sexta-feira, 29 de abril de 2011

Verissimo e a revolta da classe média

Altamiro Borges em seu blog

Reproduzo crônica de Luis Fernando Verissimo, publicada no jornal O Estado de S.Paulo:

Diálogo urbano, no meio de um engarrafamento. Carro a carro.

- É nisso que deu, oito anos de governo Lula. Este caos. Todo o mundo com carro, e todos os carros na rua ao mesmo tempo. Não tem mais hora de pique, agora é pique o dia inteiro. Foram criar a tal nova classe média e o resultado está aí: ninguém consegue mais se mexer. E não é só o trânsito. As lojas estão cheias. Há filas para comprar em toda parte. E vá tentar viajar de avião. Até para o exterior - tudo lotado. Um inferno. Será que não previram isto? Será que ninguém se deu conta dos efeitos que uma distribuição de renda irresponsável teria sobre a população e a economia? Que botar dinheiro na mão das pessoas só criaria esta confusão? Razão tinha quem dizia que um governo do PT seria um desastre, que era melhor emigrar. Quem pode viver em meio a uma euforia assim? E o pior: a nova classe média não sabe consumir. Não está acostumada a comprar certas coisas. Já vi gente apertando secador de cabelo e lepitopi como e fosse manga na feira. É constrangedor. E as ruas estão cheias de motoristas novatos com seu primeiro carro, com acesso ao seu primeiro acelerador e ao seu primeiro delírio de velocidade. O perigo só não é maior porque o trânsito não anda. É por isso que eu sou contra o Lula, contra o que ele e o PT fizeram com este país. Viver no Brasil ficou insuportável.

- A nova classe média nos descaracterizou?

- Exatamente. Nós não éramos assim. Nós nunca fomos assim. Lula acabou com o que tínhamos de mais nosso, que era a pirâmide social. Uma coisa antiga, sólida, estruturada...

- Buuu para o Lula, então?

- Buuu para o Lula!

- E buuu para o Fernando Henrique?

- Buuu para o... Como, "buuu para o Fernando Henrique"?!

- Não é o que estão dizendo? Que tudo que está aí começou com o Fernando Henrique? Que só o que o Lula fez foi continuar o que já tinha sido começado? Que o governo Lula foi irrelevante?

- Sim. Não. Quer dizer...

- Se você concorda que o governo Lula foi apenas o governo Fernando Henrique de barba, está dizendo que o verdadeiro culpado do caos é o Fernando Henrique.

- Claro que não. Se o responsável fosse o Fernando Henrique eu não chamaria de caos, nem seria contra.

- Por quê?

- Porque um é um e o outro é outro, e eu prefiro o outro.

- Então você não acha que Lula foi irrelevante e só continuou o que o Fernando Henrique começou, como dizem os que defendem o Fernando Henrique?

- Acho, mas...

Nesse momento o trânsito começou a andar e o diálogo acabou.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Altamiro Borges: “Casamento real” e os súditos da mídia


A busca por audiência não deve ser a única justificativa para a overdose midiática na cobertura do “Casamento Real”. Revistonas dão capas melosas para a união do príncipe William com a “plebéia” Kate. Jornalões gastam papel com fofocas e futricas. O pior, porém, ocorre nas emissoras de televisão – em todas elas, sem exceção. Blocos e blocos nos telejornais para divulgar banalidades.

por Altamiro Borges, em seu blog


A mídia corporativa parece adorar a vassalagem. É servil diante das monstruosidades imperiais dos EUA, assim como é vassala diante da monarquia decadente da Grã-Bretanha. A mídia dominante reproduz a ideologia das classes dominantes. Criminaliza os pobres e reverencia os ricaços – inclusive as ostentações e sandices da decrépita “família real”.

Monarquia decadente e parasitária

Na difusão dos valores “morais” da aristocracia, a imprensa sensacionalista deixa de lado até as agruras do capitalismo no país. No primeiro trimestre deste ano, o PIB britânico cresceu apenas 0,5% – após uma contração, também de meio por cento, nos últimos três meses de 2010. Milhões de trabalhadores estão sem emprego e salário, mas a mídia só fala no tal “casamento real”.

A decadente monarquia agradece tanta vassalagem. Com as festanças, ela tenta sair do atoleiro. No ano passado, a “família real” foi obrigada a cortar 12,2% das despesas oficiais com sua vida parasitária. Mesmo assim, a realeza custou mais de 46,1 milhões de euros para os contribuintes britânicos – seis vezes mais do que outra monarquia decadente, a da Espanha.

