quarta-feira, 14 de maio de 2008

Ambientalista acusa: governo quer “bonequinho” para autorizar obras



Por Anselmo Massad

José Adilson Vieira, secretário geral da rede Grupo de Trabalho Amazônico, considera um desastre a saída da ministra Marina Silva, que era “a única coisa boa no governo”. Para ele, o sinal é de que a gestão do presidente Lula mostra falta de compromisso com a questão ambiental e com a busca pelo desenvolvimento sustentável.

Apesar de medidas criticadas por ambientalistas – como a liberação do plantio de sementes transgênicas, a construção das hidrelétricas do Rio Madeira, da transposição do São Francisco, entre outras –, a preocupação é com a ausência de resistência no conflito de forças entre os ministérios.

Um dos convidados para o lançamento do Plano Amazônia Sustentável (PAS), no dia 8 de maio, Adilson Vieira afirma que não sabe se a entrega da coordenação do plano para Mangabeira Unger tenha sido ou não o pivô da crise. Mas “se eu fosse ministro do meio ambiente também pediria demissão”, declara.

Para ele, quem entrar agora no cargo, independentemente do nome escolhido, estará debilitado, porque o governo está querendo apenas um “bonequinho” para aprovar os licenciamentos ambientais.

Confira a íntegra.

Fórum – Como o GTA avalia o pedido de demissão da ministra Marina Silva?
José Adilson Vieira –
Para nós, do GTA, a saída é um desastre para a política ambiental brasileira. Pelo compromisso dela e pelo que ela representava no Ministério do Meio Ambiente, que era uma certa qualidade da política ambiental, uma seriedade. O desastre é deixar de fazer o combate interno dentro do governo. Com a demissão, o sinal é de que o governo não tem compromisso com o meio ambiente, com a redução do desmatamento da Amazônia, com povos da Amazônia.

Fórum – Há alguma outra pessoa que, ao substituir a ministra, poderia representar esse compromisso dentro do governo?
Adilson Vieira –
Para nós, a única coisa boa no governo era a ministra Marina. De todos os quadros do atual governo, nenhum tem a preocupação socioambiental ou qualquer interesse em equacionar o desenvolvimento com sustentabilidade. É só fachada. A única que a gente respeitava era a ministra Marina. Sem ela, ficamos totalmente céticos em relação ao governo.

Fórum – Durante a gestão da ministra, diversos grupos ambientalistas criticaram decisões do governo, a exemplo das hidrelétricas do Rio Madeira. Mesmo diante dessas derrotas, a ministra Marina Silva tinha esse papel importante?
Adilson Vieira –
Tem questões que, olhando de fora, parecem derrota, mas que também tem ganhos. No caso das hidrelétricas do Madeira, somos contra a construção. O Ibama deu as licenças, mas adicionou condicionantes, incorporou uma série de exigências aos estudos que não existiam. Parece derrota, mas [essas condicionantes] podem ser consideradas vitórias. Em um governo desenvolvimentista por natureza, agregar vitórias ambientais é um avanço. A vitória plena seria barrar, mas é complexo no conflito de forças.
Os ambientalistas são muito exigentes, sempre reclamamos um pouco para conseguir mais. É inegável que se conseguiu baixar as taxas de desmatamento. Mesmo assim, as taxas atuais são elevadas. O nível bom seria reduzir a 1% ou 2%. É inegável que o esforço dela fez com que o desmatamento baixasse por cinco anos seguidos. Não considero isso uma derrota.

Fórum – O fato de a coordenação do Plano Amazônia Sustentável (PAS) ter sido dado ao ministro Mangabeira Unger é apontada como “gota d’água” para a saída da ministra Marina. Qual a avaliação sobre Mangabeira Unger nesse cargo?
Adilson Vieira –
Não sei se o fato foi esse como se divulgou, só a própria ministra pode explicar. Eu estava no lançamento do PAS, em Brasília, e fiquei extremamente sem graça e até meio deslocado quando residente Lula anunciou que a coordenação do plano iria ficar com Mangabeira Unger. Uma pessoa que desconhece totalmente a região, cuja “melhor idéia” a respeito é a de um aqueduto para levar água da Amazônia ao Nordeste. Eu, no lugar dela [Marina Silva], também me demitiria, porque mostra que o presidente não tem compromisso com a região, que só quer oba-oba, o que nem é sério.

Fórum – O senhor mencionou um aqueduto?
Adilson Vieira –
Há algum tempo, o Mangabeira Unger veio ao Amazonas e falou um milhão de coisas. Entre as "pérolas" estava construir um aqueduto para levar água da região amazônica para o Nordeste Setentrional como alternativa à transposição do rio São Francisco. Quer dizer, em vez de falar em revitalização, reflorestamento, falou em tirar água da Amazônia para o Nordeste. Uma idéia sem pé nem cabeça. Isso mostra o desconhecimento deste senhor. Se eu fosse ministro do meio ambiente também pediria demissão.

Fórum – Há especulações sobre nomes de substitutos. Há algum que poderia retomar esse compromisso?
Adilson Vieira –
Não vou opinar sobre especulações. Quem perdeu não foi só o governo Lula, mas a sociedade brasileira. Perdeu o compromisso dela e dá uma marcha ré no caminho para a sustentabilidade no desenvolvimento brasileiro. Um ministro que queira seguir o rumo trilhado vai estar muito debilitado. O sinal do governo é de falta de compromisso com o meio ambiente. Quem entrar vai ser um “bonequinho” para fazer licenciamento. O governo Lula não quer sustentabilidade.

Anselmo Massad

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