“A maior parte do povo, presumo eu, ainda tem em mente, a imagem de uma América como a terra por excelência da formação universitária, única pelo seu contexto de oferta de ensino superior susceptível de servir grande parte da população. Esta ideia costumava, no passado, corresponder à realidade. Mas nos dias de hoje, os jovens norte-americanos que concluem um grau de ensino superior são em número significativamente menor, que aqueles que completam o mesmo tipo de percurso académico em muitos outros países. Na realidade, dispomos de uma taxa percentual de licenciados ligeiramente abaixo da taxa homóloga em vigor em todas as outras economias mais desenvolvidas”.
Se se tivesse de explicar o sucesso económico norte-americano através
de uma única palavra, essa palavra seria «ensino». No século XIX, os
EUA assumiram a orientação do ensino básico universal. Depois, ao passo
que as outras nações se acomodavam, a «revolução na escola secundária»
no início do século XX elevou-nos até um grau de exigência
completamente diferente. E nos anos posteriores à segunda guerra
mundial, os EUA consagraram-se na liderança no ensino de nível superior.
Mas tudo isso passava-se, então. A melhoria do ensino norte-americano provinha, incontestavelmente, da melhoria do ensino público – e, a verdade é que ao longo dos últimos trinta anos, as opções políticas têm vindo a ser contaminadas pela ideia peregrina de que qualquer investimento público constitui um desperdício dos dólares dos contribuintes. O ensino, sendo um dos sectores que mais contribuem no orçamento da despesa pública, disso se ressentiu.
Até hoje em dia, os resultados desta negligência com o ensino, têm piorado gradualmente – este é um lento despertar para a erosão da posição dominante estadunidense. Mas a situação está prestes a agravar-se dramaticamente, à medida que a crise económica – com as consequências do exagero ao nível da política de responsabilidade fiscal de Washington que prevê o cuidado excessivo com as pequenas importâncias de dinheiro em contraste com a negligência no que diz respeito às grandes fortunas – obriga a drásticos e sucessivos cortes no ensino.
Sobre essa mesma erosão dir-se-á que tem havido uma onda de vagas sobre ameaças ao predomínio das universidades norte-americanas de elite. Na mesma sequência desse tipo de denúncias, pelo menos a julgar por aquilo de que me consigo aperceber, tem-se referido o nosso declínio relativo à liderança nas iniciativas pioneiras. Os EUA que costumavam estar na frente no que diz respeito ao ensino dos seus jovens, têm, gradualmente, sido ultrapassados por outras das nações mais desenvolvidas.
A maior parte do povo, presumo eu, ainda tem em mente, a imagem de uma América como a terra por excelência da formação universitária, única pelo seu contexto de oferta de ensino superior susceptível de servir grande parte da população. Esta ideia costumava, no passado, corresponder à realidade. Mas nos dias de hoje, os jovens norte-americanos que concluem um grau de ensino superior são em número significativamente menor, que aqueles que completam o mesmo tipo de percurso académico em muitos outros países. Na realidade, dispomos de uma taxa percentual de licenciados ligeiramente abaixo da taxa homóloga em vigor em todas as outras economias mais desenvolvidas.
Mesmo sem as consequências desta crise contemporânea, haveria todos os motivos possíveis e imagináveis para se recear uma descida ainda maior deste tipo de indicadores, nem que fosse somente pelo facto de se terem criado tão difíceis condições para os estudantes com limitações financeiras para se manterem nas instituições de ensino. Nos EUA, com os fracos apoios que a Segurança Social concede e as limitadas ajudas aos estudantes existentes, os jovens acabam por preferir, tal como sucede com os seus homólogos de países como, por exemplo, a França, trabalhar a tempo parcial ao mesmo tempo que vão frequentando as aulas. Não surpreendentemente, dadas as necessidades financeiras prementes, os jovens norte-americanos acabam mesmo por permanecer menos tempo na instituição de ensino ainda antes de terem concluído o curso, para tornarem-se temporariamente trabalhadores a tempo inteiro.
Mas a crise presente criou problemas adicionais ao nosso sistema de ensino, actualmente em ruptura.
Segundo a Agência para as Estatísticas do Trabalho, a economia estadunidense perdeu 273 000 postos de trabalho no mês transacto. Desse total de postos perdidos, 29 000 ocorreram no sector do ensino nacional e distrital, fazendo subir o número total de perdas de trabalho nesse meio, e nos últimos cinco meses, para 143 000. Estes números poderão não soar a muito escandalosos, mas a verdade é que o ensino é uma das áreas em que, em normalidade de circunstâncias, e mesmo numa recessão, nunca pára de crescer. Os mercados até podem encontrar-se em crise, mas nunca haverá motivos para se deixar de ensinar os nosso filhos. Ainda por cima, é precisamente isso que está a acontecer.
