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segunda-feira, 25 de abril de 2011

Um olhar verde sobre o jornalismo


A presença dos temas ambientais na mídia e a compreensão dos processos de sustentabilidade exigem profissionais bem formados e com uma profunda visão do papel social da mídia como referência e instrumento de transformações. Por Dal Marcondes

Verde deve ser a cor do jornalismo do século XXI. Não um jornalismo adjetivado de ambiental, praticado por jornalistas especializados em meio ambiente, mas o meio ambiente presente em todo o jornalismo. Os termos jornalismo ambiental e desenvolvimento sustentável são profundamente anacrônicos. Não é desenvolvimento se não for sustentável, assim como é precário o jornalismo que não incluir em suas variáveis a transversalidade ambiental. O jornalista, como um generalista que é, acaba adjetivando seu mister pelo simples fato de que deseja se destacar em uma ou outra área do conhecimento. Sempre haverá o jornalismo econômico, o esportivo, o social e muitas outras variáveis, mas deve estar fadado à extinção a prática exclusiva de uma vertente ambiental.
A mídia e os jornalistas têm um papel fundamental na construção do futuro dentro dos conceitos de sustentabilidade. A ex-primeira ministra da Noruega e diretora da Organização Mundial de Saúde, Gro Brundtland, em seu relatório sobre sustentabilidade definiu o termo de forma muito simples: “Ser sustentável é suprir as necessidades das atuais gerações sem comprometer a capacidade das gerações futuras em suprir suas próprias necessidades”.
O que isto quer dizer? De uma forma bastante simplista isto significa que a humanidade não vai se extinguir na atual geração de pessoas. Nós teremos filhos, netos e bisnetos, que por sua vez também irão se reproduzir. Todas estas gerações vão precisar de água potável, alimentos e todos os benefícios de uma civilização evoluída e tecnológica. Para isto deverão encontrar na natureza os recursos que serão necessários para satisfazer suas necessidades.
O jornalismo ambiental surgiu da necessidade de mostrar à sociedade, aos governos e às empresas que o modelo de desenvolvimento adotado durante o século XX é insustentável em longo prazo. Muitos ambientalistas dizem isto há anos, no entanto a mídia se faz surda diante da necessidade de uma reflexão mais profunda sobre este modelo e da necessidade de transformações. Os argumentos para o distanciamento da mídia dos temas referentes à sustentabilidade, aqui visto como um equilíbrio entre as vertentes econômica, social e ambiental, são de toda a ordem. Um deles, e muito forte, é que a mídia é uma das principais beneficiárias do modelo de desenvolvimento baseado nos princípios da “Sociedade de Consumo”. Isto porque a publicidade é uma das mais importantes ferramentas deste modelo e é esta a forma como a mídia se sustenta. Uma sociedade menos voraz e consumista talvez seja também uma sociedade com menos publicidade.
Na última década do século XX, inicialmente impulsionadas pela realização no Rio de Janeiro da Cúpula da Terra, também conhecida como Rio-92, surgiram as “mídias ambientais” e grandes jornais passaram a ter meio ambiente como uma de suas editorias. As mídias que atuam exclusivamente com pautas ambientais se estabeleceram e se desenvolveram dentro do mesmo princípio das mídias de resistência à ditadura nos anos 70. São jornais, revistas e sites que se mantém à margem do processo de comunicação de massa, mas que conseguem grande audiência entre os formadores de opinião na área de meio ambiente e sustentabilidade.
O jornalista sempre foi vanguarda nas conquistas políticas e sociais. No entanto, esta é uma fronteira mais espinhosa, exige conhecimento, formação e capacidade para lidar com a diversidade de variáveis que formam as sociedades e organizações complexas. No início acreditava-se que o jornalismo ambiental seria um vertente do jornalismo científico. Isto porque havia conceitos da biologia, da física, da geografia que precisavam ser dominados para a elaboração de boas reportagens ambientais. No entanto, a sustentabilidade ambiental não se restringe a um nicho social. É uma variável presente em todas as decisões humanas e que precisa ser explicitada como tal. A sociedade define o que deseja em termos de sustentabilidade quando estabelece seus padrões de consumo de energia, de matérias-primas, de embalagens, de alimentos etc. Tudo o que se faz tem impactos ambientais anteriores e posteriores ao consumo. O jornalista que pretende compreender este planeta megadiverso não pode simplesmente ter um olhar superficial sobre a realidade, deve compreender suas interfaces e sua cadeia de consequências.
No Brasil isto é ainda mais estratégico, na medida que a biodiversidade e os recursos naturais são as commodities do futuro e devem ser compreendidas como tal por toda a sociedade. A vanguarda desta transformação conceitual é formada por jornalistas capazes de compreender esta realidade e seguir atuando de forma objetiva na disseminação de informações e conhecimento para a  sociedade.  (Envolverde)

