quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Comunidades Negras Rurais e o Direito ao Território Étnico

As comunidades formadas pelos escravos que fugiram do regime escravista ultramarino e resistiram à recaptura, enquanto construção e realidades simbólica e histórica, estão presentes nas diversas regiões do Novo Mundo em que tal regime foi implementado.

Após décadas de esquecimento, as comunidades quilombolas passaram, no período da redemocratização do país, na década de 1980, por um processo de afirmação de sua identidade e etnicidade. O auto-reconhecimento da condição de quilombola asseverou uma etnogênese ressaltada no vínculo visceral entre a identidade étnica e o território. Esse processo revestiu-se no pleito pelo reconhecimento oficial de seus liames de ancestralidade e mais precisamente pelo direito ao território étnico, que tradicionalmente ocupavam. Nesse contexto, o termo “Quilombo” foi ressemantizado, transcendendo o viés limitadamente historicista, de forma a abarcar outras territorialidades específicas, não mais voltadas para o passado, mas ressaltadas na perspectiva presente.

A Constituição de 1988, sob os marcos da plurietnicidade e multiculturalidade, garantiu no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias aos remanescentes das comunidades dos quilombos a propriedade definitiva de seu território, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos, e caracterizando-os enquanto sujeitos coletivos de direitos. O reconhecimento oficial da legitimidade dos territórios quilombolas foi firmado não apenas pelo art. 68 do ADCT, mas também por outros dispositivos e Tratados Internacionais, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, que preconizam esse direito e que já foram incorporados ao ordenamento jurídico brasileiro.

Porém, a despeito das garantias constitucionais de preservação dos modos peculiares de criar, fazer e viver dessas comunidades e conseqüentemente de preservação dos seus territórios, são pouquíssimos os territórios quilombolas que já foram regularizados. Tendo em vista esse baixo número de titulações desde promulgada a Constituição, faz-se necessário identificar as dificuldades legais, operacionais e burocrático-administrativas no acesso ao território, bem como é necessário avaliar se as políticas públicas de titulação têm sido eficazes para cumprir com aquilo a que se destinam.

O direito humano ao território é condição imprescindível de povos tradicionais, como as comunidades quilombolas no Brasil, para consecução de seus demais direitos humanos. As comunidades formadas pelos escravos que fugiram do regime escravista ultramarino e resistiram à recaptura, enquanto construção e realidades simbólica e histórica, estão presentes nas diversas regiões do Novo Mundo em que tal regime foi implementado. São os quilombos no Brasil; palenques na Colômbia; comunidades de cimarrones, em diversas partes da América Espanhola. Em alguns desses países, acordos de paz foram firmados com os negros libertos e foram garantidas conquistas políticas e territoriais. No Brasil, apenas na Constituição Federal de 1988 a plurietnicidade do estado nacional viu-se refletida, bem como a garantia de povos tradicionais, dentre elas as comunidades negras rurais descendentes dos antigos escravos, dos seus modos peculiares de criar, fazer e viver e principalmente seus territórios étnicos, o que faz da articulação dessas comunidades, aqui, um fenômeno relativamente recente.

Advogada da Terra de Direitos – Organização de Direitos Humanos.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Pela lei (Dura lex) - Filme Russo


PO ZAKONU, 1926
Legendado, Lev kuleshov


Formato: AVI (VHS-Rip)
Áudio: - 
LEGENDAS EXCLUSIVAS (intertítulos): português
Duração: 80 minutos
Tamanho: 496 MB
Servidor: Megaupload (2 partes)

LINKS

SINOPSE
 
Alguns homens em busca de ouro encontram em Klondike uma rica jazida. Porém, um acontecimento inesperado e terrível quebra o curso lento e monótono de seus trabalhos: um dos trabalhadores, o irlandês Michael Davin mata dois de seus companheiros.

The internet movie database: IMDB

Crítica (CONTÉM SPOILER
Dura Lex é um pequeno estudo sobre a linguagem cinematográfica, uma obra de enorme poder de concisão. Grande parte do filme se passa entre três personagens dentro de um quarto. A forte motivação psicológica, a tendência ao fatalismo, a claustrofobia do ambiente nos remetem a alguns efeitos do expressionismo alemão, mas de fato a principal referência de Dura Lex é o cinema de Griffith, que sempre foi a grande paixão de Kuleshov. Além da presença marcante da montagem (especialmente na sequência da morte dos dois garimpeiros), a principal herança griffithiana está no tema de edificação moral (o criminoso deve ser julgado "pela lei"), um tanto raro nos filmes russos de então. Mas essa própria leitura "moralista" do tema é desconstruído no final, quando o casal decide julgar por si mesmos o criminoso, e praticar a sentença, e, ainda assim, o fim coloca um peso amargo sobre a covardia do casal.



Mas a principal virtude de Dura Lex é como Kuleshov utiliza o espaço físico como elemento marcante de dramaturgia. Há um nítido contraste entre o começo e o fim - filmados numa externa - e a parte central do filme, toda dentro de um quarto. Ao longo do filme, as estações do ano passam, dando uma idéia de tempo, e se inserindo na narrativa (o temporal, o degelo, etc.). O clima claustrofóbico da parte central do filme entra em grande constraste com a liberdade das partes inicial e final. No fim, a decupagem, primeiro com planos gerais, depois com criativos planos próximos que valorizam o extracampo, dá a síntese desse filme de Kuleshov: um exercício de contenção de grande domínio e sabedoria no uso dos elementos de linguagem, quase como se fosse um prolongamento das suas experiências no laboratório Kuleshov. O que não o impede de fazer uma obra acabada e definitiva, até porque escapa do clima de propaganda das produções da época.

Crítica retirada de cinecasulofilia

1899 - 1970

Lev Vladimirovitch Kuleshov (em russo: Лев Владимирович Кулешов; 14 de janeiro de 1899 em Tambov - 29 de março de em 1970 na cidade de Moscou) foi um cineasta russo e um grande estudioso de teorias cinematográficas que ajudou a fundar e ensinou na primeira escola de cinema do mundo, a Escola de Cinema de Moscou.
Suas teorias, que diziam basicamente que a essência do cinema era a monntagem de duas imagens em justaposição, foram desenvolvidas antes mesmo das realizações do não menos conhecido Serguei Eisenstein. Assim, sem essa justaposição, o homem tal como fotografado e exposto num filme, simplesmente, é apenas um material bruto do qual se fará a composição futura de sua imagem atrávés de uma edição tendenciosamente manupalada para atingir ideais e conceitos planejados.
Lev Kulechov estudou arte na Escola de Pintura, Arquitetura e Escultura de Moscou quando tinha 15 anos. Em pouco tempo, ele foi empregado como desenhista de cenários num estúdio da capital russa e chegou, até, a atuar em algumas produções.
Quando a Revolução russa estourou em 1917, Kuleshov se junto ao Exército Bolchevique e foi cobrir o final da 1ª Guerra com uma pequena equipe de documentário. Na volta, com o poder consolidado, Kulechov foi ensinar na Escola de Cinema de Moscou. Foi a partir desse momento que o cineasta surgiu com as novas técnicas de edição - já que as idéias do americano D. W. Griffth, um de seus ídolos, não seriam bem recebidas no novo regime.
Kuleshov ficaria um tempo ressentido com o governo stalinista, que, no seu auge político, alegou falta de fervor ao regime por parte de Kuleshov em seus trabalhos, e que só voltaria a chamá-lo no final da 2ª Guerra.
Entre seus discípulos estiveram dois famosos diretores russos que aplicaram, desenvolveram e expandiram suas idéias: Serguei Eisenstein e Vsevolod Pudovkin.
Efeito e experimento Kuleshov
EXTRAIDO DO SITIO CONVERGÊNCIA CINÉFILA

