Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
domingo, 25 de abril de 2010
Aniversário de Lenin...
Comemorar o
nascimento de Lenine, quando a informação única pretende apagar na
memória dos povos o imenso legado de Lenine como teórico marxista,
revolucionário e dirigente de massas, não é apenas um acto de justiça.
A leitura das suas obras e o conhecimento da sua acção são
indispensáveis, ainda mais na presente crise do capitalismo, para travar
as muitas batalhas que a classe trabalhadora, o povo, tem pela frente e
para compreender “que muitas das grandes questões sobre as quais Lénine
se debruçou estão, apesar das condições muito diferentes, bem vivas na
actualidade.”
Comemoram-se
hoje os 140 anos do nascimento de Lénine. Para um Partido como o PCP(Partido Comunista de Portugal)
esta é sempre uma importante data a assinalar. E só poderia ser assim.
Pelo papel central que teve no enriquecimento e brilhante defesa do
marxismo; pelo seu empenho na defesa da dialéctica entre teoria e
prática revolucionárias; pelo papel de dirigente e guia da primeira
revolução socialista vitoriosa da História e fundador do primeiro Estado
de operários e camponeses; pelo legado histórico que deixou na
definição, construção, organização e fortalecimento do Partido
independente do proletariado – o Partido de novo tipo – e na fundação e
direcção da Internacional Comunista e do alargamento à escala mundial do
movimento comunista e revolucionário, por tudo isto, Lenine esteve,
está e estará presente na História, acção, intervenção, luta,
características e princípios de funcionamento do Partido Comunista
Português.
Mas se o que se disse bastaria para justificar a importância desta
comemoração, os tempos que vivemos conferem-lhe um significado ainda
mais especial. O aprofundamento da crise do capitalismo coloca
apaixonantes desafios aos revolucionários de hoje. Como Lénine no seu
tempo, somos chamados a travar várias batalhas, a realizar inúmeras
tarefas e, simultaneamente e em movimento, a retirar lições das
experiências passadas – tal como Lénine retirou da Comuna francesa ou da
Revolução russa de 1905 – para seguir em frente. Como Lénine, temos de
proceder à análise concreta e rigorosa da situação concreta, de
identificar correctamente as condições, objectivos, etapas, métodos,
alianças e tácticas que, no quadro da resistência à crescente ofensiva
do imperialismo, permitam atrair para a luta as camadas mais recuadas e
vulneráveis à cultura do medo e do conformismo que o imperialismo lhes
tenta incutir e organizá-las em torno dos seus interesses de classe,
fazendo assim avançar a marcha da História de emancipação dos
trabalhadores e dos povos e «varrer o velho».
Este é daqueles momentos em que vale a pena revisitar Lenine. Não
para encontrar respostas mecânicas ou modelos – Lenine foi um feroz
adversário do dogmatismo e da escolástica - mas para entender que muitas
das grandes questões sobre as quais Lénine se debruçou estão, apesar
das condições muito diferentes, bem vivas na actualidade. Aí está o
Imperialismo como fase superior do capitalismo acentuando a sua
contradição fundamental e o seu desenvolvimento desigual(1). Aí estão os
Estados funcionando como gestores dos interesses da classe dominante,
explorando e oprimindo os povos(2). Aí estão, num momento de potenciais
viragens – mais ou menos profundas, mais ou menos esperadas - as
tendências para a manifestação de «esta ou aquela variedade de
revisionismo»(3). Aí estão os «Estados Unidos da Europa» a assumir, sob o
capitalismo, o seu carácter reaccionário(4). E aí está, mais viva que
nunca, a necessidade de olhar para a teoria como «um guia autêntico para
acção» que só o é «quando se enriquece constantemente com as novas
experiências de luta, de modo a não se transformar em dogma»(5).
Dentro de dias comemoraremos também a Revolução de Abril. Uma
comemoração que se impõe ser de luta contra o ataque cerrado aos valores
e às conquistas de Abril e à Constituição da República. Mas ao
comemorarmos Abril também encontramos Lénine. Encontramos a riqueza que
ele sempre reconheceu à História e à realidade. Encontramos os avanços e
os recuos dessa mesma História e as peculiaridades no desenvolvimento
da luta. Encontramos o papel determinante das massas e a necessidade de
com elas aprender, aprender, sempre. Encontramos por fim o amor ao povo,
a paixão revolucionária, os tais corações ardentes que fazem da nossa
luta, da luta pelo Socialismo, uma festa bonita.
Notas:
[1] «O imperialismo, fase superior do capitalismo» – V.I. Lénine (1916)
[2] «O Estado e a Revolução» – V.I. Lénine (1918)
[3] «Marxismo e Revisionismo» – V. I. Lénine (1908)
[4] «Sobre a Palavra de Ordem dos Estados Unidos da Europa» - V. I. Lénine (1915)
[5] «Que Fazer» - V.I Lenine (1902)
[1] «O imperialismo, fase superior do capitalismo» – V.I. Lénine (1916)
[2] «O Estado e a Revolução» – V.I. Lénine (1918)
[3] «Marxismo e Revisionismo» – V. I. Lénine (1908)
[4] «Sobre a Palavra de Ordem dos Estados Unidos da Europa» - V. I. Lénine (1915)
[5] «Que Fazer» - V.I Lenine (1902)
* Membro da Comissão Política do PCP
Este texto foi publicado no Avante nº1.899 de 22 de
Abril de 2010.
sábado, 24 de abril de 2010
O PSOL e a Reforma Agrária...
Pré-candidato do PSOL à Presidência encampa
reforma agrária do MST
Redação - jornal correio do Brasil
Plinio de Arruda Sampaio se fortalece no PSOL
Pré-candidato à Presidência da
República, Plínio de Arruda Sampaio (P-SOL) disse, em conversa com
jornalistas, nesta quinta-feira, que a reforma agrária é o ponto central
das transformações sociais que urgem acontecer no país. Ele participou
de uma manifestação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST), encerrada no fim da noite passada. Usando um boné vermelho do
MST, Plínio reclamou da ausência dos demais pré-candidatos e afirmou que
a reforma agrária é um problema sério, que deveria estar na plataforma
política das eleições deste ano.
Segundo ele, o P-SOL está
preparando um programa político para as próximas eleições e a reforma
agrária deve ser o ponto principal, seguido pela educação.
– Este
é o tema do país. Este é o problema mais sério do país – afirmou
Plínio
também aproveitou para negar divergências em seu próprio partido quanto
à sua pré-candidatura.
– No meu partido, fatura liquidada. Lá
dentro tem um grupo recalcitrante, mas isso é um direito de todos. O
esperneio é permitido – disse.
Ações do MST
O
aumento das ações do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) com
ocupações de propriedades rurais e de prédios públicos ocorridas neste mês
teria o objetivo de colocar a questão da reforma agrária como tema a ser
debatido nas eleições deste ano. A avaliação é do historiador da
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Clifford Welch.
– O
MST quer ter certeza que essa questão da reforma agrária vai estar na
pauta política da eleição – afirmou.
Até esta quarta-feira, o
MST, que conta com o economista João Pedro Stédile entre seus
coordenadores, afirma ter ocupado 68 propriedades rurais, além da sede
do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em
Brasília e as superintendências do órgão em São Paulo, Pernambuco, no
Rio de Janeiro, Pará, Piauí e na Paraíba. O número é semelhante ao
registrado pela Comissão Pastoral da Terra em 2008 e 2007, quando
ocorreram 64 e 69 ocupações respectivamente. No entanto, é mais que o
dobro do ano passado, quando as ocupações do Abril Vermelho realizadas
pelo MST somaram 32 ações.
Welch chama atenção para a aparente
mudança de estratégia na ocupação de prédios públicos.
– Essa é
uma estratégia para fazer uma conexão entre a ocupação de terra e o
Poder Público, que é o responsável por fazer a reforma agrária – disse.
Segundo o geógrafo da Universidade de São Paulo (USP), Ariovaldo
Umbelino, mesmo tendo apresentado um nova tática de luta neste ano, os
movimentos sociais têm diminuído a mobilização nos últimos anos. Para
ele, a redução da pressão social possibilitou que o governo abandonasse o
projeto de reforma agrária.
– Os governos só fizeram
assentamentos quando os movimentos fizeram lutas – afirmou.
Umbelino
não acredita que, sem mobilização social, seja possível uma atualização
dos índices de produtividade das propriedades rurais, como defendido
pelo MST. Apesar de a Constituição Federal determinar que a cada dez
anos esses índices sejam atualizados. A última atualização foi em 1976.
Multiculturalidades sociais em debate.....
Fórum Mundial da Aliança de Civilizações abre inscrições
Em sua terceira edição, agora no Rio de Janeiro, evento
discutirá temas como a integração das sociedades multiculturais e o
impacto dos meios de comunicação sobre a percepção de outras culturas,
entre outros temas
Por: Luiz Antônio Alves, da
Agência Brasil
Brasília - Já estão abertas as inscrições para os interessados em
participar do 3º Fórum Mundial da Aliança de Civilizações, que se
realiza no Rio de Janeiro entre os dias 27 e 29 de maio. Espera-se a
participação de cerca de 2 mil políticos, líderes de corporações
nacionais e internacionais, ativistas da sociedade civil, organizações
de jovens, jornalistas, fundações e líderes religiosos.
Criado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2005, o fórum não
tem poder deliberativo, concentrando-se em diferentes iniciativas que
procuram combater os preconceitos e as incompreensões entre as diversas
culturas.
Uma tragédia que horrorizou o mundo transformou-se na base da criação
da Aliança de Civilizações. No dia 11 de março de 2004, atentados
terroristas em três estações de metrô de Madri, a capital espanhola,
deixaram 191 mortos e mais de 1,8 mil feridos.
No final de longo inquérito, a Justiça espanhola concluiu que os
atentatos foram feitos por um grupo de extremistas muçulmanos em
retaliação ao apoio do então primeiro-ministro espanhol, José Maria
Aznar, à invasão do Iraque e à presença de tropas espanholas no
Afeganistão. O grupo inspirou-se na Al-Qaeda, mas não tinha ligação
direta com a organização terrorista.
A criação da Aliança de Civilizações foi proposta à Organização das
Nações Unidas pelo atual primeiro-ministro espanhol, José Luis Rodríguez
Zapatero. O primeiro fórum realizou-se em Madri, em janeiro de 2008,
reunindo 60 países e 350 representantes da política, cultura, religião e
economia, que procuraram mostrar a existência de caminhos práticos para
a colaboração entre os mundos islâmico e ocidental. O segundo fórum foi
em Istambul, na Turquia, em abril de 2009.
O encontro do Rio de Janeiro discutirá a integração das sociedades
multiculturais, o fortalecimento da presença das mulheres na sociedade
por meio da educação, o papel dos líderes religiosos na promoção da paz e
o impacto dos meios de comunicação sobre a percepção de outras
culturas, entre outros temas.
No ano passado, ao participar do 2º Fórum da Aliança de Civilizações
em Istambul, capital da Turquia, o ministro das Relações Exteriores,
Celso Amorim, disse que muitas vezes as diferenças étnicas e religiosas
são usadas por interesses que querem fomentar conflitos.
"Por isso", disse o ministro, "necessitamos de iniciativas como a
Aliança de Civilizações. As semelhanças entre os povos são muito maiores
do que as diferenças. O contato e o diálogo entre as pessoas são
importantes pois através deles poderemos demonstrar que o acirramento de
conflitos por motivos religiosos e culturais é algo totalmente
artificial, obedecendo a interesses econômicos ou geopolíticos. Eu não
acredito que as religiões em si estejam umas contra as outras".
Os interessados em participar do fórum no Rio de Janeiro já podem se
inscrever no endereço http://inscricoes.aliancadecivilizacoes.mre.gov.br.
O Hezbolá e o sionismo...
Hezbolá: Opomo-nos a qualquer compromisso com o Sionismo
O secretário-geral do Hezbolá, Hassan Nasrallah, anunciou uma
nova carta política: uma carta na qual definiu as grandes linhas a
seguir pelo Hezbolá. Nasrallah apareceu em um telão perante uma multidão
de jornalistas e de personalidades políticas, sem esquecer a presença
do presidente do partido do Conselho, Ibrahim al Amin-Sayyed e do chefe
do bloco parlamentar da Fidelidade à Resistência, Hajj Mohammed Raad. A
seguir, os principais extratos da carta.
Por G.Houbballah, para a Al-Manar
O objetivo deste documento é dar a
conhecer a visão política do Hezbolá, que assenta nas nossas percepções e
aspirações, nas nossas esperanças e preocupações; é acima de tudo o
resultado daquilo por que passamos, do que definimos ser prioritário em
relação à supremacia do ato do sacrifício.
Num período político excepcional, rico de evoluções, não é possível fazer-se uma abordagem sem referir o papel especial da resistência, ou o impacto das suas realizações.
