sábado, 11 de agosto de 2007

Hermeto Pascoal - 1979 - Montreux Jazz Festival
Hermeto Pascoal - Montreux Jazz Festival

Copiado de:Mate-Couro

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Belchior - 1979 - Medo de Avião
Belchior - Medo de Avião
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Tráfico de órgãos é terceiro crime mais lucrativo, segundo Polícia Federal.

“Tráfico de órgãos é o terceiro crime organizado mais lucrativo no mundo. Só perde para o de drogas e o de armas”. A declaração é do coordenador de operações especiais de fronteiras da Polícia Federal, Mauro Sposito. Ele participou de audiência pública sobre Tráfico de Órgãos na Amazônia, realizada pelas Comissões da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional e de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado. O evento atendeu as solicitações dos deputados Carlos Souza (PP-AM) pela CAINDR e Raul Jungmann (PPS-PE) pela CSPCCO.
Os deputados solicitantes da audiência, a presidente da CAINDR, deputada Vanessa Grazziotin (PCdo-AM) e a deputada Elcione Barbalho (PMDB-PA), que também contribuiu com informações sobre casos de mortes no Estado do Pará, definiram que será feito um levantamento de todas as Leis que tramitam na Casa sobre essa questão. A partir desse levantamento, eles pretendem contribuir com o Ministério da Saúde no que se refere a melhorias para o Sistema Nacional de Transplantes.
Mauro Sposito explicou que existem vários formas do crime organizado de tráfico de órgãos acontecer: brasileiros vão ao exterior e, por necessidade financeira, vendem seus órgãos lá; órgãos são extraídos no Brasil e enviados para o exterior; estrangeiros vem ao Brasil e vendem seus órgãos aqui; brasileiros extraem seus órgãos no Brasil e os comercializam aqui mesmo. Segundo ele, a Polícia Federal está investigando todas essas práticas.
Porém, com relação a Amazônia, assunto específico da audiência, Sposito disse que assim que foram feitas, as denúncias foram investigadas e continuam sendo. Porém, nada foi comprovado. Ele acredita que as informações veiculadas na mídia podem estar escondendo algo mais grave. “Essa investigação é uma das nossas prioridades na região. Mas até agora não evidência concreta da retirada de órgãos de índios. As investigações mostram que as denúncias decorrem muito provavelmente de lendas e rituais antigos dos índios”, ressaltou.
Tanto a representante do Ministério da Saúde, Camila Carlone Gaspar, como o deputado Neucimar Fraga (PR-ES), que presidiu a CPI do Tráfico de Órgãos Humanos, realizada em 2004 na Câmara, disseram ser muito difícil que ocorra tráfico de órgãos na Amazônia, destinados a transplante, devido a complexidade de equipamentos necessários para o acondicionamento desses órgãos. Mas Neucimar Fraga lembrou que órgãos humanos são usados também por faculdades para estudos.
Camila Gaspar informou que o Sistema de Transplante só está agora chegando na Amazônia. Segundo ela, até o ano passado só existiam Centrais de Transplantes no Amazonas e no Pará. “Este ano é que estamos chegando ao Acre, Roraima e Amapá. Sabemos que o Sistema ainda tem muito a melhorar”, reconheceu.
A técnica esclareceu ainda que a CPI contribuiu para alguns avanços no Sistema de Transplantes. “Integrou-se o Sistema em todas os Estados e não existem mais as listas duplas. Em 2005 modificou-se a legislação com relação às Comissões intra-hospitalares, órgãos responsáveis por coordenar as ações de transplantes. Hoje, para concedermos autorização para um hospital trabalhar com transplante, o mesmo tem que comprovar que possui a Comissão e que ela funciona”, enfatizou.
O deputado Neucimar Fraga falou sobre a dificuldades de investigar esse assunto no Brasil. “Sempre que se tenta investigar denúncias de tráfico de órgãos, jogam a investigação contra a fila de transplante. Na CPI fomos acusados de estar prestando um desserviço a sociedade. É um crime de alta complexidade que envolve médicos e outros profissionais de saúde”, desabafou.
Entre os principais pontos dificultadores para que o tema seja investigado profundamente, Fraga citou o corporativismo médico. Para ele, existe e necessidade que esse assunto seja levado mais a sério pelos Ministérios envolvidos na questão e pela Polícia Federal.
Para o deputado Carlos Souza, seja qual for o motivo que leve pessoas a aparecerem mortas sem seus órgãos, tem que ser investigado. Ele citou o caso da índia de 20 anos que foi encontrada morta com o abdômen costurado de forma grosseira e sem parte de seus órgãos.
Para o deputado Raul Jungmann, é urgente que seja delimitado qual a extensão desse processo.
De tudo que foi exposto, ele concluiu que essas denúncias ficam numa zona muito obscura. “Podem ser rituais satânicos, podem ser problemas entre comunidades indígenas ou podem ser tráfico de órgãos. Mas a verdade é que a freqüência das denúncias tanto no Norte como no Nordeste aponta no sentido de que há máfia de tráfico sim e isso precisa ser investigado rigorosamente”, ressaltou.

