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terça-feira, 4 de junho de 2013

Avalanche ‘neoconservadora’ une grande mídia e governo


ESCRITO POR VALÉRIA NADER, DA REDAÇÃO  do CORREIO DA CIDADANIA





Medidas governamentais e noticiários dos últimos dias têm deixado de olhos arregalados uma boa porção daqueles que acompanham e creem no ‘neodesenvolvimentismo’ do governo atual, assim como no progressismo da mídia e na sua defesa diuturna da pluralidade e da liberdade de expressão. Neste sentido, dentre tantos acontecimentos e respectivas versões que têm dominado a pauta de governo e imprensa, dois deles podem ser tomados como ilustrativos: o último aumento da taxa de juros pelo Banco Central e mais um assassinato dentre os povos indígenas.

Voltando o olhar primeiramente para o contexto da nossa imprensa – afinal, quase onipresente na contemporaneidade em ditar as regras de corpos e mentes –, tais acontecimentos foram objeto de extensas reportagens pelos maiores veículos de comunicação nos dias que passaram. O tom maior foi de indisfarçado triunfalismo, no que diz respeito à decisão do Banco Central em elevar os juros para combater a inflação, afinal, uma prova de um governo que estaria tomando ‘juízo’. E quanto aos índios, escancarou-se, em linhas e entrelinhas, a visão dos povos originários como bárbaros invasores.

Grande mídia, Folha de S. Paulo e os juros

Entre estes veículos, os enunciados e análises da Folha de S. Paulo podem ser tomados como termômetro das falas e visões da quase maioria dos grandes órgãos de comunicação, para evitar delongas e a fim de não se cometer alguma injustiça. Afinal, ao contrário dessa maioria de veículos, que escancara seu conservadorismo, trata-se a Folha do órgão de mídia que, não raras vezes, se compraz em sua auto-identificação como progressista. Um coro que tem como portavozes, inclusive, colaboradores e colunistas já escalados para, vez ou outra, verbalizar e lembrar aos leitores das ações do diário em prol da democratização da informação.

No que diz respeito à nova taxa de juros, nas suas edições a partir de quarta-feira, 29 de maio, o diário trouxe extensa lista de matérias, editoriais e reportagens. Mesmo para quem já há bom tempo não mais se ilude com o tal ‘progressismo’ da Folha, chega a surpreender o tom monocórdio de tantas reportagens. Um legítimo ‘samba de uma nota só’, verdadeiro tratado em defesa da agenda conservadora, aquela que dita as regras do mercado financeiro, que tem por trás os grandes grupos econômicos, que obviamente lucram com a subida da taxa de juros em função de suas bilionárias aplicações nos títulos da dívida pública.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, economista famoso e colunista do jornal, foi dos únicos estudiosos com espaço profuso a emitir sua opinião. No texto chamado ‘Um dia de cão na economia’, de sexta-feira, 31 de maio, aliviou-se com a ideia de que “um novo Banco Central emergiu das cinzas da instituição que comandou com mão de ferro o sistema de metas de inflação nos oito anos do governo Lula”. E comemorou sem volteios o fato de que “os mercados financeiros vão reagir com força à decisão tomada pelo Copom sobre os juros”. Para Mendonça, a presidente Dilma, quiçá, e finalmente, teria entendido que o aumento de juros é a melhor forma de controlar a inflação e promover o crescimento.

Segundo, ainda, o Editorial de sábado, 1 de junho, ‘Alta de credibilidade’, “a decisão do BC, apesar de amarga, vem em boa hora. Talvez consiga devolver alguma firmeza à gestão da economia, perdida em devaneios intervencionistas”. Pregando ainda uma ‘política fiscal mais responsável’ no lugar da ‘frouxidão orçamentária’, conclui que a nova decisão, à medida que incidir na queda da inflação, deve ajudar a presidente na corrida eleitoral do próximo ano. Ideias reforçadas no Editorial de domingo, 2 de junho, o qual, sob o título ‘Um Plano para Dilma’, faz uma série de sugestões, sempre de cunho liberal e privatizante, para o restante de seu mandato.

Engrossando, finalmente, este coro esteve ninguém menos que o ex-presidente do Banco Central sob Lula, o também colunista da Folha Henrique Meirelles. Citando o polêmico e emblemático caso chinês, Meirelles tem uma pista para a solução dos graves problemas do país: “medidas têm sido tomadas para transferir poder de decisão à iniciativa privada, eliminando controles e burocracia para facilitar o desenvolvimento dos negócios. Se exitosas, transformarão a China em competidor ainda mais forte e inovador, com maior equilíbrio no investimento e no consumo”.

E onde estão as vozes dissonantes de reconhecidos estudiosos, não necessariamente identificados à direita ou à esquerda do espectro político, e que têm visão diametralmente oposta, ou ao menos conflitante, com a ideia convencional de que a subida da taxa de juros é a solução para a inflação que se diz estar a galope no país? Aqueles que, por exemplo, ressaltam a influência da especulação nas bolsas de mercadorias de commodities agrícolas na atual oferta e preços de produtos comercializados internamente? E outros mais que destacam que, mediante a queda das exportações de commodities agrícolas e, por conseguinte, o menor resultado no saldo da balança comercial, o aumento da taxa de juros seria a forma de atrair capitais financeiros e especulativos, com o intuito de fechar o balanço de pagamentos? Provavelmente, estão em algum lugar bem distante da rua Barão de Limeira.

A Folha de S. Paulo e os índios

Não fosse pouco um culto escancarado da ortodoxia por aqueles que se dizem arautos da liberdade de expressão, mais atenção chama ainda um enviesamento jornalístico a cada dia mais próximo do obscurantismo na área de direitos humanos.

Após mais um confronto entre policiais e indígenas, envolvendo índios terenas no Mato Grosso do Sul, outro índio foi morto pela polícia. Na sexta-feira, 31 de maio, a chamada para matéria,‘Índio morre em confronto com a polícia’, é no mínimo muito ambígua, uma vez que pode sugerir uma ação mais deliberada dos indígenas – geralmente armados de arcos, flechas, lanças e facas – em seu confronto com a polícia – munida de armas de fogo de algo calibre. No sábado, 1 de junho, nova chamada induz o leitor a enxergar índios como bárbaros e baderneiros, ao dizer que ‘Índios invadem novamente fazenda em MS’. Afinal, estão entrando, e não invadindo, em áreas que lhes pertencem, de direito ancestral, e que somente não ocupam até hoje em função de uma homologação de terras indígenas que nunca se completa.

E aqui nem é preciso ir tão longe na denúncia da estreiteza de visão, desrespeito e afronta aos direitos dos povos originários, reconhecidos pela Constituição, mas secularmente negados pelos governantes de turno. É um dos próprios colunistas do jornal, daqueles poucos que têm independência opinativa em nossa grande mídia, que denuncia, em sua coluna de domingo, 2 de junho, a desconsideração para com estes povos. “A facilidade com que ainda se massacram os direitos e as vidas dos índios é uma homenagem que o Brasil presta ao seu passado genocida (...) As liminares e outros volteios judiciais que facilitam a usurpação de terras reconhecidamente indígenas, como se dá agora com a área Buriti, em Mato Grosso do Sul, são uma via direta para a miséria e a morte das populações indígenas”, declara Jânio de Freitas.

E o governo, por onde anda?

É de se pensar, nesta altura dos acontecimentos, onde está o governo em meio a tal conjuntura.

O lugar em que se coloca não é nada mais admirável que aquele ocupado pela mídia, pelo menos para quem se propõe a enxergar a realidade menos desavisadamente, ou com possibilidades de despir-se de noções falseadoras.

No que se refere à temática econômica, o governo Dilma e, anteriormente, o próprio governo Lula, tem sido acusado recorrentemente, pela imprensa e analistas conservadores, de intervencionista, dirigista e outros termos correlatos. Isso de forma a associá-lo a um ente distante dos ideais hipoteticamente criativos e libertadores decorrentes de um funcionamento mais livre das forças de mercado.

A ideia do intervencionismo é, por um lado, evitada pelos próprios governistas, de modo a não se indispor com sua base de apoio mais conservadora; mas, por outro lado, acalentada em meio à noção de neodesenvolvimentismo, sob a qual se tenta erigir a imagem de um governo progressista, que tem papel ativo em incluir os pobres ao mesmo tempo em que promove o desenvolvimento. Qual é, portanto, o teor de verdade dessa ideia de intervencionismo do governo Dilma?

Aqui são novamente os fatos que podem sugerir a melhor resposta. É inegável a maior atenção ao social, ainda que em sua maior parte focada em uma vertente assistencialista, assim como algum grau de ‘provocação’ (e não enfrentamento) ao capital financeiro, promovidos pelos presidentes petistas. Estão aí o Bolsa Família, os reajustes do salário mínimo, taxações impostas sobre a entrada do capital externo especulativo, dentre outros, para comprovar. No entanto, também estão presentes, de modo cabal, e desde o mandato lulista, a privatização das infraestruturas econômicas do país – mais sorrateira e disfarçadamente sob Lula e, agora, de forma mais escancarada. Portos, ferrovias, aeroportos, petróleo, energia e também o que restou das telecomunicações estão, a cada dia, mais distantes não somente das mãos do governo, mas também do controle público, em uma nação em que as agências reguladoras são, comprovadamente, bem mais articuladoras dos interesses econômicos do que dos direitos dos cidadãos. Os maiores beneficiários, ao final, e como a história do país tem confirmado, são os grandes grupos econômicos e privados externos, a partir da posição subalterna e associada do Estado nacional e da burguesia interna.