É pois necessário incluir essas mudanças no contexto da comparação entre duas vias contraditórias, de proporção inversa.
Estes dados revelam-se no contexto internacional mais lato que, por sua
vez, contribui para desvendar o impasse ou mesmo o recuo da hegemonia
unipolar dos Estados Unidos a favor dum sistema multipolar cujas linhas
ainda não estão nitidamente definidas.
E o que agudiza a crise do mundo hegemônico é a crise que atingiu os mercados financeiros americanos, a economia mundial e que fez com que os Estados Unidos entrassem num estado de confusão e impotência, que atingiu como uma chicotada a própria estrutura do arrogante modelo capitalista.
Podemos pois dizer: Encontramo-nos num contexto de mudanças históricas que ameaçam os Estados Unidos de perder o seu lugar de potência dominante, e a extinção do sistema de dominação unipolar.
Perante isto, os movimentos de resistência aparecem como sendo um fator estratégico na cena internacional depois de terem desempenhado um papel central na produção ou no estímulo de mudanças ligadas à nossa região. Assim, a resistência no Líbano, em especial a resistência islâmica, foi a primeira a fazer frente à hegemonia e à ocupação há mais de trinta anos e esta escolha resistiu, apesar de todas as tentativas de demonstrar que a opção da resistência era uma imprudência ou uma tendência política que se opõe às regras do racionalismo e do realismo.
Ora o percurso das vitórias registradas pela resistência comprovou a veracidade desta opção: desde a expulsão da ocupação israelense de Beirute e da Montagne, depois a sua retirada de Saida, Nabatiyeh e Tiro, passando pelas agressões israelenses de Julho de 1993 e Abril de 1996, sem esquecer a retirada israelense em maio de 2000, até à guerra israelense contra o Líbano em 2006, tudo isso apenas serviu para reforçar a credibilidade e a legitimidade dessa resistência.
A Resistência conseguiu assim evoluir de movimento de libertação para movimento de resistência, depois para uma força de dissuasão e de defesa, para além do seu papel como pedra angular no seio do poder político para a elaboração de um Estado forte e justo.
Paralelamente, a resistência conseguiu evoluir no plano político e humanitário, e adquiriu assim, para além do seu valor patriótico libanês, um valor árabe e islâmico luminoso; tornou-se atualmente num valor universal e humano em que se inspiram todos os que prezam a liberdade e a independência em diversas partes do globo.
Ora o Hezbolá, apesar destas mudanças promissoras, considera que, embora o inimigo se encontre num impasse e incapaz de ter uma estratégia de guerra ou de impor ajustamentos de acordo com as suas próprias condições, não deve subestimar a amplitude dos desafios e dos riscos que subsistem, não deve banalizar a via difícil da luta e a dimensão dos sacrifícios exigidos pela resistência para a restituição dos territórios.
No entanto, o Hezbolá tornou-se mais claro, mais determinado nas suas escolhas, mais confiante em Deus, em si mesmo e no seu povo.
Foi neste contexto que o Hezbolá definiu as grandes linhas da sua política.
A hegemonia americana
Depois da Segunda Guerra mundial, os Estados Unidos impuseram-se como projeto central de dominação, um projeto fundado num desenvolvimento nos mecanismos de dominação e escravização sem precedentes, reforçado por realizações a todos os níveis do conhecimento científico, cultural, tecnológico, econômico e militar.
Um projeto político e econômico que considera o mundo apenas como uma abertura a mercados que devem ser regidos pelas suas próprias leis.
A coisa mais perigosa na lógica da hegemonia do Ocidente, e muito em especial dos Estados Unidos, é considerar que o direito de dominar o mundo é uma coisa natural e, portanto, que a estratégia econômica capitalista do projeto é de natureza global, sem limites nas suas ambições gananciosas.
Os fatores de controle do capitalismo selvagem, que são constituídos por um presidente e redes internacionais sustentadas por sociedades transnacionais, instituições internacionais, nomeadamente financeiras, apoiadas pela força militar superior, provocaram conflitos de identidades, de culturas e de modos de civilizações, contradições entre ricos e pobres, etc.
O capitalismo selvagem transformou a globalização num mecanismo de dominação, de desunião, de discórdia e de destruição das identidades, até mesmo de alienação cultural, econômica e social.
Esta globalização atingiu o seu paroxismo quando se transformou em militar; não faltam no Oriente Médio exemplos disso, como o Afeganistão, o Iraque, a Palestina, o Líbano, com a guerra global de julho de 2006, executada pelos israelenses.
A hegemonia e a dominação dos Estados Unidos atingiu recentemente níveis perigosos, sobretudo a partir da última década do século 20 e ainda hoje, de modo ascendente após a queda da União Soviética, uma oportunidade histórica para a hegemonia americana de liderar o mundo, em nome da responsabilidade histórica, e de impor a ideia de que não há distinção entre os interesses do mundo e os interesses americanos.
Esta hegemonia atingiu o seu apogeu com a administração Bush, que exprimiu a sua visão num documento "Projeto do Novo Século Americano", escrito antes das eleições americanas de 2000.
Não é de estranhar nem de surpreender que este documento insista na questão do reforço das capacidades dos EUA em todo o mundo, através duma política estratégica fundada no reforço das capacidades militares. Estas últimas já não são uma força de dissuasão, mas também uma força de intervenção, tanto para efetuar ataques "preventivos" para fins "terapêuticos", como para tratar das crises depois de estas se produzirem.
A administração Bush considerou os acontecimentos do 11 de Setembro de 2001, como uma ocasião para realizar essa visão, através do slogan da "guerra mundial contra o terrorismo" e esta administração trabalhou da forma seguinte:
Neste contexto, a administração dedicou-se a estabelecer uma ligação
entre o terrorismo e a resistência para lhe retirar toda a legitimidade
reconhecida nos direitos do homem e justificar assim a luta contra as
guerras de todos os tipos, e reduzir a zero os últimos bastiões da
defesa dos povos e o seu direito de viver em liberdade, com dignidade e
com orgulho, de viver a sua própria experiência, de assumir os seus
papeis no movimento da história humana, cultural e intelectualmente.
O "terrorismo" serviu de argumento para a dominação americana através de diversos meios: processos judiciais, prisão e detenção arbitrárias, ausência dos elementos mais fundamentais de um processo justo, como se verificou nos locais de detenção de "Guantânamo", intervenção direta na soberania dos Estados, desencadear guerras destrutivas e devastadoras sem distinguir o inocente do culpado, nem entre crianças e adultos, entre mulheres e jovens…
O preço humano das guerras americanas contra o terrorismo já ultrapassou o número de milhões de pessoas, sem contar com a destruição das infra-estruturas, e também o desmantelamento da estrutura e dos componentes das próprias comunidades.
Não há a menor dúvida de que o terrorismo americano está na origem de todo o terrorismo mundial, e de que a administração Bush tornou os Estados Unidos numa ameaça para o mundo inteiro, a todos os níveis. Se, atualmente, se fizesse uma pesquisa da opinião mundial, os Estados Unidos apareceriam como o país mais odiado do mundo.
O fracasso sofrido pela guerra no Iraque e a situação evolutiva da resistência, o fracasso da alegada "guerra contra o terrorismo", especialmente no Afeganistão, onde se assiste ao regresso em força do movimento dos talibãs e ao reconhecimento do seu papel procurando entrar em acordos com eles, assim como o fracasso da guerra americana contra a resistência no Líbano e na Palestina, através da ocupação israelense, tudo isso atingiu violentamente o prestígio americano a nível internacional, provocando um recuo estratégico na sua capacidade de ação.
No entanto, isso não significa que os Estados Unidos se vão retirar de cena facilmente, mas farão tudo o que for necessário para proteger o que eles chamam os seus "interesses estratégicos", porque os políticos que pretendem promover a hegemonia americana, os projetos ideológicos, alimentados por tendências extremistas aliadas à componente militar, não conhecem limites para a cupidez e as suas ambições.
A nossa região e a hegemonia americana
Os mundos árabe e muçulmano têm estado sujeitos durante séculos, a guerras coloniais brutais e sem fim, a começar pela implantação da entidade sionista na região, no quadro duma fragmentação da região em entidades contraditórias.
Atingimos o apogeu desta fase com os Estados Unidos que herdaram o antigo colonialismo na região.
O objetivo central do controle americano dos povos em todas as suas formas é político, econômico, cultural e a pilhagem dos seus recursos, em especial a pilhagem das riquezas petrolíferas é um meio de controle do Presidente da economia mundial.
Para atingir os seus objetivos políticos, os Estados Unidos aperfeiçoaram estratégias de ação, nomeadamente:
É evidente que só é possível ler qualquer conflito em qualquer região do
mundo através da perspectiva duma estratégia global e, portanto, a
ameaça americana não se reduz a um espaço preciso, a linha da frente
desta ameaça também tem que ser mundial.
Não há a menor dúvida de que se trata duma confrontação difícil e delicada, uma batalha de gerações. A nossa experiência no Líbano já demonstrou que dificuldade não significa impossibilidade.
Isto é verdade verticalmente através da história e também horizontalmente através das nossas extensões geográficas e geopolíticas.
A arrogância americana não deixou aos nossos povos senão a escolha da resistência, a escolha para uma vida melhor, para o futuro do Homem, um futuro regido por relações de fraternidade e de solidariedade na diversidade, um mundo de paz e de harmonia, conforme previsto pelo movimento dos nossos profetas e dos reformadores através da história.
O Líbano
O Líbano é a nossa pátria, a dos nossos pais e dos nossos avós, e é também a pátria dos seus filhos e netos e de todas as gerações que se seguem.
Rejeitamos toda a forma de partição ou de "federalização" explícita ou disfarçada. Queremos uma pátria livre, soberana e independente, generosa, poderosa, capaz, presente nas equações da região, e contribuinte chave no presente e no futuro, como sempre o foi na fabricação da história.
a) A resistência
"Israel" representa uma ameaça constante para o Líbano, um modelo de coexistência entre os fieis das religiões divinas e que é contrariado pela presença duma entidade racista: a entidade sionista. Além disso, a existência do Líbano na fronteira da Palestina ocupada, impõe que ele assuma responsabilidades nacionais e patrióticas.
A ameaça israelense começou a fazer-se sentir neste país desde que a entidade sionista foi implantada na Palestina; essa entidade não hesitou em divulgar as suas ambições de anexar o Líbano, de se apoderar das suas riquezas, principalmente as minerais, e tentou concretizar essas ambições progressivamente.
Essa entidade desencadeou uma série criminosa de agressões contra o país desde 1948: o massacre de Houla em 1949, a agressão ao aeroporto internacional de Beirute em 1968… a ocupação de 1982, etc.
Tudo isso foi totalmente apoiado pelos Estados Unidos da América, e em certa medida ignorado pela "comunidade internacional" e pelas instituições internacionais, tornando-as de fato cúmplices do agressor, sem esquecer o silêncio dos árabes, a ausência duma verdadeira autoridade libanesa no Líbano, que abandonou o país e o povo aos massacres e às pilhagens perpetradas pela ocupação israelense.
Perante esta tragédia nacional, o sofrimento da população e o sentimento de abandono pelo mundo levaram os libaneses fieis à sua pátria a recorrer ao seu direito de resistência, que é um dever nacional moral e religioso: a resistência popular armada nasceu assim para enfrentar o perigo sionista que ameaça a sua vida, os seus meios de subsistência e o seu futuro.
Em circunstâncias tão difíceis, o Estado libanês começou a recuperar a sua soberania através da resistência armada, a reencontrar o seu poder de decidir politicamente, um poder que a ocupação israelense tentara roubar-lhe, a resistência serviu de prelúdio à restauração do Estado e das suas instituições e, sobretudo, ao restabelecimento dos valores nacionais: a soberania da pátria e a dignidade, dando à liberdade a sua verdadeira dimensão.
A partir daí, esses valores deixaram de ser apenas um slogan, mas foram consagrados pela resistência para libertar os nossos territórios e recuperar os nossos direitos e são a pedra angular para um Líbano moderno, que recuperou o seu lugar no mapa do mundo como país respeitado e orgulhoso dos seus filhos que pertencem a uma pátria que luta pela liberdade, pela cultura, pela ciência, pela diversidade e pelo dinamismo, uma pátria de dignidade, de sacrifício e de heroísmo.
A retirada das forças de ocupação israelenses no ano 2000 e a vitória histórica na guerra de Julho de 2006, serviram de modelo de defesa e de resistência da pátria, a experiência transformou-se numa escola em proveito dos povos e das nações oprimidas.
A resistência nacional conseguiu, com o apoio do povo e do exército nacional, infligir uma derrota histórica a "Israel", os três em conjunto ofereceram uma base para uma nova fase na região, a partir de agora desempenham um papel central na função de dissuasão do inimigo garantindo a proteção da independência nacional, da soberania e da defesa do seu povo.