Bety Rita Ramos
Assessoria de Imprensa
Portal Câmara dos deputados

Para analistas franceses, contágio pode gerar grande crise


A incerteza financeira da sema tem o seu centro nos Estados Unidos e sua bolha imobiliária, porém o principal sinal de alarme veio da França. Foi ali que, na quinta-feira (9), o banco francês BNP Paribas congelou o saque de três de seus fundos de investimentos, fazendo um arrrepio de medo percorrer as bolsas do planeta. O diário francês Libération entrevistou na sexta-feira dois economistas, Jean-Paul Fitoussi e Dominique Plihon, um da fundação Sciences-Po Paris, uma instituição nacional, e o outro presidente do conselho científico da ONG Attac.


Jean-Paul Fitoussi (esq.) e Dominique Plihon

Libération - A intervenção do Banco Central Europeu (BCE, que injetou no mercado mais de US$ 200 bilhões em dois dias) marca uma virada na crise dos créditos imobiliários?


Jean-Paul Fitoussi - Os bancos intervêm para apagar o incêndio que eles mesmos atearam. Impulsionados por sua missão primeira – a estabilização da inflação –, eles fragilizaram o mercado ao elevar as taxas de juros, o que favoreceu a crise imobiliária. Uma tragédia grega entra em cartaz: a inflação retorna, via alta dos preços do petróleo e das matérias-primas agrícolas, os bancos reagem e elevam os juros, e os operadores financeiros, que apostavam na estabilidade, se vêem fragilizados.


Dominique Plihon - Temos aqui uma injeção de liquidez de emergência, do emprestador em úntima instância. É um sinal muito claro: há um princípio de incêndio no sistema bancário. O BCE quer que os pagamentos sejam honrados para que os bancos não travem o sistema. Tenta evitar um efeito dominó: os bancos em dificuldade carregariam consigo outros bancos, dos quais são devedores...


L - Quais são os riscos de contágio?


DP - O risco é real e profundo, mas uma grande crise generalizada não é inevitável. Pode-se vê-lo cada dia um pouco melhor: os grandes bancos europeus se voltaram para o mercado americano, frequentemente através de LBO (Leverage Buy Out, a recompra de empresas de crédito). Essas operações têm uma propensão para gerar riscos. Em compensação, caso se descubra que, como parece ser o caso hoje, que esses bancos estão fortemente afetados, pode acontecer uma desconfiança generalizada, que pode conduzir a um efeito de pânico, uma queda do consumo e portanto do crescimento.


J-PF - A acumulação de dívidas de risco por devedores insolventes já contamina os bancos, como o prova o caso do BNP Paribas. Eis que ele se torna vítima do modelo presa-predador. Quando os predadores devoram em excesso as populações pobres, superendividadas para adquirir um imóvel, ficam por sua vez em perigo. Em princípio, estamos diante de um efeito dominó que pode gerar uma crise de amplitude muito grande.