Não há dúvidas nenhumas sobre o que está a acontecer : o ensino é essencialmente da responsabilidade do Estado e das autarquias, que, por sua vez, se encontram em graves apuros do ponto de vista fiscal. Uma adequada ajuda federal poderia fazer uma desejada diferença. Mas enquanto que algum tipo de ajuda já foi de facto providenciada, a verdade é que essa mesma ajuda só chegou para colmatar parte das falhas ainda existentes. Tal facto ficou a dever-se, em parte, à insistência de senadores centristas, em Fevereiro passado, em retirar muito dessa mesma ajuda da Lei de Recuperação e Re Investimento Americano, de um incentivo inicialmente previsto nesse projecto de lei.
Como resultado destas políticas, o ensino encontra-se à beira de cortes financeiros ainda mais radicais. E a demissão de professores é só parte desta história muito mal contada. Ainda mais grave, é a forma como estamos a destruir oportunidades.
Por exemplo, o jornal “Crónica do Ensino Superior” noticiou recentemente a situação difícil da comunidade de estudantes de ensino superior privado do estado da Califórnia. Ao longo de sucessivas gerações, estudantes talentosos oriundos de famílias menos afortunadas, serviram-se dessas instituições de ensino como trampolim para ingressarem nas universidades públicas estaduais. Mas face à crise provocada pelo orçamento de estado, estas universidades viram-se forçadas a fechar a porta este ano, às potenciais transferências deste tipo de estudantes. Como corolário lógico deste tipo de decisão, seguir-se-á certamente, uma vida inteira de perdas e danos nas perspectivas de trabalho de muitos dos estudantes afectados – assim como um desperdício gratuito de potencial humano.
Então, o que é que deveria ser feito?
Em primeiro lugar, o Congresso deveria emendar os erros de Fevereiro, assim como fazer aprovar um novo conjunto de ajudas aos governos estaduais. Não há necessidade de se lhe chamar um incentivo, mas esse seria, indiscutivelmente, um meio eficaz para criar ou salvaguardar milhares de postos de trabalho. E seria, simultaneamente, um investimento a longo prazo.
Além disso, há que acordar para a realidade histórica de uma das chaves para o sucesso da nossa nação e que agora anda a ser desperdiçada. O ensino tornou os EUA grandes ; negligenciar o ensino pode fazer inverter esse processo.
* Paul Krugman, economista galadoardo com o Prémio Nobel em 2008 é colaborador habitual do New York Times
Este texto foi publicado no New York Times de 8 de Outubro de 2009
Tradução de João Hinard de Pádua
Mas tudo isso passava-se, então. A melhoria do ensino norte-americano provinha, incontestavelmente, da melhoria do ensino público – e, a verdade é que ao longo dos últimos trinta anos, as opções políticas têm vindo a ser contaminadas pela ideia peregrina de que qualquer investimento público constitui um desperdício dos dólares dos contribuintes. O ensino, sendo um dos sectores que mais contribuem no orçamento da despesa pública, disso se ressentiu.
Até hoje em dia, os resultados desta negligência com o ensino, têm piorado gradualmente – este é um lento despertar para a erosão da posição dominante estadunidense. Mas a situação está prestes a agravar-se dramaticamente, à medida que a crise económica – com as consequências do exagero ao nível da política de responsabilidade fiscal de Washington que prevê o cuidado excessivo com as pequenas importâncias de dinheiro em contraste com a negligência no que diz respeito às grandes fortunas – obriga a drásticos e sucessivos cortes no ensino.
Sobre essa mesma erosão dir-se-á que tem havido uma onda de vagas sobre ameaças ao predomínio das universidades norte-americanas de elite. Na mesma sequência desse tipo de denúncias, pelo menos a julgar por aquilo de que me consigo aperceber, tem-se referido o nosso declínio relativo à liderança nas iniciativas pioneiras. Os EUA que costumavam estar na frente no que diz respeito ao ensino dos seus jovens, têm, gradualmente, sido ultrapassados por outras das nações mais desenvolvidas.