Dal Marcondes

Dal Marcondes é jornalista, diretor da Envolverde, passou por diversas redações da grande mídia paulista, como Agência Estado, Gazeta Mercantil, Revistas Isto É e Exame. Desde 1998 dedica-se a cobertura de temas relacionados ao meio ambiente, educação, desenvolvimento sustentável e responsabilidade socioambiental empresarial. Recebeu por duas vezes o Prêmio Ethos de Jornalismo e é reconhecido como um "Jornalista Amigo da Infância" pela agência ANDI.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Pedagogia ecológica: Proposta para evitar tragédias e salvar vidas

 

 

Marcus Eduardo de Oliveira (*)
14446.jpegInequivocamente, o homem é um agressor em potencial da natureza. Esse pouco cuidado com o meio ambiente, aprofundado enfaticamente no último meio século, já fez centenas de milhares de vítimas mundo afora.
            Enquanto os horizontes do sistema de mercado priorizarem a busca incessante do lucro, pouco se importando se com isso o meio ambiente será ou não afetado, a natureza, agredida sem piedade, vai aos poucos dando seu recado.
            Nessa história toda parece que continuamos - nós, o bicho-homem -, sem aprender algo substancial, enquanto vítimas e mais vítimas - humanos, animais, plantas, flores e frutos - vão tombando pelo caminho. É a vida em toda sua plenitude que está sendo dilacerada.
            A recente tragédia na Região Serrana do estado do Rio de Janeiro, com vítimas fatais que aumentam a cada dia, afora o descaso do poder público que sempre fez vistas grossas para a construção de habitações nas encostas íngremes e irregulares, pois isso rende votos, é, na essência, culpa do desequilíbrio ambiental que tem, na origem, a agressão humana para com a Mãe e a Irmã Natureza.
 
            Talvez não seja precipitado associar as fortes chuvas dos últimos dias ao aquecimento global. Um aquecimento que propicia em seu conjunto mais energia no sistema climático. No centro da questão está a agressão ambiental para atender ao sistema de produção que "reclama" mais produtos no mercado.
            Enquanto grande parte de nossa gente, dos diversos estratos da sociedade, continuar a atender aos ditames do mercado engrossando os apelos do consumo voraz, insistindo em ver a natureza apenas como mero apêndice de um sistema econômico cada vez mais tacanho e perverso, capaz de construir uma "falsa" riqueza sobre os reais escombros da natureza, outras tragédias surgirão e mais e mais mortes serão computadas.
            Para tentar reverter essa trágica situação, a idéia da prática de uma Pedagogia Ecológica, ou tenha isso o nome que tiver - ecopedagogia, consciência ecológica, bioeconomia, socialismo ecológico e outros -, se insere como condição essencial de aprendizagem capaz de proporcionar não só qualidade de vida, mas sim a preservação da própria vida.
            Essa Pedagogia Ecológica aqui modestamente defendida, é fruto de ponderações de renomados pensadores da órbita ambiental, e tem como ponto focal pensar num mundo sustentável partindo do conhecimento pleno do ambiente aliado a uma relação harmoniosa para com a natureza.
            Essa Pedagogia Ecológica, para resumirmos essa idéia em poucas palavras, pressupõe uma regência do mundo natural, em todas suas matizes, de forma a se coadunar na prática do comum e irrestrito respeito ambiental, afastando-se do consumo voraz e vendo a vida no futuro como parceira indispensável da natureza.
            Na essência, trata-se de uma proposta de ecologia pedagógica que visa ensinar primeiro a respeitar o recurso natural, pois isso se reflete na qualidade de vida. Isso deverá ser ensinado nos primeiros anos de estudo, fazendo com que a garotada tenha contato inicial com a necessidade de preservar a natureza, tal qual defendemos em outro artigo que, para nossa satisfação, teve boa acolhida e ampla repercussão nos sites e boletins informativos que circulam pela internet (*).
            Além disso, essa proposta de Pedagogia Ecológica não deverá ficar restrita aos bancos escolares. É necessário e mesmo fundamental para o sucesso dessa proposta, que isso ganhe tom de campanha nacional, veiculado em termos de propaganda televisiva no horário nobre, permitindo a possibilidade de maior consciência ecológica de todos nós.
            A "linguagem" usada nessa proposta de Pedagogia Ecológica televisiva e escolar, deve ser fácil e inteligível, capaz de "chegar" a todos, do Phd que poderá reproduzir isso em sala de aula, até o mais humilde morador de uma simples habitação num pedaço de morro qualquer.
            Edward Teller certa vez disse que "A ciência procura encontrar lógica e simplicidade na natureza". Kepler, de certa forma, corroborou afirmando que "A natureza ama a simplicidade" e Newton, por sua vez, pontuou que "(...) a natureza se apraz com a simplicidade".

