quinta-feira, 5 de maio de 2011

Violência escolar se combate na escola

Rachel Duarte no Sul21

“Não há escola sem bullying”, disse o especialista gaúcho em Direitos Humanos Marcos Rolim durante palestra nesta quarta-feira (04), no Galpão Crioulo do Palácio Piratini. Ele foi um dos convidados pela Secretaria Estadual de Educação para auxiliar o governo gaúcho a trabalhar na prevenção da violência nas escolas. A iniciativa, que faz parte do projeto Governo Escuta, reuniu acadêmicos e ativistas ligados ao tema, os quais apresentaram dados e caminhos para o enfrentamento da violência na rede escolar gaúcha. A intenção é definir açõesque serão aplicadas paralelamente ao lançamento da campanha publicitária do governo sobre prevenção à violência escolar.
Rolim apresentou a definição sobre o bullying como um conjunto de atitudes agressivas e repetitivas entre pares, ou seja, um fenômeno que não segue uma hierarquia. “Pode acontecer entre professores também”, exemplificou. Segundo o especialista gaúcho, todas as escolas tem este tipo de violência, mas, como normalmente as vítimas ficam caladas, é difícil perceber e interferir. Ainda há despreparo ou desconhecimento das escolas no enfrentamento do bullying. “A característica é a agressão verbal repetitiva, normalmente por criação de apelidos ou piadas homofóbicas. Isso faz com que a vítima perca sua identidade. Ela fica conhecida pelo apelido, que normalmente é uma ridicularização de alguma característica física”, explicou.
As humilhações sofridas na escola causam consequências severas às vítimas, como sofrimento moral, aumento do risco de suicídio e das chances de uma vida adulta criminosa. Além dos sofrimentos físicos e psíquicos, há o baixo desempenho e a evasão escolar.

Como acontece?

Segundo pesquisas internacionais, a maioria dos casos de bullying ocorre com alunos da 5ª a 8ª série. Tanto as vítimas como os autores tendem a ter um desempenho escolar abaixo da média. A violência doméstica também contribui para a prática, já que, ao bater no filho, o pai ou a mãe passam a ideia de que a violência é uma forma legítima de solução de conflitos, explicou Rolim. Ele lamentou o fato de no Brasil haver poucas pesquisas sobre o fenômeno e apresentou os resultados do estudo que realizou, durante sete meses, com alunos da Escola Odila Gay da Fonseca, em Porto Alegre. O trabalho, retratado no livro Bullying: o pesadelo da escola, apontou que agressores e vítimas têm um perfil muito semelhante.
José Vicente Tavares (Foto: Ramiro Furquim/Sul21)

Para o professor titular do Departamento de Sociologia e do Programa de Pós-graduação em Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UFRGS, José Vicente Tavares, a sociedade apresenta sintomas de uma crise social que se manifesta de diversas formas. “A violência na escola é a expressão da insegurança estrutural da sociedade contemporânea, das crises nas instituições, na família e nos grupos de referência”, comparou. Defensor de uma campanha de combate à violência, Tavares destaca o papel das instituições. “A escola é o centro do problema e também é a solução”.
Além de apontar saídas para o conflito, o professor lembra que a maioria dos problemas ocorrem nas escolas. “É preciso reconhecer que existe violência no espaço escolar, diferenciar os tipos de violência e apontar várias estratégias de prevenção para cada tipo. Por ser uma instituição de socialização, a escola é o limite, pois é o ponto de condensação dos conflitos sociais”, acrescentou.
Considerado um dos exemplos de combate ao bullying na Capital, a Escola Padre Reus foi um exemplo citado no debate. O diretor da instituição Ruy Rosário Guimarães explicou o trabalho de resgate desde a estrutura física até ações de aproximação com a comunidade feita pela escola para coibir a violência. Em 2004, quando assumiu a direção do estabelecimento, Guimarães deparou-se com um cenário desolador, com o prédio da instituição depredado e elevado índice de agressividade entre os alunos. A solução foi desenvolver um projeto de conscientização através da música, do esporte e do teatro. “Há dois anos não precisamos pintar a escola. Também não registramos mais casos de vandalismo”, reconhece, lembrando que o dinheiro economizado é revertido na aquisição de equipamentos de informática.
Desde 2006, alunos, professores e funcionários participam das oficinas do projeto Escola sem Violência, idealizadas pelo professor Aloizio Pedersen. Em cinco anos, a instituição reduziu os índices de evasão e de violência no ambiente escolar.
Por onde começar?
O especialista em Direitos Humanos, Marcos Rolim, propõe a adoção de regras de comportamento claras, que sejam conhecidas pelos professores, alunos, funcionários e pais, como forma de evitar a ocorrência de atos violentos no ambiente escolar. Para casos em que a violência, física ou psicológica, já ocorreu, o professor Rolim sugere a adoção dos Círculos de Justiça Restaurativa, em que agressores e vítimas ficam frente a frente, acompanhados por um mediador.
Já que a prática do bullying costuma ocorrer na presença de outras pessoas, servindo como forma de auto-afirmação do agressor, entre as medidas sugeridas pelo palestrante estão a chegada dos professores, na sala de aula, antes dos alunos, o monitoramento do recreio e da entrada e saída dos estudantes. A colocação de caixas para que os alunos possam denunciar agressões sofridas, por eles ou por colegas, é outra proposta. A aplicação de questionários para serem respondidos de forma anônima pelos estudantes, contribui para evitar a violência, pois permite a direção conhecer a realidade da escola e identificar os conflitos existentes.
Manoel Soares (Foto: Ramiro Furquim/Sul21)

O jornalista e ativista da Cufa (Central Única das Favelas) no Rio Grande do Sul, Manoel Soares, fez uma exposição sobre a realidade que acompanha diretamente no trabalho que realiza nas periferias. Ele fez referência ao município de Canoas, que desenvolve políticas públicas para enfrentar a violência nas escolas que reúnem tecnologia e convivência comunitária dos agentes do estado. O jornalista apresentou uma reportagem que realizou na cidade, ressaltando a importância do poder público para ações além de campanhas publicitárias.
Em Canoas, foram criadas Comissões Internas de Prevenção à violência escolar (CIPAVES), formada por representantes da rede escolar e da comunidade. Também foi instituída a ronda escolar com guardas municipais foram capacitados para ter uma relação de proximidade com os estudantes, pais e professores para conseguir mediar os conflitos e para encaminhar casos a Brigada Militar, caso necessário. E, nas escolas municipais, foram implantadas câmeras de circuito fechado interno de TV e sistema de alarmes.

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