E a lista de submissão aos poderosos lobbies econômicos não para por aí. A desoneração da folha de pagamento de vários setores da economia interna, assim como uma série de medidas que vêm sendo levadas a cabo sob o rolo compressor da bancada ruralista, implicam no baixo grau de independência e autonomia na tomada de decisões internas de política econômica.

O intervencionismo, ou dirigismo, tão aventados por aí, não passam, assim, de mero jogo de palavras. Palavras, no entanto, com forte poder de persuasão sobre um governo que se perde em meio a uma extensa base de apoio e a poderosos lobbies econômicos. A atual subida da taxa de juros é acontecimento bastante sintomático desse quadro, vez que era a própria presidente Dilma que, até pouquíssimo tempo atrás, negava capitular frente às pressões para a sua elevação.

O chamado ‘neodesenvolvimentismo’ pode, portanto, ser tomado como uma ficção. Face a uma conjuntura internacional fortemente financeirizada e oligopolizada, com a crescente independentização do movimento internacional de capitais, resta exígua margem de manobra para a condução autônoma de políticas econômicas internas. Conjuntura que, obviamente, é agudizada pela dependência e subserviência de governos amparados em extensas e heterogêneas alianças políticas, reféns dessas alianças e, portanto, pouco propensos a promoverem confrontos mais pesados.

E resta uma palavra sobre a questão indígena, no caso, o assassinato de mais um índio no Mato Grosso do Sul, acima referido. Aqui, onde está o governo Dilma?

Certamente, este é tema para bem mais do que mil palavras, cabíveis em novo e profundo artigo. No entanto, forçoso é dizer que o atual mandato petista tem se mostrado, no mínimo, bem menos aberto ao diálogo com os movimentos e demandas sociais em geral do que o anterior. E, no caso em questão, são novamente os fatos que podem falar por si mesmos.

Morta a liderança indígena, a primeira providência do Planalto foi a convocação de uma reunião. Os convidados iniciais foram os interlocutores da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), ligados ao Ministério da Agricultura, sabidamente influenciado por representantes da bancada ruralista. A Funai, que tem visto seu papel na demarcação de terras indígenas cada vez mais reprimido, não foi convocada.

Em tempo

Talvez fosse interessante ao governo começar a avaliar uma troca de termos para se autodefinir. O neoconsevadorismo há tempos poderia lhe cair melhor que neodesenvolvimentismo.

Valéria Nader, jornalista e economista, é editora do Correio da Cidadania.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Dez anos de solidão