            Pois é com essa simplicidade, levando um discurso de reconstrução e preservação ambiental que devemos trabalhar. A hora é de unir esforços - poder público, sociedade civil, organizações não governamentais, movimentos populares, imprensa e universidade - para levar à frente essa campanha de Pedagogia Ecológica que é mais que informativa; é uma campanha de orientação e precaução de novas tragédias.
            Uma vez realçada essa idéia, incorporando novos adeptos, não seria presunção afirmar que outras tragédias poderão ser evitadas. Assim, se há alguém ou algo que poderá ganhar com isso, esse "algo" é, certamente, uma "coisa" indispensável que nos foi dada com total estima: a vida.
            Assegurar a vida é, antes, buscar o equilíbrio ecológico. Para isso, nada melhor que todos tenham em mente a necessidade de saber o que fazer com a natureza.             A natureza nunca foi má conosco; nós é que sempre fomos perversos com ela. É a nossa chance de retribuir o que a natureza sempre nos deu.
(*) Ver o artigo "Sustentabilidade deve ser ensinada e praticada na Escola", de nossa autoria.
Marcus Eduardo de Oliveira é economista e professor de economia da FAC-FITO e do UNIFIEO, em São Paulo. Especialista em Política Internacional pela (FESP) e mestre pela (USP). Colunista do Portal EcoDebate, do site "O Economista", da Agência ADITAL, do jornal Diário Liberdade (Galícia) e da Agência Zwela de Notícias (Angola).

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Ibama, Belo Monte e um rolo compressor

Leonardo Sakamoto em seu blog


O blog Político, da revista Época, informa que a saída do presidente do Ibama, oficializada hoje, não se deu por motivos pessoais, como alega sua carta de demissão, e sim por conta de pressões para emitir uma licença ambiental para usina de Belo Monte, talvez a mais polêmica das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC):