Ato público unifica trabalhadores na defesa de direitos

O dia nacional de luta contra a retirada de direitos – 28 de abril, no Rio Grande do Sul, foi marcado pela realização de um ato público unitário em frente ao Palácio Piratini, sede do governo gaúcho.
“Não somos nós que vamos pagar a conta, resolver com nossos salários, os problemas financeiros do estado”, declarou a presidente do CPERS/Sindicato Rejane de Oliveira, em crítica dirtea à proposta do governo de alterar a previdência estadual.
O movimento começou logo no início da tarde, quando educadores se reuniram no CPERS/Sindicato e, em caminhada, se deslocaram até o Largo Glênio Peres, onde encontraram servidores de outras categorias e trabalhadores da iniciativa privada.
Do Glênio Peres, também em caminhada, os manifestantes se dirigiram ao Palácio Piratini.
Antes do deslocamento, João Ezequiel, da direção do Sindicato dos Municipários de Porto Alegre, criticou a demissão de trabalhadores contratados pela Fugast, fundação que teve o contrato de prestação de serviços com o governo do estado rompido. “Os trabalhadores estão pagando por um erro do governo. Estes trabalhadores sequer estão recebendo suas rescisões contratuais”, denunciou o sindicalista.
Os manifestantes também deixaram claro que não aceitarão nenhum calote no pagamento das Requisições de Pequeno Valor (RPVs). Ao optar pela RPV, o servidor já ja abre mão de um direito, que é o de receber os seus precatórios.
O governo deve cortar privilégios de grandes empresas, que se beneficiam de recursos públicos quando são isentas de pagar o ICMS. Esse montante faz falta para a saúde, educação e segurança.
Durante a manifestação, os educadores cobraram a imediata implantação do piso nacional. No ano passado, ano eleitoral, muito foi falado e prometido. Agora a categoria está cobrando as promessas.
Se o pacote preparado pelo governo atingir direitos dos trabalhadores, a praça da Matriz será novamente ocupada. A advertência é das entidades que integram o Fórum dos Servidores Públicos Estaduais, organização que foi fundamental no enfrentamento aos ataques praticados pelo governo passado.
João dos Santos e Silva, assessor de imprensa do CPERS/Sindicato

fonte: CPERS

Tarso abre Palácio aos trabalhadores e pede apoio ao Programa de Sustentabilidade Financeira


Tarso recebe alimentos e bandeiras dos sindicalistas - Ramiro Furquim/Sul21

Rachel Duarte no Sul21

Para comemorar o Dia do Trabalhador (1º de Maio), o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), convidou as centrais sindicais gaúchas para um churrasco no Galpão Crioulo, do Palácio Piratini, nesta quinta-feira (28). Mais de 20 entidades compareceram ao almoço e sentaram à mesa com o chefe do executivo estadual. O gesto do governador — reconhecido pelos representantes sindicais — tinha uma segunda intenção, além de comemorar o 1º de Maio: Tarso pediu o apoio dos sindicalistas e da imprensa ao Programa de Sustentabilidade Financeira. Ele explicou os princípios que norteiam a proposta de reforma previdenciária que o governo enviará à Assembleia Legislativa.
O cerimonial permitiu que Tarso cumprimentasse todos os representantes das centrais sindicais. Emocionada, a coordenadora do Movimento dos Trabalhadores Desempregados, Eliane de Moura, lembrou o esforço dos trabalhadores para erguer palácios como o que a acolhia naquele momento. “Sãos os trabalhadores que constroem estes palácios. E, muitas vezes, não são convidados a entrar”, lembrou.
Recebidos com a música Cio da Terra, de Milton Nascimento, os primeiros sindicalistas a entrarem do Galpão Crioulo entregaram ao governador alimentos produzidos por pequenos agricultores. Os demais ofereceram as bandeiras de suas entidades, colocadas por Tarso sobre uma mesa à frente da qual estavam cinco banners com as palavras de ordem: soberania, solidariedade, desenvolvimento, sustentabilidade e democracia.
Ramiro Furquim/Sul21

Proposta para a previdência

Ao falar sobre o Programa de Sustentabilidade Financeira e, mais especificamente, sobre a proposta de mudança na Previdência estadual, Tarso reafirmou o que disse em outras ocasiões: “Ainda está em fase de estudo a possibilidade de propor o aumento da contribuição previdenciária dos servidores estaduais”. Reforçou os princípios nos quais os técnicos do governo estão se baseando para apresentar a proposta. “Vamos viabilizar a previdência pública no estado do RS. Teremos que ter um Fundo. Para isso, quem recebe mais terá que pagar mais”, falou sobre o aumento da alíquota previdenciária sobre os salários mais elevados. O governador afirmou que as alíquotas ainda não estão definidas.
Desde o começo da gestão, Tarso defende a criação de um Fundo para a previdência. “Precisamos de um fundo público para não permitir que os servidores da base (85%) financiem as aposentadorias de cima”, afirma o governador. “Alguma modificação terá que ocorrer. A paridade contributiva eu já defendi inúmeras vezes. Mas ela não pode ser aplicada de maneira indiscriminada, se não vai continuar gerando desigualdades. Vamos fazer isso conversando com os trabalhadores”, prometeu.
A criação do fundo se torna necessária, devido ao compromisso de Tarso em não aumentar impostos e não repetir gestos que oneram ainda mais os servidores. Ele lembrou que a sua gestão já diminui impostos para micro e pequenas empresas. Indiretamente, respondeu as críticas da oposição, que classificou os projetos, que compõe o Programa de Sustentabilidade Financeira, de meramente “arrecadatórios”. “Certo governador, quando assumiu, disse que o estado estava em crise. O que ele fez? Propôs arrocho salarial e plano de demissão voluntária. Nós não vamos fazer isso. Vamos valorizar o serviço público”, disse.
Ramiro Furquim/Sul21

Inspeção veicular

Sobre a proposta de inspeção veicular, Tarso lembrou que ela não é uma criação do governo estadual, mas uma lei federal, que o Estado passará a cumprir. Alertou que a administração fará “um movimento para arrecadar mais”. Vai atuar “contra quem sonega, contra quem não está pagando”. Ressaltou que o seu governo tem uma visão diferenciada sobre a sonegação. “A maior parte das sonegações — disse Tarso — é involuntária, por desconhecimento da burocracia ou erros de natureza técnica. Vamos credenciar o estado para educar, para informar e, assim, aumentar nossa receita”.