Ora, dada a ausência de um Estado forte, dado o desequilíbrio das forças entre o Estado e o inimigo, dada a ameaça permanente das forças israelenses, o Líbano tem que consagrar uma fórmula mista baseada numa aliança entre uma resistência popular que participe na defesa do país contra qualquer invasão israelense, e o exército nacional que deve proteger a pátria e garantir-lhe a sua segurança e a sua estabilidade.
Esta fórmula deve ser desenvolvida no seio duma estratégia de defesa nacional, que servirá de cobertura de segurança para o Líbano, após o fracasso de outras propostas internacionais ou árabes.
A escolha da resistência permitiu a libertação do território do Líbano, o restabelecimento das instituições estatais, a proteção da soberania e a realização duma verdadeira independência.
O êxito da experiência da resistência, o fracasso de todas as guerras para a eliminar, e a permanência da ameaça israelense no Líbano – e não o desaparecimento dessa ameaça – levam a resistência a prosseguir sem descanso na sua missão, a reforçar as suas capacidades militares, para poder participar na tarefa de libertar o que falta dos nossos territórios ainda ocupados, recuperar detidos e pessoas desaparecidas e os corpos dos mártires, e participar na missão de defesa e proteção do nosso país.
b) O Estado e o sistema político
O principal problema no sistema político libanês, que impede a reforma e o desenvolvimento e que está permanentemente na ordem do dia, é o confessionalismo político. O sistema foi estabelecido numa base confessional, o que é um obstáculo à realização da verdadeira democracia, a que abre a porta a uma boa repartição dos poderes políticos. Por consequência, a condição para a aplicação duma verdadeira democracia deste gênero é a abolição do confessionalismo político do sistema, que está inscrito no texto dos "Acordos de Taëf" e a necessidade de formar uma comissão nacional para o fazer.
Ora, enquanto os libaneses não atingirem este objetivo através do diálogo nacional – falamos da abolição do confessionalismo político – e também enquanto subsistir o sistema político baseado em linhas sectárias, a democracia consensual mantém-se a base fundamental para a governação no Líbano, porque é ela a encarnação real do espírito da constituição e a essência da Carta da coexistência.
Daí que toda a abordagem das questões nacionais pela maioria e pela minoria deve ser realizada de acordo com as condições históricas e sociais do exercício da democracia efectiva na qual o cidadão constitui um valor em si mesmo.
A democracia consensual é uma fórmula política que exige uma verdadeira participação de todos, o fator de confiança é primordial entre os componentes do país.
O Estado que queremos e que exigimos resume-se a:
A criação de um Estado assim é o objetivo de cada libanês, honesto e
sincero, e no Hezbolá estamos prontos a desenvolver todos os nossos
esforços em cooperação com as forças políticas e o povo para atingir
este nobre objetivo nacional.
c) O Líbano e as relações palestinas
Uma das trágicas consequências da implantação da entidade sionista no território da Palestina é a deslocação dos seus habitantes, o problema dos refugiados palestinos que se refugiaram no Líbano e que esperam regressar aos seus lares de onde foram expulsos.
O sofrimento dos refugiados palestinos no Líbano não está limitado à dor das migrações forçadas e também às agressões e aos massacres israelenses, como o que aconteceu no campo de Nabatiyeh, mas o seu sofrimento também decorre da situação econômica e social catastrófica dos campos, onde não está assegurado o mínimo para uma vida decente, onde estão privados de direitos civis e sociais, tudo isto por causa da indiferença dos sucessivos governos libaneses em cumprir as suas obrigações para com eles.
Este fato não é normal e é agora imperativo que as autoridades libanesas assumam as suas responsabilidades, é necessário estabelecer relações libano-palestinas sólidas e ter em conta os interesses comuns dos dois povos, não manter esta relação regulada pelos caprichos e pelos humores, e os cálculos políticos internos ou as ingerências internacionais.
Isto é possível de realizar, nomeadamente através:
d) O Líbano e as relações árabes
A identidade árabe do Líbano e a sua pertença árabe são inerentes à composição da comunidade libanesa.
A geopolítica regional e as políticas estratégicas regionais, os interesses nacionais, esses determinantes da estratégia política do Líbano, atribuem-lhe a necessidade de respeitar as causas árabes justas, nomeadamente a questão da Palestina e o conflito com o inimigo israelense.
O desenvolvimento da escola assente na luta contra os conflitos políticos, na prevenção de qualquer forma de discórdia, é uma opção que devia ser adotada no tratamento das questões árabes, assim como a procura de pontos comuns a fim de realizar uma verdadeira solidariedade para resolver as nossas questões.
Aqui, a escolha da resistência é uma necessidade fundamental para reposicionar a posição árabe e enfraquecer o inimigo, qualquer que seja a natureza das estratégias políticas ou os preconceitos.
Neste contexto, a Síria registrou uma atitude histórica e inabalável na luta contra o inimigo israelense, apoiou os movimentos de resistência na região, manteve-se ao nosso lado apesar das circunstâncias muito difíceis, procurou unificar os esforços árabes a fim de garantir os interesses da região e enfrentar os desafios.
Sublinhamos a necessidade de respeitar as relações excepcionais entre o Líbano e a Síria enquanto necessidade política, de segurança e econômica ditada pelos interesses dos dois países e dos dois povos, e também pelos imperativos da geopolítica e das exigências para a estabilidade do Líbano, ou mesmo para enfrentar os desafios comuns. Apelamos para que se ponha fim a todos os sentimentos negativos que têm manchado as relações bilaterais no decurso dos últimos anos e o regresso a relações normais logo que possível.
O Líbano e as relações islâmicas
O nosso mundo árabe e muçulmano confronta-se com desafios que afetam a composição diversificada das nossas sociedades o que exige uma tolerância zero a este respeito.
A escalada das tensões sectárias, especialmente entre sunitas e xiitas, a criação de contradições nacionais entre os curdos, os turcomanos e os árabes e os iranianos. A imigração das minorias da nossa região, em especial as minorias cristãs na Palestina, no Iraque, no Líbano, ameaça a coesão das nossas sociedades e impedem o desenvolvimento.
Ora, a diversidade religiosa e étnica, em vez de ser uma fonte de riqueza, tem vindo a ser utilizada como uma arma para destroçar a nação árabe.
O Hezbolá confirma a importância da cooperação entre os países islâmicos em todas as áreas, o que lhe garante a força da solidariedade frente a regimes arrogantes, a proteção da invasão cultural da comunidade e encoraja-os a tirar partido dos seus recursos na troca das diferentes prestações entre esses países.
Neste contexto, o Hezbolá considera que o Irã islâmico é um Estado importante no mundo muçulmano, a sua revolução conseguiu desenraizar o regime do Xá e frustrar os projetos do sionismo. O Irã apoiou os movimentos de resistência na nossa região e defende com coragem e determinação as questões árabes e islâmicas, em especial a questão palestina.
A política da República Islâmica do Irã é clara e coerente ao apoiar a questão central dos árabes e dos muçulmanos: a questão palestina.
Ao anunciar a vitória da revolução islâmica chefiada pelo Imame Khomeini, o Irã abriu uma embaixada palestina em substituição da embaixada de Israel, e manteve esse apoio sob todas as formas até hoje sob a direção do Imame Khamenei, que conquistou importantes vitórias pela primeira vez na história do conflito com os invasores sionistas.
A fabricação de contradições com a República Islâmica do Irã por determinados partidos árabes é um desafio para os árabes e só beneficiam "Israel" e os Estados Unidos da América.
O Irã, que redigiu a sua ideologia política, e construiu a sua política sobre "a centralidade da questão palestina", a luta contra "Israel" e a hegemonia americana, a integração no mundo árabe e no ambiente islâmico, deve ser tratado na base da vontade de cooperação e de fraternidade, no reconhecimento que ele é um centro de gravidade estratégico, atualmente o modelo de independência do projeto árabe da independência islâmica e uma força com que podem contar vários países e povos.
Lembramos a importância da unidade entre muçulmanos, de desconfiar de quem provoca a distinção entre eles, sobretudo as dissenções sectárias entre sunitas e xiitas, contamos com a consciência dos povos muçulmanos na luta contra o que se conspira contra eles.
A Palestina e as negociações de regulamento
Em primeiro lugar a questão da Palestina e a entidade sionista
A implantação da entidade sionista desde a agressão da Palestina e a deslocação dos seus habitantes em 1948, sob os auspícios e o apoio das potências internacionais hegemônicas da época, é uma ameaça direta e grave em toda a região árabe e uma verdadeira ameaça para a sua segurança e estabilidade, na medida em que ela não reaja.
O crime contra a humanidade praticado pelo Ocidente é a implantação desta entidade estranha no coração do mundo árabe e muçulmano, hostil, uma base do controle e da hegemonia nesta região em especial.
O movimento sionista é um movimento racista no pensamento e na prática. Além disso, a entidade continuou durante toda a ocupação os massacres e o terrorismo, com o apoio e os desvelos das potências colonialistas, em especial, dos Estados Unidos da América, o seu verdadeiro parceiro em todas as suas guerras e massacres e práticas do terrorismo.
Esta entidade é uma entidade usurpadora artificial, não é viável.
A responsabilidade histórica que compete à nação é de não a reconhecer, quaisquer que sejam as pressões e os desafios e continuar a trabalhar pela libertação de todos os territórios usurpados e restabelecer os direitos usurpados de toda a gente, independentemente do tempo que levar e dos sacrifícios que houver que fazer.
Jerusalém e a mesquita Al Aqsa
Todo o mundo está ao corrente do caráter sagrado de Jerusalém e da mesquita Al Aqsa, a primeira Qibla e o terceiro lugar santo, o ponto dos profetas e dos apóstolos (rezaram pela humanidade de Deus); ninguém nega a profundidade da sua relação com o Islão como um dos símbolos islâmicos mais importantes sobre a terra.
E a cidade de Jerusalém, o berço dos locais santos islâmicos e cristãos, goza de grande prestígio entre muçulmanos e cristãos.
A ocupação israelense continua a judaicizar a cidade santa através da expulsão do seu povo e da confisco das suas casas e dos seus bens, da construção de colônias judias e do muro do apartheid.
Os graves ataques incessantes e repetidos a Al-Aqsa fazem parte do plano da sua destruição, são uma ameaça grave e real à sua existência, a sua sobrevivência corre o risco de provocar repercussões em toda a região.
O nosso dever é apoiar a libertação de Jerusalém e defender Al-Aqsa, é um dever religioso, uma responsabilidade ética para todos os povos livres do mundo inteiro.
Convidamos e apelamos aos árabes e aos muçulmanos, e a todos os países que desejam a paz e a estabilidade no mundo, que desenvolvam esforços para libertar Jerusalém da ocupação sionista e para manter a sua verdadeira identidade e os lugares santos islâmicos e cristãos.
Em terceiro lugar: a resistência palestina
O povo palestino trava uma batalha de auto-defesa para recuperar os seus direitos nacionais legítimos na Palestina, exerce um direito legítimo reconhecido pelas mensagens celestes, pelas leis internacionais e pelos valores da humanidade.
Este direito inclui todas as formas de resistência – primeiro e acima de tudo a luta armada – e todos os meios que as facções da resistência palestina possam utilizar, tendo em conta o desequilíbrio das forças a favor do inimigo sionista que possui as mais modernas armas de destruição.
A experiência demonstrou q importância e a eficácia da opção da resistência e da luta armada frente à agressão com vista à libertação dos territórios para repor os direitos e conseguir instaurar um novo equilíbrio de forças.
A guerra de Julho de 2006 e a guerra de Gaza são disso provas reais…
Se é este o ponto da existência no Líbano e na Palestina, qual é a praticabilidade da negociação de opções Altswoi? Quais são os resultados, os interesses e os ganhos realizados pelas negociações em todas as fases e em todos os acordos obtidos? Não serão maior arrogância e hegemonia e intransigência israelense e mais ganhos dos interesses e das condições israelenses?
Enquanto afirmamos para o povo palestino e para a questão palestina, de se agarrarem à história, geográfica e política, declaramos clara e firmemente o nosso apoio ao povo palestino e aos movimentos de resistência palestina e à sua luta contra o projeto israelense.
Em quarto lugar: as negociações do regulamento
A nossa posição quanto ao processo de regulamento desde os acordos de Madrid aos Acordos de Oslo e, antes destes, os de "Camp David" e aos seus anexos, é a rejeição total da opção de um regulamento com a entidade sionista, com base no reconhecimento da legitimidade da sua existência e no abandono do território da Palestina.
Esta posição é fixa, permanente e definitiva, não negociável, mesmo que o mundo inteiro reconheça "Israel".