Belo Monte derruba presidente do Ibama
 
O presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Abelardo Bayma, pediu demissão do cargo por discordar da emissão da licença definitiva para a implantação da Usina Hidroelétrica de Belo Monte, prevista para ser construída no rio Xingu, no Pará. Em carta enviada à ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira, Abelardo alegou motivos pessoais para pedir exoneração do cargo. Mas revelou a amigos que deixou o posto depois de ter sido pressionado pela diretoria da Eletronorte a emitir a licença definitiva em nome do IBAMA para a instalação da usina. Ele estava no cargo desde abril do ano passado e é funcionário de carreira da autarquia.
Em reuniões com a diretoria da Eletronorte há dez dias, Abelardo se negou a emitir a licença definitiva para a construção da usina. Ele argumentou que o IBAMA não poderia emitir o documento porque o projeto ainda está cheio de pendências ambientais. Abelardo admitiu que o IBAMA poderia emitir a licença para a instalação e não a definitiva. A construção de Belo Monte foi um dos motivos que levou ao pedido de demissão da ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva. Ela discordava da implantação da usina alegando que a obra causará fortes danos ambientais na região com o alagamento de uma área de aproximadamente 500 km2.
Marina Silva e a então ministra-chefe da Casa Civil, a presidenta Dilma Rousseff, que defende a antecipação dos prazos para a conclusão da usina, prevista inicialmente para outubro de 2015, um ano após o mandato presidencial. Para conseguir antecipar a conclusão, como quer Dilma, é preciso que o Ibama antecipe as licenças, mas o instituto alega que há falhas técnicas a serem reparadas no projeto. A previsão é que Belo Monte gere mais de 11 mil megawats para atender a uma população de 26 milhões de pessoas na região Norte.
Há uma outra versão que diz que a licença que não foi concedida não era a definitiva, mas uma especial para a obra. De qualquer forma, o ponto é o seguinte: Belo Monte será um grande gerador de impactos sociais e ambientais. Por exemplo, o Ministério Púbnlico Federal avalia em cerca de 40 mil o total de atingidos – incluindo populações tradicionais e indígenas.
Como já disse aqui em um post dias atrás, não adianta o governo federal elevar a questão dos direitos humanos nas relações internacionais e não executar o mesmo internamente. Se quiser fazer valer os direitos humanos em regiões rurais, a presidenta Dilma Rousseff terá que comprar brigas com áreas que lhe são importantes, como o setor elétrico. Coisa que, acredito, não vá fazer, muito pelo contrário. Incluída no PAC e no Plano Decenal de Energia (2007-2016), Belo Monte está planejada para ter uma potência máxima de 11,1 mil MW, mas a produção média estimada pela Eletrobrás é de 4.796 MW.
Lutou-se na ditadura não apenas por liberdade civis e políticas, mas por direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais. Desse ponto de vista, como justificar diferenças entre o discurso de uma época em que abríamos grandes estradas em rito sumário para o momento em que construímos gigantescas hidrelétricas em rito sumário, xingando os opositores de “arautos do atraso”?

terça-feira, 30 de novembro de 2010

"Fracasso da Convenção do Clima prejudicará humanidade"


Por Alfredo Acedo
Da Minga Informativa de Movimentos Sociais

A 16ª Conferência da Convenção Marco da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-16) já é vista como um fracasso, que afetará o futuro da humanidade porque se está fortalecendo a idéia das transnacionais lucrarem com a crise climática, disse Alberto Gómez, da coordenação internacional da Via Campesina.
Nos últimos documentos de discussão, foram eliminadas as propostas do Acordo dos Povos assinado em Cochabamba (Bolívia) e a balança se inclinou em favor do mercado de carbono e do REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação), mecanismo através do qual avança a privatização mundial de matas, selvas e territórios, explicou
“Já podemos dizer que no processo de negociações rumo a Cancún foram impostos os interesses das transnacionais e virá uma forte impulso para um esquema financeiro que obriga os países a entrar em um ajuste climático mercantilista”.
“Nós não concordamos com as falsas soluções, como o mercado de carbono, porque longe de contribuir com a redução das emissões de gases de efeito estufa, gerará cedo ou tarde um sistema especulativo que poderia provocar outra crise financeira global”.
Por isso, as mobilizações da Via Campesina pretendem denunciar a irresponsabilidade da maioria dos governos que optaram por favorecer o grande capital em detrimento do interesse de suas nações e da humanidade, disse Gómez.
“As caravanas internacionais que começaram no domingo 28 buscam desmascarar o governo mexicano, mostrando a devastação ambiental e social em todo o território nacional provocada por políticas públicas contrárias ao interesse da maioria do povo”.
“Nas atividades que desenvolveremos no acampamento que a Via Campesina instalará em Cancún a partir de 2 de dezembro, vamos denunciar estes atos e convocaremos todos a se manifestarem para obrigar que a Conferência adote medidas efetivas contra a crise do clima, como as defendidas pelo Acordo dos Povos”.
“Nós afirmamos que as camponesas e os camponeses são necessários e úteis para a humanidade. Nosso papel é produzir alimentos e o fazemos de maneira sustentável, esfriando o planeta. E se contássemos com um modelo de produção, distribuição e consumo diferente poderíamos acabar com a fome e contribuir com o combate ao aquecimento da atmosfera”.
“A soberania alimentar —concluiu Gómez— é a alternativa da Via Campesina frente ao capitalismo que agora quer privatizar até o ar que respiramos”.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Multa abre caminho para punir multi poluidora