Retirado de Wikipedia







Kátia Abreu ganha prêmio 'Motosserra de Ouro' por defesa do desmatamento

Do Greenpeace

Líder da bancada do agronegócio no Congresso e fiel defensora das propostas de mudanças no Código Florestal brasileiro, a senadora Kátia Abreu (DEM-TO) recebeu das mãos de uma ativista do movimento indígena da Amazônia, junto com o Greenpeace, o prêmio Motosserra de Ouro, símbolo de sua luta incansável pelo esfacelamento da lei que protege as florestas do país.
A ativista tentou presentear Kátia Abreu com uma réplica dourada do instrumento usado para desmatar florestas no lobby do hotel em que está hospedada em Cancún, onde participa da 16ª Conferência de Clima da ONU (COP16). A senadora desprezou o agrado, visivelmente irritada, e deixou para a ativista apenas os comentários irônicos de seus assessores. A condecoração serviu para lembrar aos ruralistas defensores do relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que prevê alterações na lei, que essa proposta representa uma grave ameaça ao ambiente.
O projeto ruralista anistia desmatadores e reduz o tamanho da área que o proprietário de terra e o Estado estão obrigados a conservar para o bem público. Fazendas, dependendo do tamanho, ou serão dispensadas de ter árvores ou poderão ter menos do que devem atualmente. O projeto também diminui as faixas de floresta em beiras de lagos e rios e em encostas, que além de servir como corredores de biodiversidade evitam enchentes, deslizamentos e protegem a qualidade da água.
Caso a turma da motosserra consiga mudar a lei nos termos em que pretendem, tornarão inviável para o Brasil honrar as metas de queda de desmatamento assumidas em Copenhague, na COP15, que preveem a redução até 2020 de 36% a 39% de nossas emissões de gases-estufa. A proposta prejudica também as negociações sobre Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD), que institui o pagamento para a conservação de floresta para quem vive nela. “Se o Brasil legalizar mais desmatamentos, o custo da conservação aumentará muito e pode tornar a aplicação do REDD no Brasil inviável”, explica André Muggiati, representante da Campanha Amazônia do Greenpeace na COP16.
A bancada da motosserra continua lutando nos bastidores para que um novo e enfraquecido código seja votado a qualquer preço, ainda este ano. Querem que algo tão importante para o Brasil seja decidido já, por uma Câmara em fim de mandato, e sem a devida discussão com a sociedade. “As alterações no Código Florestal representam um retrocesso em uma das legislações florestais mais avançadas do mundo”, diz Muggiati.
Este protesto teve o apoio do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB).
Feliz Natal?
Em um apelo ao espírito natalino, um grupo de ONGs, entre elas o Greenpeace, levou Papai Noel até Cancún para ajudar a impedir que a bancada do agronegócio empurre suas propostas de mudança no Código Florestal goela abaixo dos brasileiros.
O bom velhinho ficou nesta manhã na porta do Cancun Messe, um dos prédios onde acontece a COP16, entregando mudas de árvores aos que passam, acompanhado de ativistas com dois cartazes, em português e inglês, onde se lia “Mudar o Código Florestal = Um Natal sem árvores”. Se as alterações no código forem aprovadas no Congresso, o Brasil pode se preparar para, no futuro, celebrar Natais com bem menos áreas de florestas.
O Papai Noel em Cancún teve como parceiros o Observatório do Clima, o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), além do Greenpeace.

Movimentos sociais mobilizam 10 mil em marcha em Cancún



Por Vinicius Mansur
De Cancún (México)
Da Agência Brasil de Fato


Os movimentos sociais marcaram a agenda das negociações da COP 16 – conferência da ONU sobre mudanças climáticas – ao realizar uma mobilização massiva nas ruas de Cancún, México, nesta terça-feira (7).
Esta foi a segunda marcha organizada pela Via Campesina durante a COP 16 para pressionar a ONU a tomar medidas mais efetivas no combate ao aquecimento global.
As organizações sociais já falam em um “Cancún-hagen”, indicando que o fracasso de Copenhagen irá se repetir no México.
Apesar do alto contingente policial, a marcha de quase 10 mil pessoas transcorreu sem enfrentamentos. Além de movimentos sociais e ativistas de todo o mundo, o ato contou com a presença do embaixador da Bolívia na ONU, Pablo Solón, e com o representante do governo do Paraguai, Miguel Lovero.
A Via Campesina também impulsiona em paralelo à COP 16 uma jornada de lutas chamada de ”Milhares por Cancún”. De acordo com a organização, já foram realizadas mais de 200 ações em 37 países em protesto às nações que se negam a assumir compromissos para redução de poluentes e, por outro lado, incentivam acordos que aumentam ainda mais a mercantilização da natureza.











Lutas de emancipação do povo negro e contribuições do marxismo

 A necessidade de contrapor o mito da “democracia racial” que apresentava ao resto do mundo, uma dinâmica cordial nas relações sociais entre brancos e negros no Brasil, cordialidade essa que resultava da aparente ascensão social do mulato (descendente de brancos com negros), no período colonial, se tornou uma das principais bandeiras que unificou e reorganizou a militância negra no período contemporâneo.