Deste ponto de vista, duma posição de fraternidade, de responsabilidade, apelamos aos dirigentes árabes para reconsiderar a possibilidade de negociações e reexaminar os resultados dos acordos assinados com o inimigo sionista.
A entidade sionista demonstrou durante todas as etapas das negociações que não pretende a paz, que utiliza as negociações para impor condições e proteger os seus interesses…
Por consequência, convidamos, desejamos e esperamos que todos os árabes e todos os muçulmanos se reúnam em volta da Palestina e de Jerusalém para a libertar da contaminação da ocupação sionista, suprir todas as necessidades de apoio necessárias para reforçar a resistência do povo palestino e permitir que ele prossiga a resistência e rejeite todos os projetos de normalização com o inimigo sionista, faça respeitar o direito de regresso de todos os refugiados palestinos às suas terras e às suas casas de onde foram expulsos.
Conclusão
É esta a nossa visão, ao elaborá-la esforçamo-nos por manter presente que somos os alunos da Justiça.
O nosso compromisso é defender o direito e a justiça, prontos a sacrificarmo-nos para os defender.
Através da ação, esperamos apenas a satisfação do nosso Criador, o Senhor dos céus e da terra, e esperamos para o nosso povo e para a nossa nação o bem-estar e a felicidade neste mundo e no além…
Fizemos a promessa, a ti Senhor, e a todos os oprimidos, de nos mantermos honestos para com o Pacto, de esperar pela Promessa e de sermos inabaláveis na Via que escolhemos.
* G.Houbballah é analista político do jornal libanês Al Manar
Este texto foi publicado em:
www.almanar.com.lb/newsSite/News.aspx?language=en
Tradução de Margarida Ferreira para o site ODiario.Info
Num período político excepcional, rico de evoluções, não é possível fazer-se uma abordagem sem referir o papel especial da resistência, ou o impacto das suas realizações.
É pois necessário incluir essas mudanças no contexto da comparação entre duas vias contraditórias, de proporção inversa.
1 – a via da resistência e da oposição,
uma via que assenta em vitórias militares e êxitos políticos ao ponto de
instaurar um modelo da resistência popular e política, de coerência nas
posições políticas, apesar da dimensão dos desafios. Até fazer pender a
balança na equação regional a favor da resistência e dos seus
partidários.
2 – a via da hegemonia americana e da arrogância americano-israelense e
dos seus aliados nas suas diferentes dimensões e nos seus prolongamentos
diretos e indiretos, revelando simultaneamente o fracasso estratégico
dos Estados Unidos e o desmoronamento dos seus projetos, um após outro, o
que os mergulhou na confusão, na retirada, na incapacidade de controlar
o curso das evoluções e dos acontecimentos no mundo árabe e no mundo
islâmico.
E o que agudiza a crise do mundo hegemônico é a crise que atingiu os mercados financeiros americanos, a economia mundial e que fez com que os Estados Unidos entrassem num estado de confusão e impotência, que atingiu como uma chicotada a própria estrutura do arrogante modelo capitalista.
Podemos pois dizer: Encontramo-nos num contexto de mudanças históricas que ameaçam os Estados Unidos de perder o seu lugar de potência dominante, e a extinção do sistema de dominação unipolar.
Perante isto, os movimentos de resistência aparecem como sendo um fator estratégico na cena internacional depois de terem desempenhado um papel central na produção ou no estímulo de mudanças ligadas à nossa região. Assim, a resistência no Líbano, em especial a resistência islâmica, foi a primeira a fazer frente à hegemonia e à ocupação há mais de trinta anos e esta escolha resistiu, apesar de todas as tentativas de demonstrar que a opção da resistência era uma imprudência ou uma tendência política que se opõe às regras do racionalismo e do realismo.
Ora o percurso das vitórias registradas pela resistência comprovou a veracidade desta opção: desde a expulsão da ocupação israelense de Beirute e da Montagne, depois a sua retirada de Saida, Nabatiyeh e Tiro, passando pelas agressões israelenses de Julho de 1993 e Abril de 1996, sem esquecer a retirada israelense em maio de 2000, até à guerra israelense contra o Líbano em 2006, tudo isso apenas serviu para reforçar a credibilidade e a legitimidade dessa resistência.
A Resistência conseguiu assim evoluir de movimento de libertação para movimento de resistência, depois para uma força de dissuasão e de defesa, para além do seu papel como pedra angular no seio do poder político para a elaboração de um Estado forte e justo.
Paralelamente, a resistência conseguiu evoluir no plano político e humanitário, e adquiriu assim, para além do seu valor patriótico libanês, um valor árabe e islâmico luminoso; tornou-se atualmente num valor universal e humano em que se inspiram todos os que prezam a liberdade e a independência em diversas partes do globo.
Ora o Hezbolá, apesar destas mudanças promissoras, considera que, embora o inimigo se encontre num impasse e incapaz de ter uma estratégia de guerra ou de impor ajustamentos de acordo com as suas próprias condições, não deve subestimar a amplitude dos desafios e dos riscos que subsistem, não deve banalizar a via difícil da luta e a dimensão dos sacrifícios exigidos pela resistência para a restituição dos territórios.
No entanto, o Hezbolá tornou-se mais claro, mais determinado nas suas escolhas, mais confiante em Deus, em si mesmo e no seu povo.
Foi neste contexto que o Hezbolá definiu as grandes linhas da sua política.
A hegemonia americana
Depois da Segunda Guerra mundial, os Estados Unidos impuseram-se como projeto central de dominação, um projeto fundado num desenvolvimento nos mecanismos de dominação e escravização sem precedentes, reforçado por realizações a todos os níveis do conhecimento científico, cultural, tecnológico, econômico e militar.
Um projeto político e econômico que considera o mundo apenas como uma abertura a mercados que devem ser regidos pelas suas próprias leis.
A coisa mais perigosa na lógica da hegemonia do Ocidente, e muito em especial dos Estados Unidos, é considerar que o direito de dominar o mundo é uma coisa natural e, portanto, que a estratégia econômica capitalista do projeto é de natureza global, sem limites nas suas ambições gananciosas.
Os fatores de controle do capitalismo selvagem, que são constituídos por um presidente e redes internacionais sustentadas por sociedades transnacionais, instituições internacionais, nomeadamente financeiras, apoiadas pela força militar superior, provocaram conflitos de identidades, de culturas e de modos de civilizações, contradições entre ricos e pobres, etc.
O capitalismo selvagem transformou a globalização num mecanismo de dominação, de desunião, de discórdia e de destruição das identidades, até mesmo de alienação cultural, econômica e social.
Esta globalização atingiu o seu paroxismo quando se transformou em militar; não faltam no Oriente Médio exemplos disso, como o Afeganistão, o Iraque, a Palestina, o Líbano, com a guerra global de julho de 2006, executada pelos israelenses.
A hegemonia e a dominação dos Estados Unidos atingiu recentemente níveis perigosos, sobretudo a partir da última década do século 20 e ainda hoje, de modo ascendente após a queda da União Soviética, uma oportunidade histórica para a hegemonia americana de liderar o mundo, em nome da responsabilidade histórica, e de impor a ideia de que não há distinção entre os interesses do mundo e os interesses americanos.
Esta hegemonia atingiu o seu apogeu com a administração Bush, que exprimiu a sua visão num documento "Projeto do Novo Século Americano", escrito antes das eleições americanas de 2000.
Não é de estranhar nem de surpreender que este documento insista na questão do reforço das capacidades dos EUA em todo o mundo, através duma política estratégica fundada no reforço das capacidades militares. Estas últimas já não são uma força de dissuasão, mas também uma força de intervenção, tanto para efetuar ataques "preventivos" para fins "terapêuticos", como para tratar das crises depois de estas se produzirem.
A administração Bush considerou os acontecimentos do 11 de Setembro de 2001, como uma ocasião para realizar essa visão, através do slogan da "guerra mundial contra o terrorismo" e esta administração trabalhou da forma seguinte:
1 – militarização da política externa e
das suas relações diplomáticas.
2 – evitar depender dos enquadramentos multilaterais e monopolizar a
tomada de decisões estratégicas e a coordenação, em caso de necessidade,
com os aliados que podem ser convocados.
3 – resolver rapidamente a guerra no Afeganistão para se preparar para a
etapa seguinte, ou seja: controle do Iraque, que servirá de ponte
principal para o estabelecimento de um novo Oriente Médio em ligação com
as exigências do mundo após o 11 de Setembro. Esta administração não
hesitou em recorrer a todos os métodos de camuflagem, de enganos e de
mentiras desavergonhadas para justificar as guerras, em especial a
guerra no Iraque, contra todos os que resistem aos seus neo-países
coloniais.
O "terrorismo" serviu de argumento para a dominação americana através de diversos meios: processos judiciais, prisão e detenção arbitrárias, ausência dos elementos mais fundamentais de um processo justo, como se verificou nos locais de detenção de "Guantânamo", intervenção direta na soberania dos Estados, desencadear guerras destrutivas e devastadoras sem distinguir o inocente do culpado, nem entre crianças e adultos, entre mulheres e jovens…
O preço humano das guerras americanas contra o terrorismo já ultrapassou o número de milhões de pessoas, sem contar com a destruição das infra-estruturas, e também o desmantelamento da estrutura e dos componentes das próprias comunidades.
Não há a menor dúvida de que o terrorismo americano está na origem de todo o terrorismo mundial, e de que a administração Bush tornou os Estados Unidos numa ameaça para o mundo inteiro, a todos os níveis. Se, atualmente, se fizesse uma pesquisa da opinião mundial, os Estados Unidos apareceriam como o país mais odiado do mundo.
O fracasso sofrido pela guerra no Iraque e a situação evolutiva da resistência, o fracasso da alegada "guerra contra o terrorismo", especialmente no Afeganistão, onde se assiste ao regresso em força do movimento dos talibãs e ao reconhecimento do seu papel procurando entrar em acordos com eles, assim como o fracasso da guerra americana contra a resistência no Líbano e na Palestina, através da ocupação israelense, tudo isso atingiu violentamente o prestígio americano a nível internacional, provocando um recuo estratégico na sua capacidade de ação.
No entanto, isso não significa que os Estados Unidos se vão retirar de cena facilmente, mas farão tudo o que for necessário para proteger o que eles chamam os seus "interesses estratégicos", porque os políticos que pretendem promover a hegemonia americana, os projetos ideológicos, alimentados por tendências extremistas aliadas à componente militar, não conhecem limites para a cupidez e as suas ambições.
A nossa região e a hegemonia americana
Os mundos árabe e muçulmano têm estado sujeitos durante séculos, a guerras coloniais brutais e sem fim, a começar pela implantação da entidade sionista na região, no quadro duma fragmentação da região em entidades contraditórias.
Atingimos o apogeu desta fase com os Estados Unidos que herdaram o antigo colonialismo na região.
O objetivo central do controle americano dos povos em todas as suas formas é político, econômico, cultural e a pilhagem dos seus recursos, em especial a pilhagem das riquezas petrolíferas é um meio de controle do Presidente da economia mundial.
Para atingir os seus objetivos políticos, os Estados Unidos aperfeiçoaram estratégias de ação, nomeadamente:
1 – fornecer todos os meios para
garantir a estabilidade da entidade sionista, que á a base avançada do
projeto imperialista americano na região, e sustentar totalmente essa
entidade, fornecer-lhe uma rede de segurança para a sua existência, para
que ela possa cumprir o seu papel de tiróide cancerígena na região;
2 – minar os direitos culturais dos nossos povos e trabalhar para
enfraquecer a sua moral através dos meios de comunicação sem esquecer a
guerra psicológica para afetar os valores e os símbolos da resistência;
3 – sustentar os regimes tirânicos dependentes dos Estados Unidos na
região;
4 – posicionamento de bases militares que são articulações necessárias
para apoio das guerras;
5 – impedir toda e qualquer rebelião na região que permita o acesso ao
poder e ao progresso, ou desempenhar um papel histórico no mundo;
6 – semear a discórdia e as divisões de todo o tipo, em especial os
conflitos sectários entre muçulmanos, para a produção de conflitos civis
internos intermináveis.
Não há a menor dúvida de que se trata duma confrontação difícil e delicada, uma batalha de gerações. A nossa experiência no Líbano já demonstrou que dificuldade não significa impossibilidade.
Isto é verdade verticalmente através da história e também horizontalmente através das nossas extensões geográficas e geopolíticas.
A arrogância americana não deixou aos nossos povos senão a escolha da resistência, a escolha para uma vida melhor, para o futuro do Homem, um futuro regido por relações de fraternidade e de solidariedade na diversidade, um mundo de paz e de harmonia, conforme previsto pelo movimento dos nossos profetas e dos reformadores através da história.
O Líbano
O Líbano é a nossa pátria, a dos nossos pais e dos nossos avós, e é também a pátria dos seus filhos e netos e de todas as gerações que se seguem.
