sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Por que é preciso destruir a burguesia e sua imprensa





Marcelo Salles  - A Nova Democracia 
"Porque em nenhum lugar o espírito específico dos Estados manifesta-se mais claramente que nos debates sobre a imprensa"
Karl Marx, em Liberdade de Imprensa

Em virtude dos avanços das tecnologias da informação, os meios de comunicação de massa passaram a atingir praticamente todo o universo de cidadãos que convivem em sociedade. Seus suportes são muitos: outdoors, emissoras de rádio, emissoras de televisão, jornais, revistas, internet, telefones celulares, entre outros. Por outro lado, cada vez menos atores detêm o poder de produzir e divulgar palavras e imagens, conforme registra Dênis de Moraes em seu livro A batalha da mídia: "Hoje em dia, 20 conglomerados transnacionais de mídia controlam cerca de 3/4 de toda produção simbólica no planeta, o que traz problemas gravíssimos para a diversidade informativa e para a pluralidade cultural".

No Brasil também existe uma concentração significativa entre os meios de comunicação de massa. No veículo televisão, por exemplo, o mercado pertence a um grupo de apenas seis corporações, apontando para a formação do monopólio, informa Dênis de Moraes:

"Seis empresas de mídia controlam o mercado de TV no Brasil, um mercado que gira mais de US$ 3 bilhões por ano. A Rede Globo detém aproximadamente metade deste mercado, num total de US$ 1,59 bilhão. Estas seis principais empresas de mídia controlam, em conjunto com seus 138 grupos afiliados, um total de 668 veículos midiáticos (TVs, rádios e jornais) e 92% da audiência televisiva; a Globo, sozinha, detém 54% da audiência da TV".

A televisão tem uma importância central por suas características próprias, capazes de entreter pelas vias de áudio e vídeo — o que até sua invenção era uma conjugação inédita na história da comunicação mundial entre os veículos domésticos. Por outro lado, no Brasil a importância desta mídia assume contornos ainda maiores devido ao baixo índice de alfabetização do povo — segundo o Instituto Paulo Montenegro, em pesquisa divulgada pelo escritor Venício Lima, no livro Mídia: crise política e poder no Brasil, apenas 26% dos brasileiros entendem o que lêem.

Entendemos, ainda, que os meios de comunicação funcionam como uma instituição com imensa capacidade de produzir e reproduzir subjetividades, que se desdobram em atitudes e posicionamentos bastante objetivos, como demonstra Cecília Coimbra em seu livro Operação Rio: o mito das classes perigosas:

"A mídia é atualmente um dos mais importantes equipamentos sociais no sentido de produzir esquemas dominantes de significação e interpretação de mundo (...). Esse equipamento (...) nos orienta sobre o que pensar, sobre o que sentir".

Estrutura fortemente concentrada, poder de agendamento e capacidade de influir sobre as decisões de cidadãos, instituições, chefes de Estado e da própria sociedade são características que credenciam as corporações de mídia como atores extremamente relevantes nos dias de hoje.

Em A ideologia Alemã, Karl Marx resume em grande parte a centralidade da imprensa para que a burguesia mantenha o controle sobre a sociedade:

"Os pensamentos da classe dominante são também, em todas as épocas, os pensamentos dominantes, ou seja, a classe que tem o poder material dominante numa sociedade é também a potência dominante espiritual. A classe que dispõe dos meios de produção material dispõe igualmente dos meios de produção intelectual; de tal modo que o pensamento daqueles a quem é recusado os meios de produção intelectual está submetido igualmente à classe dominante."

O controle ferrenho dos aparelhos ideológicos pela burguesia tem uma série de consequências, entre elas a de não permitir que as massas enxerguem e sintam de maneira clara as condições brutais de exploração a que são submetidas pelo sistema capitalista, sobretudo em sua fase superior, o imperialismo.

Esta violência assume proporções ainda maiores quando observamos o papel dos meios de comunicação no tocante à eterna criminalização das classes populares, de suas lutas por se libertar da exploração, de seus hábitos e costumes, de suas formas de trabalho, de sua luta por sobrevivência.

Um bom exemplo disso foram as reportagens que se seguiram à operação policial no Complexo do Alemão, que deixou mais de 40 mortos em 2007 — uma comissão federal provou, posteriormente, que pelo menos duas pessoas foram executadas a sangue frio. A revista Veja considerou a matança "a guerra necessária para a reconstrução do Rio", O Globo dedicou 95% do espaço editorial nos dois dias seguintes para apoiar a ação da polícia e a revista Época exibiu em sua capa a fotografia de um policial caminhando sobre corpos sem vida, com o título: "Um ataque inovador". Emissoras de rádio e televisão seguiram o mesmo caminho. O massacre (des) informativo atinge a sociedade como um todo, e pauta toda a sociedade com a linha política das classes dominantes, inclusive os operadores do Direito que irão interferir diretamente no fato ocorrido: delegados, promotores e juízes.

Apenas para ilustrar a agressão da imprensa burguesa contra os trabalhadores, relembramos um caso ocorrido em 16 de abril de 2003. A operária Maria Dalva da Costa Correia da Silva, de 54 anos, perdeu um filho assassinado por policiais. No dia seguinte, Thiago da Costa Correia e Silva foi chamado de bandido pelo jornal Extra, das Organizações Globo. Título: "Tiroteio mata 4 em morro da Tijuca"; subtítulo: "Policiais são surpreendidos e trocam tiros com bandidos do Borel". O texto da matéria relacionava o estudante como traficante, a forma encontrada para legitimar o seu assassinato. "Sei que não houve troca de tiro. Foi execução e todos levaram tiro nas costas e na cabeça", enfatiza Maria Dalva. Thiago tinha 19 anos, cursava a oitava série do primeiro grau e trabalhava, com carteira assinada, fazendo manutenção de bombas de gasolina.

A estratégia de criminalização da classe trabalhadora é um dos pilares centrais do fascismo, cuja implementação tem sido acelerada, principalmente nas semicolônias. O Estado mantém as massas populares permanentemente aterrorizadas e sufocadas em suas reivindicações, visando diminuir sua  capacidade de mobilização e luta.

Enquanto isso, ofuscada pela cortina de fumaça de escândalos da política mundana com cobertura nacional, procede-se a uma escandalosa usurpação das riquezas nacionais. Sob os auspícios da imprensa monopolista, a atual crise do sistema capitalista drenou o quanto pôde. Só no setor automobilístico, conforme relatório do Banco Central de 2008, as montadoras enviaram nada menos que US$ 4,8 bilhões às matrizes no exterior. Somando os outros setores da economia, a sangria alcança absurdos US$ 20,143 bilhões/ano. O Globo deu matéria sobre isso sem nenhum destaque nas páginas internas. Não dá pra aceitar calado o envio de tantos bilhões pra fora enquanto existe gente passando fome aqui dentro.

Outro ponto central da estratégia das classes dominantes em que a imprensa é utilizada em larga escala são as guerras de rapina, assim como os momentos de ruptura institucional. No primeiro caso temos o exemplo do apoio irrestrito das corporações de mídia ao governo ianque para a invasão e genocídio no Iraque e Afeganistão. No segundo caso temos o exemplo candente do recente golpe ocorrido em Honduras, cujo movimento inicial contou com o suporte efetivo do monopólio internacional dos meios de comunicação.

