controle da administração do seu Estado.


Quando eles anunciam que darão início à retirada logo nos primeiros dias da sua eventual presidência, em janeiro de 2009, Hillary Clinton e Barack Obama estão informando na mesma ocasião ao primeiro-ministro iraquiano, Nouri al-Maliki, e ao seu governo que eles precisam se preparar para prosseguirem sem a ajuda das tropas americanas.


Proximidade com o Terceiro Mundo


Em relação ao Irã, os democratas e o republicano defendem opções tão divergentes quanto esta última. John McCain encampa a idéia segundo a qual os países que estiverem decididos a enfrentar Teerã precisam entrar em acordo em torno de uma política comum de sanções realmente capazes de prejudicar os interesses deste país, mesmo que para tanto seja preciso agir fora do quadro da ONU se necessário.


Os seus concorrentes, por sua vez, defendem o princípio da condução de discussões com os dirigentes iranianos. Entretanto, apenas Barack Obama vai mais longe ao comentar a perspectiva de empreender aquilo que um antigo conselheiro da presidência, Flynt Leverett, chamou de um "grande regateio".


Como resultado desta ambiciosa negociação, o Irã cessaria de progredir no caminho do armamento nuclear em troca da sua reintegração completa nas relações diplomáticas e econômicas internacionais e do reconhecimento dos seus interesses na qualidade de grande potência regional.


O senador do Illinois se disse disposto, caso ele for eleito presidente, a se reunir com o presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, para dar início a uma negociação de conjunto.


Barack Obama apresenta-se como um reformador da política externa americana. Valendo-se, sobretudo, da mistura racial que predomina nas suas origens familiares — pai queniano, mãe americana — e da sua proximidade com o Terceiro Mundo, ele esboça uma América mais bem orientada em relação aos países pobres e aos povos que mais andaram amargando dificuldades nos rumos que o mundo vem seguindo.


Inversamente, Hillary Clinton, valendo-se da sua experiência nas relações internacionais, acumulada junto ao seu marido, Bill Clinton, e depois como senadora, tenta se apresentar como mais realista, mas também como uma dirigente mais clássica.


Os dois pré-candidatos se comprometem a fazer uma prioridade da busca de um acordo de paz duradouro na Palestina. Os defensores da política israelense têm se mostrado mais preocupados, a este respeito, com eventuais iniciativas que poderia tomar Barack Obama, do que com aquelas que podem ser esperadas de Hillary Clinton.


Alguns dentre eles vêm conduzindo, contra o senador do Illinois, uma campanha venenosa, criticando-o por contar entre os seus conselheiros Zbigniew Brzezinski, que fora um colaborador, 30 anos atrás, do presidente Jimmy Carter.


É verdade que os princípios que Carter defendia, na época do acordo de paz egípcio-israelense, se tornaram heréticos aos olhos de uma grande parte do establishment da política externa de Washington.


UOL


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