Clédisson Júnior *

É importante ressaltar o aspecto de reorganização da militância de negros e negras, pois muito pouco, se tem pesquisado sobre o processo de organização para fins de resistência dos negros e negras no Brasil em especial no período em que perdurou a escravidão formal, a qual se convencionou apresentar como característica inerente aos negros e negras escravizados a passividade ante a sua condição de cativos.
O MOVIMENTO NEGRO CONTEMPORÂNEO
O processo de reorganização do movimento negro teve como auge o surgimento do “Movimento Negro Unificado contra a discriminação racial” na década de 1970. O MNU apresentava ao conjunto da sociedade, a denuncia de um Brasil invisibilizado pela crença na igualdade de oportunidade entre negros e brancos e pela recorrente opção pela universalização da disputa social fundamentada na exploração de classes característica fundante do sistema capitalista, aonde intelectuais e organizações de esquerda acreditavam que superada as desigualdades de classes automaticamente se suprimiria as opressões étnicos-raciais.
Nos anos que se seguiram foram surgindo outras organizações que pela luta social, buscavam combater a opressão vivida pelos negros e negras no Brasil, que muito contribuíram para a consolidação do processo de reorganização e colocou na agenda social, o combate ao racismo.
A DICOTOMIA RAÇA E CLASSE
A partir da segunda década do seculo XX, intelectuais e organizações marxistas compreendiam o preconceito racial como elemento indispensável na dinâmica de funcionamento da sociedade brasileira contudo pouco contribuíram objetivamente sobre a discussão do racismo no Brasil. Analises apontam que a lacuna deixada pela critica marxista no campo da opressão vivida pelos negros e negras no Brasil se dá a partir do entendimento de que o país se encontrava em um estagio semi-colonial no que tange a sua estrutura econômica e era dirigido por uma aristocracia agraria-feudal, e que esta disposição do quadro social travava o desenvolvimento das forças produtivas, adiando deste modo o processo de ascensão da burguesia e o aprofundamento do modo de produção capitalista, etapa necessária para o surgimento do movimento emancipatório da classe trabalhadora, como parte integrante do ideário marxista-revolucionário.
Tal perspectiva secundarizou as discussões sobre o racismo no campo das organizações de esquerda, resultando em um processo de afastamento de grande parte dos intelectuais e das organizações do movimento negro. Contudo é importante evidenciar que foi do Partido Comunista Brasileiro - PCB o primeiro candidato negro a presidência da republica nas eleições de 1930 com o operário Minervino de Oliveira e também do mesmo partido o primeiro negro a ser eleito deputado federal nas eleições de 1945 com Claudino Silva.
O MARXISMO E O MOVIMENTO NEGRO
Com o aumento de sua base social e um objetivo processo de amadurecimento organizativa de suas direções, parte significativa do movimento negro passa a compor cada vez mais o campo dos movimentos identitários, movimentos esses que buscam alcançar direitos negados pelo conjunto da sociedade, direcionando assim uma ação politica que pouco ou nada dialoga com uma necessária ruptura com o modo de produção capitalista que tem no racismo um de seus pilares estruturantes.
Muitas foram as contribuições do marxismo para o processo de organização social, aonde elementos constitutivos como o materialismo histórico, modo de produção da burguesia, a teoria da mais valia entre outros permitiu ao longo de um largo período de nossa historia contemporânea um método de analise e ação, que inspirou homens e mulheres a se organizarem na busca por uma sociedade justa. Resultando em algumas experiencias reais de chegada ao poder pela classe trabalhadora.
Assim como a própria historia, o marxismo também viu suas bases teóricas serem alteradas, a qual em sua primeira expressão marcada pela verdade intransigente das lutas de classes a uma ideia de não predestinação mas o reforço do determinismo da matéria, que ao atender suas diferentes necessidades, alteram também as nossas opções e concepções, conceituando assim a dialética marcada pela constante transformação da historia.
Este processo de constante movimentação, que também podemos chamar de atualização mediante as realidades vivenciada pelos marxistas culminou em reorganização programáticas, aonde foi possível desenvolver uma perspectiva da chegada ao poder da classe trabalhadora pela via pacifica, utilizando da estrutura democrática para alterar o estado de exploração.
Deste modo, o marxismo hoje também se coloca na condição de apresentar e somar as pautas que dialogo com os movimentos identitários, apropriando de parte de suas formulações e contribuindo com as suas dinâmicas organizativas e com o processo de formação destes militantes.
A busca pelo dialogo necessário entre o programa apresentado a classe trabalhadora e a luta pela igualdade nas oportunidades entre negros e brancos, coloca em novos patamares o campo teórico analítico.
O INTELECTUAL ORGÂNICO E O MOVIMENTO NEGRO
O conceito de intelectualidade orgânica surge a partir da avaliação critica de que as direções dos movimentos ligados a emancipação da classe trabalhadora, se fechavam em analises abstratas sobre o processos formulativo, estando alheios ao desenrolar objetivo da luta dos trabalhadores e das trabalhadoras, esse distanciamento da direção “pensante” do movimento, gerou desgastes e distanciamento da base, não permitindo assim que a luta lograsse objetividade em seus intentos.
Segundo Antônio Gramsci, marxista italiano, que a partir de seus estudos nos apresenta que o(a) intelectual orgânico é aquele(a) que elabora uma concepção ético-politica que o(a) habilita a exercer funções culturais, educativas e organizativas para assegurar a hegemonia social e o domínio da classe que representa.
Tal interface se observa com mais propriedade no processo de formação de quadros dirigentes para o movimento social protagonizado por negros e negras, aonde estes mesmos militantes cada vez mais se tornam parte integrante de suas organizações, conectados com os avanços do mundo do trabalho, com as novidades no campo analítico produzido pelas universidades, em constantes contatos com as outras organizações politicas-sociais, se tornando verdadeiro(a)s intelectuais comprometidos, que organicamente tem por tarefa formular e promover avanços nos aspectos da luta social para o movimento negro.
CONSTRUIR MAIORIA PARA DISPUTAR A HEGEMONIA
Com o acirramento da disputa por hegemonia e o crescente avanço das correntes de pensamento conservadores da sociedade brasileira, se torna tarefa do movimento negro e das organizações do campo progressista o estreitamento de suas agendas e pautas emancipatórias, aonde se torna essencial a compreensão de que a transição para uma sociedade solidaria, justa e calcada em valores verdadeiramente democráticos será fruto de muita mobilização social e aprofundamentos dos instrumentos que garantam cada vez maior participação da população na dinâmica de direção da sociedade.
Aos socialistas cabe apresentar ao conjunto do movimento negro, que ao se deparar com uma sociedade injusta e desigual, a busca pela equidade deverá ser precedida pelo tratamento diferenciado para aqueles que vivem “sorte” desigual de oportunidades, construindo conjuntamente instrumentos de compensação, avançando nas discussões sobre as discriminações positivas para aqueles que historicamente vem sendo oprimidos, assegurando as mulheres o direito inalienável a autodeterminação de seu corpo e ao mesmos espaços na vida publica.
O processo de atualização do marxismo enquanto campo analítico, o coloca na condição de cada vez mais ser elemento indispensável na disputa social que enfrentamos cotidianamente.
A transição de um modelo de democracia representativa liberal que falha ao colocar a margem do processo de socialização a maioria da população do país em função de sua posição subalterna na estratificação social e principalmente pela pertencimento étnico a que fazem parte, somente obterá sucesso e transitará para um modelo de democracia, aonde a solidariedade e a igualdade de oportunidades sejam elementos fundantes se for colocado como centro estratégico a organização e o emponderamento de negros e negras e a radicalização da luta pelo fim da racismo.