Rejeitamos toda a forma de partição ou de "federalização" explícita ou disfarçada. Queremos uma pátria livre, soberana e independente, generosa, poderosa, capaz, presente nas equações da região, e contribuinte chave no presente e no futuro, como sempre o foi na fabricação da história.
a) A resistência
"Israel" representa uma ameaça constante para o Líbano, um modelo de coexistência entre os fieis das religiões divinas e que é contrariado pela presença duma entidade racista: a entidade sionista. Além disso, a existência do Líbano na fronteira da Palestina ocupada, impõe que ele assuma responsabilidades nacionais e patrióticas.
A ameaça israelense começou a fazer-se sentir neste país desde que a entidade sionista foi implantada na Palestina; essa entidade não hesitou em divulgar as suas ambições de anexar o Líbano, de se apoderar das suas riquezas, principalmente as minerais, e tentou concretizar essas ambições progressivamente.
Essa entidade desencadeou uma série criminosa de agressões contra o país desde 1948: o massacre de Houla em 1949, a agressão ao aeroporto internacional de Beirute em 1968… a ocupação de 1982, etc.
Tudo isso foi totalmente apoiado pelos Estados Unidos da América, e em certa medida ignorado pela "comunidade internacional" e pelas instituições internacionais, tornando-as de fato cúmplices do agressor, sem esquecer o silêncio dos árabes, a ausência duma verdadeira autoridade libanesa no Líbano, que abandonou o país e o povo aos massacres e às pilhagens perpetradas pela ocupação israelense.
Perante esta tragédia nacional, o sofrimento da população e o sentimento de abandono pelo mundo levaram os libaneses fieis à sua pátria a recorrer ao seu direito de resistência, que é um dever nacional moral e religioso: a resistência popular armada nasceu assim para enfrentar o perigo sionista que ameaça a sua vida, os seus meios de subsistência e o seu futuro.
Em circunstâncias tão difíceis, o Estado libanês começou a recuperar a sua soberania através da resistência armada, a reencontrar o seu poder de decidir politicamente, um poder que a ocupação israelense tentara roubar-lhe, a resistência serviu de prelúdio à restauração do Estado e das suas instituições e, sobretudo, ao restabelecimento dos valores nacionais: a soberania da pátria e a dignidade, dando à liberdade a sua verdadeira dimensão.
A partir daí, esses valores deixaram de ser apenas um slogan, mas foram consagrados pela resistência para libertar os nossos territórios e recuperar os nossos direitos e são a pedra angular para um Líbano moderno, que recuperou o seu lugar no mapa do mundo como país respeitado e orgulhoso dos seus filhos que pertencem a uma pátria que luta pela liberdade, pela cultura, pela ciência, pela diversidade e pelo dinamismo, uma pátria de dignidade, de sacrifício e de heroísmo.
A retirada das forças de ocupação israelenses no ano 2000 e a vitória histórica na guerra de Julho de 2006, serviram de modelo de defesa e de resistência da pátria, a experiência transformou-se numa escola em proveito dos povos e das nações oprimidas.
A resistência nacional conseguiu, com o apoio do povo e do exército nacional, infligir uma derrota histórica a "Israel", os três em conjunto ofereceram uma base para uma nova fase na região, a partir de agora desempenham um papel central na função de dissuasão do inimigo garantindo a proteção da independência nacional, da soberania e da defesa do seu povo.
Ora, dada a ausência de um Estado forte, dado o desequilíbrio das forças entre o Estado e o inimigo, dada a ameaça permanente das forças israelenses, o Líbano tem que consagrar uma fórmula mista baseada numa aliança entre uma resistência popular que participe na defesa do país contra qualquer invasão israelense, e o exército nacional que deve proteger a pátria e garantir-lhe a sua segurança e a sua estabilidade.
Esta fórmula deve ser desenvolvida no seio duma estratégia de defesa nacional, que servirá de cobertura de segurança para o Líbano, após o fracasso de outras propostas internacionais ou árabes.
A escolha da resistência permitiu a libertação do território do Líbano, o restabelecimento das instituições estatais, a proteção da soberania e a realização duma verdadeira independência.
O êxito da experiência da resistência, o fracasso de todas as guerras para a eliminar, e a permanência da ameaça israelense no Líbano – e não o desaparecimento dessa ameaça – levam a resistência a prosseguir sem descanso na sua missão, a reforçar as suas capacidades militares, para poder participar na tarefa de libertar o que falta dos nossos territórios ainda ocupados, recuperar detidos e pessoas desaparecidas e os corpos dos mártires, e participar na missão de defesa e proteção do nosso país.
b) O Estado e o sistema político
O principal problema no sistema político libanês, que impede a reforma e o desenvolvimento e que está permanentemente na ordem do dia, é o confessionalismo político. O sistema foi estabelecido numa base confessional, o que é um obstáculo à realização da verdadeira democracia, a que abre a porta a uma boa repartição dos poderes políticos. Por consequência, a condição para a aplicação duma verdadeira democracia deste gênero é a abolição do confessionalismo político do sistema, que está inscrito no texto dos "Acordos de Taëf" e a necessidade de formar uma comissão nacional para o fazer.
Ora, enquanto os libaneses não atingirem este objetivo através do diálogo nacional – falamos da abolição do confessionalismo político – e também enquanto subsistir o sistema político baseado em linhas sectárias, a democracia consensual mantém-se a base fundamental para a governação no Líbano, porque é ela a encarnação real do espírito da constituição e a essência da Carta da coexistência.
Daí que toda a abordagem das questões nacionais pela maioria e pela minoria deve ser realizada de acordo com as condições históricas e sociais do exercício da democracia efectiva na qual o cidadão constitui um valor em si mesmo.
A democracia consensual é uma fórmula política que exige uma verdadeira participação de todos, o fator de confiança é primordial entre os componentes do país.
O Estado que queremos e que exigimos resume-se a:
1 – um Estado que permita preservar as
liberdades públicas e fornecer todo o ambiente apropriado ao seu
exercício;
2 – um Estado baseado na unidade nacional e na coesão nacional;
3 – um Estado capaz de proteger o território e o povo e a soberania e a
independência, e que disponha de um exército nacional forte, devidamente
equipado, com instituições de segurança eficazes, e que defende a
segurança das pessoas e dos interesses;
4 – um Estado com instituições modernas com atores e colaboradores, com
poderes e funções claras e precisas;
5 – um Estado que aplique as leis a toda a gente no quadro do respeito
das liberdades públicas e da justiça quanto aos direitos e aos deveres
dos cidadãos, independentemente das suas seitas e regiões.
6 – um Estado que goze duma representação adequada, o que só pode ser
realizado corretamente por uma lei eleitoral moderna que permita aos
eleitores escolher os seus representantes libaneses na ausência do
controle do dinheiro e de diferentes pressões a fim de obter a maior
representação possível dos diversos segmentos do povo libanês;
7 – um Estado que se apoie em competências científicas altamente
qualificadas do seu povo, que coloque mecanismos sólidos e eficazes para
limpar a administração da corrupção:
8 – um Estado em que haja uma autoridade judiciária forte, independente e
livre de qualquer controle político, exercida por juízes de reputação
imparcial;
9 – um Estado que goze duma economia baseada nos seus setores
produtivos, nos setores da agricultura e da indústria, reforçada por
planejamento e programas de apoio de primeiro plano para melhorar a
produção e oferecer possibilidades de emprego, especialmente nas zonas
rurais;
10 – um Estado que aplique o princípio de desenvolvimento equilibrado
entre as regiões, esforçando-se por preencher o fosso entre as políticas
econômicas e sociais;
11 – um Estado que se preocupe com o interesse dos seus cidadãos e que
forneça os serviços apropriados à sua instrução, aos cuidados médicos e à
habitação para ter uma vida decente, um Estado que se dedique a atacar o
problema da pobreza e a fornecer possibilidades de emprego;
12 – um Estado que se preocupe com as novas gerações, que ajude a
desenvolver os seus talentos e as suas energias e a orientá-las para os
objetivos da ajuda humanitária a nível nacional e as protegerá dos
desvios e dos vícios;
13 – um Estado determinado a reforçar o papel das mulheres e a reforçar a
sua participação em todas as áreas;
14 – um Estado que dê importância à educação nacional, reforçando as
escolas públicas e a Universidade libanesa a todos os níveis, assim como
a instituição do ensino primário obrigatório e gratuito para toda a
gente;
15 – um Estado que instaure um sistema administrativo descentralizado a
fim de promover as possibilidades de desenvolvimento e de facilitar os
negócios e as transações dos cidadãos, sem permitir que a
descentralização administrativa se transforme posteriormente em
"federalização";
16 – um Estado que trave o êxodo da pátria, a migração dos jovens e das
famílias e a fuga dos cérebros;
17 – um Estado que apadrinhe os cidadãos expatriados em todos os cantos
do mundo, que os defenda, que os proteja, que beneficie da sua situação
ao serviço das questões nacionais.
c) O Líbano e as relações palestinas
Uma das trágicas consequências da implantação da entidade sionista no território da Palestina é a deslocação dos seus habitantes, o problema dos refugiados palestinos que se refugiaram no Líbano e que esperam regressar aos seus lares de onde foram expulsos.
O sofrimento dos refugiados palestinos no Líbano não está limitado à dor das migrações forçadas e também às agressões e aos massacres israelenses, como o que aconteceu no campo de Nabatiyeh, mas o seu sofrimento também decorre da situação econômica e social catastrófica dos campos, onde não está assegurado o mínimo para uma vida decente, onde estão privados de direitos civis e sociais, tudo isto por causa da indiferença dos sucessivos governos libaneses em cumprir as suas obrigações para com eles.
Este fato não é normal e é agora imperativo que as autoridades libanesas assumam as suas responsabilidades, é necessário estabelecer relações libano-palestinas sólidas e ter em conta os interesses comuns dos dois povos, não manter esta relação regulada pelos caprichos e pelos humores, e os cálculos políticos internos ou as ingerências internacionais.
Isto é possível de realizar, nomeadamente através:
1. de um diálogo direto
libano-palestino;
2. os palestinos no Líbano devem acordar um padrão de referência para os
representar neste diálogo e contornar as divergências na situação
palestina em geral;
3. dar aos palestinos os seus direitos civis e sociais e preservar a sua
personalidade, a sua identidade e a sua causa.
4. defender o seu direito de regresso e recusar toda a naturalização.
A identidade árabe do Líbano e a sua pertença árabe são inerentes à composição da comunidade libanesa.
A geopolítica regional e as políticas estratégicas regionais, os interesses nacionais, esses determinantes da estratégia política do Líbano, atribuem-lhe a necessidade de respeitar as causas árabes justas, nomeadamente a questão da Palestina e o conflito com o inimigo israelense.
O desenvolvimento da escola assente na luta contra os conflitos políticos, na prevenção de qualquer forma de discórdia, é uma opção que devia ser adotada no tratamento das questões árabes, assim como a procura de pontos comuns a fim de realizar uma verdadeira solidariedade para resolver as nossas questões.
Aqui, a escolha da resistência é uma necessidade fundamental para reposicionar a posição árabe e enfraquecer o inimigo, qualquer que seja a natureza das estratégias políticas ou os preconceitos.
Neste contexto, a Síria registrou uma atitude histórica e inabalável na luta contra o inimigo israelense, apoiou os movimentos de resistência na região, manteve-se ao nosso lado apesar das circunstâncias muito difíceis, procurou unificar os esforços árabes a fim de garantir os interesses da região e enfrentar os desafios.
Sublinhamos a necessidade de respeitar as relações excepcionais entre o Líbano e a Síria enquanto necessidade política, de segurança e econômica ditada pelos interesses dos dois países e dos dois povos, e também pelos imperativos da geopolítica e das exigências para a estabilidade do Líbano, ou mesmo para enfrentar os desafios comuns. Apelamos para que se ponha fim a todos os sentimentos negativos que têm manchado as relações bilaterais no decurso dos últimos anos e o regresso a relações normais logo que possível.
O Líbano e as relações islâmicas
O nosso mundo árabe e muçulmano confronta-se com desafios que afetam a composição diversificada das nossas sociedades o que exige uma tolerância zero a este respeito.
A escalada das tensões sectárias, especialmente entre sunitas e xiitas, a criação de contradições nacionais entre os curdos, os turcomanos e os árabes e os iranianos. A imigração das minorias da nossa região, em especial as minorias cristãs na Palestina, no Iraque, no Líbano, ameaça a coesão das nossas sociedades e impedem o desenvolvimento.
Ora, a diversidade religiosa e étnica, em vez de ser uma fonte de riqueza, tem vindo a ser utilizada como uma arma para destroçar a nação árabe.