A Obscenidade do Império obtém o Diploma da Paz


Por Raul Fitipaldi

A Velha Prostituta, e sua filha Suécia, continuam exercendo um fascínio extraordinário sobre os escravos da Colônia com seus reis assassinos de ursos, suas feias rainhas, seus príncipes alcoólatras e suas princesas promíscuas. Mas não só. Também com sua idolatria ao filho bastardo, os Estados Unidos. Li e reli alguns comentários dos líderes da América Latina sobre a entrega do galardão à ignomínia conhecido pelo nome de “Prêmio Nobel da Paz”. Prêmio de marketing político que já foi dirigido a dar álibi a figuras tão rastejantes como Shimon Peres, serviçais como Mohamed ElBaradei, pró-ocidentais como Shirin Ebadi; cínicas como Jimmy Carter (outro membro do partido democrata ianque); corrompidas como Kofi Annan; dentre outras delícias da impostura. O “Alfredinho” me faz acreditar que o nosso nível de idiotização perante o espetáculo mediático continua quase intato. Apenas a Senadora colombiana Piedad Córdoba tomou distância suficiente do tom de obamania que ainda assola o continente, quando disse “que espera que, depois de ter recebido o Prêmio Nobel da Paz, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, rechace definitivamente o acordo para a instalação de sete bases militares do seu país em território colombiano e se perguntou quando é que se fechará a prisão que Washington mantém ilegalmente em Guantánamo, Cuba.”
Só neste mundo dominado por minorias medievais, sátrapas e obscenas, o Presidente de uma nação manchada de sangue, que aplica golpes associada às oligarquias mais apátridas e grosseiras, que passa pela pior crise da sua história, que desfila sua decadência impudica, que pratica o genocídio a diário com naturalidade demoníaca fora do seu território, e o crime de estado em casa, pode receber um prêmio à paz. Não seria melhor um Prêmio Kissinger à Morte?
O Nobel da Paz é um Prêmio Obsceno para um País Obsceno. Prêmio para distrair o foco dos fracassos acumulados em nove meses pela jovem administração obamaniaca no Afeganistão, no Iraque. A implicância dos EUA no golpe em Honduras, na preparação de um golpe na Guatemala, a tentativa de desestabilização dos governos da Venezuela com paramilitares no Zulia, as campanhas maciças contra Evo Morales e seu povo, as tentativas de quebrar e confundir a mobilização popular no Equador, o apoio constante aos oligarcas do campo argentino, e sobretudo, a instalação das Sete Bases Militares Gringas na Colômbia, aqui, na Pátria Grande. O país da cadeira-elétrica, da exploração sistêmica de hispanos, da falta de saúde, da obesidade, do maior consumo de drogas, dos criminosos em série, é dirigido pelo Prêmio Nobel da Paz.
Pareceria que o fato do Mr. Obama ser um cidadão negro, charmoso, jovem, lhe confere ao Império a possibilidade de fazer-se um lifting momentâneo badalado pelas redes de multiplicação do sistema, as modeladoras da opinião do mundo. Essa máscara da paz está grudada na pele com sangue iraquiano, sudanês, afegão, hondurenho, mexicano, haitiano, e, se nossos líderes não se arrancam, por muito que doer, esse “MÁSCARA” do Prêmio Nobel da Paz, só brotarão mais rios de sangue na região. Não há nenhum texto de política de estado que indique que há de se aplaudir o chefe de um bando de criminosos (o insinua Maquiavel, é verdade...), seja qual for a gangue, mesmo que sejam os ainda sócios majoritários e consumistas dos Estados Unidos de Sua América, não da Nossa.

Brasil é líder no combate à fome entre emergentes, diz ONG

O Brasil é líder no combate à fome entre os países em desenvolvimento, de acordo com um ranking elaborado pela ONG antipobreza Action Aid e publicado nesta sexta-feira para marcar o Dia Mundial da Alimentação. Segundo o documento, o país demonstra "o que pode ser atingido quando o Estado tem recursos e boa vontade para combater a fome".

A lista foi elaborada a partir de pesquisas sobre as políticas sociais contra a fome em governos de 50 países. A partir da análise, a ONG preparou dois rankings - um com os países em desenvolvimento, onde o Brasil aparece em 1º lugar, e o outro com os países desenvolvidos, liderado por Luxemburgo.

Em último lugar na lista dos desenvolvidos está a Nova Zelândia, abaixo dos Estados Unidos. Entre os países em desenvolvimento, a República Democrática do Congo e Burundi aparecem nas últimas colocações.

Segundo a diretora de políticas da Action Aid, Anne Jellema, "é o papel do Estado e não o nível de riqueza que determina o progresso em relação à fome".

Brasil O documento elogia os esforços do governo brasileiro em adotar programas sociais para lidar com o problema da fome no país e destaca os programas Bolsa Família e Fome Zero.

"O Fome Zero lançou um pacote impressionante de políticas para lidar com a fome - incluindo transferências de dinheiro, bancos de alimentação e cozinhas comunitárias. O projeto atingiu mais de 44 milhões de brasileiros famintos", diz o texto.

Segundo o relatório, o programa ainda ajudou a reduzir a subnutrição infantil em 73%.

A ONG afirma ainda que o Brasil é "exemplar" no exercício do direito ao alimento e cita a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan 2006) e o Ministério do Combate à Fome como medidas de que exemplificam que o direito à alimentação está sendo cada vez mais reconhecido como direito fundamental.

Apesar do aspecto positivo, a ONG afirma que o Brasil "ainda tem áreas em que pode melhorar" e cita o desafio de incluir os trabalhadores sem terra e pequenos agricultores nos programas sociais de alimentação.

"É imperativo que famílias em pequenas fazendas também estejam protegidas da expansão dos enormes programas industriais de biocombustíveis do Brasil", afirma o relatório.

Índia Em segundo lugar no ranking dos países em desenvolvimento aparece a China, seguida por Gana (3º) e Vietnã (4º).

A Action Aid destaca a redução no número de famintos na China - 58 milhões em dez anos - e elogia os esforços do governo em apoiar os pequenos agricultores.

Em contrapartida, o documento critica a Índia onde, segundo o relatório, 30 milhões de pessoas teriam entrado para a taxa dos famintos desde a metade dos anos 90.

Além disso, a ONG destaca que 46% das crianças estão abaixo do peso e subnutridas no país.

"A fome existe não porque não há alimento suficiente na Índia, mas porque as pessoas não conseguem chegar até ele. O governo indiano enfrenta um enorme desafio para proteger os direitos dos pobres", diz o texto.

Ricos Não só os esforços e as políticas dos governos de países em desenvolvimento e mais pobres são criticados no documento divulgado nesta sexta-feira.

No ranking dos países desenvolvidos, atrás de Luxemburgo está a Finlândia (2º) e a Irlanda (3º), com a Nova Zelândia(22º) e os Estados Unidos (21º) nas últimas colocações.

A ONG acusa o governo neozelandês de ordenar cortes acentuados no incentivo oficial à agricultura e classifica o incentivo do governo americano à agricultura como "mesquinho".

"A contribuição (desses países) para expandir programas de segurança social permanece insignificante", diz o documento, agregando Grécia, Portugal e Itália. 
 

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Parabéns a todo(a)s que permanecem na luta....



Você sabe como surgiu o Dia do Professor?