L - 1987, 1997, 2007: existe uma inevitabilidade nos ciclos das crises financeiras?


J-PF - Desgraçadamente, é raro que se aprenda com as crises precedentes. Ontem foi a bolha internet, hoje a bolha imobiliária. E o que é mais inquietante, ainda que pouquíssimo falado por enquanto, é o carry trade (empréstimo em uma moeda cujas taxas de juros são baixos para aplicar a soma em países que oferecem juros maiores) sobre o yen japonês. Mas agora o yen se recupera, e o sistema, que abocanhou mais de US$ 200 bilhões, pode implodir.


DP - As crises econômicas não se repetem, assumem sempre novos contornos. É verdade que, apesar do déficit global de governança, grandes progressos ocorreram na prevenção e gestão de riscos. Porém o mais inquietador é a disparada dos preços das matérias-primas e alimentos e a especulação que a acompanha. Sem regulação, essa exuberância irracional corre o risco de provocar grandes estragos, porque a cegueira, para o desastre dos mercados, não mudou.


Fonte: http://www.liberation.fr



sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Chico Buarque e Elis Regina - Pois é

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Alternativas ao aquecimento global



Apresentação

“Reservemos o pessimismo para tempos melhores”, gosta de provocar o escritor uruguaio Eduardo Galeano, espalhando palavras que viu, certa vez, pintadas num muro em Bogotá. A frase contraria certa postura intelectual, ao sugerir que espírito crítico não pode ser sinônimo de desesperança – e que esta última converte-se, com freqüência, no último refúgio dos conservadores.

É o que mostra, aliás, o debate sobre aquecimento global. Quando se tornou impossível negar o fenômeno, os meios de comunicação tradicionais passaram a espetacularizá-lo. Multiplicam-se, nos jornais e TVs, as matérias dedicadas ao tema, quase sempre em tom de sensacionalismo e com ênfase na suposta inevitabilidade da tragédia. Dramatizar o assunto é, neste caso, um meio de evitar duas perguntas cruciais. Quais os nexos entre a mudança climática e uma sociedade que se tornou incapaz de refletir sobre si mesma, porque foi dominada pela lógica dos mercados? Há alternativas a ambos os fenômenos?

Conhecido tanto pela profundidade de seus artigos quanto pelo olhar incomum que eles projetam sobre questões relevantes e polêmicas, Le Monde Diplomatique escolheu exatamente este tema para lançar, no Brasil, uma série de livros temáticos. Serão publicados a cada três meses, pelo Instituto Paulo Freire – a quem cabe produzir, no país, a edição internet do jornal e seu Caderno Brasil.

A edição que você tem em mãos reúne sete artigos. Parte deles compõe o acervo de quase dois mil textos traduzidos, desde 1999, da edição francesa do jornal – e reunidos numa biblioteca virtual que pode ser acessada em www.diplo.org.br/temas. Outros foram produzidos no Brasil. Em seu conjunto, os artigos constróem, servindo-se de dados rigorosos e análises não-convencionais, um ponto de vista oposto à visão fatalista que hoje predomina sobre o assunto. Ele se apóia em duas bases essenciais: a) Embora represente uma ameaça terrível, o aquecimento da atmosfera pode ser perfeitamente revertido; b) Para alcançar esta vitória, os seres humanos serão obrigados a superar as relações alienadas que mantêm consigo mesmos e com o ambiente.

Tecnologicamente, a era petróleo acabou. Como superar o sistema que a sustenta?

A série de textos é aberta por “A possível revolução energética”, de Antonio Martins. Trabalhando a partir dos dados de um vasto relatório do Greenpeace sobre energias alternativas (sobre o qual a mídia guardou silêncio), o autor demonstra que, do ponto de vista tecnológico, já é perfeitamente possível substituir o petróleo. Fontes como o sol, os ventos e a biomassa, combinadas com mudanças em nossos padrões de consumo, permitiriam reduzir as emissões de gás carbônico à metade do volume atual, até 2050. Não haveria nenhum dano ao bem-estar. Ao contrário: seria possível estender a eletricidade a dois bilhões de pessoas, hoje privadas até mesmo do acesso à lâmpada elétrica. Tais soluções são portadoras de uma lógica pós-capitalista: elas significam que a energia deve ser vista com um direito – que precisa ser assegurado a todo ser humano – e não uma mercadoria, que cada um produz e consome segundo seu poder de compra.