Por Dioclécio Luz no OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA
O objetivo deste artigo é fazer um registro do que ocorreu no período de uma década com relação às rádios comunitárias no Brasil, quando o governo esteve sob o comando do Partido dos Trabalhadores. Analisam-se as ações do Executivo (o governo estritamente falando), e suas relações com o Legislativo e as representações da sociedade civil.
Marco zero: o início do fim
O presidente Lula assumiu em janeiro de 2003, quando já estava em vigor a Lei 9.612/98 que regulamenta as rádios comunitárias (RC). A legislação incorpora ainda o Decreto 2.615/98 e a Norma Técnica 01/11.
Nesses dez anos de poder, o governo do PT, que podia alterar toda legislação, somente mudou a Norma Técnica – e para pior. Ao mesmo tempo deu mais poderes à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), antes criticada veementemente pelo PT. Logo ao assumir, o governo do PT ampliou a repressão às emissoras não autorizadas, algo que o partido também criticava antes. A título de exemplo, em 2005 (dois anos de PT) foram fechadas 1086 emissoras de rádio que funcionavam sem autorização. Isso equivale à média de 90/mês ou 3/dia. No ano seguinte a Anatel foi mais eficiente ainda, atingindo a média de 95/mês. Uma média que tem crescido ano a ano.
É preciso deixar bem claro que, ao lidar com as rádios comunitárias, o Partido dos Trabalhadores tem adotado uma posição ideológica de direita. O pior é que faz isso camuflado como aliado das RCs, como se estivesse atuando com elas. O governo rebate as críticas acusando os críticos de estarem numa “disputa política”. Diz ainda que essa crítica está a serviço da “direita”, como se este Governo agisse pela “esquerda”. Ocorre que esta postura de avestruz oculta um mundo real demarcado claramente por uma linha ideológica de direita; uma linha que segrega e exclui quem faz rádios comunitárias.
A bem da verdade, não se pode generalizar: nem todos os petistas instalados no Governo agiram contra as RCs. Tanto no Executivo quanto no Legislativo petistas mantiveram sua coerência defendendo as rádios comunitárias. A questão é que estes não têm poder para definir e implantar uma política para o setor. Fez isto o núcleo majoritário do PT no governo: camuflando-se para se passar por aliado, reproduzindo um falso discurso democrático para justificar os abusos.
Mas como o governo do PT sustentou essa farsa por dez anos? Por que só uns poucos revelaram que havia uma farsa, uma engabelação? Uma das respostas está na utopia: acreditou-se que o PT, sendo guardião da utopia da esquerda, faria as mudanças pretendidas para o setor. Esta é uma visão romântica (e messiânica) que o Partido explora, manipulando “a esperança do povo”.
Todavia, isso ainda não é o bastante para explicar como “tantos foram enganados por tanto tempo” aceitando promessas de que algo jamais seria feito pelas rádios comunitárias. Ocorre que o governo do PT fez uso de expedientes que pareciam apontar para o debate democrático no setor. Um deles é o discurso em defesa da “democracia na comunicação”; outro, o uso de práticas que sugerem uma “construção coletiva”, ou um “processo coletivo e democrático” – termos caros aos utópicos defensores do setor.
Por exemplo, se o processo democrático, como se sabe, inclui a abertura de “diálogo com a sociedade”, os dirigentes, autoridades, técnicos agora participam de eventos, debates e reuniões. Ocorre que não resultam em nada... O governo também abre “consultas públicas” – para rejeitar tudo que representa mudança positiva; cria Grupos de Trabalho – para descartar as propostas que não lhe agradam; abafa as reivindicações com promessas que não se cumprem. Quando este governo é questionado por que não modifica a legislação ele responde com três clichês: 1) “esta é a legislação possível”; 2) “esta é a mudança possível”; 3) somente o Legislativo pode fazer isso. As três opções se constituem em meias verdades.
É claro que o PT poderia ter feito muito mais. Em dez anos de poder, salvo as exceções de praxe (servidores e técnicos que continuam atuando em defesa das RCs) , o governo do Partido dos Trabalhadores enganou, ludibriou, enrolou os que fazem rádios comunitárias. E é dessa engabelação política – uma mentira na história – que se fala aqui.
Primeiro: a ignorância é saudável
No município de Santa Luz, sertão da Bahia, funciona uma boa rádio comunitária, a Santa Luz FM: sua gestão é democrática, não pertence a padre ou pastor, não tem jabá, a comunidade participa ativamente. É assim desde 1998, quando a RC surgiu. Como não tinha autorização de funcionamento, a Santa Luz FM foi tratada como “pirata” e fechada pelo menos quatro vezes pela Polícia Federal e Anatel. Em 2007, quando a rádio ainda era tratada como “pirata” pelo governo do PT porque operava emissora sem autorização,seu diretor, Edisvânio Nascimento, ganhou o prêmio de “Jornalista amigo da criança”, concedido pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI). Na época Edisvânio nem tinha formação em jornalismo (agora está concluindo). Hoje a rádio tem autorização – a Santa Luz levou dez anos para conseguir o documento.
Ocorre que o Palácio do Planalto e o Ministério das Comunicações não fazem a mínima ideia de onde fica Santa Luz, tampouco sabem que lá existe uma boa rádio comunitária e que uma equipe desta rádio foi premiada pela competência jornalística. O governo não quer saber disso. Na verdade não sabe nem o que é uma rádio comunitária. A única leitura permitida é a política, mas uma política pobre, maquiavélica, apartando o Bem (quem tem poder) e o Mau (quem não tem). Esta ignorância é saudável para um governo que somente negocia com quem tem poder.
Segundo: inúteis Grupos de Trabalho
O Ministério das Comunicações (MC) cuida para que a ignorância seja regra. Os interlocutores do MC com a sociedade civil (muda, em média, um a cada seis meses) são tecnocratas, que, equivocadamente, entendem sua função pública como uma função política. Dotados de micro-poderes, esses tecnocratas fazem um esforço tremendo para que as relações de poder sejam mantidas. Na prática, significa que eles não precisam conhecer rádios comunitárias, mas as relações de poder dentro do processo. Atuam no processo administrativo fazendo política. Neste ponto, configura-se um grave erro: eles não cumprem a função de servidores públicos. Como se estivessem no setor privado servem à linha determinada pelo dirigente e não ao interesse da sociedade. Por isso não precisam conhecer de RC. Precisam conhecer as normas, as regras, saber como “vigiar e punir” (Foucault). São os capatazes da Casa Grande; cabe-lhes elaborar normas para controlar e punir as RCs.
Diz o senso comum que quando não se quer resolver um problema se monta uma comissão ou um Grupo de Trabalho. O PT seguiu essa regra. Nos dez anos de PT dois Grupos de Trabalho (GTs) foram instituídos para tratar de rádios comunitárias. Seguindo a tradição, os dois foram inúteis.
O primeiro GT foi constituído no início do governo do PT. Formado por representantes do Ministério das Comunicações e da sociedade civil, foi criado em março de 2003 (Portaria nº 83, do Ministério das Comunicações, 24/03/03), iniciando seus trabalhos no dia 2 de abril. O ministro das comunicações na época era Miro Teixeira (deputado federal pelo PDT do Rio de Janeiro). O objetivo do GT era burocrático: propor métodos para agilizar a burocracia no órgão (eram 4.300 processos de RCs parados no MC). Depois de 90 dias o GT apresentou suas conclusões, entre elas um Projeto de Lei modificando a lei 9.612/98. O PL proposto foi para o lixo e mudanças pequenas foram introduzidas na burocracia.
O segundo GT veio em 2004. O Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) foi criado por Decreto Presidencial (assinado por Luiz Inácio Lula da Silva) em 26 de novembro, com a finalidade de...
analisar a situação da radiodifusão comunitária no País e propor medidas para disseminação das rádios comunitárias, visando ampliar o acesso da população a esta modalidade de comunicação, agilizar os procedimentos de outorga e aperfeiçoar a fiscalização do sistema.
Coordenado pelo Ministério das Comunicações, as atividades do GTI tiveram início no dia 3 de fevereiro de 2005 e foram concluídas no dia 10 de agosto de 2005.
O relatório final do GTI revelou o que todo mundo sabia: 1) algumas rádios sem autorização são comunitárias; 2) muitas rádios que receberam autorização não são comunitárias. O documento observa que, se no Ministério das Comunicações um processo demora em média 26 meses, no Palácio do Planalto o tempo médio entre a entrada e saída de um processo é de 14 meses. Este tempo é a prova de como um trâmite burocrático foi transformado em balcão de “negócios políticos”. Este nova etapa de avaliação – e desta vez exclusivamente política –, não existia no governo de Fernando Henrique Cardoso (responsável pela Lei 9.612/98). Em tese, cabe ao Planalto apenas “carimbar” o processo e encaminhá-lo para o Congresso Nacional. Mas isso não acontece. O processo para no Palácio do Planalto. Essa parada demora o tempo de negociação com os poderes envolvidos. E, claro, se uma rádio não conta com padrinhos políticos, se não aparece ninguém para negociar por ela, por melhor que seja seu projeto a RC está condenada a uma espera que pode chegar à dezena de anos. Por isso emissoras como a Santa Luz – de qualidade, mas sem padrinho político ou religioso – esperam 10 anos para conseguir outorga. Consta que o balcão funciona até hoje dentro do Palácio do Planalto – é preciso um político, padre ou pastor para que o processo seja encaminhado ao Congresso Nacional.
O relatório do GTI omitiu a existência desse “balcão de negócios”. No entanto, estudo desenvolvido por Cristiano Lopes e Venício Lima (ver, neste Observatório, “Coronelismo eletrônico de novo tipo (1999-2004): as autorizações de emissoras como moeda de barganha política”), mostra que ele existe ou existiu, pelo menos no período. O estudo mostra como a Igreja Católica tem abocanhado concessões de RCs:
No total, em 120 (5,4%) rádios comunitárias pesquisadas foi encontrado algum tipo de vínculo religioso. O domínio de vínculos pela religião católica é notável. Dessas 120 rádios, 83 (69,2%) eram ligadas à igreja católica, 33 (27,5%) a igrejas protestantes, 2 (1,66%) a ambas, 1 à doutrina espírita (0,8%) e 1 (0,8%) ao umbandismo. (LIMA, V.; LOPES, 2007).
Esse mesmo Estado que é tão rigoroso no fechamento de emissoras não autorizadas, fecha os olhos à lei e distribui autorizações para os seus aliados políticos e religiosos. A Lei 9.612/98 – artigo 4º e artigo 11 – veda às religiões o comando de rádios comunitárias, mas o governo, contraindo essa lei, distribuiu autorizações para os religiosos. Eis dois exemplos, com dados oficiais:
Processo nº 53770.000456/99. Licença Definitiva para a “Associação Comunitária Nossa Senhora de Copacabana”, localizada na rua Hilário Gomes, 36, Copacabana, Rio de Janeiro. No local funciona a Igreja Nossa Senhora de Copacabana. (fonte: Ministério das Comunicações).
Conclusão: embora autorizada, a rádio está sob o comando da Igreja Católica.
Processo nº 53000.000210/00. Autorização concedida à “Associação de Assistência Social Casa da Benção”, localizada, de acordo com o MC, à Área Especial 5 – Setor F Sul Taguatinga Sul, Distrito Federal. A Catedral da Casa Bênção funciona no mesmo endereço, com o nome de fantasia de “Rádio ondas da bênção” (http://www.catedraldabencao.org.br). (fonte: Ministério das Comunicações).
Conclusão: embora autorizada, a rádio está sob o comando da Igreja evangélica Casa da Bênção.