O Dia do Professor é comemorado no dia 15 de outubro. Mas poucos sabem como e quando surgiu este costume no Brasil.
No dia 15 de outubro de 1827 (dia consagrado à educadora Santa Tereza D’Ávila), D. Pedro I baixou um Decreto Imperial que criou o Ensino Elementar no Brasil. Pelo decreto, “todas as cidades, vilas e lugarejos tivessem suas escolas de primeiras letras”. Esse decreto falava de bastante coisa: descentralização do ensino, o salário dos professores, as matérias básicas que todos os alunos deveriam aprender e até como os professores deveriam ser contratados. A idéia, inovadora e revolucionária, teria sido ótima - caso tivesse sido cumprida.
Mas foi somente em 1947, 120 anos após o referido decreto, que ocorreu a primeira comemoração de um dia dedicado ao Professor.
Começou em São Paulo, em uma pequena escola no número 1520 da Rua Augusta, onde existia o Ginásio Caetano de Campos, conhecido como “Caetaninho”. O longo período letivo do segundo semestre ia de 01 de junho a 15 de dezembro, com apenas 10 dias de férias em todo este período. Quatro professores tiveram a idéia de organizar um dia de parada para se evitar a estafa – e também de congraçamento e análise de rumos para o restante do ano.

O professor Salomão Becker sugeriu que o encontro se desse no dia de 15 de outubro, data em que, na sua cidade natal, professores e alunos traziam doces de casa para uma pequena confraternização. Com os professores Alfredo Gomes, Antônio Pereira e Claudino Busko, a idéia estava lançada, para depois crescer e implantar-se por todo o Brasil.
A celebração, que se mostrou um sucesso, espalhou-se pela cidade e pelo país nos anos seguintes, até ser oficializada nacionalmente como feriado escolar pelo Decreto Federal 52.682, de 14 de outubro de 1963. O Decreto definia a essência e razão do feriado: "Para comemorar condignamente o Dia do Professor, os estabelecimentos de ensino farão promover solenidades, em que se enalteça a função do mestre na sociedade moderna, fazendo participar os alunos e as famílias".

Fontes:
Site www.diadoprofessor.com.br
Site www.unigente.com


Lia Sabugosa – Por Um Beijo Teu (2005)


quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Tá no portal Vermelho.org


Morte do dólar: rumores demasiado exagerados

Um sistema monetário mundial que depende da moeda de um único país é algo problemático, tanto para o emissor como para os usuários. É a temporada de pânico com o dólar. Os comerciantes de pânico são variados: adeptos de investimentos em ouro, defensores da linha dura fiscal e muitos outros concordam que o dólar, moeda dominante desde a Primeira Guerra Mundial, está em seu leito de morte.


Por Martin WolfValor, do Financial Times, no Valor Econômico

Um colapso hiperinflacionário estaria em gestação. Será que isso faz sentido? Não. Ainda assim, o sistema monetário mundial baseado no dólar é falho. Seria bom começar a desenvolver alternativas. Deveríamos começar pelo que não confere com o que vem ocorrendo. O valor do dólar subiu. Quando a confiança voltou, o quadro reverteu-se. O dólar valorizou-se 20% entre julho de 2008 e março. Desde então, perdeu grande parte dos ganhos. Portanto, o declínio do dólar é sintoma de seu sucesso e não de seu fracasso.

Será que é possível encontrar sinais mais profundos de que o mundo esteja abandonando a moeda dos EUA? Um indicador bastante apreciado é o preço do ouro, que quadruplicou desde o início da década. Seu preço, contudo, é um indicador dúbio do risco inflacionário: seu pico anterior foi em janeiro de 1980, pouco antes de a inflação ter sido exterminada.

O aumento nos preços do ouro reflete medo e não fatos. Esse medo não é compartilhado de forma generalizada. O governo dos EUA consegue captar recursos a 4,2% anuais ao longo de 30 anos e a 3,4%, com vencimento em dez anos. Durante a crise, as expectativas inflacionárias indicadas pela diferença entre o rendimento dos papéis convencionais e os dos protegidos contra a inflação desmoronaram.

Desde então, recuperaram terreno - outro sinal de êxito da política econômica. Porém, ainda estão abaixo do patamar em que estavam antes da crise. O perigo imediato - tendo em vista o excesso de capacidade - nos EUA e no mundo é a deflação e não a inflação.
A correção do dólar não é apenas natural; é útil. Reduzirá o risco de deflação nos EUA e facilitará a correção dos "desequilíbrios" mundiais que ajudaram a causar a crise.

Concordo com um artigo, ainda por sair, de Fred Bergsten, do Peterson Institute of International Economics, a respeito de que os "fluxos imensos de capital para os EUA facilitaram o excesso de alavancagem e subestimação do risco" (O dólar e os déficits, "Foreign Affairs", novembro/dezembro 2009). Mesmo os céticos concordam que os EUA precisam de uma expansão puxada pelas exportações.

Por fim, o que poderia substituir o dólar? A menos (e até) que a China remova os controles cambiais e desenvolva mercados financeiros líquidos e profundos - o que possivelmente levaria uma geração- o euro é o único concorrente sério do dólar. Atualmente, 65% das reservas mundiais são compostas por dólares e 25%, por euros. Sim, poderia haver alguma mudança. Provavelmente, contudo, seria vagarosa. A região do euro também possui altos déficits fiscais e endividamento. O dólar existirá daqui a 30 anos; o destino do euro não é tão certo.

Essa visão pode ser muito complacente. O perigo de colapso do dólar é pequeno e sua substituição por outra moeda é ainda menor. Porém, um sistema monetário mundial que depende da moeda de um único país é algo problemático, tanto para o emissor como para os usuários. Os riscos também estão aumentando, particularmente, desde a emergência do "Bretton Woods 2" - a prática de administrar as taxas de câmbio em relação ao dólar.

Nos anos 60, Robert Triffin, um economista belgo-americano, argumentou que um sistema monetário global baseado no dólar tinha uma falha: a elevada liquidez que o mundo buscava exigiria déficits em conta corrente nos EUA. Cedo ou tarde, no entanto, o excesso de passivos monetários minaria a confiança na moeda-chave. A visão - conhecida como "dilema de Triffin" - mostrou-se visionária: o sistema de Bretton Woods caiu em 1971.

Estritamente falando, as reservas poderiam ser criadas se o país da moeda-chave simplesmente captasse no curto prazo e emprestasse no longo. Na prática, contudo, a demanda por reservas gerou déficits em conta corrente no país emissor. Em um regime de taxa de câmbio livre, o acúmulo de reservas também deveria ser desnecessário.

Depois das crises financeiras dos anos 90, entretanto, os países emergentes decidiram que precisavam buscar uma expansão puxada pelas exportações e segurar-se contra crises. Como resultado direto, apenas nesta década, foram acumuladas 75% das reservas cambiais mundiais.

Essa própria busca por estabilidade, entretanto, ameaça criar uma instabilidade de longo prazo. De fato, as autoridades monetárias chinesas estão preocupadas com o risco sobre o valor de suas imensas reservas em dólar, que, pela lógica de Triffin, é exacerbado por sua própria política. As autoridades monetárias dos EUA podem repetir o mantra do "dólar forte".