O texto seguinte, “Bem-vindos ao fim da era petróleo”, de Nicolas Sarkis, é o retrato de uma insensatez. Nos últimos anos, o aquecimento global deixou de ser uma abstração teórica para se materializar nas imagens que registram o derretimento de imensas massas de gelo. Neste mesmo período, o consumo de combustíveis fósseis intensificou-se como nunca. A demanda mundial, que crescia ao ritmo de 1,54% ao ano, na década de 1990, aumentou 3,7% em 2004. O autor demonstra que esta é a causa essencial da persistente alta nas cotações do óleo. E vai além: como nossas sociedades continuam incapazes de articular uma substituição programada desta fonte de energia, elevações devastadoras dos preços e crises de abastecimento podem tornar-se comuns, nos próximos anos.

Por que insistimos em aprofundar nossa dependência? Em “Os danos do movimento perpétuo”, Philippe Mühlstein explora a relação entre o consumo cego de combustíveis e os interesses econômicos hoje hegemônicos. Ele mostra que a eficiência energética do transporte pessoal por trem ou metrô é onze vezes maior que por automóvel – e, no entanto, nossos modelos urbanísticos não param de privilegiar, além do asfalto, as cidades que exigem longos deslocamentos. Além disso, ao estimular a deslocalização de empresas para regiões de mão-de-obra barata, o modelo atual de globalização multiplicou o transporte de cargas. O autor relata casos em que a insanidade torna-se funcional. Empresas alemãs enviam ao sul da Itália, para lavagem e corte, batatas que, em seguida, serão industrializadas e vendidas em seu país de origem.

Uma das marcas do paradigma energético atual é a desigualdade. “As primeiras vítimas”, de Agnés Sinai descreve esta característica. A autora revela que um consumidor médio nos Estados Unidos emite, em seu trabalho e consumo, cinco toneladas de gases do efeito estufa ao ano – 50 vezes mais que um cidadão de Burkina Faso. No entanto, mostra o texto, as primeiras vítimas de uma eventual catástrofe ambiental serão os que menos contribuíram para provocá-la. Gente como os esquimós, ou os habitantes da Aliança dos Pequenos Estados-Ilhas (Aosis, na sigla em inglês). Embora evidentemente favorável ao Protocolo de Kyoto, o artigo expõe algumas de suas graves contradições, como os créditos de carbono. O mecanismo premia os países do Sul que poluem, enquanto deixa órfãos os que hoje quase não emitem CO2.

Para o cientificismo: o planeta era mero recurso a ser consumido incessantemente

Em 1945, o poeta Paul Valéry cunhou uma frase que serve como emblema para os tempos que vivemos. “Começou o tempo do mundo que termina”, disse ele. O aquecimento obriga a enxergar o planeta como algo mais que um recurso, a ser incessantemente consumido. Mas esta nova mirada exige também outras relações entre os próprios seres humanos. É urgente ultrapassar o modelo da competição, segundo o qual “a vida de cada indivíduo ou coletividade é reduzida a uma sucessão de batalhas, às vezes ganhas, mas que terminam numa guerra perdida de antemão”.

Uma possível forma de fazê-lo é apresentada por Serge Latouche, em “As vantagens do decrescimento”. Ainda pouco debatido no Brasil, este conceito questiona o culto ao aumento incessante do Produto Interno Bruto (PIB). Enfeitiçadas por este índice, argumenta o autor, as sociedades – e junto com elas, a esquerda tradicional – fecham os olhos ao que está por trás dele. Passam a perseguir um “desenvolvimento” que significa, não raro, envenenamento da natureza, ampliação das desigualdades, aumento das jornadas de trabalho, consumo banal. Latouche esclarece que não propõe, como alternativa, a redução do PIB – mas uma “descolonização do imaginário”, que substitua valores como egoísmo, consumo ilimitado, obsessão pelo trabalho e eficiência produtivista por altruísmo, ampliação da vida social, direito ao lazer e apreciação das belas obras.