*Clédisson Júnior é militante do Coletivo Nacional de Juventude Negra Enegrecer e  diretor de Combate ao Racismo da UNE.

Educar politicamente...

Educar o povo brasileiro



Chegamos ao fim de 2010, e ao fim da primeira década do século XXI, vislumbrando um país diametralmente diferente daquele que chegou ao novo século. Em 2000, éramos um país sem perspectiva. O fim da hiperinflação em meados da década que terminava – uma década começa e termina nos anos com dois zeros na casa da dezena de sua representação numérica – não conseguira nos fazer progredir economicamente e tampouco distribuir renda.
Hoje, dez anos depois do início do novo século – e, não nos esqueçamos, de um novo milênio, o que contém um simbolismo altamente significativo –, tornamo-nos um país em que as perspectivas saltam sobre nós, de tantas que são. Todavia, culturalmente o Brasil ainda é um país extremamente atrasado. E na base desse atraso cultural está um conservadorismo que oscila entre o patético e o deprimente, sobretudo para quem quer acreditar que um novo país esteja surgindo.
Artigo do diretor do instituto Vox Populi, Marcos Coimbra, publicado no Correio Brasiliense de hoje (8/12) revela um dado que, à primeira vista, é desanimador, mas que representa, apenas, a apuração de um problema na cultura brasileira que, devido à sua dimensão, assusta, mas que pode, sim, ser revertido, ainda que tal feito deva tardar um bom tempo até acontecer.
Coimbra lembra pesquisa do instituto que preside feita no mês passado, portanto após a eleição presidencial, que revela que o brasileiro, antes de tudo, é um conservador nato. Temas considerados “morais”, tais como aborto – que é um problema de saúde pública –, homossexualidade – que é uma escolha legítima e constitucional do cidadão – e uso de drogas – que é outro problema de saúde que se tornou problema de Segurança Pública devido à vã tentativa de se proibir o uso de certas substâncias e de se liberar outras – aparecem na pesquisa de uma forma preocupante.
Segundo o Vox Populi:
1-      82% dos entrevistados são de opinião que o aborto não deve deixar de ser considerado crime;
2-      72% acham que o governo não deve propor mudanças na legislação que o descriminalizem;
3-      60% entendem que a união civil de pessoas do mesmo sexo não deve ser permitida;
4-      72% acham que o governo não deve propor leis que descriminalizem o consumo de drogas
E a conclusão de Coimbra sobre a pesquisa é de uma precisão cirúrgica:
“(…) As variações socioeconômicas e regionais nas respostas são pouco relevantes, embora aconteçam nas direções esperadas. Pessoas de escolaridade mais alta, com maior renda, mais jovens, moradores de áreas urbanas e de estados mais desenvolvidos, tendem a ser menos hostis a mudanças, mas nunca em proporções elevadas (a aceitação de que o aborto não seja considerado crime é de 10% entre pessoas de baixa ou nenhuma escolaridade, mas vai a apenas 20% nas de alta escolaridade). Ou seja, se quisermos falar em conservadorismo, trata-se de um fenômeno majoritário na sociedade inteira (..)”
A pergunta que surge é sobre por que um povo que precisa tanto de mudanças se aferra a dogmas religiosos e moralistas que estão na base da ideologia que moldou o país que mantém esse povo na miséria desde sempre? Por que em um momento de ruptura com o dogma de que só doutores poderiam governar bem um país, em um momento em que a mudança é o nome do jogo que está sendo jogado, o conservadorismo – o que seja, o apreço pelo “tradicional” – continua tão forte inclusive entre os que apóiam politicamente a mudança?
A explicação está naquele esquerdista que prega valores moralistas e ultra-religiosos de repúdio ao aborto e à homossexualidade, mas que defende valores progressistas como distribuição de renda, igualdade racial e de gênero etc. Porque a cultura brasileira foi impregnada por esses valores ao longo de séculos, e muitos ainda mantêm os valores dentro dos quais foram criados por país conservadores, ainda que tenham se deixado seduzir por valores humanistas ao amadurecerem.
Outro fator de peso na construção da mentalidade conservadora do brasileiro é o baixo nível cultural que, a despeito dos níveis de escolaridade, permeia todas as classes sociais, todas as regiões, ambos os gêneros, todas as faixas etárias e todas as regiões geográficas do país. Mesmo entre os mais ricos e escolarizados, a cultura geral é baixíssima. Entre empresários, por exemplo, enorme parte deles é de homens sem qualquer refinamento cultural ou preocupação intelectual, que lêem a Veja e acreditam que estão consumindo cultura.
O povo brasileiro está entre os que menos lêem no mundo e esse não é um fenômeno restrito às camadas populares, pois devido ao gigantismo do país e de sua população nossas classes média alta e alta encerram contingentes que, somados, superam as populações de vários países. Ainda assim, o Brasil tem um dos menores mercados editoriais do mundo.
Chegamos à segunda década do século XXI em condições de educar este povo, para que, mais esclarecido, ultrapasse valores medievais e se insira na moderna sociedade contemporânea da informação, na revolução dos costumes que o conhecimento da história revela inexorável em sua marcha cadenciada através da odisséia humana.
Temos riqueza e pujança econômica suficientes, hoje, para tornar o Brasil um país culto e educado. Só depende das escolhas políticas que continuarmos fazendo durante a década que começa. Se mantivermos no poder grupos políticos dispostos a apostar alto no social a despeito da gritaria de uma casta que se sente ameaçada pela distribuição de renda, poderemos nos tornar uma das maiores potências do novo milênio.
Renato Janine e o exercício da tolerância
É sempre uma honra receber os comentários do professor Renato Janine Ribeiro neste blog. Apesar de eminente, pode haver quem não conheça esse que é um dos grandes pensadores deste país na contemporaneidade. Vale a pena reproduzir suas credenciais, pois.
Renato Janine Ribeiro (Araçatuba, 9 de dezembro de 1949) é um filósofo brasileiro. Atualmente é professor-titular da cadeira de Ética e Filosofia Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP). Recebeu o Prêmio Jabuti em 2001, bem como foi condecorado com a Ordem Nacional do Mérito Científico, em 1998, e com a Ordem de Rio Branco, em 2009.
Sobre o post anterior, referente ao exercício da tolerância, deixou comentário que expõe, de forma quase acadêmica, apesar de sucinta, o pensamento deste blogueiro. É incrível porque ele propôs exatamente o que eu já estava escrevendo. Reproduzo a tese logo abaixo, agradecendo ao professor por sua contribuição.
Caro Eduardo,
parabéns pela idéia e até pela modéstia de reconhecer que isso é difícil. É mesmo.
O que me preocupa muito na Internet é a tendência dos comentadores a serem muito radicais no que dizem. Com freqüência se radicaliza o que o próprio blogueiro apenas indicou ou assinalou.
Ora, ninguém de nós é dono da verdade. Podemos, todos, errar. E erramos.
Acho que, apesar de certas ações horríveis como o preconceito contra os nordestinos e gays nesse período pós-eleitoral, poderíamos aproveitar que as eleições passaram e que seu resultado foi acatado por todos.
Eu temia que estivesse se preparando uma deslegitimação da presidente eleita (leia-se: clima de golpe). Não aconteceu, e acho isso fabuloso!
Sinto orgulho do Brasil por ter chegado a esse ponto. E acho que certos pontos podiam ser discutidos com menos exaltação. Dou um exemplo: na educação, há muito mais convergência hoje do que dez anos atrás.
Mas uma divergência é entre ensinar com livros didáticos (posição do governo federal) ou com apostilas e material fornecido por grandes redes privadas, na verdade bem capacitadas (posição que o governo paulista parece adotar – em parte).
O que li a esse respeito, até hoje, foi só faccioso. Esse é um bom tema de debate, se questionarmos o que é melhor para quem realmente importa: as crianças. E termino mandando um abraço para as suas”.
Renato Janine Ribeiro