Porém, é uma aspiração sem instrumento para sustentá-la. As medidas políticas relevantes são tomadas pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), que não tem a instrução de preservar o valor externo do dólar. A única forma por meio da qual as autoridades monetárias chinesas poderiam preservar o valor doméstico de suas reservas externas seria apoiar o dólar, sem limites, o que comprometeria a estabilidade monetária doméstica da China e, no fim das contas, acabaria se mostrando autodestrutivo.

Nesse ponto, as preocupações generalizadas sobre a estabilidade monetária dos EUA e o papel externo do dólar convergem. Uma recomendação padrão em prol dessa estabilidade seria preservar a independência do Federal Reserve e também assegurar solvência fiscal no longo prazo. Caso aumente o receio de que qualquer um desses - ou pior, ambos - esteja em perigo, o resultado poderia ser uma crise autorrealizável.

O dólar poderia despencar e as taxas de longo prazo, decolar. Em tal crise, poderia muito bem temer-se que um Federal Reserve menos independente seria compelido a comprar dívidas públicas. Isso aceleraria a fuga para longe dos dólares. Portanto, as duas precondições para a estabilidade de longo prazo são um banco central com independência crível e a solvência federal. Ambas parecem estar dentro do controle dos EUA.

Isso, entretanto, é demasiado simples. A maioria dos analistas presume que a posição fiscal dos EUA pode ser determinada independente das decisões tomadas fora do país. Porém, se o setor privado dos EUA ficar desalavancado demais por um longo período (e, portanto, gastar substancialmente menos do que suas entradas), enquanto o resto do mundo quiser acumular ativos denominados em dólar como reservas, o governo dos EUA naturalmente surgiria como captador de recursos de última instância.

Uma das conclusões do dilema de Triffin é que o papel internacional do dólar poderia dificultar para os EUA administrarem seus assuntos fiscais de forma bem-sucedida, mesmo se o quisessem.

Chego, por um caminho um tanto diferente, à mesma conclusão de Bergsten: o papel mundial do dólar não está no interesse dos EUA. Os argumentos para passar a um sistema diferente são muito fortes. Não se trata disso porque o papel do dólar está ameaçado agora. Trata-se disso porque prejudica a estabilidade doméstica e mundial. O momento para alternativas é agora.

*Martin Wolf é editor e principal comentarista econômico do Financial Times

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Quanta discriminação....

POLÍCIA REPRIME PROCISSÃO DE SEM TERRA EM UBERLÂNDIA (MG)

 
 
A Polícia Militar de Minas Gerais, ontem dia 12 de outubro de 2009, cercou, com armas na mão, uma procissão em honra a Nossa Senhora Aparecida e submeteu os fiéis a uma “blitz”, na periferia da cidade de Uberlândia, no Triângulo Mineiro. Um grupo da comunidade católica do Assentamento de Reforma Agrária Dom Mauro, enquanto estava cumprindo promessa, de doação de uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, à Igreja, do bairro Morada Nova, não muito distante do assentamento, em uma procissão, foi surpreendido pelo cerco de políciais armados, com viaturas e helicóptero.

Os fiéis estavam a cavalo, outros a pé e alguns em automóveis e a imagem era conduzida em uma carroça enfeitada com um toldo azul e flores cor de rosa. A alegação da polícia era de que estavam realizando uma “blitz” e que os veículos irregulares seriam apreendidos, o que de fato fizeram.

Toda prática religiosa deve ser respeitada, não importando a condição social de quem a vivência. Até mesmo nos presídios a prática religiosa, e a profissão de fé é permitida e incentivada. As fé das camadas populares traz consigo a força do cristianismo, com sua solidariedade, disponibilidade e fraternidade. Sofrer intimidação, de policiais com armas em punho, na sua prática religiosa, pelo fato de serem sem terra ou coisa que o valha, nos remete à uma figura de discriminação, realidade abominável, como o caso dos Dalits, na Índia. A estigmatização de um grupo social, a busca de sua criminalização, motividadas pelo lugar que ocupam na estrataficação social ou mesmo pelas idéias ou causas que defendam, no sentido da busca da justiça, não é legitimo e fere os principios da democracia.

Foram várais as procissões em honra a Nossa Senhora Aparecida, pelo Brasil a fora, neste dia 12 de outubro de 2009, ontem mais de 2 milhões de pessoas estavam na procissão do Círio de Nazaré, em Belém do Pará. Em nenhuma dessas manifestações religiosas se ouviu falar em blitz, ou na necessidade de verificar se a documentação dos carros dos fiéis estavam em dia ou se presenciou um cerco policial armado.
Ficamos imaginando se as autoridades passassem a utilizar essa prática, nas procissões de motoristas com seus veículos, no dia de São Cristovão. Submeter, um grupo pagando promessa, em procissão de fé, no dia da Padroeira do Brasil, ao poder da autoridade, mesmo que seja no uso de suas atribuições legais, é ato que deve nos levar a refletir. Acreditamos que é possível compatibilizar o respeito às pessoas, à liberdade religiosa e a eficiência policial, no âmbito de uma política de segurança pública que respeite a dignidade humana. Temos que refletir sobre os modelos policiais de operação e procurar difundir a tese de que o respeito ao tipo de uso da força permite a adequação entre a prática limite da repressão e o respeito aos direitos civis e humanos. 

A discriminação, praticada pela Polícia Militar de Minas Gerais, favorece aqueles que não suportam ver expostas às raízes profundas das dívidas sociais, que ainda persistem no Brasil, que se incomodam com os movimentos dos sem-terra, que inquietam suas mentes que querem ver perpetuadas a visão de seres humanos de primeira e de segunda categoria. A nossa fé cristã repousa em Deus, que veio em uma família pobre, que ocupou um curral alheio, para que a mulher desse à luz a Jesus Cristo. Essa mulher, que hoje devotamente, os católicos celebram, como Aparecida negra, nas redes de pescadores, no rio Paraíba do Sul. A fé anima a resistência histórica e abre caminhos para festa de uma sociedade nova.

Uberlândia 12 de outubro de 2009 

AFES (Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade)
APR (Animação Pastoral e Social no Meio Rural)
Capelania dos Assentamentos Santa Paulina
Frei Rodrigo (34) 9167-2929
Jose Oliveira (34) 9994-3218

Zapatismo: exemplo de resistência...

Os zapatistas e as múltiplas formas de resistência
  Guga Dorea - Correio da Cidadania  

 
"Para começar, te rogo não confundir a resistência com a oposição política. A oposição não se opõe ao poder, senão a um governo, e sua forma lograda e completa é a de um partido de oposição; enquanto a resistência, por definição (agora sim), não pode ser um partido: não é feita para governar, senão para ... resistir".
 
Com esse texto, de Tomás Segovia, que é chamado de Alegatorio e foi escrito no México em 1996, o subcomandante Marcos praticamente encerra uma espécie de manifesto político desenvolvido por ele cujo título é "A Quarta Guerra Mundial já começou".
 
Nesse manifesto, Marcos divide a sua visão em relação ao neoliberalismo em sete peças. O texto do Segovia faz parte da última peça, cujo conteúdo se refere a possibilidades latentes de resistências ao regime capitalista. Chamada por ele de "As bolsas de resistência", a peça refere-se a um "choque" intermitente entre "a aparente infalibilidade da globalização" e a "teimosa desobediência da realidade". São bolsas "de todos os tamanhos, de diferentes cores, das formas mais variadas. Sua única semelhança é sua resistência à ‘nova ordem mundial’ e ao crime contra a humanidade produzido pela guerra neoliberal" .
 
