sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Discussão por royalties oculta conquista de marco regulatório para o pré-sal


Ricardo Stuckert/PR
Foto: Ricardo Stuckert/PR

Felipe Prestes no Sul21


A Câmara dos Deputados aprovou ontem (1) o marco regulatório para a exploração do pré-sal. O texto cria o Fundo Social que destinará recursos da extração do petróleo do pré-sal para a educação, combate à pobreza, saúde, cultura, ciência e tecnologia e proteção ao meio-ambiente. A garantia de recursos para a população brasileira, contudo, foi eclipsada pela discussão sobre uma emenda que altera a partilha dos royalties para qualquer exploração de petróleo em alto mar. “Realmente esta discussão acabou ficando num patamar acima da importância que merecia diante da aprovação do marco regulatório”, diz a deputada federal Maria do Rosário (PT).
O texto da emenda retira os atuais privilégios para estados onde ocorre a produção de petróleo, como Rio de Janeiro e Espírito Santo. Fica estabelecido que uma parcela dos royalties vai para a União e outra para municípios afetados pela produção do petróleo, sendo o restante distribuído pelos critérios do Fundo de Participação dos Municípios (50%) e pelos critérios do Fundo de Participação dos Estados (50%). Além de desagradar aos estados que perderão benefícios, a emenda desagradou ao governo federal porque estabelece que caberá à União compensar estes estados.
O governo federal alega que pagar esta compensação irá reduzir drasticamente os benefícios do Fundo Social. O ministro das Relações Institucionais Alexandre Padilha declarou hoje (2) à Agência Brasil que vai pedir para o presidente Lula vetar a emenda. “Vou defender o veto e que se abra o debate na próxima legislatura. A emenda retira recursos do Fundo Social que iriam para educação, cultura, ciência e tecnologia e coloca nos gastos correntes dos estados”, disse.
“O risco de veto é grande, infelizmente”, diz o deputado federal Beto Albuquerque (PSB). Ele lamenta o possível veto porque, ao contrário de Padilha, acredita que uma compensação aos estados onde é produzido o petróleo seria ínfima perto das riquezas que pode gerar o pré-sal. “A perspectiva de arrecadação com o pré-sal é tão grande que a compensação para Rio de Janeiro e Espírito Santo é infinitamente menor”, diz.
A deputada federal Maria do Rosário (PT) não está tão certa sobre este cálculo e diz que é este impacto que deve ser avaliado pelo presidente Lula antes de decidir se veta ou sanciona a emenda. “É a análise que tem que ser feita nos próximos dias. Acredito que o presidente Lula irá avaliar isto antes de decidir se aprova ou não a emenda”.
Apesar de defender a compensação, Beto Albuquerque ressalta que o mais justo é que todos os estados tenham participação nos royalties, “porque a Petrobras é construída com o dinheiro de todos os brasileiros”.
Os parlamentares Ibsen Pinheiro (PMDB) e Maria do Rosário (PT) concordam com o socialista: o grande erro está na origem, quando foi determinado o pagamento de royalties, já que os estados nada produzem, e a Petrobras é uma empresa de todos os brasileiros. “O mar territorial não pertence aos estados”, diz o peemedebista. “É um equívoco pagar royalties aos estados”, diz a petista.
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"União é o primo rico da extração de petróleo" (Foto: Divulgação)
Entretanto, Ibsen e Rosário discordam quanto à compensação aos estados “produtores”. Para o peemedebista, a União deve compensar os estados. “A compensação será feita pela União, que foi quem criou o problema. Ela ganha 40% de royalties. É o primo rico da extração de petróleo. Não podem ser os estados a bancar esta compensação”. A petista não tem um conceito fechado sobre esta matéria, considera a questão “complexa”. Reconhece que uma perda brusca de recursos seria prejudicial para os estados, mas acredita que benfeitorias muito maiores para todos os brasileiros podem ser feitas por meio do Fundo Social. Acredita que os estados também precisam se adaptar à perda de recursos, mas reconhece que talvez fosse necessário pensar em uma transição gradual até o fim do repasse destes recursos para os estados. Rosário garante que confia na avaliação do presidente Lula e irá apoiar qualquer decisão que ele tome.
Interlocutores do governo no Congresso afirmam que o presidente Lula deve optar pelo veto. O líder do governo na Câmara Candido Vacarezza (PT-SP) declarou à Agência Brasil ser “natural” que o presidente vete a emenda, que Lula já teria dito que considera inconstitucional. A líder do governo no Senado Ideli Salvatti, disse que “a sinalização é de veto por parte do presidente Lula”. Salvatti afirmou que há um projeto de lei no Senado que discute critérios mais amplos para a distribuição dos royalties. “Com o veto do presidente, há grande possibilidade de darmos sequência a esses debates”
Benefícios para a população
O Fundo Social será constituído com verbas de um bônus de assinatura destinado pelos contratos de partilha de produção, pelos royalties destinados à União — descontada a parte que vai a determinados órgãos do governo — e por receitas de comercialização de petróleo e gás natural pela União. De acordo com a lei que cria o fundo, 50% dos ganhos deste fundo deverão ir para a educação (80% disto para ensino fundamental e infantil). “O Fundo Social abre uma perspectiva muito grande para a educação brasileira”, diz Maria do Rosário.
O texto diz que “a finalidade do Fundo Social é de constituir fonte de recursos para o desenvolvimento social e regional, na forma de programas e projetos nas áreas de combate à pobreza e de desenvolvimento da educação, da cultura, da saúde pública, da ciência e tecnologia e de mitigação e adaptação às mudanças climáticas”.
Uma alteração em relação ao projeto enviado pelo governo destina ainda mais recursos para o Fundo Social. Os recursos de royalties das áreas de pré-sal que já estão sendo exploradas em regime de concessão também devem ser direcionados ao Fundo Social. Calcula-se que o montante total que pode ser destinado ao Fundo só nestas áreas — que correspondem a 28% das áreas do pré-sal — seja de R$ 160 bilhões.
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"Riquezas do pré-sal serão usufruídas de acordo com os interesses do país" (Foto: Divulgação)
Partilha e desenvolvimento industrial
Além dos benefícios sociais, o marco regulatório institui o regime de partilha para as áreas ainda não concedidas do pré-sal. Diferentemente da concessão, a partilha faz com que a Petrobras seja a operadora em todas as áreas e tenha no mínimo 30% dos direitos e obrigações da exploração do petróleo em cada bloco do pré-sal. “A União agora é proprietária do óleo. Não é mais concessionária”, ressalta o deputado Ibsen Pinheiro. “O sistema de partilha assegura que as riquezas do pré-sal sejam usufruídas de acordo com os interesses do país”, comemora Maria do Rosário.


Gerenciando todos os blocos de extração do pré-sal, a Petrobras tem um plano ambicioso de estímulos à indústria nacional. A estatal poderá definir que equipamentos serão usados em todos os blocos, e quais serviços serão contratados. E pretende privilegiar a indústria brasileira. O texto do marco regulatório institui inclusive que os editais de contratos de partilha para exploração do pré-sal especifiquem a proporção de bens e serviços que deverão ser produzidos e prestados no País. E o Executivo terá 120 dias após a publicação do marco regulatório para apresentar medidas que aumentem a participação de empresas de pequeno e médio porte na exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás.

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