RPVs

O programa, que busca equilibar as contas do Estado e amenizar a previsão de déficit de R$ 550 milhões em 2011, proporá uma mudança no pagamento das Requisições de Pequeno Valor (RPVs), que acumularam, ao longo dos anos, um volume elevado, que deverá ser pago pelo atual governo. “Estas dívidas do Estado, inclusive a dos precatórios, são dívidas cumulativas. Por descumprimento de obrigações legais, por governantes que não eram da mesma orientação política nossa. Agora nós vamos enfrentá-las”, disse.
Aos jornalistas, Tarso Genro não precisou com quais hipóteses o governo trabalha para pagar as RPVs. “Os estudos estão sendo feitos, mas não há nenhuma definição nossa sobre isso”, disse.
Professores e outras categorias fizeram caminhada em protesto contra projetos do governo - Ramiro Furquim/Sul21

Protesto

Mesmo que o governo ainda não tenha divulgado a íntegra dos projetos que serão votados pelos deputados, algumas entidades se opuseram ao almoço oferecido pelo governo e foram para as ruas manifestar o descontentamento.
A caminhada foi organizada pelo sindicato dos professores, o Cpers, que reuniu o maior número de integrantes no ato. A marcha saiu às 13 horas da sede da entidade e formou um grande bloco no Largo Glênio Peres, no centro de Porto Alegre. Com carro de som e cartazes contra as mudanças nas RPVs e na Previdência, as entidades se dirigiram, a partir das 14 horas, à Praça da Matriz. Em frente ao Palácio Piratini, chamavam a atenção do governador sobre as suas reivindicações. A principal delas era contra a reforma da previdência, estudada pelo governo. “O governo não pode é querer aumentar a receita e resolver os problemas financeiros do estado colocando a conta nos nossos ombros”, disse a presidente do Cpers, Rejane de Oliveira.
O protesto reuniu tanto trabalhadores da iniciativa privada quanto servidores públicos, de 10 entidades, entre elas o Cpers, movimentos estudantis, centrais sindicais e metalúrgicos. O ato encerrou por volta das 16 horas.
Durante o almoço, Tarso Genro disse que compreendia o gesto dos trabalhadores que foram às ruas, uma vez que eles “sempre foram maltratados em outros governos”. Ele avaliou a mobilização como um processo natural e importante para que o governo informe melhor suas intenções. Segundo ele, com a proposta que o governo irá apresentar “nenhum professor será atingido”.

Celebrar 1º de Maio hoje significa lutar pela retomada da organização autônoma dos trabalhadores

Escrito por a Força, a UGT, CGTB, CTB   
 
Com o início da industrialização, lá por volta de 1775, com a criação da máquina a vapor, surgem duas classes sociais distintas: o Empresariado Industrial e a Classe Operária.
 
Aproveitando-se da forte migração campo-cidade da época em busca de trabalho assalariado, os empresários passaram a exigir dos seus empregados jornadas longas, que chegavam a 16 e até 18 horas diárias. Os descansos dos fins de semanas eram raros. Os salários baixos, o que levava a que muitas donas de casa fossem para as fábricas, assim como crianças, visando a melhora do rendimento para o lar.
 
A jornada prolongada fazia com que muitos adoecessem, sofressem acidentes graves e provocou muitas mortes. Foi daí que começaram as reações dos operários (os que operam as máquinas). As reações iniciais foram individuais, isoladas, o que permitiu a repressão patronal. Essas derrotas individuais forçaram o aprendizado de que era necessário organizar a luta coletiva. Encontros internacionais de trabalhadores decidiram organizar movimentos pela redução da jornada em todos os países industrializados: oito horas de trabalho, oito horas de descanso e oito horas para convívio familiar, atividades sociais e culturais.
 
No dia 1º de Maio de 1886, nos Estados Unidos, grande greve paralisou mais de um milhão de operários. Mais de 100 mil pararam a cidade de Chicago. Ali houve forte repressão policial, com gente ferida e mortes. Quatro dias depois uma greve ainda maior, nova repressão, outras mortes e a prisão de oito dirigentes daquela manifestação. Num julgamento a "toque de caixa" e com "cartas marcadas", os jurados decidiram pela condenação dos oito como os responsáveis pelos acontecimentos. Dois foram condenados à prisão perpétua e um a 15 anos de prisão (Miguel Schwab, Oscar Neeb e Samuel Fielden). Os outros cinco foram condenados à morte pela forca em praça pública: August Spies, Albert Parsons, Adolph Fischer, George Engel e Luiz Lingg - este último preferiu o suicídio na cela.
 
As lutas se intensificaram em todos os países e, aos poucos, as oito horas foram sendo conquistadas, assim como condições específicas para o trabalho das mulheres e menores e tantos outros benefícios.
 