Mas como pensar em resistências concretas quando o imaginário capitalista atravessou por todos os cantos da subjetividade humana, reprimiu as singularidades e impôs o UNO, arrastando pretensas identidades e tradições culturais? O capitalismo contemporâneo, dentro dessa perspectiva, tratou de contaminar o que Guattari chamou por "territorialidades humanas tradicionais".
 
Em contrapartida, reiterou sempre Guatarri, estamos presenciando um processo conhecido como heterogênese, ou seja, novas formas de conceber a vida estão sempre prontas a romperem o cerco reterritorializante do sistema. Retornando à peça 7 do quebra-cabeça zapatista, Marcos aponta não para uma resistência supostamente unificada, mas para múltiplas resistências que podem se interconectar entre si, sem que uma se sobreponha ou seja subjugada pela outra.
 
"Ao tratar de impor seu modelo econômico, político, social e cultural, o neoliberalismo pretende subjugar milhões de seres, e desfazer-se de todos aqueles que não têm lugar em sua nova repartição do mundo. Porém, resulta que esses ‘prescindíveis’ se revoltam e resistem ao poder que quer eliminá-los. Mulheres, crianças, anciões, jovens, indígenas, ecologistas, homossexuais, lésbicas, soropositivos, trabalhadores e todos aqueles e aquelas que não só ‘sobram’, mas que também ‘molestam’ a ordem e o progresso mundial, se revoltam, se organizam e lutam. Sabendo-se iguais e diferentes, os excluídos da ‘modernidade’ começam a tecer as resistências contra o processo de destruição/despovoamento e reconstrução/reordenamento levado adiante, como guerra mundial, pelo neoliberalismo".
 
A frase "sabendo-se iguais e diferentes" é a mais pertinente. Como deve ser conceituado o tema "diferença" na atual órbita contemporânea mundial? É uma questão complexa que merece um pouco de atenção antes de continuarmos no nosso instigante quebra-cabeça planetário. Mas por enquanto fiquemos com uma carta remetida para os participantes do Fórum Nacional Indígena. Nela, o Comitê Clandestino Revolucionário Indígena proclamou o seguinte dilema em relação ao racismo:
 
"Não podemos combater o racismo praticado pelos poderosos com um espelho que apresenta a mesma coisa, só que ao contrário: a mesma falta de razão e a mesma intolerância, mas agora contra os mestiços. Não podemos combater o racismo contra os indígenas praticando o racismo contra os mestiços. (...) No mundo que os zapatistas querem cabem todas as cores de pele, todas as línguas e todos os caminhos" .
 
É nesse contexto que o EZLN, sobretudo através dos comunicados do subcomandante Marcos, tem resgatado esse tema bastante atual e pertinente para o Brasil. Ao defender a polêmica hipótese de que a defesa da diferença não significa negar a importância da igualdade social, os zapatistas estão redimensionando os conceitos do que é ser diferente e igual no mundo contemporâneo, o que pode nos remeter inclusive à velha dicotomia antropológica entre etnocentrismo e relativismo.
 
Como definir entre um etnocentrismo unilateral, no qual o mais forte impõe seus interesses ao mais fraco, e um relativismo complacente que reitera a intocabilidade das diferenças, isolando culturas em espécies de guetos incomunicáveis e, não poucas vezes, geradores de sangrentas guerras de verdades contra verdades?
 
Há dois lados de uma mesma moeda. A cultura ocidental globalizada, ao impor o princípio da homogeneização ou do monoculturalismo, acabou gerando, no seu contra-fluxo, diversas e múltiplas manifestações heterogêneas, nem sempre inéditas no contexto da historiografia mundial, que resistem a essa busca por uma eventual massificação globalizante.
 
O capitalismo contemporâneo, é impossível negar, está em toda a parte. Contaminou o tempo e os espaços geográficos reprimindo, na medida do possível, qualquer possibilidade da emergência de desejos singulares, sejam eles coletivos ou individuais. A partir do pressuposto de que a chamada globalização do mercado tornou-se um fato irreversível, o principal nó a ser desatado é como deve ocorrer a inserção de um país como o México no contexto mundial.
 
Diante de todo esse panorama, como criar novos mecanismos políticos, econômicos, sociais e culturais para que o planeta não fique exclusivamente nas mãos do mercado, que é inevitavelmente excludente. O surgimento de novos grupos, que atuam paralelamente ao Estado, de uma maneira transversalizada, talvez venha a se tornar o primeiro passo rumo a uma globalização não perversa, que não busque a destruição das diferenças humanas em nome de uma fictícia igualdade, abrindo possíveis espaços e brechas para novas singularidades, novos modos de ser, que devem ser planetários, mas sempre se levando em consideração as diferenças localizadas.
 
(1) Felice, Massino Di & Muñoz, Cristobal (orgs), "A revolução invencível", Boitempo Editorial, São Paulo, 1998, pg 221
(2) idem, pg 121
(3) Id, pgs 221& 222.
(4) Id, pg 150 & 151.
 
Guga Dorea é jornalista e sociólogo. Atualmente é integrante do Instituto Futuro Educação e colaborador do Projeto Xojobil.

Será mesmo essa maravilha?...

República Popular da China: 60 anos

 
A experiência histórica do país é extremamente valiosa para demonstrar que não existem modelos de revolução
 
Por Wladimir Pomar
 
Em dezembro de 1949, a China assistiu à fundação da República Popular, com a vitória do Exército Popular de Libertação sobre os exércitos comandados pelo Guomindang. A nova república implantou a reforma agrária, com a nacionalização da terra e sua entrega, em usufruto, a mais de 150 milhões de camponeses. Além disso, denunciou os tratados desiguais que, por mais de um século, permitiram às potências imperialistas espoliar e humilhar a China.
 
As propriedades das empresas imperialistas, assim como dos chineses que haviam colaborado com os agressores japoneses, foram nacionalizadas. Mas os empresários nacionais mantiveram suas propriedades, em concordância com o Programa da Nova Democracia. Proposto pelo Partido Comunista, em 1946, esse programa previa uma aliança de longo prazo com o empresariado nacional, para desenvolver a capacidade produtiva de uma China ainda pobre e atrasada.
 
A nova república, mesmo confrontada com a destruição de mais de 20 anos de guerras, assim como com o bloqueio das potências imperialistas e com as ameaças da Guerra da Coréia e de guerra nuclear, conseguiu reconstruir o país e garantir, num primeiro momento, os direitos humanos básicos de alimentação, moradia, educação e saúde.
 
Para manter a soberania recuperada, proteger-se contra as ameaças da Guerra Fria, e avançar em suas propostas de ingressar numa sociedade socialista, a República Popular necessitava industrializar o país. Porém, sem contar com riquezas acumuladas, nem com capitais externos, o caminho que lhe restou foi contar com os próprios esforços e uma pequena ajuda da União Soviética, em projetos e técnicos, para construir a base de sua indústria pesada.
 