O Hezbolá confirma a importância da cooperação entre os países islâmicos em todas as áreas, o que lhe garante a força da solidariedade frente a regimes arrogantes, a proteção da invasão cultural da comunidade e encoraja-os a tirar partido dos seus recursos na troca das diferentes prestações entre esses países.
Neste contexto, o Hezbolá considera que o Irã islâmico é um Estado importante no mundo muçulmano, a sua revolução conseguiu desenraizar o regime do Xá e frustrar os projetos do sionismo. O Irã apoiou os movimentos de resistência na nossa região e defende com coragem e determinação as questões árabes e islâmicas, em especial a questão palestina.
A política da República Islâmica do Irã é clara e coerente ao apoiar a questão central dos árabes e dos muçulmanos: a questão palestina.
Ao anunciar a vitória da revolução islâmica chefiada pelo Imame Khomeini, o Irã abriu uma embaixada palestina em substituição da embaixada de Israel, e manteve esse apoio sob todas as formas até hoje sob a direção do Imame Khamenei, que conquistou importantes vitórias pela primeira vez na história do conflito com os invasores sionistas.
A fabricação de contradições com a República Islâmica do Irã por determinados partidos árabes é um desafio para os árabes e só beneficiam "Israel" e os Estados Unidos da América.
O Irã, que redigiu a sua ideologia política, e construiu a sua política sobre "a centralidade da questão palestina", a luta contra "Israel" e a hegemonia americana, a integração no mundo árabe e no ambiente islâmico, deve ser tratado na base da vontade de cooperação e de fraternidade, no reconhecimento que ele é um centro de gravidade estratégico, atualmente o modelo de independência do projeto árabe da independência islâmica e uma força com que podem contar vários países e povos.
Lembramos a importância da unidade entre muçulmanos, de desconfiar de quem provoca a distinção entre eles, sobretudo as dissenções sectárias entre sunitas e xiitas, contamos com a consciência dos povos muçulmanos na luta contra o que se conspira contra eles.
A Palestina e as negociações de regulamento
Em primeiro lugar a questão da Palestina e a entidade sionista
A implantação da entidade sionista desde a agressão da Palestina e a deslocação dos seus habitantes em 1948, sob os auspícios e o apoio das potências internacionais hegemônicas da época, é uma ameaça direta e grave em toda a região árabe e uma verdadeira ameaça para a sua segurança e estabilidade, na medida em que ela não reaja.
O crime contra a humanidade praticado pelo Ocidente é a implantação desta entidade estranha no coração do mundo árabe e muçulmano, hostil, uma base do controle e da hegemonia nesta região em especial.
O movimento sionista é um movimento racista no pensamento e na prática. Além disso, a entidade continuou durante toda a ocupação os massacres e o terrorismo, com o apoio e os desvelos das potências colonialistas, em especial, dos Estados Unidos da América, o seu verdadeiro parceiro em todas as suas guerras e massacres e práticas do terrorismo.
Esta entidade é uma entidade usurpadora artificial, não é viável.
A responsabilidade histórica que compete à nação é de não a reconhecer, quaisquer que sejam as pressões e os desafios e continuar a trabalhar pela libertação de todos os territórios usurpados e restabelecer os direitos usurpados de toda a gente, independentemente do tempo que levar e dos sacrifícios que houver que fazer.
Jerusalém e a mesquita Al Aqsa
Todo o mundo está ao corrente do caráter sagrado de Jerusalém e da mesquita Al Aqsa, a primeira Qibla e o terceiro lugar santo, o ponto dos profetas e dos apóstolos (rezaram pela humanidade de Deus); ninguém nega a profundidade da sua relação com o Islão como um dos símbolos islâmicos mais importantes sobre a terra.
E a cidade de Jerusalém, o berço dos locais santos islâmicos e cristãos, goza de grande prestígio entre muçulmanos e cristãos.
A ocupação israelense continua a judaicizar a cidade santa através da expulsão do seu povo e da confisco das suas casas e dos seus bens, da construção de colônias judias e do muro do apartheid.
Os graves ataques incessantes e repetidos a Al-Aqsa fazem parte do plano da sua destruição, são uma ameaça grave e real à sua existência, a sua sobrevivência corre o risco de provocar repercussões em toda a região.
O nosso dever é apoiar a libertação de Jerusalém e defender Al-Aqsa, é um dever religioso, uma responsabilidade ética para todos os povos livres do mundo inteiro.
Convidamos e apelamos aos árabes e aos muçulmanos, e a todos os países que desejam a paz e a estabilidade no mundo, que desenvolvam esforços para libertar Jerusalém da ocupação sionista e para manter a sua verdadeira identidade e os lugares santos islâmicos e cristãos.
Em terceiro lugar: a resistência palestina
O povo palestino trava uma batalha de auto-defesa para recuperar os seus direitos nacionais legítimos na Palestina, exerce um direito legítimo reconhecido pelas mensagens celestes, pelas leis internacionais e pelos valores da humanidade.
Este direito inclui todas as formas de resistência – primeiro e acima de tudo a luta armada – e todos os meios que as facções da resistência palestina possam utilizar, tendo em conta o desequilíbrio das forças a favor do inimigo sionista que possui as mais modernas armas de destruição.
A experiência demonstrou q importância e a eficácia da opção da resistência e da luta armada frente à agressão com vista à libertação dos territórios para repor os direitos e conseguir instaurar um novo equilíbrio de forças.
A guerra de Julho de 2006 e a guerra de Gaza são disso provas reais…
Se é este o ponto da existência no Líbano e na Palestina, qual é a praticabilidade da negociação de opções Altswoi? Quais são os resultados, os interesses e os ganhos realizados pelas negociações em todas as fases e em todos os acordos obtidos? Não serão maior arrogância e hegemonia e intransigência israelense e mais ganhos dos interesses e das condições israelenses?
Enquanto afirmamos para o povo palestino e para a questão palestina, de se agarrarem à história, geográfica e política, declaramos clara e firmemente o nosso apoio ao povo palestino e aos movimentos de resistência palestina e à sua luta contra o projeto israelense.
Em quarto lugar: as negociações do regulamento
A nossa posição quanto ao processo de regulamento desde os acordos de Madrid aos Acordos de Oslo e, antes destes, os de "Camp David" e aos seus anexos, é a rejeição total da opção de um regulamento com a entidade sionista, com base no reconhecimento da legitimidade da sua existência e no abandono do território da Palestina.
Esta posição é fixa, permanente e definitiva, não negociável, mesmo que o mundo inteiro reconheça "Israel".
Deste ponto de vista, duma posição de fraternidade, de responsabilidade, apelamos aos dirigentes árabes para reconsiderar a possibilidade de negociações e reexaminar os resultados dos acordos assinados com o inimigo sionista.
A entidade sionista demonstrou durante todas as etapas das negociações que não pretende a paz, que utiliza as negociações para impor condições e proteger os seus interesses…
Por consequência, convidamos, desejamos e esperamos que todos os árabes e todos os muçulmanos se reúnam em volta da Palestina e de Jerusalém para a libertar da contaminação da ocupação sionista, suprir todas as necessidades de apoio necessárias para reforçar a resistência do povo palestino e permitir que ele prossiga a resistência e rejeite todos os projetos de normalização com o inimigo sionista, faça respeitar o direito de regresso de todos os refugiados palestinos às suas terras e às suas casas de onde foram expulsos.
Conclusão
É esta a nossa visão, ao elaborá-la esforçamo-nos por manter presente que somos os alunos da Justiça.
O nosso compromisso é defender o direito e a justiça, prontos a sacrificarmo-nos para os defender.
Através da ação, esperamos apenas a satisfação do nosso Criador, o Senhor dos céus e da terra, e esperamos para o nosso povo e para a nossa nação o bem-estar e a felicidade neste mundo e no além…
Fizemos a promessa, a ti Senhor, e a todos os oprimidos, de nos mantermos honestos para com o Pacto, de esperar pela Promessa e de sermos inabaláveis na Via que escolhemos.
* G.Houbballah é analista político do jornal libanês Al Manar
Este texto foi publicado em:
www.almanar.com.lb/newsSite/News.aspx?language=en
Tradução de Margarida Ferreira para o site ODiario.Info
Fonte: www.vermelho.org.br
sexta-feira, 23 de abril de 2010
Adeus Mendes, sem saudades...
Leandro Fortes: A Idade Mendes
por Leandro Fortes, no Brasília, eu vi
No fim das contas, a função primordial do ministro Gilmar Mendes à
frente do Supremo Tribunal Federal foi a de produzir noticiário e
manchetes para a falange conservadora que tomou conta de grande parte
dos veículos de comunicação do Brasil. De forma premeditada e com muita
astúcia, Mendes conseguiu fazer com que a velha mídia nacional
gravitasse em torno dele, apenas com a promessa de intervir, como de
fato interveio, nas ações de governo que ameaçavam a rotina, o conforto e
as atividades empresariais da nossa elite colonial. Nesse aspecto, os
dois habeas corpus concedidos ao banqueiro Daniel Dantas, flagrado no
mesmo crime que manteve o ex-governador do Distrito Federal José Roberto
Arruda no cárcere por 60 dias, foram nada mais que um cartão de
visitas. Mais relevante do que tudo foi a capacidade de Gilmar Mendes
fixar na pauta e nos editoriais da velha mídia a tese quase infantil da
existência de um Estado policialesco levado a cabo pela Polícia Federal
e, com isso, justificar, dali para frente, a mais temerária das gestões
da Suprema Corte do País desde sua criação, há mais cem anos.
Num prazo de pouco menos de dois anos, Mendes politizou as ações do
Judiciário pelo viés da extrema direita, coisa que não se viu nem
durante a ditadura militar (1964-1985), época em que a Justiça andava de
joelhos, mas dela não se exigia protagonismo algum. Assim, alinhou-se o
ministro tanto aos interesses dos latifundiários, aos quais defende sem
pudor algum, como aos dos torturadores do regime dos generais, ao se
posicionar publicamente contra a revisão da Lei da Anistia, de cuja à
apreciação no STF ele se esquivou, herança deixada a céu aberto para o
novo presidente do tribunal, ministro Cezar Peluso. Para Mendes, tal
revisão poderá levar o País a uma convulsão social. É uma tese tão
sólida como o conto da escuta telefônica, fábula jornalística que teve o
presidente do STF como personagem principal a dialogar canduras com o
senador Demóstenes Torres, do DEM de Goiás.
A farsa do grampo, publicada pela revista Veja e repercutida, em
série, por veículos co-irmãos, serviu para derrubar o delegado Paulo
Lacerda do comando da PF, com o auxílio luxuoso do ministro da Defesa,
Nelson Jobim, que se valeu de uma mentira para tal. E essa, não se
enganem, foi a verdadeira missão a ser cumprida. Na aposentadoria, o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá tempo para refletir e
registrar essa história amarga em suas memórias: o dia em que, chamado
“às falas” por Gilmar Mendes, não só se submeteu como aceitou mandar
para o degredo, em Portugal, o melhor e mais importante diretor geral
que a Polícia Federal brasileira já teve. O fez para fugir de um
enfrentamento necessário e, por isso mesmo, aceitou ser derrotado.
Aliás, creio, a única verdadeira derrota do governo Lula foi exatamente a
de abrir mão da política de combate permanente à corrupção desencadeada
por Lacerda na PF para satisfazer os interesses de grupos vinculados às
vontades de Gilmar Mendes.
O presidente do STF deu centenas de entrevistas sobre os mais
diversos assuntos, sobretudo aqueles sobre os quais não poderia, como
juiz, jamais se pronunciar fora dos autos. Essa é, inclusive, a mais
grave distorção do sistema de escolha dos nomes ao STF, a de colocar
não-juízes, como Mendes, na Suprema Corte, para julgar as grandes
questões constitucionais da nação. Alheio ao cargo que ocupava (ou
ciente até demais), o ministro versou sobre tudo e sobre todos. Deu
força e fé pública a teses as mais conservadoras. Foi um arauto dos
fazendeiros, dos banqueiros, da guarda pretoriana da ditadura militar e
da velha mídia. Em troca, colheu farto material favorável a ele no
noticiário, um relicário de elogios e textos laudatórios sobre sua luta
contra o Estado policial, os juízes de primeira instância, o Ministério
Público e os movimentos sociais, entre outros moinhos de vento vendidos
nos jornais como inimigos da democracia.
Na imprensa nacional, apenas CartaCapital, por meio de duas
reportagens (“O empresário Gilmar” e “Nos rincões de Mendes”), teve
coragem de se contrapor ao culto à personalidade de Mendes instalado nas
redações brasileiras como regra de jornalismo. Por essa razão, somos,
eu e a revista, processados pelo ministro. Acusa-nos, o magistrado, de
má fé ao divulgar os dados contábeis do Instituto Brasiliense de Direito
Público (IDP), uma academia de cursinhos jurídicos da qual Mendes é
sócio. Trata-se de instituição construída com dinheiro do Banco do
Brasil, sobre terreno público praticamente doado pelo ex-governador do
DF Joaquim Roriz e mantido às custas de contratos milionários fechados,
sem licitação, com órgãos da União.