Como esta criança, 30 mil pessoas tiveram lesões e intoxicações provocadas pela lama tóxica gerada na limpeza do navio do Probo Koala

Brizola Neto em seu blog Tijolaco

Uma notícia que não saiu, que eu visse, em qualquer jornal brasileiro, é importantíssima.  A Justiça da Holanda condenou a multinacional Trafigura - que opera na comercialização de petróleo e derivados – em 1 milhão de Euros por ter ocultado a natureza tóxica de uma carga de gasolina com alto teor de enxofre, transportada  no navio Probo Koala e tê-la exportado para Abdijan, na Costa do Marfim, sem antes saber se haveria condição de tratar lá este lixo tóxico. A multa é menos importante pelo seu valor em dinheiro – a Trafigura teve um lucro 340 vezes maior, ano passado – do que pelo caminho que abre para que a empresa responda em diversas cortes pela intoxicação que seu produto causou em milhares de marfinenses, levando 16 deles à morte, em 2006.
No ano seguinte, a empresa teria feito um acordo com o governo da Costa do Marfim para evitar processos e iniciou uma ofensiva contra os meios de comunicação para abafar o escândalo.
A Trafigura entrou com uma ação judicial  para proibir o jornal britânico The Guardian de publicar um documento – conhecido como Relatório Milton – no qual especialistas atribuíam os problemas em Abidjan aos resíduos do Probo Koala. O jornal  foi proibido de mencionar não só o relatório, como o próprio recurso judicial da Trafigura.  Mas os detalhes do Relatório Milton, e o próprio documento, rapidamente começaram a circular na Internet. A ação foi movida também contra a BBC, que  teve censurada,  no final do ano passado, uma peça jornalística anterior, com o título “Dirty tricks and toxic waste in the Ivory Coast” (“Jogos sujos e lixo tóxico na Costa do Marfim”). A estatal, porém, não parou de noticiar o caso.
A nossa imprensa, que diz estar tendo sua liberdade “ameaçada” – ninguém sabe como nem porque – não se interessou em noticiar nem o caso, nem a tentativa de abafá-lo na imprensa.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Mudanças no Código Florestal baseiam-se em ‘desconhecimento entristecedor’

Escrito por Aziz Ab’Saber   no Correio da Cidadania
 
Em face do gigantismo do território e da situação real em que se encontram os seus macrobiomas – Amazônia Brasileira, Brasil Tropical Atlântico, Cerrados do Brasil Central, Planalto das Araucárias e Pradarias Mistas do Brasil Subtropical – e de seus numerosos mini-biomas, faixas de transição e relictos de ecossistemas, qualquer tentativa de mudança no "Código Florestal" tem de ser conduzida por pessoas competentes e bioeticamente sensíveis.
 
Pressionar por uma liberação ampla dos processos de desmatamento significa desconhecer a progressividade de cenários bióticos, a diferentes espaços de tempo futuro. Favorecendo de modo simplório e ignorante os desejos patrimoniais de classes sociais que só pensam em seus interesses pessoais, no contexto de um país dotado de grandes desigualdades sociais.
 
Cidadãos de classe social privilegiada, que nada entendem de previsão de impactos. Não têm qualquer ética com a natureza. Não buscam encontrar modelos técnico-científicos adequados para a recuperação de áreas degradadas, seja na Amazônia, seja no Brasil Tropical Atlântico ou alhures. Pessoas para as quais exigir a adoção de atividades agrárias "ecologicamente auto-sustentadas" é uma mania de cientistas irrealistas.
 