Desvios de rota
Nessas condições, era inevitável ocorrer desequilíbrios. Também era inevitável que camponeses e operários reclamassem que seu sobre-trabalho fosse desviado para produzir aço, máquinas e fábricas, ao invés de produzir bens que lhes propiciasse um melhor padrão de vida. Paralelamente, ressurgiu uma intensa luta de classes, opondo camponeses pobres a camponeses abastados, tendo como fulcro o usufruto da terra, que tendia a ser dominado pelos mais ricos, detentores de saber e de relações sociais antigas.
 
Os desequilíbrios na economia, a luta de classes no campo, as tentativas da burguesia nacional de lucrar com a especulação de alimentos, os movimentos contra-revolucionários, que tentavam se aproveitar das dificuldades do novo regime, as ameaças da Sétima Frota dos Estados Unidos e dos exércitos do Guomindang, no estreito de Taiwan, a Guerra Fria e sua ameaça nuclear, tudo isso dificultava o desenvolvimento econômico e social chinês, impondo-lhe desafios de toda sorte.
 
Foi num quadro como esse que a República Popular acabou por se desviar do Programa da Nova Democracia. Os movimentos massivos das Cem Flores, Comunas Populares, Grande Salto Adiante e Quatro Modernizações, expressaram apenas as tentativas contraditórias de desenvolver as forças produtivas, com ou sem o concurso da burguesia e de formas capitalistas de propriedade.
 
O mais radical de todos esses movimentos massivos foi a Revolução Cultural, entre 1966 e 1976, que levou ao limite a idéia da socialização completa da propriedade, da abolição do mercado, e da participação democrática direta das massas no poder, na suposição de isso permitiria desenvolver as forças produtivas. Mais uma vez, como em todas as grandes revoltas da história chinesa, o igualitarismo econômico e social camponês foi a força propulsora que levou massas de milhões a desafiar o Partido Comunista e o poder instaurado em 1949.
 
Debate sobre a experiência histórica
Após passar por todas essas experiências, e realizar uma avaliação histórica sobre elas, a República Popular ingressou, entre 1976 e 1978, numa retirada parcial, no estilo da Grande Marcha, para superar os elementos de instabilidade política e ideológica, encaminhar a solução dos problemas mais aflitivos do povo, e realizar as “quatro modernizações”, retornando ao Programa da Nova Democracia.
  
Apesar das críticas a Mao Zedong, a necessidade de perseverar na linha que toma as massas como centro das preocupações, e no estilo de trabalho, que toma a prática como critério da verdade, criados por Mao, foram considerados decisivos para emancipar as mentes, combinar democracia e centralismo, e distinguir as contradições dentro do povo das contradições entre o povo e o inimigo.
 
Além disso, houve o reconhecimento de que, apesar de todos os avanços, a China ainda era um dos países mais pobres do mundo. Suas forças científicas, tecnológicas e educacionais estavam 20 a 30 anos atrás dos países desenvolvidos. A China possuía uma população imensa, com pouca terra arável. Então, como modernizar a China e, ao mesmo tempo, dar trabalho e bem-estar à sua enorme população? Como evitar que as “quatro modernizações” criassem uma imensa população excedente e pobre? As experiências de desenvolvimento do mundo capitalista apontavam para uma crescente massa de desempregados, o que ia contra os princípios socialistas.
 
Essas preocupações levaram a República Popular a ancorar-se nos princípios ideológicos e políticos que haviam orientado seus fundadores. Isto é, ter como princípios cardeais na definição das políticas de modernização o caminho socialista, o regime democrático popular, a direção do Partido Comunista, e o guia teórico do marxismo e do pensamento Mao Zedong.
 
A China só se recuperara como nação ao enveredar pelo caminho socialista. Assim, embora as reformas representassem um recuo estratégico, este podia transformar-se em ofensiva, desde que almejasse uma civilização com um alto nível cultural e ideológico, tendo como suporte uma civilização material forte. Neste sentido, o combate aos crimes econômicos tornou-se vital. Não seria possível enfrentar a corrupção, nem os distúrbios, pequenos e grandes, causados pelo processo de modernização, sem uma forte adesão ideológica ao socialismo, ao regime democrático popular e à liderança do PC.
 
Reajustamentos preliminares
Em 1978 e 1979, em pleno curso do debate sobre a experiência histórica da revolução e da República Popular, a China adotou reajustamentos importantes na agricultura e em sua política de abertura ao exterior.
 
Na agricultura, que sempre foi o fundamento da nação chinesa, foram elevados os preços pagos aos produtores agrícolas e permitiu-se que os próprios camponeses organizassem sua produção e pudessem vender livremente seus excedentes. Isto levou à retomada da economia agrícola familiar, substituindo paulatinamente as comunas populares, e resultou na elevação da produção agrícola, de 304 milhões para 450 milhões de toneladas. 
 
Paralelamente a isso, após o salto em sua abertura ao exterior, em plena vigência da Revolução Cultural, quando os Estados Unidos e a maioria dos países ocidentais reconheceram a existência de uma só China e a República Popular como seu governo legítimo, a partir de 1979, a República Popular passou a permitir investimentos estrangeiros em seu território, com a criação das Zonas Econômicas Especiais e dos Portos Abertos. Durante mais de uma década, os investimentos estrangeiros limitaram-se e essas zonas, tendo como condição se associarem a uma empresa nacional, aportarem novas tecnologias, e exportarem a produção.
 
A nova Grande Marcha
No processo de reformas, iniciado em 1980, a República Popular optou por um programa gradual. Tendo por base experimentos variados, por meta uma economia moderadamente desenvolvida em duas décadas e, por perspectiva, 30 a 50 anos de desenvolvimento progressivo, a China iniciou as reformas agrícolas em 1980, a as reformas urbanas na indústria, comércio, finanças, serviços, educação etc, em 1984.
 
As reformas utilizam várias combinações estratégicas. Elas relacionam planejamento e mercado, propriedade social e propriedade privada, trabalho intensivo e capital intensivo, tecnologias baixas e altas, protecionismo e livre comércio, e regulação e desregulação. O mercado voltou a ser a base do cálculo econômico e o principal regulador dos preços e das demandas produtivas. Mas o Estado, através do planejamento, retifica os desvios do mercado e o orienta de acordo com as estratégias da construção econômica e das reformas.
 
A estrutura de propriedade mantém o setor público (estatal e coletivo) como principal. Ao mesmo tempo, garante o funcionamento de empresas individuais e privadas, nacionais e estrangeiras, assim como mistas. Ao completar 60 anos, a República Popular da China deve possuir mais de 30 milhões de empresas individuais e privadas, 250 mil empresas sino-estrangeiras e estrangeiras, 680 mil cooperativas, e cerca de 10 milhões de empresas de propriedade pública (estatais e coletivas). Estas últimas respondem por mais de 45% do PIB.
 
As reformas tinham como meta dobrar o PIB entre 1980 e 1990 e dobrá-lo novamente entre 1990 e 2000, tendo por base o PIB de 1980. Entre 2000 e 2010 o PIB deve ser dobrado novamente, mas desta vez tendo por base o PIB de 2000. Quanto à distribuição da renda, ela deveria acompanhar de perto o crescimento da economia, de tal modo que em 2000 não houvesse mais nenhum chinês abaixo da linha da pobreza e, em 2010, as camadas inferiores da população estejam vivendo um padrão médio comparável ao dos belgas.
 