Passados 125 anos, o Capital desfecha novos golpes contra a classe trabalhadora em todo o mundo capitalista, roubando direitos conquistados com muita luta e muito sangue derramado. No Brasil não é diferente. Os empresários querem o fim da jornada de 44 horas.
 
Na prática, obrigam seus trabalhadores a jornadas mais longas, superiores até a 10 horas, inclusive aos sábados, domingos e feriados. Exigem reformas da Previdência para que os trabalhadores se aposentem após 65 anos (mulheres aos 60) de idade, e um mínimo de 35 anos de contribuição. Com a rotatividade no emprego, o desemprego e os trabalhos precários, poucos chegarão à aposentadoria: morrerão trabalhando. Querem o fim do 13º salário, diminuição das férias, eliminação da licença gestação/maternidade e a livre negociação por empresas para facilitar o achatamento dos salários e quebrar de vez o papel representativo dos sindicatos.
 
Quantos outros direitos já não vêm sendo surrupiados aos trabalhadores, disfarçadamente? Um exemplo: a contratação para trabalhar sem registro por experiência ou temporariamente.
 
Nossas esperanças foram depositadas na formação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), em 1983. O momento político da época e o avanço da consciência da classe trabalhadora foram determinantes para esse novo passo do conjunto do movimento sindical.
 
Entretanto, o empresariado não estava dormindo. Buscou novos aliados e provocou o racha no movimento dos trabalhadores. Da união do peleguismo comandado por Joaquinzão com a direção do então PCB, do PC do B e do MR-8, nasce a divisionista CGT para combater as greves por categorias profissionais ou mesmo gerais, como vinha acontecendo. Era o esforço para dividir a classe operária, colocando-a a serviço dos interesses patronais.
 
Contrariados com os fracos resultados dessa divisão, os homens do capital patrocinaram a formação de mais uma central: A Força Sindical (ou Farsa sindical?). O "sindicalismo de resultados", troca dos dedos por alguns anéis, levou à capitulação progressiva da direção cutista. Já nos anos 90 percebia-se que a direção da CUT não estava mais interessada em defender os interesses dos trabalhadores. Sua meta era outra: levar Lula à presidência da República, a qualquer preço. E esse preço incluía a passividade do movimento sindical.
 
Hoje, estamos assistindo à mais vergonhosa capitulação das centrais sindicais tradicionais aos interesses do capital nacional e internacional. Sobretudo a CUT e a Força Sindical - verdadeiras inimigas entre si nos anos 90 -, tornaram-se cúmplices da entrega dos nossos direitos ao capital e se unem para abafar a consciência e a memória histórica dos trabalhadores. Em São Paulo, estão unidas na promoção do show no dia 1º de maio, a Força, a UGT, CGTB, CTB (esta correia de transmissão do PC do B) e Nova Central. Show financiado por empresas estatais (Petrobras, Caixa, Eletrobrás) e muitas empresas particulares (Brahma, Carrefour, Casas Bahia, Pão de Açúcar, BMG, Banco Itaú, Bradesco*), que financiarão também 20 carros a serem sorteados durante o show.
 
O que é, então, celebrar o 1º de Maio, hoje, 125 anos depois dos acontecimentos de Chicago? É retomar a organização autônoma dos trabalhadores, a começar pelos locais de trabalho (fábricas, comércio, hospitais, escolas, unidades públicas e também nas comunidades), para reforçar os sindicatos que continuam comprometidos com os trabalhadores; é fazer novas experiências de organização e de lutas visando a construção de um outro instrumento de lutas, que não repita os desvios ideológicos como vem acontecendo nos últimos 20 anos; é entrar nas lutas em defesa dos nossos direitos, pelas 40 horas semanais, contra as reformas que visam eliminar direitos conquistados e que estão circulando no Congresso Nacional, entre tantas outras importantes.
 
Participe dos atos em memória dos nossos mártires! É urgente somar forças com os setores do movimento sindical e popular que ainda resistem aos ataques do capital e renovar o compromisso de lutar em defesa dos nossos direitos.
 
Em São Paulo, ato na Praça da Sé, a partir das 10,00 horas
 
Atividades culturais, memória dos 125 anos de lutas e apresentação da pauta de lutas da Classe Trabalhadora. Patrocínio das Pastorais Sociais, de parcela do movimento social, dos sindicatos ligados à Conlutas e Intersindical, Consulta Popular e partidos da esquerda (PSOL, PCB, PSTU).
 
* Fonte: Folha de 24/04, página A10.
 
Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.