Por muitas razões, se houvesse um movimento para aprimorar o atual Código Florestal, teria que envolver o sentido mais amplo de um Código de Biodiversidades, levando em conta o complexo mosaico vegetacional de nosso território. Remetemos essa idéia para Brasília e recebemos resposta de que era boa, mas complexa e inoportuna (…). Entrementes, agora outras personalidades trabalham por mudanças estapafúrdias e arrasadoras no chamado Código Florestal.
 
Razão pela qual ousamos criticar aqueles que insistem em argumentos genéricos e perigosos para o futuro do país. Sendo necessário, mais do que nunca, evitar que gente de outras terras, sobretudo de países hegemônicos, venha a dizer que fica comprovado que o Brasil não tem competência para dirigir a Amazônia (…). Ou seja, os revisores do atual Código Florestal não teriam competência para dirigir o seu todo territorial do Brasil. Que tristeza, gente minha.
 
O primeiro grande erro dos que no momento lideram a revisão do Código Florestal brasileiro – a favor de classes sociais privilegiadas – diz respeito à chamada estadualização dos fatos ecológicos de seu território específico. Sem lembrar que as delicadíssimas questões referentes à progressividade do desmatamento exigem ações conjuntas dos órgãos federais específicos, em conjunto com órgãos estaduais similares, uma Polícia Federal rural e o Exército Brasileiro. Tudo conectado ainda com autoridades municipais, que têm muito a aprender com um Código novo que envolva todos os macrobiomas do país e os mini-biomas que os pontilham, com especial atenção para as faixas litorâneas, faixas de contato entre as áreas nucleares de cada domínio morfoclimático e fitogeográfico do território.
 
Para pessoas inteligentes, capazes de prever impactos, a diferentes tempos do futuro, fica claro que ao invés da "estadualização" é absolutamente necessário focar para o zoneamento físico e ecológico de todos os domínios de natureza do país. A saber, as duas principais faixas de Florestas Tropicais Brasileiras, a zona amazônica e a zona das matas atlânticas; o domínio dos cerrados, cerradões e campestres; a complexa região semi-árida dos sertões nordestinos; os planaltos de araucárias e as pradarias mistas do Rio Grande do Sul; além de nosso litoral e o Pantanal mato-grossense.
 
Seria preciso lembrar ao honrado relator Aldo Rabelo, que a meu ver é bastante neófito em matéria de questões ecológicas, espaciais e em futurologia – sendo que atualmente na Amazônia Brasileira predomina um verdadeiro exército paralelo de fazendeiros que em sua área de atuação têm mais força do que governadores e prefeitos. O que se viu em Marabá, com a passagem das tropas de fazendeiros, passando pela Avenida da Transamazônica, deveria ser conhecido pelos congressistas de Brasília e diferentes membros do Executivo. De cada uma das fazendas regionais passava um grupo de cinqüenta a sessenta camaradas, tendo a frente em cavalos nobres o dono da fazenda e sua esposa e filhos em cavalos lindos.
 
E os grupos iam passando separados entre si, por alguns minutos. E, alguém a pé, como se fosse um comandante, controlava a passagem da cavalgada dos fazendeiros. Ninguém da boa e importante cidade de Marabá saiu para observar a coluna amedrontadora dos fazendeiros. Somente dois bicicletistas meninos deixaram as bicicletas na beira da calçada olhando silentes a passagem das tropas. Nenhum jornal do Pará, ou alhures, noticiou a ocorrência amedrontadora. Alguns de nós não pudemos atravessar a ponte para participar de um evento cultural.
 
Será certamente, apoiados por fatos como esse, que alguns proprietários de terras amazônicas deram sua mensagem, nos termos de que "a propriedade é minha e eu faço com ela o que eu quiser, como quiser e quando quiser"? Mas ninguém esclarece como conquistaram seus imensos espaços inicialmente florestados. Sendo que, alguns outros, vivendo em diferentes áreas do centro-sul brasileiro, quando perguntados sobre como enriqueceram tanto, esclarecem que foi com os "seus negócios na Amazônia" (…). Ou seja, através de loteamentos ilegais, venda de glebas para incautos em locais de difícil acesso, os quais ao fim de um certo tempo são libertados para madeireiros contumazes.
 