Em 1995, a China quadruplicou seu PIB, alcançando em 2000 uma cifra superior a 1,2 trilhão de dólares em termos de paridade cambial, ou cerca de 5 trilhões de dólares em termos de paridade de poder de compra. Enquanto a economia cresceu a uma média de 8% a 9%, durante 20 anos, a renda da população urbana e rural cresceu a uma média de 5% a 6%. Das 250 milhões de pessoas que viviam abaixo da linha da pobreza, em 1990, restaram menos de 20 milhões na passagem do século. E a meta de dobrar novamente o PIB até 2010, isto é, quase 2,5 trilhões de dólares, pela paridade cambial, e cerca de 12 trilhões de dólares, pela paridade de poder de compra, está sendo alcançada antes do prazo.
 
No entanto, como os próprios chineses reconhecem, ainda há um longo caminho a percorrer. Seu ponto de partida estava historicamente muito atrasado. A imensidão de sua população dilui qualquer produção bruta, por mais elevada que seja. E a paz, que tanto necessitam para levar a bom termo seu programa, não depende apenas deles.
 
Problemas do século 21
A China possuí mais de um bilhão e trezentos milhões de habitantes, ou 22% da população do globo. Desta população, 56% estão concentradas nas zonas rurais, cuja terra arável compreende apenas 7% do planeta.
No processo de modernização, a pressão sobre a produção agrícola aumentou, enquanto as periferias das cidades, as novas estradas, avenidas, fábricas e zonas habitacionais avançaram sobre as terras agrícolas, reduzindo as áreas de cultivo. Apesar disso, a China deu um salto em sua produção de grãos, chegando a 510 milhões de toneladas.
 
Porém, as tecnologias tradicionais não são mais capazes de fazer com que a produção agrícola da China cresça a uma taxa mínima de 1% ao ano. Isto só será possível elevando a produtividade, com o uso da ciência e da tecnologia, o que está acarretando um crescente excesso de mão-de-obra agrícola. Para evitar desemprego e êxodo massivos no rumo das cidades, a República Popular está empenhada, desde 2006, num vasto programa de modernização das zonas rurais.
 
Ele abrange a construção das infra-estruturas educacional, de saúde, cultural, de transportes, energia e telecomunicações, a universalização dos sistemas educacionais e de saúde pública, pensões, aposentadorias e seguro desemprego, e a consolidação do sistema de empresas industriais, comerciais e de serviços, nos cantões e povoados rurais.
Estas empresas são responsáveis por mais de 50% do valor da produção rural e pelo emprego de mais de 130 milhões de trabalhadores.
 
Apesar das diferenças ainda existentes entre a renda rural e urbana, a melhoria geral da renda no país pode ser medida pelas mudanças na estrutura de consumo. Na estrutura alimentar, diminuiu o consumo de cereais e cresceu o de carnes, ovos, leites, verduras e frutas. O consumo de roupas passou dos modelos simples para os variados, ao mesmo tempo em que no varejo aumentou o consumo de roupas prontas e caiu o de tecidos. Das “quatro velhas peças” de consumo - bicicleta, relógio, máquina de costura e rádio - os chineses passaram primeiro para as “seis novas peças” - televisor, geladeira, lavadora, gravador, ventilador e máquina fotográfica. E, a partir do final dos anos 1990, incorporaram o telefone, computador, moradia e turismo.
 
Nesta nova Grande Marcha, a China se transformou na principal fábrica do mundo. Introduziu uma nova configuração produtiva, contribuiu para o controle mundial da inflação, e jogou papel importante em colocar no mercado global cerca de 40% da população do planeta. Por outro lado, do mesmo modo que ritmos lentos de crescimento, ritmos muito rápidos têm causado instabilidade social. O crescimento médio de cerca de 10%, entre 1980 e 2008, foi o mais elevado da história chinesa após 1949, e da história mundial no período de 1980 a 2008. Ele permitiu melhorar o padrão de vida e tornar mais sólidos os fundamentos econômicos do país, mas colocou em tensão a infra-estrutura, pressionou os preços, causou pressões inflacionárias, e criou condições para o surgimento de surtos de instabilidade política, como o de 1989. E acarretou novos problemas ambientais, riscos financeiros, corrupção e disparidades regionais e entre pobres e ricos.
 
Por isso, ao completar 60 anos, a República Popular se esforça para adotar a “construção verde” como centro dos projetos econômicos. Ela tem fechado empresas e minas poluidoras, obrigado a realização dos estudos de impacto ambiental, desenvolvido métodos de monitoramento, conservação e recuperação ambiental, imposto compensações pelo uso de recursos e por danos causados ao meio ambiente, e quer reduzir o consumo de energia em 20%, até 2010.
 
Ela também segue na política de redistribuição de renda, através dos aumentos salariais, universalização das aposentadorias, pensões e seguros-desemprego, elevação do padrão de vida dos 20 milhões que ainda vivem abaixo da linha da pobreza, garantia dos direitos dos trabalhadores migrantes, e elevação das taxas pagas pelas classes de renda mais alta, para estender e baratear os serviços públicos.
 
Durante a crise global iniciada em 2008, a China se empenhou em reduzir os riscos globais, reiterando sua política de coexistência pacífica, aprofundando as reformas de seu sistema financeiro, diminuindo o desequilíbrio no comércio internacional do país, através do aumento das importações, e constituindo fundos financeiros para projetos no exterior.
Ela também tem reiterado que persiste na extensão dos direitos democráticos, reforçando o sistema de congressos populares, e ampliando os sistemas de cooperação multipartidária, consulta política, e auto-gestão nos níveis primários da sociedade.
 
Embora já seja o segundo país em PIB pela paridade do poder de compra, a República Popular assegura que a China ainda é um país em desenvolvimento. Reitera que se encontra na fase primária de seu socialismo. E que, paralelamente ao desenvolvimento das forças produtivas, se empenha em construir uma sociedade harmônica, como base de uma civilização política e culturalmente avançada.
 
Nessas condições, em 60 anos de existência, a República Popular da China apenas parece haver encontrado o caminho para alcançar seus objetivos de transitar da revolução democrático popular para o socialismo. Seus êxitos e seus riscos são de igual magnitude. Embora tenha avançado muito rapidamente no desenvolvimento de suas forças produtivas, sua contrapartida foi o ressurgimento, na China, de uma classe burguesa detentora de meios de produção.
 
Assim, a experiência histórica da República Popular da China é extremamente valiosa para demonstrar que não existem modelos de revolução, nem de construção socialista. E que a construção de uma nova sociedade, a partir de uma sociedade capitalista atrasada, talvez seja ainda mais complexa, mesmo após uma revolução, porque não se pode destruir por decreto uma formação econômica e social que ainda não esgotou todas as suas possibilidades históricas.
 
Wladimir Pomar é escritor e analista político

Meios de comunicação contra democratização dos meios de comunicação






Milton Temer- Portal Socialismo e Liberdade


Milton Temer
Milton Temer
Na contramão das potências capitalistas ocidentais, governos latino-americanos, os bolivarianos particularmente, estão dando exemplo numa batalha essencial dos tempos sombrios a que estamos condicionados. Insurgem-se contra o estabelecimento da barbárie cultural que vem ameaçando seus povos por conta da crescente concentração de poder, político e econômico, em mãos dos grandes meios de informação privados. Ousam propor, e aprovar, legislações que estabelecem controles democráticos sobre esses meios, e as executam.
Em função de tal "heresia", tornam-se alvo de ataques incessantes e crescentes dos tentáculos da Sociedade Interamericana de Prensa (SIP), essa Internacional orgânica que acumplicia os controladores dessas corporações mediáticas aos setores mais reacionários dos diversos países do continente. São tratados como protoditatoriais, e outros epítetos do gênero. Alvos, enfim, de belicosidade, sequer original, pois que vem de longe.