As sinergias perversas que a desigualdade social estabelece com a devastação da natureza – e a necessidade de rompê-las – são o tema do artigo de Ladislau Dowbor. Em “Inovação social e sustentabilidade”, ele examina e compara, com argúcia, quatro recentes relatórios internacionais sobre a situação das sociedades e do planeta. Um deles, produzido pela Universidade das Nações Unidas, constata, por exemplo, que 1% das famílias do planeta já acumula 40% da riqueza global, enquanto que a metade dos habitantes da Terra é obrigada a dividir 1%. A partir de dados como este, Ladislau provoca: “o modelo de consumo do planeta é o dos ricos. Por que razão não teriam todos os chineses e indianos direito a ter também, cada um, seu automóvel?” Esta lógica, diz ele, conduz a que “achemos normal mobilizar um carro de duas toneladas para levar nosso corpo de 70 quilos para postar no correio uma carta de 20 gramas...” Ladislau vê, como única alternativa, “pensar de maneira inovadora sobre os processos decisóros que regem o planeta e nosso quotidiano”. E conclui: “os desfios principais do planeta não consistem em inventar um chip mais veloz ou uma arma mais eficiente, mas em nos dotarmos de formas de organização social que permitam ao cidadão ter impacto sobre o que realmente importa”.

Devaneios? Susan George mostra que não. Em “Outra globalização é possível”, ela demonstra, por meio de um exemplo histórico quase esquecido, que não estamos condenados à ditadura dos mercados. Em 1942, ainda durante a II Guerra Mundial, o economista britânico John Maynard Keynes formulou, em detalhes, um projeto para reorganizar o comércio e as finanças internacionais, em bases muito distintas às que hoje prevalecem. Seu plano garantia, entre outros pontos, padrões mundiais de respeito aos direitos trabalhistas (penalizando com barreiras alfandegárias os produtos dos países que resistissem às normas); direito das sociedades a proteger suas indústrias nascentes; sustentação dos preços dos produtos primários; criação de mecanismos financeiros capazes de evitar a desigualdade no comércio entre as nações. Keynes acreditava nas virtudes do capital, mas o capitalismo real terminou por ignorar suas idéias. Há 65 anos, ele vislumbrou alguns dos riscos a que estavam submetidas as sociedades que entregam seu destino aos mercados. Diante do espectro da catástrofe climática, saberemos inventar lógicas sociais que superem a pequenez do cálculo econômico e estabeleçam o direito humano à construção consciente do futuro coletivo?

Os editores

Alternativas ao aquecimento global
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Agora, também nas bancas

Mais um reforço chegando: Le Monde - Brasil

Pronta edição em papel do Le Monde Diplomatique Brasil. Jornal publicará livros e terá, na internet, caderno especial para debater temas brasileiros. Por trás das novidades, uma articulação editorial inédita entre entidades da sociedade civil


Tudo o que é novo deveria estimular o jornalismo, mas há uma satisfação especial em difundir certas notícias. Quase oito anos após surgir no Brasil, e quinze meses depois de seu relançamento, Le Monde Diplomatique prepara, para as próximas semanas, três iniciativas que multiplicarão o seu alcance. Em 6 de agosto, chega às bancas uma edição em papel, com tiragem de 40 mil exemplares. Pouco depois, sairá o primeiro número de uma série de livros temáticos de bolso. Em setembro, começa a ser construído, na internet, o Caderno Brasil, um conjunto de canais participativos para debater em profundidade o país, a globalização e as alternativas. As novidades vêm num momento em que a mídia convencional vive uma crise de credibilidade junto a parte importante de seu público. E são possíveis porque duas organizações da sociedade civil (o Instituto Paulo Freire e o Instituto Pólis) construíram uma articulação inédita, visando atuar no terreno das comunicações – de forma autônoma, mas em colaboração.