Fazendeiro é condenado por trabalho escravo


Para procurador do Trabalho, condenação de Edgar Antunes é um fato inédito no estado



Do Brasil de Fato




O fazendeiro Edgar Antunes, ex-presidente da Associação dos Plantadores de cana do Estado de Alagoas (Asplana) e atual presidente do Hospital do Açúcar, foi condenado pelo juiz da 2ª Vara Federal, Guilherme Masaiti Hirata Yendo, a três anos e seis meses de reclusão, por manter empregados em condições análogas a de escravo. Baseado no artigo 149 do Código Penal, o magistrado atendeu a pedido de ação do Ministério Público Federal, fundamentada em queixa crime encaminhada pelo Ministério Público do Trabalho, em 2008.

Antunes, dono das fazendas Prata, Mato Grosso e Lagoa Redonda, localizadas nos municípios de Porto Calvo e Jacuípe, Litoral Norte do Estado, mantinha trabalhadores em condições degradantes, com péssimas condições de higiene, transporte em condições perigosas e humilhantes, comprovadas pela fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Por ter bons antecedentes e não ter cometido o crime com uso de violência e/ou grave ameaça, Edgar Antunes teve a pena de privação de liberdade convertida em prestação de serviços comunitários e prestação pecuniária, além de pagamento de multa.

Para o procurador do Trabalho Rafael Gazzanéo, que encaminhou a queixa crime ao MPF, a condenação de Edgar Antunes, por prática de trabalho análogo a de escravo, é um fato inédito em Alagoas. “Acredito que essa decisão poderá mudar o cenário de trabalho degradante que ainda vemos em nosso país e beneficiar milhares de trabalhadores rurais que ainda são desrespeitados em sua dignidade e submetidos a essa prática humilhante”, destacou.

Gazzanéo lembra que, em 2007, o MPT ajuizou ação civil pública contra o fazendeiro após constatação de irregularidades trabalhistas nas fazendas Prata, Mato Grosso e Lagoa Redonda. Nesse mesmo ano, a Justiça do Trabalho homologou acordo judicial na referida ação. O empresário teve de pagar indenização por dano moral coletivo no valor de 30 mil reais, além assumir o cumprimento de várias obrigações trabalhistas.

Atuação do MPT

Em 2007, o MPT recebeu denúncia formalizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, a partir de fiscalizações realizadas nas três fazendas de Edgar Antunes, destinadas ao plantio de cana-de-açúcar. “Foi constatado que, além de trabalho clandestino, admissão de trabalhador sem carteira assinada, o empresário não fazia o depósito do FGTS dos empregados nem concedia férias nos doze meses subsequentes ao período aquisitivo. Prática que em muito se assemelha às práticas escravistas”, ressaltou.

Na ação, o procurador Gazzanéo destacou que além de não oferecer condições adequadas ao trabalhador, o fazendeiro mantinha sistema de armazém, os conhecidos barracões, onde os empregados eram obrigados a comprar o que precisavam consumir. “O empregador, num efeito ‘bola de neve’, colocava-se em posição de eterno credor do empregado, que, ao fim, trabalhava sem receber remuneração ou recebia parcela ínfima do salário ajustado”, denunciou.

Para Gazzanéo, a conduta de Edgar Antunes desrespeitava a dignidade dos trabalhadores e a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). “Nas fazendas não havia registro dos empregados em livros, fichas ou sistema eletrônico. Também não era disponibilizado controle de jornada que permita anotação da hora de entrada e saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico”.

Nas fazendas investigadas não havia implantado o Serviço Especializado em Segurança e Saúde do Trabalhador (SESTR) nem a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho Rural, conforme determina a Norma Regulamentadora 31, do Ministério do Trabalho e Emprego. “A conduta do empresário rural era um afronta à NR-31. Ele descumpria, de forma absolutamente desumana, essa norma em questão, colocando em risco a saúde e a integridade física de seus empregados”, justificou.

Os trabalhadores eram transportados em veículos inadequados e sem autorização, pelos órgãos competentes. Além de tudo, os trabalhadores rurais eram mantidos em alojamentos sem as mínimas condições de higiene e sem água potável. “Para se ter idéia, os empregados faziam as necessidades fisiológicas ao ar livre, no mato mesmo, e para tomar banho tinham de ir ao açude da fazenda, compartilhando a água com animais e lavadeiras de roupa”, disse indignado o procurador na fundamentação da ação.

Diante da gravidade do problema, além da atuação junto à Justiça do Trabalho, o procurador Gazzanéo também encaminhou, em março de 2008, documentação ao MPF, uma queixa crime, com provas sobre a conduta ilegal de Edgar Antunes, o que resultou na atuação do órgão na Justiça Federal e condenação do empresário.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