A maior parte do povo, presumo eu, ainda tem em mente, a imagem de uma América como a terra por excelência da formação universitária, única pelo seu contexto de oferta de ensino superior susceptível de servir grande parte da população. Esta ideia costumava, no passado, corresponder à realidade. Mas nos dias de hoje, os jovens norte-americanos que concluem um grau de ensino superior são em número significativamente menor, que aqueles que completam o mesmo tipo de percurso académico em muitos outros países. Na realidade, dispomos de uma taxa percentual de licenciados ligeiramente abaixo da taxa homóloga em vigor em todas as outras economias mais desenvolvidas.
Mesmo sem as consequências desta crise contemporânea, haveria todos os motivos possíveis e imagináveis para se recear uma descida ainda maior deste tipo de indicadores, nem que fosse somente pelo facto de se terem criado tão difíceis condições para os estudantes com limitações financeiras para se manterem nas instituições de ensino. Nos EUA, com os fracos apoios que a Segurança Social concede e as limitadas ajudas aos estudantes existentes, os jovens acabam por preferir, tal como sucede com os seus homólogos de países como, por exemplo, a França, trabalhar a tempo parcial ao mesmo tempo que vão frequentando as aulas. Não surpreendentemente, dadas as necessidades financeiras prementes, os jovens norte-americanos acabam mesmo por permanecer menos tempo na instituição de ensino ainda antes de terem concluído o curso, para tornarem-se temporariamente trabalhadores a tempo inteiro.
Mas a crise presente criou problemas adicionais ao nosso sistema de ensino, actualmente em ruptura.
Segundo a Agência para as Estatísticas do Trabalho, a economia estadunidense perdeu 273 000 postos de trabalho no mês transacto. Desse total de postos perdidos, 29 000 ocorreram no sector do ensino nacional e distrital, fazendo subir o número total de perdas de trabalho nesse meio, e nos últimos cinco meses, para 143 000. Estes números poderão não soar a muito escandalosos, mas a verdade é que o ensino é uma das áreas em que, em normalidade de circunstâncias, e mesmo numa recessão, nunca pára de crescer. Os mercados até podem encontrar-se em crise, mas nunca haverá motivos para se deixar de ensinar os nosso filhos. Ainda por cima, é precisamente isso que está a acontecer.
Não há dúvidas nenhumas sobre o que está a acontecer : o ensino é essencialmente da responsabilidade do Estado e das autarquias, que, por sua vez, se encontram em graves apuros do ponto de vista fiscal. Uma adequada ajuda federal poderia fazer uma desejada diferença. Mas enquanto que algum tipo de ajuda já foi de facto providenciada, a verdade é que essa mesma ajuda só chegou para colmatar parte das falhas ainda existentes. Tal facto ficou a dever-se, em parte, à insistência de senadores centristas, em Fevereiro passado, em retirar muito dessa mesma ajuda da Lei de Recuperação e Re Investimento Americano, de um incentivo inicialmente previsto nesse projecto de lei.
Como resultado destas políticas, o ensino encontra-se à beira de cortes financeiros ainda mais radicais. E a demissão de professores é só parte desta história muito mal contada. Ainda mais grave, é a forma como estamos a destruir oportunidades.
Por exemplo, o jornal “Crónica do Ensino Superior” noticiou recentemente a situação difícil da comunidade de estudantes de ensino superior privado do estado da Califórnia. Ao longo de sucessivas gerações, estudantes talentosos oriundos de famílias menos afortunadas, serviram-se dessas instituições de ensino como trampolim para ingressarem nas universidades públicas estaduais. Mas face à crise provocada pelo orçamento de estado, estas universidades viram-se forçadas a fechar a porta este ano, às potenciais transferências deste tipo de estudantes. Como corolário lógico deste tipo de decisão, seguir-se-á certamente, uma vida inteira de perdas e danos nas perspectivas de trabalho de muitos dos estudantes afectados – assim como um desperdício gratuito de potencial humano.
Então, o que é que deveria ser feito?
Em primeiro lugar, o Congresso deveria emendar os erros de Fevereiro, assim como fazer aprovar um novo conjunto de ajudas aos governos estaduais. Não há necessidade de se lhe chamar um incentivo, mas esse seria, indiscutivelmente, um meio eficaz para criar ou salvaguardar milhares de postos de trabalho. E seria, simultaneamente, um investimento a longo prazo.
Além disso, há que acordar para a realidade histórica de uma das chaves para o sucesso da nossa nação e que agora anda a ser desperdiçada. O ensino tornou os EUA grandes ; negligenciar o ensino pode fazer inverter esse processo.
* Paul Krugman, economista galadoardo com o Prémio Nobel em 2008 é colaborador habitual do New York Times
Este texto foi publicado no New York Times de 8 de Outubro de 2009
Tradução de João Hinard de Pádua