O Ministério Público tem que
ser rigoroso com todos!
procurador federal (OAB/RS nº 45.857)
É comum na
sociedade brasileira o sentimento de que existem dois Poderes
Judiciários: um
restrito “aos poderosos”, que
estão “acima da lei”, e outro,
para o povo, com
todos os “rigores da Lei”.
Porém, ao menos no círculo dos operadores do Direito,
todos sabemos que o Poder Judiciário só atua mediante provocação.
Por isso, as inúmeras injustiças que presenciamos constantemente não podem ser atribuídas exclusivamente ao Judiciário, já que se não for provocado nada pode fazer.
Essa provocação,
consoante a Constituição Brasileira, é
atribuição do Ministério Público no que se refere à defesa da ordem
jurídica, do
regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Para
tanto, esta mesma Constituição, felizmente, concedeu aos membros do
Ministério
Público garantias para que possam exercer suas funções com a mais ampla
liberdade para que a justiça se torne uma realidade.
Porém,
lamentavelmente não conseguimos ver o Ministério Público do Estado do RS
cumprir
com as suas atribuições na sua plenitude. Pelo contrário, vemos um MP
rigoroso
com a sociedade organizada e omisso com os "poderosos”. Veja-se:
A
governadora Yeda Crusius, logo depois de eleita, comprou uma “mansão” por um
valor duvidoso e com recursos de origem supostamente ilícita, segundo
amplamente
divulgado pela imprensa gaúcha. No entanto, mesmo diante de tantas
dúvidas que
pairavam sobre tal aquisição, o Ministério Público do Estado apressou-se
no
arquivamento das investigações.
Já
a sociedade organizada, indignada com
a divulgação dos escândalos de corrupção que envolveram importantes
integrantes
do Governo do Estado no ano passado - como legitimamente se espera numa
sociedade verdadeiramente consciente da sua responsabilidade - decidiu
protestar. E nada mais sensato do que esse protesto pacífico ocorresse
nos
arredores da “mansão” da
governadora, em face das diversas dúvidas que pairavam
sobre a aquisição daquele imóvel, já que até mesmo aquele local
eventualmente
poderia ser fruto da corrupção.
E assim fizerem porque acreditavam estar em um país verdadeiramente democrático.
Para espanto de muitos, alguns dos participantes do protesto pacífico foram presos como se fossem criminosos que surrupiam o dinheiro alheio.
E mais: o Ministério Público do Estado
do RS, com a autonomia constitucionalmente garantida para tanto, ao
invés de
investigar todos os casos de corrupção (que para quem tem um pouco de
discernimento é inevitável supor que “campeia solta” segundo esclareço
abaixo)
prefere incriminar alguns dos integrantes do protesto pacífico,
denunciando a
presidente do CPERGS, Rejane de Oliveira, a vice-presidente do CPERGS,
Neida
Oliveira, e a Vereadora do PSOL, Fernanda Melchionna, por cárcere
privado. Essas
mulheres são cidadãs reconhecidas na luta por uma sociedade melhor, que
nada
mais fizeram do que usar a arma que cabe ao povo para combater o
hedionda
corrupção: o protesto pacífico.
É
indispensável esclarecer que a crítica
(que espero seja recebida como construtiva) não é restrita à denúncia
contra a
prisão de cidadãs que apenas protestavam pacificamente contra a
corrupção, até
porque não temos maiores informações sobre o caso.
A questão é muito maior. Por que o Ministério Público não age com o mesmo rigor com os "poderosos”?
Ora, 40%
dos salários de todos nós se destinam ao pagamento
de tributos (esclareço, desde já, que não defendo a redução dos tributos
porque
só através deles se constrói uma nação justa socialmente).
E para onde
vai todo este dinheiro? Sabemos que não muito mais que metade volta para
a
sociedade por meio de obras e serviços públicos. Inevitavelmente temos
que
concluir que o restante é desviado pela corrupção. Por isso escrevi
antes que
quem tem um pouco de discernimento sabe que a corrupção “campeia solta” pelo
nosso Rio Grande
Não dá
para duvidar que o nível da corrupção no RS seja
similar ao recentemente divulgado no Distrito Federal, sendo a única
diferença
que lá o Ministério Público agiu. Se é inevitável constatar que a
corrupção
corre solta no nosso Estado por que o Ministério Público não a combate,
conforme
sua atribuição constitucional, com o mesmo rigor que agiu com as
dirigentes do
CPERGS e com a vereadora? Por que esse tratamento desigual?
Não há outra
forma de concretizarmos a justiça social senão por meio de um Ministério
Público
rigoroso com todos. Só assim não faltarão escola nem professores para
nossas
crianças, esporte para nossos adolescentes, trabalho para nossos homens e
mulheres, saúde para nossos idosos e presídios para os criminosos.
Espero que esta
exposição não seja recebida como uma manifestação em
desfavor do Ministério Público do RS, mais sim como uma contribuição
para
encontrarmos uma sociedade gaúcha e brasileira mais confiante nas
instituições,
sejam elas do Judiciário, do Ministério Público, do Executivo ou
Legistativo.
Por fim, esclareço que a
presente manifestação não tem, em hipótese
alguma, ainda que indiretamente, qualquer intenção de apoiar a proposta
do
deputado Federal Paulo Maluf que pretende amordaçar a atuação do
Ministério
Público. Pelo contrário, quero que o Ministério Público do Rio Grande
use as
suas garantias hoje vigentes para fazer a lei ser igual para todos.
(*) E.mail: marcelo.zeni@hotmail.com
Fonte: www.espacovital.com.br