Para os autores do estudo, essa forma de distribuição de outorgas de rádios comunitárias é “um comportamento que remonta ao velho Estado patrimonialista, no qual não havia limite entre o público e o privado e os patrimônios do Estado e do governante terminavam por se misturar”. Foi visto que:
Dos 1.106 casos detectados em que havia vínculo político, exatos 1.095 (99%) eram relativos a um ou mais políticos que atuam em nível municipal. Além disso, todos os outros 11 casos restantes são referentes a vínculos com algum político que atua em nível estadual ou candidatos derrotados a cargos de nível federal. Não houve nenhum caso detectado de vínculo direto entre emissoras comunitárias e ocupantes de cargos eletivos em nível federal. (LIMA, V.; LOPES, 2007).
As conclusões do estudo:
1. Durante a gestão de pelo menos dois ministros após a edição da Lei 9.612/98, há indícios de preferência na distribuição de outorgas de interesse político do próprio ministro.
2. O Palácio do Planalto acelerou processos ou reteve outros conforme interesses políticos.
3. Há uma “intensa utilização política das outorgas de radiodifusão comunitária”. Ela se dá em dois níveis: no municipal, em que as outorgas têm um valor político localizado; e no estadual/federal, aí as rádios comunitárias são controladas por forças políticas locais que devem o “favor” de sua legalização a um padrinho político.
Quanto ao relatório do GTI...
Ele faz um diagnóstico da situação, mas apresenta propostas “medrosas”, pouco alterando a atual situação.
Como o GT anterior, as conclusões deste GTI também foram para o lixo. Mas, desta vez com um elemento insólito: embora o relatório tenha sido amplamente divulgado, é como se ele não tivesse existido – nunca foi oficialmente reconhecido pelo governo.
Terceiro: omissão é posição
A legislação em vigor foi feita para impedir a existência das RCs. Sancionada pelo governo anterior (Fernando Henrique Cardoso) o governo petista optou pelo mais cômodo, fazer-se de cego, omitiu-se. E ao fazer isso, na prática, posicionou-se pela lei em vigor. Por isso, criada há 14 anos, a legislação permanece com seus absurdos.
O absurdo mais flagrante é o limite de alcance para 1 quilômetro de raio. Isso não está na lei, foi uma invenção do Executivo. O artigo 1º da Lei 9.612/98 estabelece que a potência da RC deve ser limitada a 25 w. O Decreto 2.615/98, porém, vai além e diz que o alcance da rádio não deve ultrapassar 1 km. Na prática, o Executivo mudou o conteúdo da lei fazendo uso de um Decreto – o que é ilegal! Com isto o Estado (que é quem aplica a legislação) ampliou mais ainda o caráter restritivo da Lei. Ele impôs uma comunidade com fronteiras eletromagnéticas; substituiu as antigas e verdadeiras fronteiras da comunidade – definidas por relações humanas, culturais e geográficas – por “cercados eletromagnéticos”, com limites restritos a um círculo de raio de 1 km.
Antes, pela Lei, a RC deveria atender a “comunidade do bairro e/ou vila”. Com a redação dada no Decreto, a RC deve atender somente a quem está dentro desse círculo de raio de 1 km. O Estado criou um espaço que não existia, uma espécie de gueto ou “campo de concentração”, cercado por redes eletromagnéticas – dentro dele deve operar a rádio e devem morar seus dirigentes.
Por que o governo do PT não mudou isso? Porque fez uma opção política em função de uma linha ideológica. É a mesma que está inserida na Lei 9.612/98 (art. 5º), quando se determina que as RCs devam transmitir em um só canal (uma faixa limitada de frequências), indicando-se um canal alternativo quando não for possível usar o primeiro indicado. Que canais são estes? Em tese devem estar dentro do dial de Frequência Modulada (FM), a faixa que vai de 88 a 108 MHz. Afinal todo receptor de rádio FM é construído para receber sinais dentro dessa faixa – faz parte de um acordo internacional entre os países.
Mas o Estado brasileiro inovou...
Em 1998, através da Resolução 60, a Anatel decidiu que as rádios comunitárias deveriam operar no canal 200 (faixa de 87,9 MHz, a 88,1 MHz). Isso era no governo FHC. Em 2004, já no governo do PT (Lula), a Anatel, através da Resolução 356, diz que as RCs devem ocupar, também, os canais 198 e 199 (faixa de 87,5 MHz a 87,7 MHz). Portanto, para as RCs de todo Brasil foi destinada a faixa de freqüências que vai de 87,5 MHz a 88,1 MHz. Ocorre que salvo a freqüência de 88,1, tais canais estão fora do dial! Se, como foi visto, a faixa de FM vai de 88 a 108 MHz, para quem a RC vai transmitir se os receptores de FM não recebem abaixo de 88 MHz?
Isso não importa para o governo petista que se associa a Anatel para defender que os aparelhos de rádio recebem nessa faixa. A Anatel chegou a apresentar estudos técnicos para provar que isto é possível. Não consegue provar, porém, que este ato não é uma discriminação – para nenhuma emissora comercial ou educativa foi designado canal nestas condições, fora do dial.
A legislação que o governo do PT não quis modificar é repleta de atos de segregação. Ela exige que os dirigentes da emissora residam dentro do círculo determinado pelo raio de alcance de 1 km; veda a formação de redes; veda a publicidade, permitindo apenas o “apoio cultural”; estabelece que se a RC interferir sobre outro serviço de telecomunicações ela será punida, porém se ocorre o contrário, se uma emissora comercial interfere no sinal da RC, conforme a Lei, o Estado nada vai fazer.
Quarto: vigiar e punir
Em outubro de 2011 o Ministério das Comunicações resolveu mudar a legislação. E começou mudando a Norma Técnica 01/04. Essa mudança adquire um caráter simbólico porque foi a única alteração da legislação de RC em 10 anos de governo do PT. Imaginava-se que o PT tivesse ouvido as rádios comunitárias e apresentasse propostas que reduzissem os efeitos negativos dessa legislação. Era o que se esperava de um Partido que tinha, no seu discurso, um apelo social e, por base, as camadas populares. Não foi o que aconteceu.
Entenda-se, a legislação do Serviço de Radiodifusão Comunitária se constitui basicamente (e hierarquicamente) da Lei 9.612/98, seu Decreto regulamentador, 2.615/98, e, hoje, da Norma Técnica, 01/11. O mais sensato seria, primeiro, mudar a lei, depois o Decreto e, por fim a Norma.
O Executivo não mudou o Decreto, que é de sua alçada, optando por fazer uma nova Norma Técnica, a 01/11 (está em vigor hoje). Deste modo o PT entra na história das rádios comunitárias por ter assinado uma mudança da legislação que a torna pior do que já era.
Deve-se entender a Norma como um discurso institucional, uma fala do Poder. E, por ser uma Norma técnica, é um discurso do poder que se apresenta semioticamente com “virtudes”: ela teria autonomia (teria sido construída em ambiente alheio aos conflitos do setor), seria necessária (ao processo burocrático), seria apolítica (teria sido construída em ambiente alheio à política). Portanto, impositivo por natureza, a Norma técnica é um discurso do governo do PT – ela “diz o que o governo pensa sobre o assunto”.
O discurso expresso nesta Norma objetiva manipular. O manipulador, o governo, quer submeter (manipular) os que querem fazer rádio comunitária.
A manipulação envolve não apenas o poder, mas especificamente abuso de poder, ou seja, dominação. Mais especificamente, a manipulação implica o exercício de uma forma de influência deslegitimada por meio do discurso: os manipuladores fazem os outros acreditarem ou fazerem coisas que são do interesse do manipulador, e contra os interesses dos manipulados (VAN DIJK, Teun A. Discurso e poder. São Paulo, Contexto, 2008).
Esse mascaramento do discurso, essa tentativa de manipulação das pessoas, é um ato ilegítimo.
Definimos como ilegítimas todas as formas de interação, comunicação ou outras práticas sociais que servem apenas aos interesses de uma parte e são contra os interesses dos receptores. (idem, p. 238).
A pretensão do discurso/norma é controlar as pessoas, “vigiar e punir”, mais exatamente, que é título de célebre estudo do francês Michel Foucault sobre os métodos adotados historicamente para conter e punir os criminosos (Rio de Janeiro, Petrópolis: Vozes, 2009). No caso, “criminosos” são os que fazem ou pretendem fazer rádios comunitárias de forma independente. Para tanto, segundo Foucault, o Poder faz uso do que se entende por “ordem disciplinar” – um conjunto de práticas de controle, sistematizadas a partir do Século XIX e usadas até hoje nas mais diversas instituições. O objetivo dessa ordem disciplinar é humilhar e controlar, vigiar e punir aqueles que poderiam desobedecer ao poder.
A punição e a vigilância são poderes destinados a educar (adestrar) as pessoas para que essas cumpram normas, leis e exercícios de acordo com a vontade de quem detêm o poder. A vigilância é uma maneira de se observar a pessoa, se esta está realmente cumprindo com todos seus deveres – é um poder que atinge os corpos dos indivíduos, seus gestos, seus discursos, suas atividades, sua aprendizagem, sua vida cotidiana. A vigilância tem como função evitar que algo contrário ao poder aconteça e busca regulamentar a vida das pessoas para que estas exerçam suas atividades. Já a punição é o meio encontrado pelo poder para tentar corrigir as pessoas que infligem as regras ditadas pelo poder e ela também é o meio de impedir que essas pessoas cometam condutas puníveis (através da punição as pessoas terão receio de cometer algo contrário às normas do poder). A vigilância e a punição podem ser encontradas em várias entidades estatais, como hospitais, prisões e escolas (FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Rio de janeiro, Petrópolis: Vozes, 2009).
A Norma 01/11 é o discurso da “direita”, tanto criticada pelo PT. Por exemplo, ela restringiu a forma de patrocínio da RC. Se a Lei diz que o patrocínio somente pode ser feito por estabelecimentos instalados na área em que funciona a rádio comunitária, a Norma diz que o “apoio cultural” não pode divulgar ofertas, produtos, valores. Pergunta-se: qual a loja ou serviço vai patrocinar uma RC sabendo que não pode colocar os valores da oferta?
A bem da verdade, antes de existir uma definição de apoio cultural a Anatel já usava esta que agora se impõe. Ou seja, ela aplicou multas em diversas rádios por descumprirem uma regra que não existia! Este abuso da Anatel (punir sem ter norma legal para tanto) contou com a colaboração do Ministério das Comunicações, que tornou público em seu site uma regra inexistente como se fosse norma legal. Bem antes da Norma ser publicada, esse texto estava lá no site do MC (pelo menos até 13/05/11) como resposta às “perguntas mais frequentes”. Os redatores da Norma copiaram o texto e colaram na nova Norma.
Quanto à nova Norma 01/11. Ela amplia a burocracia e o controle sobre as pessoas. Para tanto pede (item 8.1.d) a lista...
De todos os associados pessoas físicas, com o número do CPF, número do documento de identidade e órgão expedidor mais o endereço de residência ou domicílio, bem como de todos os associados pessoas jurídicas, com o número do CNPJ e endereço da sede.
Qual o interesse do Estado em saber quem faz parte da associação? Quais as suas pretensões? Imagine-se o calhamaço que vai render uma associação como a Rádio de Heliópolis, São Paulo, instalada numa comunidade com 125 mil pessoas. O que o Ministério das Comunicações pretende fazer com uma lista contendo os dados de centenas ou milhares de pessoas, com a especificação de nome, endereço, CPF? Vai verificar a autenticidade de cada uma? Ao que parece temos aqui uma prática comum a regimes ditatoriais objetivando controlar as pessoas.