Ao Instituto Pólis caberá produzir a edição impressa. “É preciso preencher um espaço que está vazio na imprensa brasileira, oferecendo um olhar crítico e analítico sobre o mundo e o Brasil”, acredita Sílvio Caccia Bava, coordenador-geral do Pólis e agora também diretor da edição impressa do Le Monde Diplomatique. O número de agosto procura responder a este desafio. Na matéria de capa – uma entrevista –, o lingüista norte-americano Noam Chomsky descreve os mecanismos por meio dos quais a mídia procura construir consensos que reproduzem as lógicas do capitalismo. Chomsky nota, sempre apoiado em uma profusão de dados sociológicos e históricos, que muitas vezes esta construção se faz contra o senso comum. Pesquisas revelam, por exemplo, que 75% dos norte-americanos seriam favoráveis a um acordo com o Irã, que substituísse as crescentes ameaças de Washington àquele país – e uma maioria consistente defende a redução do orçamento militar. Contudo, assim como ocorreu nos preparativos para a guerra contra o Iraque, os jornais reproduzem freqüentemente, e quase sempre de modo acrítico, as provocações por meio das quais a Casa Branca procura apontar Teerã como uma ameaça à segurança dos EUA.

Dezessete outros textos compõem o número de lançamento. Além da matéria de capa, foram taduzidos do original francês autores como Armand Mattelart, Bernard Cassen, Pierre Lévy e o romancista inglês John Berger. Entre os temas debatidos estão o papel dos intelectuais na era da internet, os esforços da indústria farmacêutica para criar medicamentos que podem se tornar armas de guerra, a redescoberta das literaturas indianas (um texto já publicado na edição eletrônica). A edição é enriquecida com artigos de colaboradores brasileiros, como José Tadeu Arantes (que é o editor da versão impressa e entrevista Antanas Mokus, “o homem que reinventou Bogotá”); Roberto Kishinami (que traz subsídios para o debate sobre o etanol); Márcio Santili (num texto que debate alternativas para a Amazônia); Ferréz (uma crônica mordaz sobre a emergência da cultura das periferias, suas possibilidades e contradições) e o próprio Sílvio Caccia Bava (que especula sobre a crise do neoliberalismo na América Latina). Impressa em papel acetinado e de alta gramatura, a edição tem 40 páginas e é vendida a R$ 8,90.

Uma série de livros temáticos e um site cada vez mais visitado

Em 13 de agosto, uma semana após o lançamento da edição mensal impressa, chega às livrarias Alternativas ao Aquecimento Global, primeiro livro temático publicado pelo projeto Le Monde Diplomatique Brasil. Ao longo de sete artigos (em 128 páginas), a obra constrói um ponto de vista original, em relação a um dos temas contemporâneos mais cruciais. Os textos recusam-se a aceitar a postura fatalista (e, portanto, paralisante...) que passou a predominar na mídia, depois que se tornou impossível negar a elevação das temperaturas terrestres. Argumenta-se, ao contrário, que o futuro está em aberto. Há alternativas: é perfeitamente possível evitar a catástrofe climática – desde que a humanidade esteja disposta a superar as lógicas sociais destrutivas que caracterizam o capitalismo. O livro estará à venda também pela internet. Impresso em papel reciclável, custará R$ 15. Já é possível ler uma breve resenha, que apresenta o sentido da obra e de cada um de seus textos.

Uma nova edição temática será lançada a cada três meses. Além de publicarem artigos inéditos de autores brasileiros (no primeiro número, Ladislau Dowbor e Antonio Martins), elas apóiam-se na biblioteca de quase 2 mil textos (e mais de quinhentos temas) que Le Monde Diplomatique Brasil vem constituindo, na internet, desde seu lançamento, em 1999. A circulação destes textos é regida pelos princípios expressos no conceito de conhecimento compartilhado. Disponíveis em www.diplo.org.br/temas), eles podem ser lidos e reproduzidos livremente, desde que citada a fonte. A edição impressa oferece o conforto do papel e a praticidade do formato de bolso.