Cretinice imperialista:
Irã recebe ameaças por construção de usina de energia nuclear dos mesmos que fecham os olhos para as 200 ogivas nucleares de Israel.

Já na Revolução Francesa do fim do século XVIII, Robespierre, numa de suas monumentais disputas retóricas na tribuna da Convenção, era peremptório na definição do poder dos formadores de opinião. "Os jornalistas têm nas mãos o destino dos povos. (...) Assim como os príncipes calculam suas forças pela quantidade de seus soldados e pelos recursos de suas finanças, os chefes de facções rivais entre nós calculam as deles pelo número de cronistas que podem patrocinar", afirmava ele, e dava exemplo prático, a partir do seu embate com La Fayette. O "herói de dois mundos", então passado para o campo da burguesia, obtivera, através do controle sobre jornalistas influentes, "mais conquistas, no espaço de alguns meses, do que poderia ter alcançado na Revolução, durante meio século, à frente de um Exército". A quem interessar, este trecho é extraído de obra importantíssima, editada pela Contraponto: "Discursos e Relatórios na Convenção".
Mas retornando ao grão. Se já era assim quando a mídia se restringia a quase panfletos mal impressos, distribuídos entre populações com altíssimo nível de analfabetismo, não é difícil imaginar por que, com o avanço tecnológico gigantesco, o terreno se transformou numa arena quase principal do confronto entre o mundo do trabalho e as classes dominantes, nos dias atuais. Cabendo aos governos, por via de conseqüência, se definir por campo exatamente a partir da posição que tomam em relação ao conceito de "liberdade de expressão".
Se ousarem considerar que é um direito social, estarão entrando em choque com o grande capital, onde o conceito é avaliado pela maior ou menor capacidade de transformar notícia e informação, para além de ferramenta de poder, em produto, valor de troca; em mercadoria geradora de lucro, no mais das vezes pantagruélicos.
O caso mais recente é o que concerne à divulgação da nova lei do audiovisual na Argentina. A ler a correspondente do Globo, em Buenos Aires, com matérias valorizadas nas manchetes de página, a reforma estaria sendo enfiada goela abaixo do Congresso e da população por um poderoso governo, controlado por um inqüestionável Executivo. Longe de nós entrar nas querelas e seqüelas das lutas internas entre os herdeiros do peronismo. Mas é impossível não repelir a desonestidade editorial, e a cumplicidade aí constatável do quadro assalariado de editores e redatores, que não se peja de fazer o jogo sujo dos interesses empresariais e ideológicos do grande patronato.
Pois se há algo facilmente verificável, é que poder, na realidade argentina atual, tem a própria idéia de quebra do monopólio privado sobre os meios de comunicação, e não a presidência de Cristina Kishner.
Seu grupo político foi batido em recentes eleições legislativas. Resultado previsível para governos que se pretendem populares e democráticos, mas não vão ao grão das questões essenciais.
Por que, então, vem obtendo êxito retumbante na aprovação de uma legislação que estabelece limites concretos ao monopólio do Clarin (grupo que corresponde, na Argentina, aos privilégios e exclusividades que as organizações Globo têm no Brasil)?
Porque, por conta de confronto de interesses diretos, colocou a seu lado amplos setores da sociedade civil organizada, através de um projeto que transfere para empresas de menor expressão econômica, ou para organizações não-lucrativas da sociedade civil, concessões até então abocanhadas quase monopolisticamente pelo grupo. Fato gerador de base parlamentar favorável, pois congressista burguês é capaz de tudo, menos de pôr em risco o seu mandato.
Entre os efeitos já percebidos pela população há um elucidativo: o da transmissão do futebol. Pela lei, não pode mais ser exclusividade do grupo Clarin. Passa a ser transmitido de forma mais ampla; por todas as TVs abertas, inclusive as públicas. Quanto aos clubes, tiveram sua participação na distribuição de recursos da venda significativamente ampliada. Passam a receber muito mais do que lhes tocava na venda ao grupo monopolista. Ou seja, e para citar o quadro brasileiro: fim à subordinação do horário dos jogos ao horário das novelas.
Mais ainda; estabelece-se limites de extensão de rede, e de tempo de concessão. Ninguém poderá controlar mídias distintas sobre um mesmo território. A concessão será reavaliada a cada 10 anos. Podendo, ou não, ser renovada desde que atendidas, ou não, preceitos mínimos de respeito à cidadania e ao ser direito concreto de ter acesso à informação. Para tanto, evidentemente, instrumentos de controle serão implementados.
Nada de novidade, tudo previsto em amplos debates que, na discussão do processo constitucional de 88, os segmentos brasileiros voltados para a democratização dos meios de comunicação. Mostrando que, no Brasil, se a idéia pega, se o governo Lula tivesse um mínimo de autonomia e coragem, a  Globo tem muito com que se preocupar.
O que preciso ser esclarecido de forma incisiva é a necessidade de definir legitimamente o conceito de liberdade de expressão, ponto fundamental na construção de uma sociedade justa e libertária. Conceito que não tem nada a ver com a forma como é utilizado pela SIP e seus tentáculos nos diversos países. Não se trata, para ser preciso, de defender direitos empresariais sobre a concessão pública de rádio e televisão (as emissoras são simples produtoras que têm concessão sobre canais de transmissão que não lhes pertence, mas sim à sociedade como um todo).
Para receber tal concessão, que tem tempo definido, essas concessionárias se obrigam a deveres que não cumprem. Basta, aliás, consultar o capítulo de Comunicação Social de nossa Constituinte, para ver a imensa quantidade de exigências constantemente atropeladas por esses concessionários aqui no Brasil.
Quando a Globo esperneia, sabe por que o faz. Quando ataca Chavez ou Rafael Correa por não terem renovado concessões de canais que substituem partidos políticos onde a direita não consegue organizá-los, conscientemente atropela a realidade dos fatos. Omite o que esses canais são capazes de produzir para desestabilizar a ordem institucional vigente - e quem fizer um balanço honesto do papel das emissoras de tv venezuelanas no fracassado golpe contra Chavez terá infindáveis argumentos comprobatórios.
Cabe, portanto, aos que lutam pela democratização dos meios de comunicação no Brasil, ampliarem seu espectro de reivindicações para além da defesa das emissoras comunitárias. Cabe retomar os tempos em que o povo, na rua, afirmava não ser bobo, e rejeitava a rede Globo. Exigir desse governo que se diz democrático e popular a abertura de debate semelhante ao que ocorre entre nossos vizinhos continentais. Cenário realmente difícil de imaginar, quando lembramos que, distintamente do moderado Tancredo Neves - cuja primeira coletiva de imprensa foi dada no Congresso Nacional, onde afirmou não se propor a "pagar a dívida externa com o sangue do povo brasileiro" - , Lula deu a sua sentadinho no banco de ouvinte do Jornal Nacional, dirigido pelo casal apresentador e respeitando os intervalos comerciais.

Milton Temer é jornalista e presidente da Fundação Lauro Campos