Ainda nesta Norma, o governo pede ao interessado “declarações” aparentemente absurdas para conceder a autorização. Um exemplo: é solicitado aos dirigentes das emissoras declarações de que seguirão a norma legal. Ora, qual a lógica em solicitar de concessionário de serviço público papel assinado dizendo que ele vai seguir a lei?
Não se trata, porém, de uma insensatez. Os que redigiram essa Norma não são nada insensatos. Pelo contrário. A Norma é parte de uma estratégia de manutenção do Poder, baseada numa determinada postura ideológica. A Norma é uma regra, mas também o discurso deste poder arrogante, abusivo. Ela afirma este Poder dizendo quem manda, quem dá as ordens; é o poder que humilha, discrimina, segrega, controla, vigia, enfim, faz de tudo para tornar dóceis os prováveis rebeldes. Cabe a imagem dos tempos coloniais: para evitar que os negros fujam das senzalas existem as cercas, as regras e as punições. A punição era o açoite, mas também a humilhação.
A Norma 01/11 faz exigências – “declarações” – com essa mesma intenção. Eis mais três delas:
a) Declaração de que os dirigentes da RC residem dentro do círculo com 1 km de raio, o espaço reservado pelo Estado para alojar as RCs. O dirigente também deve apresentar mapa topográfico indicando onde fica sua moradia destro deste gueto.
b) Declaração de que, quando solicitada, a entidade vai apresentar o projeto técnico.
Se a entidade sabe que, de acordo com a legislação, ela tem que apresentar projeto técnico, e que se não apresentá-lo não consegue outorga, porque exigir a declaração?
c) Declaração assinada por todos seus dirigentes de que irão cumprir a lei.
Ora, em nenhum outro setor da sociedade civil exige-se da pessoa física ou jurídica declaração de que ela vai seguir a lei. Isto somente acontece com quem se habilita às RCs.
Devem-se entender as exigências dessas declarações como parte do processo de punição. O Poder, ao tempo que se afirma ideologicamente, também humilha. Nos Estados Unidos os negros eram obrigados a cederem os assentos aos brancos. Era norma, mas antes disso era um discurso (uma ideologia). A Norma 01/11, assinada pelo governo do PT, tem efeito similar.
Quinto: cadeia para as RCs
Milhares de pessoas foram punidas por operarem emissoras sem autorização. Geralmente as rádios são fechadas em ações conjuntas da Anatel e Polícia Federal. A base legal é o Artigo 70 da Lei 4.117/62, o Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT) e o artigo 183 da Lei 9.472/97, a Lei Geral de Telecomunicações (LGT). Conforme a Constituição brasileira é preciso mandado judicial para que os agentes possam entrar e fazer a apreensão de equipamentos ou prender pessoas.
Na prática o mundo é outro. E há a história...
Por exemplo, até virar poder, o PT era contra a Lei Geral de Telecomunicações. Esta lei – uma invenção de Fernando Henrique Cardoso para encaixar o setor no mundo neoliberal – criava uma regulamentação para as telecomunicações, criava a Anatel e privatizava a Embratel. O PT era contra tudo isso. Era contra, inclusive, o poder de polícia dos agentes expresso no artigo 19, inciso XV, dessa lei. Diz o texto:
Art. 19 – À Agência compete adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras atuando com independência , imparcialidade , legalidade, impessoalidade e publicidade , e especialmente:
(...)
XV – realizar busca e apreensão de bens no âmbito de sua competência.
Em 1997, tão logo foi aprovada a LGT, o PT (com o PDT e PSB), entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) junto ao Supremo Tribunal Federal. O PT não aceitava que os agentes da Anatel tivessem o poder de fazer a apreensão de equipamentos de rádios. Para o PT isto feria a lei maior do país. Em 20/08/98 o Supremo concedeu liminar (nº 1668). Vitória do PT.
Pois bem, instalado no Palácio do Planalto, o PT encaminhou para o Congresso Nacional Projeto de Lei regulamentando os cargos dos que atuavam nas agências reguladoras. O PL foi aprovado no Congresso e sancionado pelo presidente Lula em 20 de maio de 2004 na forma da lei 10.871. Diz o artigo 3º desta lei:
Art. 3º São atribuições comuns dos cargos referidos nos incisos I a XVI do art. 1º desta Lei:
Parágrafo único. No exercício das atribuições de natureza fiscal ou decorrentes do poder de polícia, são asseguradas aos ocupantes dos cargos referidos nos incisos I a XVI do art. 1o desta Lei as prerrogativas de promover a interdição de estabelecimentos, instalações ou equipamentos, assim como a apreensão de bens ou produtos, e de requisitar, quando necessário, o auxílio de força policial federal ou estadual, em caso de desacato ou embaraço ao exercício de suas funções (grifo nosso).
 Isto é, com apenas um ano de governo, o PT encaminhou e aprovou Lei que dá poderes de polícia aos agentes da Anatel (e das demais as agências), legitimando a apreensão de equipamentos. Foi uma prova de que ao chegar ao poder o PT mudou de ideia (e ideologia). O que antes o partido considerava ilegal, inconstitucional, não apenas deixara de ser como criou lei para legitimar a situação.
Sexto: as ideias mudam
Sim, o PT era contra as agências reguladoras. Quem se der ao trabalho de ler as intervenções de parlamentares petistas no Congresso durante a votação da LGT, ou mesmo as manifestações públicas do partido sobre o assunto, constatará como o partido era visceralmente contra a criação de agências, uma das principais bases para implantação do Estado neoliberal defendido por FHC dentro da nova ordem mundial. Mas assim que chegou ao poder o PT mudou. Não apenas deixou de criticar as agências no governo anterior com cuidou de criar quase uma dezena de novas.
Petistas mantenedores deste poder conceituam esse fenômeno de mutação ideológica como “governabilidade”. Porém, petistas de raiz, classificam isso como atos de direita realizados por um partido que se pretende de esquerda, e traduzem a expressão “governabilidade” como “oportunismo”.
O problema é que quando se muda de ideia, ou de discurso, não se consegue apagar a memória. Por exemplo, este governo não se incomoda com o fato da repressão às rádios não autorizadas ser feita – hoje! – com base num dispositivo criado pela ditadura militar. O texto do artigo 70 da Lei 4.117/62 foi alterado pelo general Castelo Branco através do Decreto 236 em 1967. O novo texto pune com dureza os “subversivos” que ousarem colocar no ar emissoras sem autorização dos ditadores. O texto ainda fere o direito à legítima defesa consagrado na Constituição Federal de 1988 (motivo da ADIN impetrada pelo PT em 1997):
Art. 70 Constitui crime punível com a pena de detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, a instalação ou utilização de telecomunicações, sem observância do disposto nesta lei e nos regulamentos.
Parágrafo único. Precedendo ao processo penal, para os efeitos referidos neste artigo, será liminarmente procedida a busca e a apreensão da estação ou aparelho ilegal.
Isso está valendo hoje. E não constrange o governo petista, embora ciente de que “companheiros” foram presos, torturados e mortos por essa ditadura. A Anatel e a Polícia Federal fazem uso desse dispositivo porque ele está em vigor. Hoje, com base neste dispositivo e no art. 183 da LGT, há milhares de pessoas processadas por operar sem autorização.
Parlamentares do PT e de outros partidos apresentaram propostas visando anistiar essas pessoas punidas com base nessa lei. As propostas foram apensadas ao PL nº 4549/98. Coube a relatoria desse PL ao deputado Walter Pinheiro, do PT da Bahia (hoje senador), que, em 2008, apresentou um PL Substitutivo. O novo texto incorporou as propostas mais avançadas, anistiando todos que foram punidos, propondo penas administrativas para quem operasse emissoras nessa condição; revoga o artigo 70 da Lei 4.117/62 e dá nova redação ao artigo 183 da Lei 9472/97(punindo somente quem ultrapassar 250 watts de potência).
Então, ocorreu um feito raro: o Substitutivo foi aprovado (10/12/08) na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTI)! Daí foi encaminhado à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a última instância antes de seguir para o Senado. Era uma excelente notícia para os que fazem rádio comunitária. (O Substitutivo está disponível aqui.)
Nesse momento o governo petista resolveu intervir. Apoiando o PL aprovado na CCTI? Não. Pelo contrário: logo no início do novo ano, exatamente no dia 30/01/09, o governo do PT manda para o Congresso o Projeto de Lei nº 4573/09, que é um retrocesso diante do que havia sido aprovado na Comissão. A nova proposta é apensada ao que havia sido aprovado na CCTI e trava a tramitação na Câmara. O governo petista conseguiu uma façanha: barrou uma antiga reivindicação dos que atuam em RC mesmo sendo apresentada por um parlamentar do partido.
Mas ainda era pouco para. A nova Norma Técnica, assinada em junho de 2011, inseriu dispositivo que veta a participação dos processados pela PF na diretoria de RC. Isto é, as lideranças que ousaram enfrentar o aparato repressivo e colocaram emissoras no ar, exatamente aquelas pessoas que foram punidas pela Polícia Federal e pediam a anistia, agora são novamente punidas pelo PT com a exclusão do comando da emissora. O governo petista quer somente líderes dóceis, bonzinhos, dirigindo emissoras comunitárias – o que é coerente com a sua linha de “vigiar e punir”.
Finalmente, deve-se registrar que parlamentares do PT no Parlamento atuaram desde o primeiro instante por mudanças na legislação das rádios comunitárias. Em 2004, por exemplo, tramitavam no Congresso 20 propostas de petistas, e todas sugeriam avanços na legislação. Não era só isso: dezenas de parlamentares petistas estavam (e muitos ainda continuam) na linha de frente em defesa das rádios; alguns até enfrentaram corpo a corpo a Polícia Federal. Mas esta defesa de uma nova proposta para as rádios comunitárias não sensibilizou o poder instalado no Executivo.
Sétimo: conclusões
Como no célebre romance de Gabriel García Márquez, o tempo não passa para as rádios comunitárias – elas continuam sendo enroladas, enganadas, desprezadas e humilhadas pelos governos que se sucedem. Muda governo, renovam-se os burocratas e tecnocratas, mas a postura é a mesma – de segregação. Seja o PSDB de Fernando Henrique Cardoso, ou o PT de Lula ou Dilma Rousseff, o tratamento não muda.
Convenhamos, porém, o presidente Fernando Henrique Cardoso foi coerente. Seu governo sempre se posicionou claramente contra as rádios comunitárias; e a Lei 9.612/98, altamente restritiva, reproduz este pensamento. O discurso do governo petista, porém, é ilusionista – manifesta-se como uma defesa das RCs, mas suas ações promovem o estigma da exclusão de classes. “Rádio comunitária é coisa de pobre, dê-se a ela as migalhas, as sobras do banquete”, é outro significado desse discurso.
Os dez anos do PT significaram dez anos de solidão para as rádios comunitárias. O governo do PT (e não se pode generalizar para todo partido) fez o pior papel a se esperar numa disputa política: mascarou-se de aliado mas agiu como inimigo das RCs.
O partido não aprendeu as lições do velho Mao Tse Tung que dizia: numa guerra a primeira a coisa é saber quem são seus aliados e seus inimigos. O PT escolheu fazer uma política que destruiu a utopia de um partido de esquerda. Para desespero dos petistas de raiz, dos que acreditavam num partido da utopia, o governo do PT faz um esforço enorme para mostrar ao mundo que o PT é um partido igual aos outros.
No caso das rádios comunitárias o governo do Partido dos Trabalhadores é bem claro. São dez anos de enrolação, dez anos esperando Godot, dez anos de falsas promessas, dez anos que representam cem anos de solidão.
***
Dioclécio Luz é jornalista, mestre em Comunicação pela UnB, autor de A arte de pensar e fazer rádios comunitárias