O caminho do agrotóxico para engordar as empresas


Por Joana Tavares
Da Página do MST

O Produto Interno Bruto (PIB) agropecuário é a soma de todas as mercadorias agrícolas vendidas. Os dados disponíveis são estimativos, mas pode-se dizer que o PIB agropecuário de 2009 esteja em torno de R$ 163 bilhões, cerca de 15% do PIB total do Brasil.
Desses, calcula-se que cerca de R$ 120 bi sejam do agronegócio, e R$ 60 da agricultura familiar, não entrando no cálculo os produtos de auto-consumo.
Para entender o que significa esses R$ 163 bilhões, é necessário conhecer o modelo que sustenta a produção. Mais da metade do valor gerado – cerca de R$ 90 bi – é o volume de crédito oficial destinado para as fazendas do agronegócio.
Quase dez vezes mais a quantia do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar.(Pronaf) destinada à agricultura familiar.
A professora Rosemeire Aparecida de Almeida, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, comparou os índices de financiamento público no MS e comprovou que as pequenas unidades de produção, com menos de 50 hectares, multiplicaram por 20 o valor do financiamento. Já a grande propriedade dividiu por dois o valor do financiamento. E são essas grandes propriedades que concentram a maioria do maquinário agrícola, o que deveria aumentar a produtividade.
“Moderna” agricultura
O Censo Agropecuário de 2006 demonstra que os tratores estão concentrados nas propriedades acima de 500 hectares, que possuem 73% do total das máquinas. “Isso demonstra que a modernização da agricultura serve somente a uma pequena parcela do campo. A sua disseminação foi desigual, o que lhe rende o rótulo de 'modernização conservadora'. Como podemos observar pelos dados do IBGE, o pacote tecnológico – mecanização, insumos e conhecimento técnico – não abrange homogeneamente toda a atividade agropecuária”, aponta Tiago Flores, estudante do mestrado de geografia humana da USP.
Para seguir o modelo da “moderna agricultura”, grande parte dos R$ 90 bi de crédito vai para o pacote máquinas-fertilizantes-venenos. E quem controla esse comércio?
São 50 grandes empresas transnacionais que controlam esse mercado, apresentarando juntas lucros acima do total do PIB agrícola.
Segundo o anuário do agronegócio, referente a 2010, os ativos das 50 empresas ficou em R$ 189 bilhões. As dez maiores controlam 51% do já oligopolizado mercado.
Deste valor, parte considerável vai para o mercado de agrotóxicos. As vendas mundiais de venenos chegaram a US$ 48 bilhões. No Brasil, o mercado cresceu 172% entre 2000 e 2009.
Venenos
Segundo dados do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Agrícola (Sindag), somente no ano passado o mercado movimentou US$ 6,6 bilhões no país. E a expectativa é que cresça 10% na análise de 2010.
“Somando as receitas das principais empresas estrangeiras produtoras de agrotóxicos no Brasil, segundo o balanço de 2009, temos um total de R$ 14 bilhões. Este dado é muito significativo, já que revela que, do PIB agrícola como um todo, o setor de agrotóxicos abocanhou, sozinho, cerca de 10%, isso lembrando que não estão computados os dados da Monsanto. Isto significa que estamos, literalmente, comendo veneno, monopolizado pelo capital estrangeiro”, explica Larissa Mies Bombardi, professora do Departamento de Geografia USP.
Segundo João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST e da Via Campesina, o modelo do agronegócio leva ao consumo de venenos em larga escala. “Sempre que aumentar a área de um produto em monocultivo, mais máquinas e venenos serão necessários. Gera-se um desequilíbrio ambiental, então é preciso aumentar o uso de herbicidas (para matar as ervas), fungicidas e inseticidas para matar insetos e ainda secantes e desfolhantes na hora da colheita”, aponta.
Paulo Alentejano, Andre Campos Burigo e Alexandre Pessoa Dias, professores-pesquisadores da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz) acompanham a questão dos agrotóxicos e afirmam que o controle das grandes corporações sobre a agricultura no Brasil gera concentração de renda e empobrecimento dos agricultores.
“As empresas estrangeiras, produtoras de agrotóxicos, controlam cerca de 92% da receita no setor. Considerando que nestes dados não estão incluídas as informações da receita da Monsanto - fabricante do glifosato “round up”, herbicida vendido em larga escala no Brasil e popularmente conhecido como “mata-mato” - este número é, sem dúvida, maior. Isto significa que o setor de agrotóxicos é absolutamente monopolizado pelo capital estrangeiro, particularmente estadunidense, seguido pelo suíço e pelo alemão”, aponta Larissa.
O crescimento nos últimos anos das culturas de milho, soja, cana e algodão, de acordo com os pesquisadores da Fiocruz, geram um aumento do consumo de agrotóxicos. No caso da cana, foram 6,13 litros por hectare em 2008, e 6,7 litros no milho, em 2008. Na soja, chegou a 15,14 litros e no algodão a 39,7.
Doenças
O aumento do uso de venenos agrícolas tem efeitos graves no ambiente e, inclusive, na saúde pública. Os agrotóxicos podem provocar três tipos de intoxicação: aguda, subaguda e crônica.
Na aguda, os sintomas surgem rapidamente. Na intoxicação subaguda, os sintomas aparecem aos poucos: dor de cabeça, dor de estômago e sonolência. Já a intoxicação crônica pode surgir meses ou anos após a exposição e pode levar a paralisias e doenças, como o câncer.
Um estudo publicado em abril no “Americal Journal of Epidemiology” demonstra que a exposição a pesticidas e herbicidas aumenta em até 75% o risco de desenvolver a Doença de Parkinsosn. A pesquisa foi realizada na região agrícola do estado da Califórnia, nos Estados Unidos, e mostra ainda que crianças expostas a esses produtos têm mais chance de desenvolver câncer, tumores e até leucemia.
Mesmo com todos esses indícios de que o veneno faz mal à saúde, o governo autorizou em novembro elevar em dez vezes o limite máximo de resíduo (LMR) no cultivo do milho.
Segundo matéria do jornal Valor Econômico, o índice de Ingestão Diária Aceitável (IDA), que é uma referência máxima que uma pessoa pode consumir, aumentou para 10 miligramas por quilo. O milho conterá mais resíduos à base do princípio do glifosato. Com a alteração, o agrotóxico passa a ser aplicado após o nascimento da planta.
“Isso significa que o governo está cedendo aos interesses das grandes empresas interessadas em vender esse tipo de produto”, apontam os pesquisadores da Fiocruz.

Levanta o Povo Rapa Nui

Desde o mês de julho de 2010 os Rapanui têm tomado prédios e terras que estão na mão do governo. Exigem de volta o que é seu.Por Elaine Tavares no BrasilDeFato



Elaine Tavares


Há pouco tempo o mundo inteiro acompanhou o semblante sorridente e inofensivo do novo presidente do Chile, Sebastián Piñera, durante o resgate dos mineiros que ficaram presos numa mina na região de Atacama. Mas com os povos em luta e os trabalhadores chilenos ele não é tão inofensivo assim. Por 80 dias, prisioneiros Mapuche fizeram greve de fome porque não aceitam estar presos como bandidos, se tudo o que fazem é lutar por sua terra, e o governo os tratou com brutal dureza.

Agora, nos primeiros dias de dezembro foi a vez do povo Rapanui, os que habitam a ilha de Páscoa, a ilha mais distante do continente, a 3.700 quilômetros da costa leste do Chile. Um grupo de 45 soldados fortemente armados irrompeu na comunidade recuperada pelo clã Tuko Tuki, no centro de Hanga Roa, capital da ilha. Esse espaço vem sendo reivindicado pela gente originária desde há muito tempo, sem que haja sensibilidade por parte do governo que atualmente ocupa as terras, com vários prédios públicos. Até mesmo os organismos internacionais de Direitos Humanos já reconheceram a legitimidade da demanda dos Rapanui, mas a violência desencadeada na última semana pela polícia chilena mostra o quanto isso ainda está longe de acabar.

