JulianoDomingues,
A situação dos médicos brasileiros formados em Cuba e que hoje residem no Brasil teve um relativo avanço. Foi aprovado nesta quarta-feira (12), na Comissão de Relação Exteriores da Câmara dos Deputados, com apenas três votos contra, o acordo que torna automática a validação de diplomas de brasileiros formados na faculdade de Medicina de Cuba, Escola Latino-Americana (Elam) de Ciências Médicas.
O avanço é relativo, pois o acordo ainda deve passar por mais três comissões antes de seguir para o Senado. No entanto, o resultado foi comemorado pelos médicos brasileiros formados em Cuba e que hoje esperam poder exercer efetivamente a profissão.
“É um pequeno passo porque ainda existem outras etapas, mas não deixa de ser um avanço. De certa forma, foi até uma surpresa para nós ao ver que o acordo foi aprovado com apenas três votos contra”, afirma Lúcio Flávio, médico formado em Cuba há dois anos, mas que ainda espera para poder exercer a profissão no Brasil.
Contexto
Os médicos brasileiros que vêm sendo formados pela Elam desde 2005, não podem atuar no Brasil devido ao não-reconhecimento da validade de seus diplomas pelas faculdades de medicina brasileiras e pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), os quais alegam incompatibilidade da grade curricular.
Segundo o médico e integrante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), Josiano Macedo, a compatibilidade dos diplomas dos dois países chega a 95%, dependendo da faculdade. Para o médico, o que existe é um corporativo por parte do CFM, do Conselho Nacional de Medicina e da Associação Médica Brasileira em alegar que já existem médicos demais no Brasil e que os formados em Cuba iriam ocupar o lugar dos médicos brasileiros no mercado de trabalho.
No entanto, dados do Ministério da Saúde mostram que existem mais de mil municípios brasileiros nos quais não existe nenhum médico. Segundo a declaração do ministro da Saúde, José Gomes Temporão, os médicos formados em Cuba deverão atuar no Sistema Único de Saúde (SUS) brasileiro e integrar o Programa de Saúde da Família (PSF), trabalhando não só a cura, como principalmente a prevenção.
“Nós esperamos que os nossos estudantes ao chegarem aqui, sejam capazes de assumir o que se comprometeram que é trabalhar a medicina social, que não vai abandonar o camponês ou o cidadão que mora no interior do país”, afirma a integrante da Associação dos Pais e Apoiadores dos Estudantes Brasileiros em Cuba (Apac), Maria Correia.
Prevenção, cura e mercatilização
De acordo com o presidente do Conselho Nacional de Saúde, Francisco Batista Júnior, o Brasil possui uma visão histórica “muito mais fincado no tratamento da doença do que propriamente de prevenção da doença”.
“Nós não vemos ninguém no Brasil reclamar da falta de nutricionista na rede básica fazendo a prevenção de hipertensão e diabetes. Esse raciocínio vale para todas as demais categorias e ações profissionais”, relata.
Segundo Francisco, a falta de prevenção aliada à demanda cada vez maior por tratamentos de alta complexidade e por medicamentos caros, fazem com que boa parte dos processos de cura que deveriam ser realizados pelo SUS, passem para as mãos de setores privados, processo que gera uma dependência cada vez para com o mesmo.
Josiano afirma que formação ministrada em Cuba, diferente da brasileira, é mais fincada na prevenção e não possui um perfil mercadológico que hoje marca a formação dos médicos das faculdades brasileiras, fato que também é confirmado pelo presidente da CSN.
“Nós tivemos, na década de 1990, uma profunda mercantilização do ensino universitário na área de saúde. O que se abriu nesse período, principalmente de faculdade privadas, foi de uma irresponsabilidade flagrante, porque os cursos eram abertos sem nenhuma responsabilidade ou necessidade social, mas única e exclusivamente para auferir lucros e fazer disputa de mercado. Tanto é que nós temos a dificuldade de formação de profissionais de saúde em lugares onde a relação de mercado não interessa e a formação de lucros é mais difícil”, afirma Francisco.
Fonte:BrasilDeFato