segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Assentamentos: as dificuldades quase 20 anos depois

A região da Campanha é uma das regiões do Estado que mais abriga assentamentos de trabalhadores rurais.
 
fotos: Francisco Bosco 
Maritza Costa Coitinho no JORNAL MINUANO
MELHORIAS: já foram registradas, mas ainda há muito o que mudar
 

A expressão "assentamento", segundo o site oficial do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), é utilizada para identificar não apenas uma área de terra no âmbito dos processos de Reforma Agrária, destinada à produção agropecuária e ou extrativista, mas também um espaço heterogêneo de grupos sociais constituídos por famílias camponesas, que ganham a terra depois de desapropriada ou adquirida pelos governos federal e ou estadual, com o fim de cumprir as disposições constitucionais e legais relativas à Reforma Agrária. As cidades de Bagé, Candiota, Hulha Negra e Aceguá somam 55 assentamentos, incluindo os federais (criados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), conjuntos (Incra e governo estadual), estaduais (governo estadual) e municipais. O primeiro assentamento desta região foi o PA Fazenda São Francisco, em Candiota, criado em 10 de junho de 1992. O local também é chamado de 8 de agosto, em homenagem à data em que os assentados chegaram na área pela primeira vez.
No total, já são 1 755 famílias assentadas na região, conforme a assessoria de imprensa do Incra. Quando o instituto adquire uma área, procede à seleção de famílias entre aquelas cadastradas como candidatas. Quando um lote é abandonado ou retomado, o Incra também seleciona nova família, através dos Editais de Lotes Vagos.
A Cooperativa Regional dos Agricultores Assentados (Cooperal), que agrega assentados de Candiota, Hulha Negra e Aceguá, é uma das experiências consideradas de maior sucesso pelo Incra. Com 1,6 mil associados, a Cooperal possui, atualmente, 626 produtores de leite que produzem 600 mil litros do produto por mês, comercializados para a indústria de lácteos. Assim, esses assentados cumprem uma das determinações exigidas, que é o compromisso de promover uma agroecologia cooperada. A ideia é estimular as famílias a organizar a agroindústria de forma cooperativada, garantindo uma renda mensal aos associados, assegurando preços aos produtos e viabilizando a comercialização da produção.
Na Cooperal, dirigida pelo assentado Dirceu Zanatto, 35 anos, há 13 assentado, já tem 18 anos e garante renda mensal próxima de um salário mínimo para cada participante. "A produção de leite é financeiramente mais segura. Os assentados têm muitas dificuldades e as cooperativas são uma das soluções", avalia. Entre as dificuldades, estão o clima instável, que já trouxe prejuízos de 90% na produção, e a falta de infraestrutura, como água potável, que falta em cerca de 95% dos assentamentos, e estradas. A luz também falta constantemente. "Já chegamos a ficar seis dias sem luz, o que prejudicou a produção", conta ele.
Zanatto, que vive no assentamento Madrugada com a mulher e quatro filhas, diz que, perto do que foi no início, as dificuldades de hoje são mínimas. "Foi tudo muito sofrido, não tínhamos nem luz. Ficamos seis meses sem nada e, aos poucos, foi tudo se ajeitando. Sofríamos muita rejeição da sociedade. Hoje, já nos aceitam mais", comenta ele, falando sobre o preconceito. Outras lembranças ruins, como as crianças estudando embaixo de lonas, também vieram à tona.
Sobre a rejeição inicial, ele diz que hoje está mais tranqüilo. "Somos muito organizados e, hoje, as pessoas nos olham com outros olhos", acrescenta. Perguntado sobre a postura de assentados que vendem ou arrendam suas terras, ele diz que, como em todas as classes, há pessoas que não fazem o trabalho sério. "Mas não é bem assim. A verdade é que muitos vão embora por não se adaptarem ao trabalho e acabam vendendo a terra bem barata só para poder sair", defende ele.
A maioria dos assentados da região vem das Missões. É o caso de Marli Caetano da Silva, que veio de Herval Seco e está assentada há 13 anos. Ela diz que não dá para viver só da renda da comercialização do leite e que, para complementar, o marido vende verduras. "Nossa vida é muito difícil, não temos acesso à saúde e tudo é muito longe. Quando alguém passa mal, tem que procurar um carro para levar", diz ela, mostrando uma cicatriz no joelho, conseqüência de um tombo e que poderia, certamente, ser muito menor se o atendimento fosse mais rápido e eficiente. Marli reclama também que é difícil a conclusão do estudo dos filhos. Dos sete, dois foram até a sexta série e um terceiro concluiu o Ensino Fundamental. Os mais novos, que ainda moram com ela, enfrentam a insistência da mãe para concluir os estudos. "Quero que eles possam ter uma vida melhor", comenta.
 
fotos: Francisco Bosco
TRANSPORTE: muitos se locomovem de carroça
 
 
FRANCISCO BOSCO
REBANHO: produção do leite garante sustento
 
     
FRANCISCO BOSCO
COLETA LEITEIRA: trabalho diário
 
 
FRANCISCO BOSCO
ZANATTO: coordena cooperativa
 
     
FRANCISCO BOSCO
MARLI: elenca dificuldades

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