Cortina de fumaça, manchas de petróleo
Por Brizola Neto em seu blog tijolaco
Enquanto o óleo jorra sem parar do furo no fundo do mar deixado
pela plataforma “Deepwater Horizon”, na maior catástrofe ambiental que
os Estados Unidos, o New York Times publica uma matéria
intitulada “Longe do Golfo, vazamento de petróleo na Nigéria dura 50
anos”.
Confesso que em um primeiro momento, pensei se tratar de uma “cortina
de fumaça”, já que os dados técnicos contidos na matéria datam de 2006,
e me pareceram “convenientemente requentados” para dizer algo como:
“É, aqui no Golfo está ruim… mas lá está pior!” Ou seja , uma matéria
para amenizar a irresponsabilidade da British Petroleum no episódio .
Sabem como é, de tantas que a nossa mídia faz, a gente fica assim
Mas a reportagem é chocante, sobretudo pela postura “Pôncio
Pilatos” assumida pelas multinacionais que operam na região justificam a
catástrofe. Com uma população majoritariamente miserável, reservas
gigantes de petróleo, e uma economia que depende quase que
exclusivamente de sua extração, fica fácil descobrir quem manda
realmente na Nigéria.
O sistema de concessões, tão elogiadopor nossos privatistas, é o que
vigora na Nigéria. Nas licitações, claro que todos os projetos de
perfuração e exploração são “limpos e seguros” . Na realidade, como
mostram as fotos, a coisa é diferente. Segundo a reportagem até
“546 milhões de galões de petróleo foram derramados no Delta do (Rio)
Níger nas últimas cinco décadas, ou quase 11 milhões de galões por ano,
concluiu um relatório de 2006 feito por uma equipe de especialistas do
governo da Nigéria e de grupos ambientalistas locais e internacionais”
O incrível é que o óleo derramado, segundo a matéria, não é
unicamented oriundo de problemas nos poços, mas também dos oleodutos e árvores
de natal (aquela válvula que “tampa” os poços terrestres)
abandonadas. Ou seja, pela pura falta de manutenção e monitoramento. O
óleo invade manguezais próximos ao delta do rio Níger, expulsando
pescadores, forçando os moradores a buscar água para beber, banhar-se e
cozinhar, cada vez mais longe de suas casas. “Há petróleo Shell no
meu corpo” – resume Hannah Baage, moradora do entorno da região
afetada.
Segundo os moradores, quando recauchutam um cano, logo
outro estoura, e não parece haver muita vontade do governo em melindrar
seus principais patrocinadores, que preferem culpar a população. Veja a
inacreditável declaração de Caroline Wittgenstein, porta-voz da Shell
no país:
“Nós não discutimos vazamento individuais” – “a vasta maioria é
causada por sabotagem ou roubo, com apenas 2% devido à falha de
equipamento ou erro humano. Nós não acreditamos que nos comportamos de
forma irresponsável, mas operamos em um ambiente único onde a segurança e
a ilegalidade são os maiores problemas”.
O que ela quer dizer é que o derrame é culpa dos nigerianos
miseráveis que furam os oleodutos para obter combustível e de movimentos
políticos que estariam sabotando os dutos. Os ambientalistas, porém,
apontam a falta de manutenção como o vilão ecológico.
Boa parte dos “ladrões” de petróleo, aliás, são as pessoas que ali
moram há séculos, milênios, e que nas últimas décadas já nem conseguem
mais o que pescar para seu próprio sustento.
A mancha de óleo no Golfo do México é um notícia , e tem que ser
mesmo um escândalo. A mancha de óleo na Nigéria é um escândalo, mas não
é notícia.
Amanhã vou publica um vídeo muito interessante, de uma escritora
nigeriana, Chimamanda Adichie, que mostra como o Ocidente “civilizado”
“entende” os africanos. Não deixe de assistir, é uma luz que se abre em
nossas cabeças sobre o quanto somos incapazes de entendermos que somos
uma só humanidade.
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