Rebeliões: destruindo os estereótipos das mulheres árabes


Por Soumaya Ghannoushi*Na Carta Capital

Entre esta nova geração de proeminentes mulheres árabes, a maioria escolhe usar o hijab. Urbanizadas e educadas, elas não são menos confiantes e carismáticas que suas irmãs “desveladas”.
As revoluções árabes não somente estão abalando as estruturas da tirania até suas mais profundas fundações, como estão destruindo muitos dos mitos a respeito da região árabe que têm se acumulado por décadas. No topo desta lista de mitos dominantes estão aqueles das mulheres árabes como enjauladas, silenciadas, e invisíveis. Estes não são os tipos de mulheres que apareceram na Tunísia, Egito, ou mesmo no ultraconservador Iêmen nas últimas semanas e meses.
Não apenas as mulheres participaram ativamente nos movimentos de protestos enfurecidos nestes países, como desempenharam também papeis fundamentais. Elas organizaram protestos e piquetes, mobilizaram muitos cidadãos, e eloquentemente expressaram suas exigências e aspirações por mudanças democráticas.
Como Israa Abdel Fatteh, Nawara Nejm e Tawakul Karman, a maioria das mulheres está na faixa dos 20 ou 30 anos. Há ainda casos inspiradores de ativistas mais velhas: Saida Saadouni, uma mulher com seus 70 anos na Tunísia, enrolou a bandeira nacional em seus ombros e participou dos protestos de Qasaba, que conseguiram derrubar o governo provisório de M. Ghannouchi. Tendo protestado por duas semanas, ela disseminou um espírito revolucionário único entre os milhares que se reuniram a sua volta para escutar seus discursos incendiários. “Eu resisti à ocupação francesa. Eu resisti às ditaduras de Bourguiba e Ben Ali. Não descansarei enquanto nossa revolução não chegar ao fim, por vocês, meus filhos e filhas, não por mim,” disse Saadouni.
Seja nos campos de batalha virtuais da internet ou nos protestos físicos nas ruas, as mulheres têm se provado como reais incubadoras de lideranças. Isto é parte de um fenômeno mais amplo característico destas revoluções. A política aberta das ruas fez nascer e amadurecer futuras líderes. Elas crescem organicamente nos campos, muito mais do que sendo impostas de cima por organizações políticas, grupos religiosos ou imposições de gênero.
Outro estereótipo sendo desconstruído neste movimento é a associação da burca com a passividade, submissão e segregação. Entre esta nova geração de proeminentes mulheres árabes, a maioria escolhe usar o hijab. Urbanizadas e educadas, elas não são menos confiantes e carismáticas que suas irmãs “desveladas”. Elas são uma expressão da complexa formação da cultura muçulmana, com processos de modernização e globalização sendo a marca fundamental da sociedade árabe contemporânea.
Este novo modelo de líderes mulheres criadas em suas terras natais, nascidas de levantes revolucionários, representa um desafio a duas narrativas, as quais, embora diferentes nos detalhes, são similares em referência ao mito da singularidade cultural árabe; ambos destituem a figura da mulher árabe como criatura inerte e sem força de vontade.
A primeira narrativa – que é dominante nos círculos muçulmanos conservadores – sentencia as mulheres a uma vida de reprodução e criação das crianças; mulheres são feitas para viver nos estreitos confins de suas casas com a permissão de seus maridos e parentes homens. Sua presença deve se limitar em torno de noções de pureza sexual e honra familiar; interpretações reducionistas da religião são procuradas para justificar isto.
A outra visão é abraçada por euro-americanos neoliberais, que veem as mulheres árabes e muçulmanas através do estreito prisma do modelo Talibã: objetos miseráveis de pena que precisam de uma intervenção benevolente de intelectuais, políticos ou mesmo militares. Mulheres árabes aguardam a libertação da jaula escura do velamento para um jardim prometido de iluminação.
As mulheres árabes estão se rebelando contra ambos modelos: elas estão tomando para si as rédeas dos próprios destinos libertando a si mesmas, ao passo em que libertam suas sociedades das ditaduras. O modelo de emancipação que estão conformando com suas próprias mãos é definido por suas próprias necessidades, escolhas e prioridades – e de ninguém mais.
Embora possa haver resistência a este processo de emancipação, a Praça Tahrir e Qasaba agora são parte da psiquê e da cultura das mulheres árabes. De fato, elas finalmente têm voz para gritar seus há muito silenciados anseios por libertação do autoritarismo – tanto político quanto patriarcal.

* Tradução de Cainã Vidor.

* Publicado originalmente no site da Al Jazeera, em português no Envolverde.

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Banda larga, avanços e impasses

Altamiro Borges em seu blog

Reproduzo artigo publicado no sítio da campanha "Banda larga é um direito seu":

O ano começou agitado para quem se interessa pelo debate de ampliação do acesso à internet. O Ministério das Comunicações acelerou a implantação do Plano Nacional de Banda Larga. Junto com a Anatel, o ministério também discute a terceira versão do Plano Geral de Metas de Universalização e consequentes mudanças nos contratos das empresas de telefonia fixa, que devem ser revistos até 30 de junho. Por sua vez, o Congresso Nacional discute mudanças na lei do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações.

Infelizmente, tamanho agito não se reflete necessariamente em boas notícias para aqueles preocupados com o interesse público. Em todas essas iniciativas, estão sendo tomadas decisões silenciosas que reorganizam o setor e derrubam pilares que sustentam o aspecto de serviço público nas telecomunicações. Acende-se a luz amarela e é hora de soar o alarme.

As boas e as más notícias

O acesso à banda larga no Brasil é caro, ruim e para poucos. Com isso concordam Ministério das Comunicações e a Anatel. Frente a esse cenário e à inação da gestão anterior do ministério, cerca de um ano e meio atrás, o gerenciamento das políticas de ampliação da banda larga e inclusão digital foi deslocado para o núcleo central do Governo Federal, e em maio de 2010 foi lançado o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). Com a mudança de governo, mudou também a gestão do Ministério das Comunicações, que voltou a ser o centro formulador e implementador dessas políticas e do PNBL.