E o fato mais infeliz é que ninguém procura novos conhecimentos para reutilizar terras degradadas. Ou exigir dos governantes tecnologias adequadas para revitalizar os solos que perderam nutrientes e argilas, tornando-se dominados por areias finas (siltização).
 
Entre os muitos aspectos caóticos, derivados de alguns argumentos dos revisores do Código, destaca-se a frase que diz que se deve proteger a vegetação até sete metros e meio do rio. Uma redução de um fato que por si já estava muito errado, porém agora está reduzido genericamente a quase nada em relação aos grandes rios do país. Imagine-se que para o rio Amazonas a exigência protetora fosse apenas sete metros, enquanto para a grande maioria dos ribeirões e córregos também fosse aplicada a mesma exigência. Trata-se de desconhecimento entristecedor sobre a ordem de grandeza das redes hidrográficas do território intertropical brasileiro. Na linguagem amazônica tradicional, o próprio povo já reconheceu fatos referentes à tipologia dos rios regionais.
 
Para eles, ali existem, em ordem crescente: igarapés, riozinhos, rios e parás. Uma última divisão lógica e pragmática, que é aceita por todos os que conhecem a realidade da rede fluvial amazônica.
 
Por desconhecer tais fatos os relatores da revisão aplicam o espaço de sete metros da beira de todos os cursos d’água fluviais sem mesmo ter ido lá para conhecer o fantástico mosaico de rios do território regional.
 
Mas o pior é que as novas exigências do Código Florestal proposto têm um caráter de liberação excessiva e abusiva. Fala-se em sete metros e meio das florestas beiradeiras (ripário-biomas) e depois em preservação da vegetação de eventuais e distantes cimeiras. Não podendo imaginar quanto espaço fica liberado para qualquer tipo de ocupação do espaço. Lamentável em termos de planejamento regional, de espaços rurais e silvestres. Lamentável em termos de generalizações forçadas por grupos de interesse (ruralistas).
 
Já se poderia prever que um dia os interessados em terras amazônicas iriam pressionar de novo pela modificação do percentual a ser preservado em cada uma das propriedades de terras na Amazônia. O argumento simplista merece uma crítica decisiva e radical. Para eles, se em regiões do centro-sul brasileiro a taxa de proteção interna da vegetação florestal é de 20%, por que na Amazônia a lei exige 80%? Mas ninguém tem a coragem de analisar o que aconteceu nos espaços ecológicos de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Minas Gerais com o percentual de 20%. Nos planaltos interiores de São Paulo a somatória dos desmatamentos atingiu cenários de generalizada derruição.
 
Nessas importantes áreas, dominadas por florestas e redutos de cerrados e campestres, somente o tombamento integrado da Serra do Mar, envolvendo as matas atlânticas, os solos e as aguadas da notável escarpa foi capaz de resguardar os ecossistemas orográficos da acidentada região. O restante, nos "mares de morros", colinas e várzeas do Médio Paraíba e do Planalto Paulistano, e pró-parte da Serra da Mantiqueira, sofreram uma derruição deplorável. É o que alguém no Brasil – falando de gente inteligente e bioética – não quer que se repita na Amazônia brasileira, em um espaço de 4.200.000 km².
 
Os relatores do Código Florestal falam que as áreas muito desmatadas e degradadas poderiam ficar sujeitas a "(re)florestamento" por espécies homogêneas pensando em eucalipto e pinus. Uma prova de sua grande ignorância, pois não sabem a menor diferença entre reflorestamento e florestamento. Esse último, pretendido por eles, é um fato exclusivamente de interesse econômico empresarial, que infelizmente não pretende preservar biodiversidades. Sendo que eles procuram desconhecer que para áreas muito degradadas foi feito um plano de (re)organização dos espaços remanescentes, sob o enfoque de revigorar a economia de pequenos e médios proprietários: o Projeto FLORAM.
 