Assim, a figura de Gilmar Mendes, além de tudo, está inserida
eternamente em um dos piores momentos do jornalismo brasileiro. E não
apenas por ter sido o algoz do fim da obrigatoriedade do diploma para se
exercer a profissão, mas, antes de tudo, por ter dado enorme
visibilidade a maus jornalistas e, pior ainda, fazer deles, em algum
momento, um exemplo servil de comportamento a ser seguido como condição
primordial de crescimento na carreira. Foi dessa simbiose fatal que
nasceu não apenas a farsa do grampo, mas toda a estrutura de comunicação
e de relação com a imprensa do STF, no sombrio período da Idade Mendes.
Emblemática sobre essa relação foi uma nota do informe digital
“Jornalistas & Companhia”, de abril de 2009, sobre o aniversário do
publicitário Renato Parente, assessor de imprensa de Gilmar Mendes no
STF (os grifos são originais):
“A festa de aniversário de 45 anos de Renato Parente, chefe do
Serviço de Imprensa do STF (e que teve um papel importante na construção
da TV Justiça, apontada como paradigma na área da tevê pública),
realizada na tarde do último domingo (19/4), em Brasília, mostrou a
importância que o Judiciário tem hoje no cenário nacional. Estiveram
presentes, entre outros, a diretora da Globo, Sílvia Faria, a colunista
Mônica Bergamo, e o próprio presidente do STF, Gilmar Mendes, entre
outros.”
Olha, quando festa de aniversário de assessor de imprensa serve para
mostrar a importância do Poder Judiciário, é sinal de que há algo muito
errado com a instituição. Essa relação de Renato Parente com
celebridades da mídia é, em todos os sentidos, o pior sintoma da doença
incestuosa que obriga jornalistas de boa e má reputação a se misturarem,
em Brasília, em cerimônias de beija-mão de caráter duvidoso. Foi, como
se sabe, um convescote de sintonia editorial. Renato Parente é o chefe
da assessoria que, em março de 2009, em nome de Gilmar Mendes, chamou o
presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), às falas, para
que um debate da TV Câmara fosse retirado do ar e da internet. Motivo:
eu critiquei o posicionamento do presidente do STF sobre a Operação
Satiagraha e fiz justiça ao trabalho do delegado federal Protógenes
Queiroz, além de citar a coragem do juiz Fausto De Sanctis ao mandar
prender, por duas vezes, o banqueiro Daniel Dantas.
Certamente em consonância com o “paradigma na área de tevê pública”
da TV Justiça tocada por Renato Parente, a censura na Câmara foi feita
com a conivência de um jornalista, Beto Seabra, diretor da TV Câmara,
que ainda foi mais além: anunciou que as pautas do programa “Comitê de
Imprensa”, a partir dali, seriam monitoradas. Um vexame total. Denunciei
em carta aberta aos jornalistas e em todas as instâncias corporativas
(sindicatos, Fenaj e ABI) o ato de censura e, com a ajuda de diversos
blogs, consegui expor aquela infâmia, até que, cobrada publicamente, a
TV Câmara foi obrigada a capitular e recolocar o programa no ar, ao
menos na internet. Foi uma das grandes vitórias da blogosfera, até
então, haja vista nem um único jornal, rádio ou emissora de tevê, mesmo
diante de um gravíssimo caso de censura e restrição de liberdade de
expressão e imprensa, ter tido coragem de tratar do assunto. No
particular, no entanto, recebi centenas de e-mails e telefonemas de
solidariedade de jornalistas de todo o país.
Não deixa de ser irônico que, às vésperas de deixar a presidência do
STF, Gilmar Mendes tenha sido obrigado, na certa, inadvertidamente, a se
submeter ao constrangimento de ver sua gestão resumida ao caso Daniel
Dantas, durante entrevista no youtube. Como foi administrada pelo
Google, e não pelo paradigma da TV Justiça, a sabatina acabou por
destruir o resto de estratégia ainda imaginada por Mendes para tentar
passar à história como o salvador da pátria ameaçada pelo Estado
policial da PF. Ninguém sequer tocou nesse assunto, diga-se de passagem.
As pessoas só queriam saber dos HCs a Daniel Dantas, do descrédito do
Judiciário e da atuação dele e da família na política de Diamantino,
terra natal dos Mendes, em Mato Grosso. Como último recurso, a
assessoria do ministro ainda tentou tirar o vídeo de circulação, ao
menos no site do STF, dentro do sofisticado e democrático paradigma de
tevê pública bolado por Renato Parente.
Como derradeiro esforço, nos últimos dias de reinado, Mendes
dedicou-se a dar entrevistas para tentar, ainda como estratégia,
vincular o próprio nome aos bons resultados obtidos por ações do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ), embora o mérito sequer tenha sido
dele, mas de um juiz de carreira, Gilson Dipp. Ministro do Superior
Tribunal de Justiça e corregedor do órgão, Dipp foi nomeado para o cargo
pelo presidente Lula, longe da vontade de Gilmar Mendes. Graças ao
ministro do STJ, foi feita a maior e mais importante devassa nos
tribunais de Justiça do Brasil, até então antros estaduais intocáveis
comandados, em muitos casos, por verdadeiras quadrilhas de toga.
É de Gilson Dipp, portanto, e não de Gilmar Mendes, o verdadeiro
registro moralizador do Judiciário desse período, a Idade Mendes, de
resto, de triste memória nacional.
Mas que, felizmente, se encerra hoje.
O velho Bang Bang visto sob outro prisma...
ERA
UMA VEZ A REVOLUÇÃO
Por Celso Lungaretti
Um dos gêneros cinematográficos que mais falou da
revolução para platéias amplas foi o western italiano. Poucos, hoje,
sabem disso.
Nascido em meados da década de 1960, o spaghetti-western foi também muito caro para a minha geração noutro aspecto: lavou a alma de todos que gostávamos dos bangue-bangues, mas não da caretice dos estadunidenses.
Teve
surpreendente sucesso nas bilheterias: O
Dólar Furado (1), p. ex., chegou a ficar em cartaz durante cerca
de um ano num cinema de São Paulo. Isto se deveu não só a ter ocupado
um espaço vazio, já que os norte-americanos haviam deixado de fazer
westerns, como também a haver trazido um novo enfoque e uma nova moldura
para o gênero.Nascido em meados da década de 1960, o spaghetti-western foi também muito caro para a minha geração noutro aspecto: lavou a alma de todos que gostávamos dos bangue-bangues, mas não da caretice dos estadunidenses.
Tirando obras de exceção como Matar ou Morrer (2), Sem Lei e Sem Alma (3), O Matador (4), Estigma da Crueldade (5) e Rastros do Ódio (6), os faroestes made in USA de até então tinham o insuportável defeito de tentarem nos impingir aquela ladainha da luta eterna do Bem contra o Mal -- um tédio!
O mocinho não fumava, não bebia, não praguejava e nem trepava. A mocinha era recatada donzela. O xerife, pachorrento mas digno. Os índios, selvagens bestiais que tinham de ser tirados do caminho para não atrapalharem o progresso. Os mexicanos, beberrões subumanos.
Mesmo no mato, conduzindo boiada, o mocinho tinha a decência de manter-se sempre limpo e escanhoado. Bah!
O western italiano surgiu meio por acaso. A indústria cinematográfica italiana conseguira nos anos anteriores faturar uma boa grana com filmes épicos e mitológicos. Hércules, Maciste, Ursus, Golias, fundação de Roma, guerra de Tróia, etc. O filão, entretanto, estava esgotando-se e a Cinecittà saiu à cata de um novo produto.
Sergio Leone, então com 34 anos, tinha começado a carreira no neo-realismo italiano (como assistente de direção e diretor de segunda unidade), mas não conseguira alçar-se à direção. Era difícil abrir um espaço entre mestres como Vittorio De Sica, Lucchino Visconti, Pier Paolo Pasolini, Federico Fellini, Michelangelo Antonioni, etc.
Então, entre atuar eternamente à sombra dos medalhões do cinema de arte ou mostrar seu trabalho no cinema dito comercial, escolheu a segunda opção. Depois de dirigir os épicos Os Últimos Dias de Pompéia (7) e O Colosso de Rodes (8), teve a sorte de estar no lugar certo, no momento exato, para dar o pontapé de partida num novo ciclo.
Adaptou para o Oeste a história de Yojimbo (9), um filme de Akira Kurosawa sobre samurai que açula a discórdia entre dois senhores feudais para prestar-lhes serviço alternadamente, sem que percebam seu jogo duplo. O que Leone fez em Por Um Punhado de Dólares (10), basicamente, foi mudar a ambientação e colocar um pistoleiro caça-prêmios no lugar do samurai.
O protagonista também teve aí seu grande golpe de sorte. Clint Eastwood não emplacara em Hollywood como mocinho, ficando relegado a papéis secundários em séries de TV e a filminhos classe “B” e “C”.
Leone percebeu nele um bom anti-herói. Compôs seu personagem (o Estranho Sem Nome) com barba rala, chapéu sobre os olhos, charuto na boca, fala arrastada e um poncho. Com isto, acabou alçando-o ao estrelato e fazendo jus à homenagem que depois Eastwood lhe prestaria, ao dedicar-lhe sua obra-prima Os Imperdoáveis (11).
O que diferenciou o western italiano foi exatamente ter sido feito por cineastas bem diferentes dos tarefeiros hollywoodescos (os ditos artesãos, que se limitavam ao feijão-com-arroz artístico que lhes garantisse o dito cujo gastronômico).
Damiano Damiani, Carlo Lizzani e Sergio Corbucci eram outros talentos com a cabeça feita pelo cinema de arte, assim como o superlativo roteirista Sergio Donatti (aliás, até os grandes diretores Bernardo Bertolucci e Dario Argento chegaram a escrever história para western).
Então, não se limitaram a realizar filmes com muita ação e nenhuma vida inteligente; fizeram questão de deixar sua marca, passando mensagens cifradas, dando toques, propondo outra abordagem para o gênero.
Em vez de um palco em que o Bem vence sempre o Mal, o bangue-bangue italiano mostrou o velho Oeste como uma terra de ninguém, primitiva e selvagem, em que todos perseguem seus objetivos como podem.
Evidentemente, há muito mais verossimilhança nesse enfoque do que no norte-americano. O Oeste do século 19 seria algo como o garimpo de Serra Pelada no seu apogeu. Um grotão selvagem onde prevalecia a lei do mais forte.
Em vez do herói, o western italiano consagrou o anti-herói: barbudo, desgrenhado, com roupas sinistras, muitas vezes um caça-prêmios, quase sempre um mau-caráter. No fundo, só se diferenciando dos bandidos por agir sozinho enquanto os outros atuam em bando.
Lembrem-se: era a década de 1960, quando havia um imenso desencanto com a ordem estabelecida. Rebeldes eram tudo que queríamos ver. Não suportávamos mais os heroizinhos c.d.f. de Hollywood, daí termos sido imediatamente cativados pela alternativa européia, os Djangos, Sabatas e Sartanas (os únicos mocinhos nos moldes estadunidenses eram os protagonizados por Giuliano Gemma).
E, enquanto os poderosos viraram vilãos, os
índios e os peões mexicanos passaram a ser mostrados como vítimas e
heróis. Afinal, vários cineastas italianos tinham inclinações
revolucionárias, mas não havia nada revolucionário para destacar nos EUA
do século 19.
A solução foi transferir a ação para o efervescente México, como em Quando Explode a Vingança (12), Gringo (13), Reze a Deus e Cave Sua Sepultura (14), Réquiem Para Matar (15), Companheiros (16) e O Dia da Desforra (17).
Toques esquerdistas, sim, eles podiam inserir em filmes ambientados nos EUA:
A solução foi transferir a ação para o efervescente México, como em Quando Explode a Vingança (12), Gringo (13), Reze a Deus e Cave Sua Sepultura (14), Réquiem Para Matar (15), Companheiros (16) e O Dia da Desforra (17).
Toques esquerdistas, sim, eles podiam inserir em filmes ambientados nos EUA:
- o próprio Django (18), no qual os vilãos são flagrantemente inspirados na Ku-Klux-Khan;
- Quando os Brutos Se Defrontam (19), reflexão sobre a gênese de líderes oportunistas;
- O Especialista (20), que coloca jovens rebeldes (referência às barricadas francesas de 1968) em ação no Oeste;
- O Vingador Silencioso (21), denunciando o massacre de Johnson Country, quando centenas de imigrantes eslavos foram dizimados pelos barões de gado do Wyoming – o mesmo episódio histórico que seria depois retratado na superprodução O Portal do Paraíso (22);
- e o extraordinário Três Homens em Conflito (23), com algumas das mais marcantes seqüências antibelicistas do cinema em todos os tempos.