Na virada do ano, as notícias indicavam disposição do governo em enfrentar os interesses particulares das concessionárias de telecomunicações, principais responsáveis pelo quadro do acesso à internet no Brasil. De fato, o PNBL congrega propostas importantes em diferentes frentes (medidas regulatórias, políticas de investimento em infraestrutura, incentivos fiscais e tributários, fortalecimento de tecnologia nacional etc.), e sua implementação tem sido tratada com a urgência necessária.

O problema surgiu na negociação com as empresas concessionárias de telefonia fixa – Oi, Telefônica e Embratel. Depois de elas entrarem com processos contra o governo e a Telebrás, inclusive no Supremo Tribunal Federal, e questionarem as propostas iniciais do PGMU-III, o quadro mudou, e os resultados da negociação com o governo e a Anatel podem levar aos seguintes resultados negativos:

Espectro gratuito – deve ser cedida, sem licitação e sem ônus, a faixa de 450-470MHz para as operadoras de telefonia fixa cumprirem as metas da telefonia rural. Essa faixa é capaz de suportar múltiplos acessos em banda larga e interessa à Telebrás por possibilitar melhores condições de promoção da inclusão digital. Numa doação de espectro por parte do Estado, as empresas ganharão esta faixa sem que se respeite a obrigatoriedade de licitação para a transferência de bens e recursos públicos.

Obrigações privadas com dinheiro público – hoje as empresas devem pagar, a cada dois anos, 2% de sua receita operacional líquida como forma de pagamento pela concessão. A Anatel considera a possibilidade de os custos necessários para o cumprimento das obrigações de universalização previstas no novo PGMU serem descontadas desse valor.

Sem obrigações de backhaul – backhauls são as ligações de internet das grandes redes para os municípios, a partir do qual se distribui o sinal para as redes que chegam para prover banda larga nas residências. Na versão anterior do PGMU-III, havia obrigações de as operadoras de telecomunicações instalarem backhauls em todas as localidades com mais de 1.000 habitantes. Naquele momento, houve críticas da sociedade civil a esta medida pela inclusão de metas de internet no plano de telefonia fixa, o que é proibido por lei e levaria ao subsídio cruzado entre os serviços, com o custeamento da banda larga pela telefonia fixa, quando o correto seria prever metas de universalização específicas à internet. De outro lado, houve críticas das empresas, que não queriam arcar com o investimento. Provavelmente não haverá qualquer menção a essa obrigação na versão final, mas também não está prevista a definição de metas próprias para a banda larga. Em resumo, prevaleceu a posição das empresas.

Sem concorrência da Telebrás no varejo – o decreto de criação da Telebrás dizia que ela iria atuar na oferta direta ao usuário final onde inexistisse oferta ‘adequada’ pelas operadoras privadas. Agora, o Governo Federal diz que espera que as operadoras privadas deem conta dessa tarefa e que, em princípio, a Telebrás só vai atuar no atacado.

Sem serviço público – a banda larga segue sendo tratada como serviço prestado apenas em regime privado, sem obrigações de universalização, sem controle de tarifas e sem uma série de garantias típicas de serviço público.

A fundo perdido

Não bastassem todos esses pontos, o Congresso Nacional está em vias de aprovar um projeto de lei que modifica a lei do FUST, permitindo que o fundo possa ser utilizado não apenas para universalização, mas para qualquer investimento em serviços de telecomunicações, prestados em regime público ou privado. Aquilo que pode parecer uma boa notícia pode se configurar, na verdade, em uma gigantesca doação de recursos públicos para as empresas privadas expandirem seu patrimônio.

Isso porque as contrapartidas exigidas ficam totalmente em aberto, não sendo nem mesmo obrigatórias na versão atual do projeto. Além disso, não há reversibilidade dos bens adquiridos com o dinheiro do FUST, ou seja, as empresas ficarão eternamente de posse de todos os bens adquiridos com esse recurso público, mesmo que deixemde prestar o serviço.

Se todos concordamos que é urgente ampliar o acesso à banda larga no país, a reivindicação é que isto se faça por meio do reconhecimento da internet como um serviço essencial, a ser prestado em regime público. Com isto, a lei do FUST permaneceria como está, impedindo mudança que resulte em transferência da renda dos consumidores às empresas de telecomunicações, já bastante beneficiadas. Mais do que ampliado, o acesso à banda larga deve ser universalizado, o que o PNBL não estabelece nem como meta. De toda forma, nem mesmo o desafio da massificação pode ser enfrentado sem que haja um papel ativo do Estado – não apenas como gerente ou fiscal das políticas, mas como agente econômico e executor do serviço.

Os fatos demonstram a necessidade de se voltar os olhos com urgência às políticas de acesso à banda larga no país. Este serviço é essencial e é dever do Estado garantir sua universalização, com políticas pautadas no interesse público. A Campanha "Banda Larga é um Direito Seu! Uma ação pela internet barata, de qualidade e para todos" defende o acesso à internet em banda larga como direito fundamental e se organiza para pressionar por seu reconhecimento nestes termos.

Para debater esses assuntos e lançar publicamente a campanha foram programadas em várias cidades atividades para a noite do dia 25 de abril, segunda-feira (mais informações no site campanhabandalarga.org.br). É preciso que organizações da sociedade civil e movimentos sociais estejam atentos e mobilizados, e que sejam entendidas como interlocutoras neste debate, da mesma forma que são os representantes de concessionárias e provedores.

