De como exercer a ousadia moral
Por Mauro Santayana no JB on line
Velha teoria explica as guerras generalizadas como inevitável irritação
da História: as situações envelhecem e se tornam insuportáveis, para
estourar nos conflitos sangrentos. Alguns as veem como autorregeneração
do mundo, ao contribuir para o equilíbrio demográfico. Outros a atribuem
à centelha diabólica que dorme no coração dos homens e incendeia o ódio
coletivo. O mundo finará sem que entendamos a fisiologia do absurdo.
Para os humanistas, são repugnantes os massacres coletivos tanto como os
assassinatos singulares.
De qualquer forma, a História tem como eixo a tensão permanente entre guerra e paz; entre a competição e o entendimento; entre o egoísmo que se multiplica no racismo e a solidariedade internacional. Uma coisa é inegável: quando os mais fortes querem, não lhes faltam argumentos trôpegos para justificar a agressão. La Fontaine soube reduzir esse comportamento no diálogo entre o lobo e o cordeiro. Quando o lobo quer, os filhos são responsáveis por falsas culpas dos pais e as águas sobem os rios.
É interessante registrar, no episódio da questão do Irã, algumas dúvidas que assaltam o homem comum. A primeira delas – e devo essa observação a um amigo – é a do direito de os possuidores das armas atômicas decidirem quem pode e quem não pode desenvolver a tecnologia nuclear. Mais ainda, quando o árbitro maior é o governo do país que a usou criminosamente, ao arrasar, sem nenhuma razão tática ou estratégica, duas cidades inteiras e indefesas do Japão. Reduzidas as dimensões do absurdo, podemos aceitar como lícitas as associações criminosas, como as dos narcotraficantes dos morros. Possuidores de bom armamento, impõem sua lei às comunidades e constroem sua própria legislação, cobram tributos e exigem obediência, sob a ameaça dos fuzis e da tortura. Chegaremos assim a uma sociologia política, abonada indiretamente por Weber e outros, que admite todo poder de facto, sem discutir sua legitimidade ética.
O momento histórico é de grande oportunidade para a Humanidade – e de grande perigo, também. A República dos Estados Unidos é um lobo ferido em suas entranhas. Por mais disfarcem o choque, a eleição de Barack Hussein Obama lanhou as glândulas da tradição conservadora da Nova Inglaterra. A águia encolheu suas asas. A maioria dos estados e, neles, a maioria dos eleitores, decidiu por um homem mestiço, filho de pai negro e mãe branca, nascido em uma colônia dissimulada em estado, o Havaí; e que passou o período mais importante da formação, o da adolescência, na Ásia: na Indonésia muçulmana e no arquipélago em que nasceu.
No inconsciente coletivo, os Estados Unidos já sentem a decadência, que se acelerou com o neoliberalismo. Eles poderão administrá-la com inteligência, integrando-se em uma Humanidade que necessita, com urgência, de novos parâmetros e de nova tecnologia, capazes de preservar a natureza, hoje em acelerada erosão, ou entrar em desespero. Se entrarem em desespero, conduzirão o mundo a nova guerra, mas isso não parece provável, diante da crescente consciência antibélica de seu povo.
Por enquanto os falcões parecem contar com a Europa e com a China, no caso do Irã. Mas não há, nos horizontes movediços de hoje, país suficientemente forte, capaz de impor-se aos demais. A Europa desce a ladeira, com sua bolsa de euros de barro, e a União Europeia se encontra ameaçada de fragmentação. A China é uma nebulosa impenetrável. O capitalismo financeiro descolou-se de qualquer compromisso ético, se é que o teve um dia. O sistema se torna mais selvagem quando se vale dos instrumentos tecnológicos de operação universal e instantânea.
É nesse momento que a presença do Brasil começa a impor-se no cenário internacional. Não temos armas atômicas, não dispomos de exércitos numerosos e bem equipados, mas somos chamados a manter o bom-senso, e manter o bom-senso é exercer a ousadia moral.