Uma última característica notável foi
libertar a trilha musical da tirania do country. Não mais o que
realmente existia nos EUA do século retrasado, como violões, violinos,
banjos, gaitas e sanfonas, mas também flauta, saxofone, órgão,
sintetizadores, castanholas -- tudo que se harmonizasse com o clima
daquela seqüência, pouco importando se tais instrumentos eram
encontrados ou não no velho Oeste.
Para completar, o uso criativo de sinos, caixas de música, assobios e outros achados. Morricone é, com certeza, o melhor criador de trilhas musicais de todos os tempos.
Para completar, o uso criativo de sinos, caixas de música, assobios e outros achados. Morricone é, com certeza, o melhor criador de trilhas musicais de todos os tempos.
FILMES INESQUECÍVEIS
Quando Explode a Vingança
está entre os melhores filmes do Leone. É, na verdade, o segundo da
trilogia era uma vez, que
inclui Era Uma Vez No Oeste (24)
e Era Uma Vez Na América (25).
Deveria ter-se chamado Era Uma Vez A
Revolução, mas acabou com um título que em italiano significa
"abaixe a cabeça" e, nos EUA, "agache-se, otário!".
Na visão do Leone, os verdadeiros heróis da revolução são os anônimos homens do povo, enquanto os líderes acabam sempre traindo a causa -- seja no México (o médico interpretado por Romolo Valli) ou na Irlanda (o dirigente do IRA que é amigo do John/James Coburn).
Foi feito em 1971, quando os movimentos revolucionários pipocavam na Itália, radicalizando-se progressivamente. Parece expressar o desencanto do Leone com o Partido Comunista Italiano e ser um alerta de que as Brigadas Vermelhas e congêneres teriam destino trágico.
Um lance interessante é mostrar de forma totalmente desumanizada o comandante das forças contra-revolucionárias: ele é visto escovando repulsivamente os dentes, chupando um ovo, olhando pelo binóculo. Leone não lhe concede sequer a dignidade da fala. De sua forma sutil, expressa o desprezo absoluto que tinha pela direita troglodita.
Outra grande sacada do Leone é ressaltar que a História nunca fixa a versão correta dos fatos. A frase que o Irlandês sempre repete, sobre "os grandes e gloriosos heróis da revolução", é um primor de sarcasmo.
Na visão do Leone, os verdadeiros heróis da revolução são os anônimos homens do povo, enquanto os líderes acabam sempre traindo a causa -- seja no México (o médico interpretado por Romolo Valli) ou na Irlanda (o dirigente do IRA que é amigo do John/James Coburn).
Foi feito em 1971, quando os movimentos revolucionários pipocavam na Itália, radicalizando-se progressivamente. Parece expressar o desencanto do Leone com o Partido Comunista Italiano e ser um alerta de que as Brigadas Vermelhas e congêneres teriam destino trágico.
Um lance interessante é mostrar de forma totalmente desumanizada o comandante das forças contra-revolucionárias: ele é visto escovando repulsivamente os dentes, chupando um ovo, olhando pelo binóculo. Leone não lhe concede sequer a dignidade da fala. De sua forma sutil, expressa o desprezo absoluto que tinha pela direita troglodita.
Outra grande sacada do Leone é ressaltar que a História nunca fixa a versão correta dos fatos. A frase que o Irlandês sempre repete, sobre "os grandes e gloriosos heróis da revolução", é um primor de sarcasmo.
* * *
Três Homens em Conflito foi,
claramente, o divisor de águas na carreira de Sergio Leone, o momento
em que ele mostrou ser muito mais do que um (brilhante) artesão.
Até
então, em Por um Punhado de Dólares ele
introduzira a figura do anti-herói no centro da trama; a amoralidade
básica dos tipos e das situações; a apresentação criativa dos letreiros
iniciais, valorizada com vários recursos, inclusive o uso de animação; a
nova concepção musical que Morricone trouxe para os westerns; e um dos
personagens mais emblemáticos do bangue-bangue à italiana, o pistoleiro
oportunista interpretado por Clint Eastwood.
Depois, em Por Uns Dólares a Mais (26), todas essas características foram desenvolvidas e aprimoradas. É um filme muito melhor do que o anterior, mas, paradoxalmente, não apresentou novidades significativas.
A única que vale a pena citar é a colocação de dois personagens em destaque, em vez de um. A partir daí, os filmes de Leone trariam sempre essa dupla de anti-heróis ocupando o espaço dos antigos mocinhos.
Depois dos personagens interpretados por Clint Eastwood/Lee Van Cleef em Por Uns Dólares a Mais, tivemos Clint Eastwood/Eli Walash (Três Homens em Conflito), Charles Bronson/Jason Robards (Era Uma Vez no Oeste), Rod Steiger/James Coburn (Quando Explode a Vingança) e Robert De Niro/James Woods (Era Uma Vez na América).
Aí, finalmente, estava pronto para seu tour-de-force: Três Homens em Conflito foi a obra em que Leone definiu e afirmou seu estilo, embutindo no cinema de ação discussões mais profundas, sem prejuízo do entretenimento propriamente dito. É um tipo de obra em camadas. De acordo com sua sensibilidade, o espectador pode se divertir apenas com o básico ou captar os muitos toques subjacentes.
E é grandiosa a crítica que Leone fez ao belicismo, com algumas das seqüências mais comoventes que o cinema já apresentou: o oficial bêbado sem coragem para destruir a ponte, a orquestra do campo de prisioneiros tocando para abafar os ruídos da tortura, o jovem soldado agonizante a quem o Estranho Sem Nome dá seu charuto.
Nos três filmes seguintes ele dissecaria a lenda (vinganças) e a realidade (construção da ferrovia) no Velho Oeste, as verdades e mentiras de uma revolução; e a transição da época glamourosa do aventureirismo para a hegemonia insípida das grandes organizações.
Foi o cineasta que conseguiu ir mais longe na proposta de mesclar entretenimento e reflexão, saindo-se tão bem nas bilheterias quanto em termos de qualidade cinematográfica.
Depois, em Por Uns Dólares a Mais (26), todas essas características foram desenvolvidas e aprimoradas. É um filme muito melhor do que o anterior, mas, paradoxalmente, não apresentou novidades significativas.
A única que vale a pena citar é a colocação de dois personagens em destaque, em vez de um. A partir daí, os filmes de Leone trariam sempre essa dupla de anti-heróis ocupando o espaço dos antigos mocinhos.
Depois dos personagens interpretados por Clint Eastwood/Lee Van Cleef em Por Uns Dólares a Mais, tivemos Clint Eastwood/Eli Walash (Três Homens em Conflito), Charles Bronson/Jason Robards (Era Uma Vez no Oeste), Rod Steiger/James Coburn (Quando Explode a Vingança) e Robert De Niro/James Woods (Era Uma Vez na América).
Aí, finalmente, estava pronto para seu tour-de-force: Três Homens em Conflito foi a obra em que Leone definiu e afirmou seu estilo, embutindo no cinema de ação discussões mais profundas, sem prejuízo do entretenimento propriamente dito. É um tipo de obra em camadas. De acordo com sua sensibilidade, o espectador pode se divertir apenas com o básico ou captar os muitos toques subjacentes.
E é grandiosa a crítica que Leone fez ao belicismo, com algumas das seqüências mais comoventes que o cinema já apresentou: o oficial bêbado sem coragem para destruir a ponte, a orquestra do campo de prisioneiros tocando para abafar os ruídos da tortura, o jovem soldado agonizante a quem o Estranho Sem Nome dá seu charuto.
Nos três filmes seguintes ele dissecaria a lenda (vinganças) e a realidade (construção da ferrovia) no Velho Oeste, as verdades e mentiras de uma revolução; e a transição da época glamourosa do aventureirismo para a hegemonia insípida das grandes organizações.
Foi o cineasta que conseguiu ir mais longe na proposta de mesclar entretenimento e reflexão, saindo-se tão bem nas bilheterias quanto em termos de qualidade cinematográfica.
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Keoma (27) foi o canto do cisne do western italiano. E
encerrou o ciclo com extrema dignidade. Trata-se daquela única
obra-prima que, às vezes, um diretor convencional faz na vida, como que
para provar que tinha talento para voos maiores.
O subtexto é riquíssimo:
- a briga entre os quatro irmãos remete, evidentemente, a Freud e suas teorias sobre a horda primitiva;
- o nascimento da criança num estábulo é um paralelo bíblico, assim como a crucificação do herói;
- a presença da velha índia nos momentos culminantes do filme vem da mitologia grega, ela é um tipo de deusa do destino;
- o herói errante em busca de um desígnio que justifique sua vida também tem inspiração mitológica;
- a peste se constituiu num elemento bíblico e mitológico ao mesmo tempo, além de estabelecer uma ponte com o escritor Albert Camus (A Peste, O Estrangeiro), cujas obras são uma óbvia referência no delineamento do personagem principal;
- finalmente, Castellari reverencia seus mitos cinematográficos -- Keoma é filho de Shane, o herói protagonizado por Alan Ladd em Os Brutos Também Amam (28), enquanto a presença de Woody Strode no elenco constitui uma homenagem a John Ford, de quem era um dos atores prediletos.
E não foi só Castellari quem se superou,
atingindo uma qualidade de que ninguém o suporia capaz. A dupla de
compositores Guido e Maurizio de Angelis fez uma trilha musical
extraordinária, capaz de rivalizar com as melhores de Morricone. O
contraste do baixo com a soprano chega a nos arrepiar, as letras se
casam maravilhosamente com o filme.
Em suma: trata-se de um clássico ainda não reconhecido.
Em suma: trata-se de um clássico ainda não reconhecido.
Filmes citados:
- Un Dollaro Bucato, 1965, d. Giorgio Ferroni
- High Noon, 1952, d. Fred Zinneman
- Gunfight at O.K. Corral, 1957, d. John Sturges
- The Gunfighter, 1950, d. Henry King
- The Bravados, 1958, d. Henry King
- The Searchers, 1956, d. John Ford
- Gli Ultimi Giorni di Pompei, 1959, creditado, entretanto, a Mario Bonnard
- Il Colosso di Rodi, 1961, d. Sergio Leone
- Yojimbo, 1961, d. Akira Kurosawa
- Per un Pugno di Dollari, 1964
- Unforgiven, 1992, d. Clint Eastwood
- Giù la Testa, 1971, d. Sergio Leone
- El Chuncho, Quién Sabe?, 1967, d. Damiano Damiani
- Prega Dio... e scavati la fossa, 1968, d. Edoardo Mulagia
- Requiescant, 1967, d. Carlo Lizzani
- Vamos a Matar, Compañeros, 1970, d. Sergio Corbucci
- La Resa dei Conti, 1966, d. Sergio Sollima
- Django, 1966, d. Sergio Corbucci
- Faccia a Faccia, 1967, d. Sergio Sollima
- Gli Specialisti, 1969, d. Sergio Corbucci
- Il Grande Silenzio, 1968, d. Sergio Corbucci
- Heaven’s Gate, 1980, d. Michael Cimino
- Il Buono, Il Brutto, Il Cattivo, 1966, d. Sergio Leone
- C’Era Uma Volta il West, 1968, d. Sergio Leone
- Once Upon a Time in América, 1984, d. Sergio Leone
- Per Qualche Dollaro in Più, 1965, d. Sergio Leone
- Keoma, 1976, d. Enzo G. Castellari
- Shane, 1953, d. George Stevens
BBC – Human All Too Human: Nietzsche - 1999
SINOPSE
A semente do pensamento disseminado por
Nietzsche no século XIX prefigurava o piloto do século XX sobre os
conceitos do existencialismo e da psicanálise. Este programa conta com
entrevistas de grandes estudiosos do pensamento de Nietzsche sendo eles:
Ronald Hayman e Leslie Chamberlain (biógrafos de Nietzsche), Andrea
Bollinger (arquivista), Reg Hollingdale (tradutor), Will Self (escritor)
e Keith Ansell Pearson (filósofa) que sondam a vida e os escritos de
Nietzsche. O documentário mostra também o papel da irmã de Nietzsche na
edição de suas obras para o uso como propaganda nazista. Apresenta
partes de prosas aforísticas extraídas de obras como a "Parábola de um
louco" e "Assim falou Zaratustra", as quais transmitem a essência e o
estilo desse pensador profético.
DADOS DO ARQUIVO
Áudio: Inglês
Legendas: Português
Duração: 51 min.
Qualidade: DVDRip
Tamanho: 165 MB
Servidor: Rapidshare (2 partes)
Créditos: Lamash - LaranjaPsicodelica
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