Os eucaliptólogos perdem sentido ético quando alugam espaços por trinta anos de incautos proprietários, preferindo áreas dotadas ainda de solos tropicais férteis, do tipo dos oxissolos, e evitando as áreas degradadas de morros pelados reduzidas a trilhas de pisoteio, hipsométricas, semelhantes ao protótipo existente no Planalto do Alto Paraíba, em São Paulo. Isso ao arrendar terras de bisonhos proprietários, para uso em 30 anos, e sabendo que os donos da terra podem morrer quando se completar o prazo. Fato que cria um grande problema judicial para os herdeiros, sendo que ao fim de uma negociação as empresas cortam todas as árvores de eucaliptos ou pinus, deixando miríades de troncos no chão do espaço terrestre. Um cenário que impede a posterior reutilização das terras para atividades agrárias. Tudo isso deveria ser conhecido por aqueles que defendem ferozmente um Código Florestal liberalizante.
 
Por todas as razões somos obrigados a criticar a persistente e repetitiva argumentação do deputado Aldo Rebelo, que conhecemos há muito tempo e de quem sempre esperávamos o melhor. No momento somos obrigados a lembrar a ele que cada um de nós tem de pensar na sua biografia e, sendo político, tem de honrar a história de seus partidos. Principalmente em relação aos partidos que se dizem de esquerda e jamais poderiam fazer projetos totalmente dirigidos para os interesses pessoais de latifundiários.
 
Insistimos que em qualquer revisão do Código Florestal vigente deve-se enfocar as diretrizes através das grandes regiões naturais do Brasil, sobretudo domínios de natureza muito diferentes entre si, tais como a Amazônia e suas extensíssimas florestas tropicais, e o Nordeste Seco, com seus diferentes tipos de caatingas. Trata-se de duas regiões opósitas em relação à fisionomia e à ecologia, assim como em face das suas condições sócio-ambientais. Ao tomar partido pelos grandes domínios administrados técnica e cientificamente por órgãos do Executivo federal, teríamos de conectar instituições específicas do governo brasileiro com instituições estaduais similares. Existem regiões como a Amazônia, que envolve conexões com nove estados do Norte brasileiro. Em relação ao Brasil Tropical Atlântico os órgãos do Governo Federal – IBAMA, IPHAN, FUNAI e INCRA – teriam que manter conexões com os diversos setores similares dos governos estaduais de norte a sul do Brasil. E assim por diante.
 
Enquanto o mundo inteiro repugna para a diminuição radical de emissão de CO2, o projeto de reforma proposto na Câmara Federal de revisão do Código Florestal defende um processo que significará uma onda de desmatamento e emissões incontroláveis de gás carbônico, fato observado por muitos críticos em diversos trabalhos e entrevistas.
 
Parece ser muito difícil para pessoas não iniciadas em cenários cartográficos perceber os efeitos de um desmatamento na Amazônia de até 80% das propriedades rurais silvestres.
 
Em qualquer espaço do território amazônico que vêm sendo estabelecidas glebas com desmate de até 80% haverá um mosaico caótico de áreas desmatadas e faixas de inter-propriedades estreitas e mal preservadas. Nesse caso, as bordas dos restos de florestas, inter-glebas, ficarão à mercê de corte de árvores dotadas de madeiras nobres. E, além disso, a biodiversidade animal certamente será profundamente afetada.
 
Seria necessário que os pretensos reformuladores do Código Florestal lançassem sobre o papel os limites de glebas de 500 a milhares de quilômetros quadrados, e dentro de cada parcela das glebas colocassem indicações de 20% correspondentes às florestas ditas preservadas. E, observando o resultado desse mapeamento simulado, poderiam perceber que o caminho da devastação lenta e progressiva iria criar alguns quadros de devastação similares ao que já aconteceu nos confins das longas estradas e seus ramais, em áreas de quarteirões implantados para venda de lotes de 50 a 100 hectares, onde o arrasamento de florestas no interior de cada quarteirão foi total e inconseqüente.
 
Aziz Ab’Saber é professor emérito de geografia da USP e já produziu diversos trabalhos sobre a Amazônia Brasileira, tendo mais de 400 trabalhos acadêmicos publicados.