Gabriel Perissé
O bom filme hipnotiza para nos fazer despertar. Educadores precisam ver filmes, pensar filmes, divulgar filmes. Filmes novos ou antigos, tanto faz, contanto que nos façam refletir mais...
El ángel exterminador (1962), de Luis Buñuel, por exemplo. As pessoas presas na mansão, presas a si mesmas, presas ao comodismo, a “paradogmas”, ao inexplicável. Socialmente doentes. Pessoas presas a seitas, a convenções que há muito perderam sua razão de ser, presas a manias, a medos. No final, após grande sofrimento, o grupo vai a uma missa de ação de graças pela libertação... O grupo e os outros fiéis ali presentes voltam a prender-se, desta vez dentro da igreja. E, como desfecho, ovelhas caminhando “inocentemente”.
Somos nós também, ainda presos. Presos a conceitos apodrecidos, a uma imagem de Deus talvez apodrecida.
O filme 21 gramas, de 2003. Inesquecível. Alejandro González-Iñárritu é o diretor. A morte alimentando a vida. Um homem recebe o coração de outro, e se apaixona pela viúva do doador. O coração continua amando. Uma vida que pesa tão pouco — 21 gramas, dizem, é a diferença de peso entre uma pessoa viva e seu cadáver.
Um filme recentíssimo, O labirinto do Fauno (2006). Duas horas de hipnose benéfica, uma história que não decai em nenhum momento. Atores ótimos, elementos míticos que tocam o cerne de cada um de nós: a menina órfã, o labirinto, os testes existenciais, a lua cheia, as gotas de sangue.
Ao contrário do que diz a mãe de Ofelia (a protagonista), magia existe, sim, ou estaremos à mercê da maldade, da nossa maldade. A inocência vencerá, ou não valerá a pena viver, ou não valerá a pena cultivar a esperança.
Outro filme, Ser e ter, de 2002. Filme francês, algo de documentário. Ser paciente, ter responsabilidade; ser professor, ter uma vida; ser atento, ter emoções. Ser e ter, ter e ser. Não se opõem. Complementam-se. Educação é essa complementação.
Um dos alunos está com as mãos sujas, e o professor aproveita para conversar sobre os nomes dos dedos: polegar, anelar, indicador... O pai de outro aluno vai sofrer uma intervenção cirúrgica séria, e o professor conversa serenamente sobre a realidade da dor...O professor ajuda os alunos, os alunos se ajudam, todos conversam, em clima de exigência tranqüila. Há algumas regras, há alegria, há trabalho, há companheirismo, carinho.
Ter uma utopia é começar a ser...
Gabriel Perissé é doutor em Educação pela USP e escritor. Web Site: www.perisse.com.br