sábado, 11 de julho de 2009

Do blog Agencia Chasque...

Estamos rumo ao apartheid ambiental

Felipe Amaral

Porto Alegre (RS) - Estudo divulgado pala organização Oxfam Internacional alerta que podemos regressar 50 anos na luta pela erradicação da pobreza. A Oxfam é uma aliança, uma confederação de 13 organizações que tem uma similar filosofia e trabalham conjuntamente, além do suporte de sócios e colaboradores em todo o mundo. Suas atividades estão voltadas para assegurar a melhoria de condições de vida dos pobres e das comunidades marginalizadas.

O informe intitulado “Evidências que doem: as mudanças climáticas, os povos e a pobreza”, combina os últimos descobrimentos científicos sobre as mudanças climáticas com os testemunhos de comunidades espalhadas por mais de 100 países. O conteúdo releva como as alterações no sistema climático estão influenciando a estabilidade dos sistemas produtivos, sobretudo em países mais pobres, comprometendo as colheitas e ampliando o estado de fome e miséria já endêmicas em muitas regiões do globo.

O estudo é enfático ao afirmar que se medidas reais, eficientes e contínuas para redução dos efeitos do aquecimento global não forem adotadas e implementadas imediatamente, teríamos um retrocesso irreparável de 50 anos em todas as conquistas e avanços na erradicação da fome. O que levaria a humanidade a uma tragédia ainda neste século.

O informe publicado simultaneamente ao encontro do G-8 na Itália trata de temas pontuais e estabelece suas correlações como a fome, agricultura, saúde, trabalho, água, desastres e desabrigados, ou como diria: os refugiados ambientais.

Sobre a fome e agricultura, destaca como a instabilidade climática das estações anuais, com a redução das chuvas, está comprometendo as culturas tradicionais na Nicarágua, Uganda e Bangladesh. E que o arroz e o milho, os cultivos mais importantes e base da cadeia alimentar na Ásia, América e África, estão gradativamente reduzindo suas colheitas e a produtividade. Segundo os dados apresentados, até 2020 as colheitas de milho terão uma queda em torno de 20%, principalmente na África Subsahariana e Índia, regiões já empobrecidas.

O quadro apresentado para a saúde não deixa dúvidas sobre os efeitos das mudanças climáticas, principalmente pela ampliação de epidemias, pestes e enfermidades para regiões onde anteriormente não existiam registros de casos. Os cálculos estimam que ocorrerão em média 150 mil mortes a mais ao ano por distintas enfermidades, comparadas aos registros de 1970, principalmente por fatores ligados ao saneamento e à expansão de doenças para regiões climáticas onde não haviam registros.

Os desastres naturais estão mais freqüentes e mais intensos, com a previsão de triplicar os acontecimentos extremos até 2030, atingindo de forma desigual pobres e ricos, localizados em uma mesma região, área ou cidade. Isso se deve ao fato de que os mais abastados têm condições de mitigar seus danos e recompor sua vidas. Enquanto aqueles mais carentes e já debilitados economicamente não têm acesso a seguros e a outros meios, como financiamentos para habitação e construção, ficando reféns do poder público e do “mercado da caridade”.

Hoje os desabrigados ambientais, ou refugiados ambientais, somam 26 milhões de pessoas e as estimativas indicam um aporte anual de 1 milhão de pessoas.

Dentre os dados apresentados pelo estudo o mais surpreendente, pelas dimensões e efeitos sobre a economia de regiões industrializadas e urbanizadas, refere-se à influência do clima sobre o regime do trabalho. Onde o aumento das temperaturas pode reduzir o ritmo do trabalho, influenciando diretamente na jornada laboral e saúde dos trabalhadores. Principalmente para aquelas atividades desenvolvidas ao ar livre em cidades localizadas em regiões tropicais, podendo ter uma queda de até 30% na produtividade.

Enquanto líderes e chefes de estado discutem a possibilidade remota de efetivar medidas para redução dos efeitos do aquecimento global, com o protecionismo às atividades industriais e receio de encolhimento das economias, amplia-se a fome e a miséria.

O mundo dos ricos amplia os riscos para o mundo dos pobres. Implementa-se o apartheid climático ambiental.

Felipe Amaral é ecólogo e integrante do Instituto Biofilia (http://www.institutobiofilia.org.br).

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