domingo, 3 de março de 2013

Cebes denuncia: Pacote de estímulo a planos privados de saúde é mais um golpe no SUS


do Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes), via e-mail

O Sistema Único de Saúde — SUS — tem sofrido sucessivas derrotas, sendo uma das mais emblemáticas e dolorosas a indigesta aprovação da Emenda Constitucional-29 sem a destinação dos necessários 10% da Receita para a saúde.
No dia 27/02/2013 a Folha de São Paulo 1/1-Cotidiano (FSP) publicou matéria intitulada “União quer ampliar acesso a Planos de Saúde”, segundo a qual a Presidenta Dilma estaria negociando com as grandes empresas do setor privado da saúde (Qualicorp, Bradesco e Amil) medidas de redução de impostos, ampliação de financiamento para infraestrutura hospitalar e solução para as dívidas das Santas Casas. Segundo o jornal, o objetivo seria o de facilitar o acesso das pessoas aos planos privados de saúde com o compromisso de elevar o padrão de atendimento, anunciando que setores do governo celebram esse pacote como uma nova marca para a saúde.
A notícia de um “pacote  com medidas de estímulo” às empresas de planos e seguros do setor privado da saúde é mais um golpe no SUS, além de ser uma medida inconstitucional. A Constituição Federal de 1988 Art. 199 § 2º afirma que “É vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos”. Os planos e seguros de saúde são empresas que, por sua própria natureza, visam o lucro acima de tudo, independente de jogar com a saúde e a vida das pessoas. Constituem-se em um poderoso e lucrativo setor sem compromissos com indicadores de saúde e sem controle social.
Quem precisa urgente de “estímulo” é o SUS, que contrário do que prevê a Constituição, está se tornando complementar às instituições privadas na prestação de serviços, sobretudo na atenção medica especializada e hospitalar. O atual governo pode passar para a história como um dos responsáveis pela extinção da possibilidade e viabilidade do SUS como um sistema público universal  que deve oferecer atenção integral.
O CEBES, diante da notícia veiculada manifesta profunda preocupação com a hipótese que esta noticia seja de fato configurada como estratégia de governo e, tal como todo o movimento sanitário, encontra-se em alerta máximo contra essa iniciativa que compromete irreversivelmente o Sistema Único de Saúde como projeto de saúde para a sociedade brasileira.
É preciso lembrar o Governo de que a ampliação da oferta de planos de saúde para a classe media constitui um atentado ao direito à saúde e um retrocesso na consolidação do SUS como sistema universal, integral e de qualidade, além de representar uma perversa extorsão para a população que paga barato, mas tem plano com cobertura de atendimento restrita que não dá conta das necessidades de saúde das pessoas. É falacioso e desonesto atribuir mérito da desoneração do SUS a esta estratégia da expansão da oferta de planos privados.
O Movimento Sanitário integrado por intelectuais, pesquisadores, estudantes, gestores, profissionais de saúde, movimentos sociais de usuários do SUS e ativistas, vem reclamando por mais recursos orçamentários para o SUS por constatar a precariedade da assistência oferecida fruto, dentre outras causas secundarias, do baixo investimento publico no setor saúde.
Nosso objetivo é consolidar o SUS constitucional que a população brasileira conquistou onde saúde é um direito universal e um dever do Estado. Por isso nossa posição é radicalmente contraria à expansão do mercado privado da saúde que se apresenta hoje financeirizado  e comprometido eticamente com os interesses do capital, sem nenhuma responsabilidade sanitária. Da mesma forma seremos implacáveis na defesa de que seja cessada a sangria das transferências de recursos públicos para o setor privado, especialmente com a compra de serviços, em detrimento de ampliar a oferta de serviços públicos.
O Brasil precisa de um projeto estratégico de fortalecimento e consolidação do SUS, a noticia veiculada pela FSP leva à constatação de que, de forma deliberada ou não, prevalece sobre a saúde uma visão fiscalista, em que o fomento do mercado de planos aparece como solução “pragmática” para desonerar as contas públicas compondo o ideário de setores economicistas da atual coalizão governamental.
Em termos concretos, como desdobramento desse cenário político-ideológico, o subfinanciamento do SUS e a captura da ANS revelam uma opção pelo crescimento e pela autorregulação do mercado de planos de saúde, valorando positivamente o subsistema privado e a estratificação de clientela. Um desvio, ou melhor, um erro estratégico que fere de morte o artigo 196 da Constituição.
O elevadíssimo custo dos  sistemas privados de saúde em países capitalistas que não contam com sistema públicos universais integrais como   é o caso americano, tem induzido uma ampliação da intervenção governamental. Essa experiência deveria ser exemplar na defesa e fortalecimento do sistema publico brasileiro. Ao contrário, no Brasil, após a extinção da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) – uma vitória da oposição em fins de 2007 – observa-se no interior do governo Dilma, um franco interesse em ampliar os incentivos governamentais para o setor privado, apesar deste já contar com subsídios escandalosos.
Em razão das atuais circunstâncias históricas, o CEBES não acredita nem aposta que as relações mercantis do setor saúde poderão ser extintas por decreto e, nessa perspectiva dirigimos nossa mobilização para que as eleições presidenciais de 2014 constituam um momento oportuno para reagregar o bloco histórico identificado com os direitos sociais, com o SUS universal e com uma reforma sanitária que tenha como norte a solidariedade e os direitos sociais como referencia civilizatória.

PT apóia lei popular para regular mídia

Por Rodrigo Vianna, no blog Escrevinhador:

Dilma mandou dizer que o governo não levará adiante o debate sobre a necessária regulação da mídia no Brasil. As prioridades dela são outras: retomar o crescimento, convencer os velhos rentistas de que a redução dos juros é definitiva e que, portanto, é preciso tirar o dinheiro do banco e investir.

Trata-se de um erro de Dilma. Ela não percebe que parte da dificuldade para destravar o debate econômico (dominado por colunistas/”consultores”/comentaristas ligados a bancos e ao conservadorismo) passa justamente pela Comunicação – hoje, controlada por poucos, dominada pelo BV (bônus de veiculação, espécie de propina que agências de publicidade recebem para concentrar anúncios em poucos meios de comunicação) e por meia dúzia de famílias, num esquema oligárquico e concentrador de verbas e de verbo. Concentra-se dinheiro e opinião.

Esse debate avança na Argentina, Venezuela, Equador, Bolívia… É uma questão de tempo que avance mais também no Brasil. Aliás, lentamente, vem avançando. Lembremos… Dez anos atrás, meia dúzia de professores e especialistas denunciavam sozinhos a falta de Democracia na mídia (Brizola era voz isolada, entre os políticos, a criticar o monopólio/oligopólio midiático brasileiro).

De cinco anos pra cá, o debate invadiu os blogs, as redes sociais… E agora ganha apoio dos movimentos sociais e partidos políticos. O PT acaba de aprovar uma resolução conclamando o governo a rever sua posição, e declarando apoio a “um Projeto de Lei de Iniciativa Popular para um novo marco regulatório das comunicações, proposto pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), pela CUT e outras entidades”.

A CUT decidiu priorizar esse debate, participando ativamente do FNDC. A CTB e outras centrais sindicais também dão apoio. O MST, os movimentos de moradia, as associações de combate ao racismo, as uniões de mulheres, os sindicatos e associações mais combativos… Todos já se deram conta: esse debate é central no Brasil.

Desde o governo Lula, esperava-se que o comando do processo viria do poder Executivo – como aconteceu no Equador, Venezuela, Argentina… Lula ensaiou um movimento nessa direção. Logo abortado. Dilma recuou ainda mais. Derrota?

Em termos. O fato é que, se o governo não avança, os movimentos sociais vão partir pra rua. Prepara-se o projeto de lei, de Iniciativa Popular, que receberá milhares (milhões?) de assinaturas antes de ser levado ao Congresso. Ou seja: no Brasil, a Ley de Medios não virá dos gabinetes. Mas das ruas. Teremos força para fazer o Congresso aprovar depois?

Não será tarefa fácil. Mas é essa a batalha que se trava agora. Jornais e famílias que controlam os meios de comunicação estão preocupados. Manchete da Folha nesse sábado era: “PT pede campanha por controle da mídia“.

Mentira. Jornais e famílias querem dar a impressão de que o conteúdo do que a mídia publica seria “censurado”. Eles, que censuram e retaliam blogs com ações judiciais, querem ser os donos da liberdade de expressão no Brasil.

Humildemente, aliás, sugiro o “slogan” para a campanha de coleta de assinaturas ao projeto de Lei de Iniciativa Popular: “Liberdade de Expressão não tem dono.”