Num único mês, mais de 35 grupos de famílias Rapanui recuperaram seus antigos terrenos que estão em mãos do governo e desde aí abriram uma ferida que
aparentemente estava fechada. Justamente por ser um dos pontos mais afastados da terra, a ilha esteve longe da cobiça dos conquistadores por muito tempo Foi só em 1722 que um navegador neerlandês chegou à ilha, exatamente num dia de Páscoa, daí este ser o nome dado ao lugar, como sempre, desrespeitando seu nome original. Porque a ilha não era um lugar deserto. Lá habitavam os Rapanui que davam ao lugar o nome de Rapa Nui, que significa ilha grande. Em 1774 um capitão inglês aportou no lugar e um século depois a ilha foi ocupada por europeus que introduziram ali a criação do gado ovino. Em 1888 a ilha foi anexada ao Chile e passou a existir como uma enorme fazenda de ovelhas, sendo o seu povo tornado escravo.

Foram muitas as lutas travadas pelo povo Rapanui pela recuperação da sua liberdade e de seu território. Mas, só em 1966 eles foram alçados à condição de cidadãos chilenos. Até então eram ninguém. Só que o povo da grande ilha nunca quis ser chileno, e nunca ninguém lhes perguntou isso. Essa cidadania foi imposta, assim como a escravidão anterior. Na gente Rapanui sempre esteve muito vivo o sentimento de sua identidade e hoje isso renasce com força total.

Desde o mês de julho de 2010 os Rapanui têm tomado prédios e terras que estão na mão do governo. Exigem de volta o que é seu. Querem o direito de dirigir suas próprias vidas, de acordo com os seus costumes. Outros prédios e terrenos ainda em mãos do estado e recebem pequenas bandeiras de Rapa Nui como um símbolo de que aquele lugar tem outro dono. Há um clima de tensão no ar. E há um renascer dos movimentos originários que, apesar das diferenças entre os clãs, voltam a se reunir e encaminhar lutas conjuntas. A recuperação do território é a mais importante.

Na última semana o governo decidiu endurecer e realizou, no amanhecer, uma brutal operação de retirada de famílias. As pessoas ainda dormiam quando a polícia chegou, derrubando portas e golpeando todo mundo. Houve reação, e muita gente acabou ferida. Fotos mostram senhoras de idade com balaços de borracha no rosto, uma das lideranças teve o olho destroçado, gente sangrando por todo o lado, alguns gravemente atingidos. Depois de toda a cena de brutalidade os soldados ainda se dispuseram a um último gesto de poder: queimaram as bandeiras de Rapa Nui, numa demonstração de desconhecimento das reivindicações e da cultura do povo autóctone. Nitroglicerina pura. As famílias originárias estão em pé de guerra.

A ilha de Rapa Nui é um importante centro turístico que recebe mais de 60 mil turistas por ano, atraídos pelos misteriosos Moais e pelas praias paradisíacas. Agora, está deflagrado um grave conflito entre o povo Rapanui e o Estado Chileno. O que as famílias querem é um diálogo aberto e respeito, muito respeito. Coisa que o ataque do dia 3 de dezembro mostra parecer impossível. A gente da ilha quer negociar, mas está disposta a lutar se preciso for. No caso deste clã que foi desalojado agora em 3 de dezembro, a reivindicação envolve um espaço de 5, 5 hectares no centro da capital. No terreno estão prédios importantes como a sede da prefeitura, o Banco do Estado e outros prédios públicos. O clã da família Hito reivindica um terreno onde está um dos mais importantes hotéis da ilha. Enfim, é uma batalha gigantesca a que está sendo travada agora naquela longínqua terra.

Quem acompanha a movimentação é o jornal Azkintwe, veículo oficial do país Mapuche. Mas, no resto do mundo poucos sabem da luta deste esplêndido povo,
esquecido no meio do pacífico.



Elaine Tavares  - jornalista.


(Com informações de Elias Paillan – Jornal Azkintwe)

Um passo corajoso na direção da paz


O Brasil anunciou o reconhecimento de um Estado palestino nas fronteiras existentes antes da Guerra dos Seis Dias de junho de 1967. O reconhecimento do estado da Palestina é a melhor maneira de tirar do estancamento as negociações de paz, buscar a estabilidade na região e aliviar a crise humanitária por que passa boa parte do povo palestino. Ao mesmo tempo Brasília condena quaisquer atos terroristas, praticados sob qualquer pretexto. O artigo é de Max Altman no Carta Maior

Em resposta a um pedido feito pelo presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, o Brasil anunciou o reconhecimento de um Estado palestino nas fronteiras existentes antes da Guerra dos Seis Dias de junho de 1967. Trata-se da concretização da legítima aspiração do povo palestino a um Estado coeso, seguro, democrático e economicamente viável, coexistindo em paz com Israel. A iniciativa do governo Lula abre caminho e favorece as imprescindíveis negociações entre Israel e os palestinos a fim de que se alcance concessões mútuas sobre outras questões centrais do conflito. O reconhecimento do estado da Palestina é a melhor maneira de tirar do estancamento as negociações de paz, buscar a estabilidade na região e aliviar a crise humanitária por que passa boa parte do povo palestino. Ao mesmo tempo Brasília condena quaisquer atos terroristas, praticados sob qualquer pretexto.

Com uma vitória militar arrasadora na Guerra dos Seis Dias, Israel ampliou seu território, muito além do estabelecido pela Partilha da Palestina, em 1948. Já em novembro de 1967, o Conselho de Segurança da ONU votou a célebre resolução 242 que determina “que a efetivação dos princípios da Carta das Nações Unidas requer o estabelecimento de uma paz justa e duradoura no Oriente Médio que inclua a aplicação dos dois seguintes princípios:

1. Evacuação das forças armadas israelenses dos territórios ocupados no
conflito recente;

2. Encerramento de todas as reivindicações ou estados de beligerância e respeito pelo reconhecimento da soberania, integridade territorial e independência política de cada Estado da região e de seu direito a viver em paz dentro das fronteiras seguras e reconhecidas, livres de ameaças ou de atos de força.

Afirma ainda a necessidade de: a - Garantia de liberdade de navegação através das águas internacionais da área; b - Conseguir um acordo justo para o problema dos refugiados; c - Garantir a inviolabilidade territorial e independência política de cada Estado da região, através de medidas que incluam a criação de zonas desmilitarizadas.

Esta resolução jamais foi respeitada por Israel sempre contando com o apoio de Washington. Levantaram-se questões semânticas - o texto não dizia evacuação de “todos” os territórios ocupados – e depois infindáveis obstáculos geoestratégicos e de diversas outras ordens. Israel argumenta agora que o reconhecimento do Brasil viola o chamado “Acordo de Oslo 2” firmado entre o israelense Itzhak Rabin e o palestino Yasser Arafat em 28 de setembro de 1995, que prevê que o status final da Cisjordânia só poderá ser definido por meio de negociações diretas, portanto qualquer ação unilateral estaria vedada. Contudo, a história registra que poucas semanas depois da assinatura desse acordo em 4 de novembro de 1995, Rabin foi assassinado. Líderes de partidos de direita, incluído muitos membros do Knesset (Parlamento), foram acusados de incitação selvagem que levaram ao acontecimento.