Digam o que disserem os quislings domésticos, o Brasil ganhou o respeito do mundo ao buscar a paz no Oriente Médio. Se contribuirmos para evitar o conflito, nosso será o mérito; se não houver o êxito, fica, na História, o testemunho de um esforço destemido e honrado – e não menos meritório.
De qualquer forma, a História tem como eixo a tensão permanente entre guerra e paz; entre a competição e o entendimento; entre o egoísmo que se multiplica no racismo e a solidariedade internacional. Uma coisa é inegável: quando os mais fortes querem, não lhes faltam argumentos trôpegos para justificar a agressão. La Fontaine soube reduzir esse comportamento no diálogo entre o lobo e o cordeiro. Quando o lobo quer, os filhos são responsáveis por falsas culpas dos pais e as águas sobem os rios.
É interessante registrar, no episódio da questão do Irã, algumas dúvidas que assaltam o homem comum. A primeira delas – e devo essa observação a um amigo – é a do direito de os possuidores das armas atômicas decidirem quem pode e quem não pode desenvolver a tecnologia nuclear. Mais ainda, quando o árbitro maior é o governo do país que a usou criminosamente, ao arrasar, sem nenhuma razão tática ou estratégica, duas cidades inteiras e indefesas do Japão. Reduzidas as dimensões do absurdo, podemos aceitar como lícitas as associações criminosas, como as dos narcotraficantes dos morros. Possuidores de bom armamento, impõem sua lei às comunidades e constroem sua própria legislação, cobram tributos e exigem obediência, sob a ameaça dos fuzis e da tortura. Chegaremos assim a uma sociologia política, abonada indiretamente por Weber e outros, que admite todo poder de facto, sem discutir sua legitimidade ética.
O momento histórico é de grande oportunidade para a Humanidade – e de grande perigo, também. A República dos Estados Unidos é um lobo ferido em suas entranhas. Por mais disfarcem o choque, a eleição de Barack Hussein Obama lanhou as glândulas da tradição conservadora da Nova Inglaterra. A águia encolheu suas asas. A maioria dos estados e, neles, a maioria dos eleitores, decidiu por um homem mestiço, filho de pai negro e mãe branca, nascido em uma colônia dissimulada em estado, o Havaí; e que passou o período mais importante da formação, o da adolescência, na Ásia: na Indonésia muçulmana e no arquipélago em que nasceu.
No inconsciente coletivo, os Estados Unidos já sentem a decadência, que se acelerou com o neoliberalismo. Eles poderão administrá-la com inteligência, integrando-se em uma Humanidade que necessita, com urgência, de novos parâmetros e de nova tecnologia, capazes de preservar a natureza, hoje em acelerada erosão, ou entrar em desespero. Se entrarem em desespero, conduzirão o mundo a nova guerra, mas isso não parece provável, diante da crescente consciência antibélica de seu povo.
Por enquanto os falcões parecem contar com a Europa e com a China, no caso do Irã. Mas não há, nos horizontes movediços de hoje, país suficientemente forte, capaz de impor-se aos demais. A Europa desce a ladeira, com sua bolsa de euros de barro, e a União Europeia se encontra ameaçada de fragmentação. A China é uma nebulosa impenetrável. O capitalismo financeiro descolou-se de qualquer compromisso ético, se é que o teve um dia. O sistema se torna mais selvagem quando se vale dos instrumentos tecnológicos de operação universal e instantânea.
É nesse momento que a presença do Brasil começa a impor-se no cenário internacional. Não temos armas atômicas, não dispomos de exércitos numerosos e bem equipados, mas somos chamados a manter o bom-senso, e manter o bom-senso é exercer a ousadia moral.
Digam o que disserem os quislings domésticos, o Brasil ganhou o respeito do mundo ao buscar a paz no Oriente Médio. Se contribuirmos para evitar o conflito, nosso será o mérito; se não houver o êxito, fica, na História, o testemunho de um esforço destemido e honrado – e não menos meritório.
Nenhum comentário:
Postar um comentário