O debate é justamente esse: o Brasil precisa de regras para evitar a ”propriedade cruzada” (numa cidade, a mesma família controla jornal, TV, internet, rádio… pode isso, numa Democracia?), precisa desconcentrar verbas e verbo, tornando a Comunicação mais democrática. No mundo capitalista “avançado”, há leis para isso. Para evitar a concentração. Os sinhozinhos da mídia no Brasil não querem esse debate. Dilma gostaria de evitá-lo, para não causar “marola”. Mas ele virá.

A seguir, a resolução do PT, na íntegra…

*****

RESOLUÇÃO DO DIRETÓRIO NACIONAL DO PT

O Diretório Nacional do PT, reunido em Fortaleza nos dias 1 e 2/3/2013, levando em consideração:

1. A decisão do governo federal de adiar a implantação de um novo marco regulatório das comunicações, anunciada em 20 de fevereiro pelo Ministério das Comunicações;

2. A isenção fiscal, no montante de R$ 60 bilhões, concedida às empresas de telecomunicações, no contexto do novo Plano Nacional de Banda Larga;

3. A necessidade de que as deliberações democraticamente aprovadas pela Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), convocada e organizada pelo governo federal e realizada em Brasília em 2009 — em especial aquelas que determinam a reforma do marco regulatório das comunicações, mudanças no regime de concessões de rádio e TV,adequação da produção e difusão de conteúdos às normas da Constituição Federal, e anistia às rádios comunitárias — sejam implementadas pela União;

4. Por fim, mas não menos importante, que o oligopólio que controla o sistema de mídia no Brasil é um dos mais fortes obstáculos, nos dias de hoje, à transformação da realidade do nosso país.

RESOLVE:

I. Conclamar o governo a reconsiderar a atitude do Ministério das Comunicações, dando início à reforma do marco regulatório das comunicações, bem como a abrir diálogo com os movimentos sociais e grupos da sociedade civil que lutam para democratizar as mídias no país;

II. No mesmo sentido, conclamar o governo a rever o pacote de isenções concedido às empresas de telecomunicações, a reiniciar o processo de recuperação da Telebrás; e a manter a neutralidade da Internet (igualdade de acesso, ameaçada por grandes interesses comerciais);

II. Apoiar a iniciativa de um Projeto de Lei de Iniciativa Popular para um novo marco regulatório das comunicações, proposto pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), pela CUT e outras entidades, conclamando a militância do Partido dos Trabalhadores a se juntar decididamente a essa campanha;

III. Convocar a Conferência Nacional Extraordinária de Comunicação do PT, a ser realizada ainda em 2013, com o tema “Democratizar a Mídia e ampliar a liberdade de expressão, para Democratizar o Brasil”.

Fortaleza/CE, 01 de março e 2013.

Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores

sábado, 2 de março de 2013

Primavera árabe: ‘Há que se passar pela experiência do islamismo no poder’


Nesta entrevista ao ‘Le Monde’, o destacado analista libanês Gilbert Achcar comenta as dificuldades dos governos islâmicos que subiram ao poder no mundo árabe. Além disso, diz que a Turquia não é uma referência para esses países, pois lá o AKP turco se reconciliou com o laicismo, tornando-se a versão islâmica da democracia cristã europeia.

Personagem desta entrevista, Gilbert Achcar é professor na School of Oriental and African Studies (SOAS) de Londres e um dos mais respeitados analistas do mundo árabe contemporâneo. Nasceu em 1951 e deixou o Líbano em 1983.

Ensinou na Universidade de París VIII e no Centro Marc-Bloch de Berlim. O seu compromisso com as esquerdas e movimento pró-palestina nunca o impediu de dirigir um olhar severo sobre as ditaduras nacionalistas árabes. É autor de “Le peuple veut une exploration radicale du soulèvement arabe”, editora Actes Sud.

Como qualificar o que aconteceu no mundo árabe, desde 2011?
 
Escolhi a palavra “levante” como título para o meu livro. Mas, na introdução falo de um processo revolucionário a longo prazo. O que estava claro desde o princípio é que estávamos muito no início de uma explosão, e o que se pode prever com certeza é que será de longa duração.

Emmanuel Todd deu uma explicação demográfica do fenômeno. Você inclina-se mais para uma explicação marxista.
 
A fase durante a qual o mundo árabe se distinguia por uma demografia galopante acabou há vinte anos. Comecei com a análise da situação em vésperas da explosão, em 2010. Constata-se um bloqueio do desenvolvimento que contrasta com o resto do mundo; inclusivamente com a África subsariana. A expressão mais espetacular desse bloqueio é uma taxa de desemprego recorde, particularmente entre os jovens. Além disso, há uma modalidade específica do capitalismo na região: em diferentes níveis, todos os Estados são rentistas. A outra caraterística é um patrimonialismo no qual o clã dominante se apropria do Estado até ao ponto de o transmitir de forma hereditária.

As revoluções árabes traduziram-se em liberalizações políticas, mas não em grandes mudanças sociais. Por quê?
 
No Egito e na Tunísia, só foi quebrada a ponta do icebergue; quer dizer, os déspotas e o seu grupo próximo. Por outro lado, nesses dois países, o “Estado profundo”, a administração, os aparelhos de segurança, não mudaram. Neste momento, só na revolução Líbia se deu uma mudança radical: hoje, já não há Estado; já não há exército. Nesse país, o descalabro social foi mais profundo, porque o reduzido espaço privado que existia era ocupado pela família Gadafi.

No Ocidente estranhou-se o triunfo dos islamitas nas eleições, quando não foram eles a lançar essas revoluções…
 
As expectativas do Ocidente, esse romanticismo em volta da “primavera” e o “jasmim”, todo esse vocabulário orientalista, baseavam-se num desconhecimento da situação. Era evidente que os integristas iam apanhar as castanhas do fogo porque, desde finais dos anos 70, impuseram-se como uma força hegemónica no protesto popular. Encheram o vazio deixado pelo fracasso do nacionalismo árabe. Por outro lado, a principal razão pela qual os governos ocidentais apoiavam os despotismos árabes era o receio dos integristas. Crer que essa situação iria ser varrida pelos acontecimentos, era tomar os desejos por realidades. Com o apoio financeiro do Golfo e o apoio televisivo da Al Jazeera, não se podia esperar outra coisa que vitórias eleitorais integristas. O que é chamativo é que essas vitórias não tenham sido esmagadoras. No Eipto, desde as legislativas ao referendo sobre a Constituição, passando pelas presidenciais, estamos a ver a velocidade a que se desmorona o voto integrista. Na Tunísia, Ennahda consegue 40% numas eleições em que participaram metade das pessoas inscritas. E, na Líbia, a Irmandade Mulçumana local foi derrotada.

Surpeendem-lhe as atuais dificuldades dos islamistas no poder?
 
Em primeiro lugar, há que dizer que o regresso aos despotismos não é algo exequível. Há que passar pela experiência do islamismo no poder. As correntes integristas construíram-se como forças de oposição com um slogan simplista: o islão é a solução. É algo completamente oco, mas funcionava num contexto de miséria e de injustiça no qual se podia vender essa ilusão. Os islamistas são traficantes do ópio do povo. Desde o momento em que estão no poder, isso já não é possível. São incapazes de resolver os problemas das pessoas. Chegaram aos postos de comando em condições que ninguém inveja e não têm nenhum programa econômico.

Pode-se confiar neles no momento de organizar escrutínios que os poderão expulsar do poder?
 
Esse é o argumento clássico: uma pessoa, um voto, mas uma só vez. Salvo que cheguem ao poder em posição de força. O povo aprendeu a “querer” sair à rua. Jamais um dirigente, na história do Egito, foi tratado com tanto desprezo pelo seu povo como atualmente Morsi…

Pode-se copiar o modelo turco para o mundo árabe?
 
Não, na Turquia não é a Irmandade Mulçumana que dirige o país, mas uma cisão modernista que se reconciliou com o princípio do laicismo. O AKP turco é a versão islâmica da democracia cristã europeia. A Irmandade Mulçumana não é isso. É uma organização integrista que milita pela Sharia e para quem a palavra laicismo é uma injúria. No terreno econômico, não tem nada a ver: o AKP encarna um capitalismo de pequenos industriais, enquanto a Irmandade Mulçumana participa numa economia rentista, fundada no lucro a curto prazo.

Pode descrever a influência do Qatar nestas revoluções?
 
É um enigma. Alguns dirigentes colecionam carros ou armas; o Emir do Qatar, por seu lado, joga na política externa. Apresentou-se como comprador da Irmandade Mulçumana da mesma forma que compraria uma equipe de futebol. Um homem que jogou um papel fundamental nesta nova aliança (que faz recordar a que houve entre Mohamed ben Abdel Wahab e a dinastia dos Saud no século XVIII) é o sheik Qaradhawi, chefe espiritual dos Irmandade Mulçumana, instalado desde há muito no Qatar, e que tem grande influência na Al Jazeera. Tudo isso acontece num país em que o Emir não tolera qualquer oposição.

Como explicar a complacência dos Estados Unidos para com a Irmandade Mulçumana?
 
É algo que começou sob a administração Bush. Para os neoconservadores, o despotismo nacionalista produziu o terrorismo e, portanto, havia que derrubar déspotas como Saddam Hussein para poder estender a democracia. Condoleezza Rice quis retomar a aliança com a Irmandade Mulçumana, que se deu nos anos 50 e 60. Mas a vitória do Hamas nas eleições palestinianas bloqueou o processo. A administração Obama, que herdou uma situação catastrófica no Médio Oriente, mostrou uma atitude indecisa e prudente. Quando tudo estalou, optou por tentar dar a impressão de acompanhar o movimento. A obsessão de Washington na região é a estabilidade e o petróleo. E a tradução desta obsessão, é a procura de aliados que disponham de uma base popular.