Espiritualidade pós-moderna

  Frei Betto   
 
O que caracteriza os tempos pós-modernos em que vivemos, segundo Lyotard, é a falta de resposta para a questão do sentido da existência. Por enquanto, estamos na zona nebulosa da terceira margem do rio.
 
A modernidade agoniza, solapada por esse buraco aberto no centro do coração pela cultura da abundância. Nunca a felicidade foi tão insistentemente ofertada. Está ao alcance da mão, ali na prateleira, na loja da esquina, publicizada em todo tipo de mercadoria.
 
No entanto, a alma se dilacera, seja pela frustração de não dispor de meios para alcançá-la, seja por angariar os produtos do fascinante mundo do consumismo e descobrir que, ainda assim, o espírito não se sacia...
 
A publicidade repete incessantemente que todos temos a obrigação de ser felizes, de vencer, de nos destacarmos do comum dos mortais. Sobre esses recai o sentimento de culpa por seu fracasso. Resta-lhes, porém, uma esperança, apregoam os que deslocam a mensagem evangélica da Terra para o Céu: o caráter miraculoso da fé. Jesus é a solução de todos os problemas. Inútil procurá-la nos sindicatos, nos partidos, na mobilização da sociedade.
 
Vivemos num universo fragmentado por múltiplas vozes, frente a um horizonte desprovido de absolutos, com a nossa própria imagem mil vezes distorcida no jogo de espelhos. Engolida pelo vácuo pós-moderno, a religião tende a reduzir-se à esfera do privado; olvida sua função social; ampara-se no mágico; desencanta-se na auto-ajuda imediata.
 
Nesse mundo secularizado, a religião perde espaço público, devido à racionalidade tecnocientífica, ao pluralismo de cosmovisões, à racionalidade econômica. Sobretudo, deixa de ser a única provedora de sentido. Seu lugar é ocupado pelo oráculo poderoso da mídia; os dogmas inquestionáveis do mercado; o amplo leque de propostas esotéricas.
 
A crise da modernidade favorece uma espiritualidade adaptada às necessidades psicossociais de evasão, da falta de sentido, de fuga da realidade conflitiva. Espiritualidade impregnada de orientalismo, de tradições religiosas egocêntricas, ou seja, centradas no eu, e não no outro, capazes de livrar o indivíduo da conflitividade e da responsabilidade sociais.
 
Agora, manipula-se o sagrado, submetendo-o aos caprichos humanos. O sobrenatural se curva às necessidades naturais. A solução dos problemas da Terra reside no Céu. De lá derivam a prosperidade, a cura, o alívio. As dificuldades pessoais e sociais devem ser enfrentadas, não pela política, mas pela auto-ajuda, a meditação, a prática de ritos, as técnicas psico-espirituais.
 
Reduzem-se, assim, a dimensão social do Evangelho e a opção pelos pobres. O sagrado passa ser ferramenta de poder, para controle de corações e mentes, e também do espaço político. O Bem se identifica com a minha crença religiosa. Bin Laden exige que o Ocidente se converta à sua fé, não ao bem, à justiça, ao amor.
 
Essa religião, mais voltada à sua dilatação patrimonial que ao aprimoramento do processo civilizatório, evita criticar o poder político para, assim, obter dele benefícios: concessão de rádio e TV etc. Ajusta a sua mensagem a cada grupo social que se pretende alcançar.
 
Sua ideologia consiste em negar toda ideologia. Assim, ela sacraliza e fortalece o sistema cujo valor supremo, o capital, se sobrepõe aos direitos humanos. Como observava Comblin, as forças que hoje dominam são infinitamente superiores às das ditaduras militares.
 
Aos pobres, excluídos deste mundo, resta se entregarem às promessas de que serão incluídos, cobertos de bênçãos, no outro mundo que se descortina com a morte. Frente a essa "teologia" fica a impressão de que a encarnação de Deus em Jesus foi um equívoco. E que o próprio Deus mostra-se incapaz de evitar que sua Criação seja dominada pelas forças do mal.
 
Felizmente, nas Comunidades Eclesiais de Base, nas pastorais sociais, nos grupos de leitura popular da Bíblia, fortalece-se a espiritualidade de inserção evangélica. A que nos induz a ser fermento na massa e crê na palavra de Jesus, de que ele veio "para que todos tenham vida e vida em abundância" (João 10, 10).
 
Fomos criados para ser felizes neste mundo. Se há dor e injustiça, não são castigos divinos, resultam de obra do ser humano e por ele devem ser erradicadas. Como diz Guimarães Rosa, "o que Deus quer ver é a gente aprendendo a ser capaz de ficar alegre e amar, no meio da tristeza. Todo caminho da gente é resvaloso. Mas cair não prejudica demais. A gente levanta, a gente sobe, a gente volta".
 
Frei Betto é escritor, autor de "Um homem chamado Jesus" (Rocco), entre outros livros.
 