As eleições de 1996 deram vitória ao partido de direita Likud, e Benjamin Netanyahu assumiu como primeiro-ministro, propondo-se a torpedear o Acordo de Oslo. O resultado do pleito trouxe de volta ao poder governantes que não estavam dispostos a continuar fazendo concessões em nome da paz. Em agosto de 1996, o governo anulou o decreto que proibia a expansão dos assentamentos judaicos na Cisjordânia.

A ocupação dos territórios palestinos já leva 43 anos. Só para citar um exemplo histórico, a Alemanha, responsável pela hecatombe da Segunda Guerra Mundial que vitimou dezenas de milhões de soldados e civis, que provocou no Holocausto o extermínio de 6 milhões de judeus, ocupada, após a sua capitulação pelas forças dos países Aliados, recuperou sua independência e integridade territorial 4 anos depois, em maio de 1949 – República Federal Alemã, e em outubro de 1949 – República Democrática Alemã. Já em 1990, após a que do Muro de Berlim houve a reunificação.

Muitos países que mantêm relações intensas com Israel reconhecem a Palestina bem como a esmagadora maioria dos países representados na OBU. A iniciativa brasileira é consentânea com a postura histórica e a disposição inalterada de contribuir com o processo de paz, estando em consonância com as resoluções das Nações Unidas que exigem o fim da ocupação dos territórios palestinos e a construção de um Estado independente dentro de fronteiras reconhecidas, aquelas anteriores à Guerra dos Seis Dias. É a defesa do princípio de “Dois Estados”

Posição histórica nesse sentido também é a do Partido dos Trabalhadores. Em meados dos anos 1990, membro do coletivo da Secretaria de Relações Internacionais, respeitando criteriosamente as teses defendidas pelo Partido, ajudamos a fundar, organizar e dirigir o Movimento Shalom Salam Paz. Esse movimento congregava brasileiros de ascendência judaica, sionistas e não sionistas, de esquerda e centro-esquerda, brasileiros de ascendência árabe, moderados e menos moderados, os de ascendência palestina e todos aqueles dispostos a lutar por uma paz justa e duradoura no Oriente Médio e em particular, entre Israel e os palestinos.

Foi extremamente difícil conciliar as posições, houve pressão das Federações judaica e árabe e do consulado de Israel, porém conseguiu-se aprovar os pontos básicos: desocupação dos territórios palestinos ocupados com a Guerra de 1967; respeito à Resolução 242 das Nações Unidas com o reconhecimento pelos palestinos do Estado de Israel com fronteiras demarcadas, reconhecidas internacionalmente, seguras e definitivas; criação do Estado palestino, laico e viável; estabelecimento de Jerusalém leste e oeste como capital de ambas as nações; reconhecimento do direito de retorno dentro de limites a serem acordados; direito de acesso à água definidos em acordo binacional; facilidade do direito de ir e vir e do comércio binacional.

Forças internacionais sob a égide da ONU garantiriam o cumprimento das decisões. O Shalom Salam Paz levou essas idéias a dezenas de faculdades e colégios, a diversas instituições, deu dezenas de entrevistas a jornais, rádios e televisões, participou de debates, esteve presente nos Fóruns Sociais Mundiais. O Partido dos Trabalhadores tem relações de camaradagem com partidos e organizações de esquerda, de centro-esquerda e progressistas de todo o mundo, inclusive de Israel. As pontes que deseja construir e manter devem ser alicerçadas em princípios comuns, de soberania, de auto-determinação dos povos, de relações fraternais entre povos e nações, de solução pacífica e justa para os confrontos internacionais.

Uma diabólica espiral de sangue e dor, com raros interregnos, tomou conta da região nas últimas décadas. Guerras convencionais, ações terroristas e retaliações terroristas sem fim e com teor cada vez mais cruel e aterrador atingindo pessoas inocentes, governos árabes massacrando palestinos, assassinato de Rabin, negociações de paz torpedeadas ao sabor de interesses estratégicos e de poder, massacre de Munique e chacina de Jenin, intifada um e dois.

Desde 1948, os palestinos estão condenados a viver submetidos a uma revoltante humilhação. Perderam suas terras, perderam a liberdade e nunca puderam formar e organizar seu Estado. Hoje o cerco se estreitou e se tornou cruel. Sem permissão, não têm acesso à agua, a alimentos, a medicamentos. Não têm empregos nem vida econômica normal. Não podem ir de Gaza à Cisjordania, seus dois pedaços de terra. Não lhes permitem circular extra-muros sem passar por vexaminosos controles. Gaza se transformou numa prisão quando seus habitantes votaram em quem seus vizinhos acharam que não deveriam ter votado.

A Palestina hoje é muito menor que a que sobrou da Guerra dos Seis Dias. Colônias são assentadas em suas terras e atrás vêm os soldados corrigindo a fronteira. Se os assentamentos não são suficientes, que se erga um muro comendo mais pedaços de terra. Se olharmos comparativamente os mapas vemos que pouca Palestina restou.

Sabemos que a atual composição do eleitorado israelense levou ao governo líderes que abraçam a solução de confronto e não reconhecimento de “Dois Estados” laicos e democráticos. Se de um lado, moralmente, não pode um povo que ao longo da história sofreu o que sofreu impor a outro povo sofrimentos que tem de sofrer, de outro, só a pressão dos povos e da comunidade internacional poderá levar as partes a uma séria mesa de negociações. Geograficamente – e isto é ineludível – Israel é território do Oriente Médio, tendo como vizinhos em todas as direções países árabes.

Não é possível sentar-se o tempo todo sobre a ponta da baioneta, ao preço de transformar a nação numa simples fortaleza. Inexoravelmente, vai ter de conviver no futuro, e pacificamente, com seus vizinhos.
Contudo, a comunidade internacional deve abandonar os discursos vazios, as declarações ardilosas, a indiferença, as manifestações altissonantes, comportamentos ambíguos que servem de amparo à impunidade. Que os países árabes deixem de lavar as mãos. Que países europeus, que durante séculos costumavam praticar a caça aos judeus e há décadas passaram a cobrar essa dívida histórica dos palestinos, ponham de lado a hipocrisia de derramar umas tantas lágrimas enquanto celebram secretamente outro lance de mestre. E que os Estados Unidos deixem a parcialidade e ajudem a construir a paz justa entre Israel e palestinos, que seguramente servirá para estendê-la a outros rincões da mesma região.

(*) Max Altman é jornalista