Tanto os livros temáticos quanto a edição eletrônica estão sob responsabilidade do Instituto Paulo Freire (IPF). “Vivemos na época das redes. A profundidade e o espírito crítico de Le Monde Diplomatique precisam estar ligados, no Brasil, às ações pela transformação social. E a intenet permite esta associação”, afirma Moacir Gadotti, diretor geral do IPF. Sua fala antecipa o sentido das mudanças por que passará o site do jornal.

Relançado em maio do ano passado, ele vem alcançando, desde então, índices expressivos de audiência – em julho, foram 11 mil textos lidos em média, a cada dia, por um total de 74,9 mil visitantes. A partir de setembro, o site abrigará também o Caderno Brasil – um espaço onde a análise qualificada das questões mais decisivas da atualidade, marca registrada do Le Monde Diplomatique, estará articulada com as principais características da comunicação compartilhada: interatividade, livre circulação de conhecimentos, geração de inteligência coletiva.

No Caderno Brasil, altermundismo e comunicação compartilhada

Caderno Brasil terá dois objetivos editoriais permanentes. Ao examinar a realidade brasileira e internacional além das aparências, procurará identificar em especial as possibilidades de mudança social, de interromper as lógicas da dominação, de construir relações de igualdade e reciprocidade. Ao mesmo tempo, buscará tornar visíveis as ações transformadoras já em curso – inclusive as desprezadas pela mídia de mercado, que reconhece como política apenas o que se dá nos espaços institucionais e estatais.

Estes objetivos serão alcançados em duas fases. Na primeira, que começa em setembro, Caderno Brasil abrirá espaço para um conjunto de colaboradores que expressam, por suas ações ou reflexão, a possibilidade de um mundo e um país novos. Alguns dos convidados são conhecidos pelo papel destacado que desempenham na construção do pensamento crítico: entre outros, o economista Ladislau Dowbor, o filósofo Paulo Arantes, o sociólogo José Luiz Fiori, a arquiteta Ermínia Maricato, a jornalista Elisabeth Carvalho. Caderno Brasil não pretende se limitar, contudo, aos nomes que já freqüentam o debate político. Uma das características mais marcantes de nossos dias é a emergência novos temas e novas vozes. Por isso, também estão sendo convidados personagens como Dalton Martins, do MetaReciclagem e Escola do Futuro; Fátima Mello, das campanhas contra a ALCA e por novas relações de comércio; Marcelo Branco, das comunidades de software livre; Ronaldo Lemos, do Creative Commons. O escritor Rodrigo Gurgel organizará uma seção de literatura. O site também difundirá o trabalho de artistas plásticos, numa iniciativa coordenada por Chico Linares, Guilherme Werner (do ateliê Espaço Coringa) e Yili Rojas. Além de indicar possíveis colaboradores, os leitores poderão intervir num Blog da Redação.

Numa segunda etapa, a interatividade será ainda mais densa. O jornal abrirá canais para participação direta dos leitores. Uma revista acadêmica multidisciplinar, coordenada por Ladislau Dowbor, abrigará a produção de boa qualidade das universidades brasileiras, muitas vezes desconhecida por falta de meios de difusão. Os avanços, impasses e perspectivas dos movimentos pela transformação social terão uma seção própria, onde os próprios ativistas poderão relatar experiências e refletir sobre ela. A Agenda Social Brasileira permitirá compor, como num mosaico contruído interativamente, um quadro das iniciativas desenvolvidas pela sociedade civil. A Biblioteca que o site já dispõe será ampliada, para agregar, em cada tema, publicações virtuais e impressas que produzem material de qualidade a respeito.

Para trocar opiniões sobre o Caderno Brasil e ajudar a construí-lo, está sendo aberto, a partir de hoje, um endereço eletrônico específico: cadernobrasil@diplo.org.br. Será uma satisfação receber e debater, desde já, as sugestões, críticas e acréscimos dos leitores ao projeto.

Olhos nos Olhos - Chico Buarque