Por que é que a intervenção da OTAN foi possível na Líbia e não na Síria?
 
A Síria encontra-se perante um risco de caos tipo Líbia, mas num contexto regional bastante mais perigoso. Está também o apoio da Rússia e do Irão. Desde o começo, a OTAN disse que não queria intervir. A questão não é “porque é que o Ocidente não intervém na Síria?”, mas “porque é que impede a entrega de armas à rebelião?”. A razão profunda é o medo do movimento popular na Síria. E o resultado é que a situação está a apodrecer. O regime sírio acabará por cair, mas a que preço? A miopia dos governos ocidentais é alucinante: com o pretexto de não reproduzir os erros cometidos no Iraque, quer dizer, o desmantelamento do estado baasista, fazem algo pior. Hoje, os sírios estão persuadidos de que o Ocidente deixa que o seu país se auto-destrua para proteger Israel.

A esquerda anti-imperialista vê um complô americano nestas revoluções…
 
Se, por oportunismo, as insurreições populares são apoiadas por potências imperialistas, não justifica que apoiemos as ditaduras. A teoria do complô americano é grotesca. Basta ver o aperto de Washington. É claro que, depois de quarenta anos de totalitarismo, o que chega é o caos, mas, como diria Locke, prefiro o caos ao despotismo, porque no caos tenho uma opção.


* Tradução: António José André, do Esquerda.net

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Max Altman: Ao povo soberano da Venezuela caberá a última palavra



A Folha de S. Paulo desta terça-feira, 8 de janeiro de 2013, trombeteia em sua principal manchete: “Brasil dá apoio a manobra que adia a posse de Chávez”. É mais um típico exemplo de desinformação, manipulação e distorção da grande mídia.

Por Max Altman*, no Opera Mundi


Agência Brasil
Venezuela Presidente Hugo Chávez está em Havana onde se recupera de uma cirurgia para a retirada de um câncer na região pélvica
 
O que a Folha considera manobra é o governo Dilma defender o adiamento da posse do presidente venezuelano Hugo Chávez, prevista para esta quinta-feira (10), e a manutenção do atual vice Nicolás Maduro no cargo por até 180 dias. O jornal deixa transparecer ao leitor menos avisado, de maneira falaciosa, que os 180 dias sugeridos correspondem a uma manobra e que esse prazo não passa de chute.

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Na página principal do caderno Mundo, o jornal traça, a seu modo, panoramas para a Venezuela, expõe o que diz a Carta da Venezuela, o que dizem os chavistas, o que diz a oposição, o que diz a cláusula democrática do Mercosul e o que diz o Brasil, mas em nenhum momento menciona ou transcreve, ou seja, esconde o art. 234 da Constituição da Venezuela que fundamenta a posição brasileira: “Art. 234 : As faltas temporárias do Presidente ou Presidenta da República serão supridas pelo Vice-Presidente Executivo ou Vice-Presidenta Executiva até por noventa dias prorrogáveis por decisão da Assembleia Nacional por noventa dias mais.

Se uma falta temporária se prolongar por mais de noventa dias consecutivos, a Assembleia Nacional decidirá por maioria de seus integrantes se deve considerar-se que há falta absoluta.”

Em que circunstâncias se dá a falta absoluta, o que obriga a convocar novas eleições, dependendo do caso? A resposta está no “Art. 233 : Serão faltas absolutas do Presidente ou Presidenta da República: sua morte, sua renúncia, ou sua destituição decretada por sentença do Tribunal Supremo de Justiça; sua incapacidade física ou mental permanente certificada por uma junta médica designada pelo Tribunal Supremo de Justiça e com aprovação da Assembleia Nacional; o abandono do cargo, declarado como tal pela Assembleia Nacional, assim como a revogação popular de seu mandato.

Quando se produzir a falta absoluta do Presidente eleito ou Presidenta eleita antes de tomar posse, se procederá a uma nova eleição universal, direta e secreta dentro dos trinta dias consecutivos seguintes. Enquanto se elege e toma posse o novo Presidente ou a nova Presidenta, se encarregará da Presidência da República o Presidente ou Presidenta da Assembleia Nacional.

Se a falta absoluta do Presidente ou Presidenta da República se produzir durante os primeiros quatro anos do período constitucional, se procederá a uma nova eleição universal, direta e secreta dentro dos trinta dias consecutivos seguintes. Enquanto se elege e toma posse o novo Presidente ou a nova Presidenta, se encarregará da Presidência da República o Vice-Presidente Executivo ou a Vice-Presidenta Executiva.

Nos casos anteriores, o novo Presidente ou Presidenta completará o período constitucional correspondente.

Se a falta absoluta se produzir durante os últimos dois anos do período constitucional, o Vice-Presidente Executivo ou a Vice-Presidenta Executiva assumirá a Presidência da República até completar dito período.”

A oposição, apoiada freneticamente pela mídia local e internacional, insiste em que no dia 10 de janeiro encerra-se um período constitucional e começa outro. Encerrado o período deixam automaticamente de exercer suas funções o vice-presidente, Maduro, e todos os ministros designados anteriormente por Chávez. Se não houver posse do presidente eleito em 7 de outubro, sobrevem um vazio de poder. E para que não haja vazio ele só pode ser preenchido pelo presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello. Alardeia a oposição que se em 10 de janeiro não ocorrer o juramento do presidente e não forem ativadas as disposições constitucionais relacionadas com a falta temporária do Presidente da República, será consumada uma grave violação à ordem constitucional na Venezuela que afetará a essência da democracia. Ora como se viu acima, as disposições constitucionais relativas à falta temporária falam que esta será suprida pelo vice-presidente. E como o vice-presidente é nomeado pelo presidente e , segundo a oposição, suas funções se extinguem com o encerramento do período constitucional anterior, é o presidente da Assembleia Nacional, para que não haja vazio de poder, quem deve assumir. É aí que reside o golpe. Se o presidente da Assembleia assumir fica configurada a falta absoluta e ele deve obrigatoriamente convocar novas eleições em 30 dias. A oposição, derrotada em 7 de outubro e depois em 16 de dezembro, espera a revanche, agora sem a presença de Hugo Chávez.

E por quê Marco Aurélio Garcia sustenta que Nicolás Maduro deve responder pelo governo no período sugerido de 90 dias mais 90 ? Ele o faz apoiado na realidade de que há um processo de continuidade. O presidente eleito em 7 de outubro de 2012 é o mesmo que vinha exercendo o cargo, de modo que não há descontinuidade. Trata-se do mesmo presidente e de todos os seus auxiliares designados. Nesse caso concreto a posse e o juramento passam a ser uma formalidade que pode ser suprida quando o presidente eleito puder fazê-lo. A cirurgia de Chávez e a sua impossibilidade de tomar posse e jurar no dia 10 de janeiro é um motivo superveniente de que trata o “Art. 231 : O candidato eleito ou a candidata eleita tomará posse do cargo de Presidente ou Presidenta da República em 10 de janeiro do primeiro ano de seu período constitucional, mediante juramento ante a Assembleia Nacional. Se por qualquer motivo superveniente o Presidente ou Presidenta da República não puder tomar posse ante a Assembleia Nacional, o fará ante o Tribunal Supremo de Justiça.”

A Constituição não estabelece prazo para que o fato superveniente possa ser superado. O limite está exatamente naqueles 90 mais 90 dias.

O colunista Clovis Rossi, na mesma edição do jornal, interpreta a seu talante esse artigo. Diz que “a data é fixa e inamovível. Móvel pode ser apenas o local de juramento. Qualquer outra interpretação é chicana política”. Imaginem o caso de um presidente venezuelano eleito que, estando no exterior, embarca no dia 9 de janeiro para poder estar presente nesse “inamovível” dia 10. O avião em virtude de mau tempo se vê impedido de levantar vôo e esse mau tempo perdura por mais 24 horas, tornando impossível sua presença nesse dia “inamovível”. O que acontece? Perde o lugar?

Todos os artigos acima citados são fundamentais mas dizem respeito apenas ao mecanismo de posse e das faltas temporária e absoluta. Somente periódica e eventualmente a eles se lança mão.

Permanente, cláusula pétrea e essência da democracia é o que dispõe o “Art 5º : A soberania reside intransferivelmente no povo, quem a exerce diretamente na forma prevista nesta Constituição e na lei, e indiretamente, mediante o sufrágio, pelos órgãos que exercem o Poder Público.

Os órgãos do Estado emanam da soberania popular e a ela estão submetidos. “

Em 7 de outubro de 2012, o povo venezuelano, mediante sufrágio universal, direto e secreto, além de limpo, justo , democrático e concorrido, elegeu como seu presidente, pela terceira vez, Hugo Chávez. Mas não elegeu apenas Chávez, sufragou também um plano amplamente divulgado e debatido, o “Plano Socialista da Nação – 2013-2019”, programa histórico de cinco objetivos fundamentais, que tem por lema ‘desenvolvimento, progresso, independência, socialismo’.

É ao povo soberano que caberá a última palavra.

*Max Altman é jornalista