Página e Twitter do autor:www.freibetto.org - twitter:@freibetto
 
 

Governo do RS já esboçou o projeto para pagar as RPVs. Agora, espera a avaliação da base aliada


Tarso se reuniu com os secretários - Foto: Caco Argemi / Palácio Piratini

Rachel Duarte no Sul21

Na manhã desta terça-feira (27), o governo gaúcho e os líderes de partidos da base aliada na Assembleia Legislativa (PT, PSB, PCdoB, PTB e PDT) se reuniram pela primeira vez. Os deputados foram informados sobre os projetos que compõem o Programa de Sustentabilidade Financeira. O Palácio Piratini enviará o pacote para a Assembleia Legislativa no mês de maio. Entre os projetos em elaboração e à espera da apreciação da base aliada está o que trata do pagamento dos precatórios e das Requisições de Pequeno Valor (RPV). O Porgrama também foi discutido em reunião do governador Tarso Genro com os secretários. Ao final da reunião, o governador afirmou: “A reunião do secretariado foi excelente. Um debate qualificado das medidas de sustentabilidade financeira do Rio Grande do Sul.”
O pagamento das Requisições de Pequeno Valor é um dos dilemas enfrentados, atualmente, pelo Governo Tarso. O volume — segundo a líder do governo na Assembleia, deputada Miriam Marroni — triplicou nos últimos sete meses. Isto levou o governo a estudar uma forma de pagar a dívida, sem esvaziar ainda mais o cofre público. O Executivo, no entanto, mantém silêncio sobre o que pretende propor para viabilizar o pagamento de cerca de R$ 11 milhões referentes às RPVs, equivalentes aos precatórios renegociados, em que o Estado paga o teto de 40 salários mínimos. A maior parte desta dívida é com funcionários aposentados e pensionistas, que entraram na Justiça reivindicando o pagamento da chamada Lei Brito.
A Emenda Constitucional nº 62, publicada em 10 de dezembro de 2009, determina que o governo disponibilize o equivalente a 1,5% da Receita Corrente Líquida — RCL para o pagamento dos precatórios. Os valores definidos por lei são depositados mensalmente pelo Tesouro do Estado em duas contas correntes. Em 2010, foram pagos R$ 498 milhões. Para este ano, a previsão é de que serão pagos R$ 314 milhões.
De acordo com a Emenda Constitucional, 50% dos recursos se destinam ao pagamento dos precatórios, que deve ser feito em ordem cronológica, dando preferência aos idosos (mais de 60 anos) e a portadores de doenças graves. Os outros 50% vão para conciliações, leilões e pagamento por ordem crescente de valor.
Nos últimos setes meses cresceu o número de precatoristas que passaram a negociar o valor de seus créditos, entrando na fila dos que aceitam, em vez do valor total a que têm direito, o equivalente a 40 salários minimos. Com isso, deveriam receber o que o Estado lhes deve no prazo máximo de 60 dias. Ricardo Bertelle, assessor jurídico do Sindicato dos Servidores Aposentados e Pensionista do RS, o Sinapers, afirma que a negociação tornou-se uma alternativa para os beneficiários poderem receber os valores a que têm direito ainda em vida, já que os precatórios não vêm sendo pagos desde 1999.
“Os precatórios têm que ser inscritos até 1º de julho de cada ano para terem previsão orçamentária no ano seguinte. As RPVs não. São decididas pela Justiça e devem ser pagas em até 60 dias pela Fazenda”, ressalta Bertelle. Expirado este prazo, sem pagamento, o Poder Judiciário pode sequestrar os valores das contas do estado. Segundo Bertelle, no entanto, mesmo as RPVs estão com pagamento atrasado. “Levam de seis meses a um ano e meio para serem pagos”, disse.
A anomalia da dívida
O número de RPVs — decididas pela Justiça de acordo com a decisão do credor em negociar com o Estado — não pode ser previsto, ao contrário do de precatórios. No entanto, a Secretaria Estadual da Fazenda trabalha, atualmente, com dois números: R$ 800 milhões, relativos à dívida com RPVS, e R$ 300 milhões a serem pagos, este ano, em precatórios.
O dilema do governo Tarso Genro é como pagar os RPVs no curto espaço de tempo, determinado pela legislação, tendo em vista um déficit orçamentário de R$ 1 bilhão. Nenhuma autoridade se dispõe a revelar o que o governo pretende fazer para superar este problema. Afirmam apenas que a intenção é pagar a dívida.
A líder do governo na Assembleia, deputada estadual Miriam Marroni (PT), disse que há a necessidade de normatizar a legislação, e, assim, encontrar uma forma de o estado cumprir com as obrigações para com os funcionários. Sem precisar quais as linhas gerais da proposta do governo e o limite que pretende propor para o pagamento desta dívida, Miriam disse que, nesta quarta-feira (27), começará a dialogar com a base aliada para coletar contribuições dos parlamentares. “Nós aumentamos a receita do estado, mas os valores de RPVs triplicaram nos últimos sete meses. Precisamos ver como iremos resolver isso. Mas, nós vamos pagar”, garantiu.
Os demais líderes consultados pelo Sul21 adotaram o mesmo poscionamento da líder do governo. Todos confirmaram que os precatórios e as RPVs estiveram na pauta da reunião desta terça-feira, mas não deram qualquer detalhe. “Ficou de ser detalhado melhor na próxima semana ou na outra ainda”, disse o deputado Adroaldo Loureiro, líder da bancada do PDT.
As intenções do governo
O secretário da Fazenda, Odir Tonollier, esteve na reunião com os líderes dos partidos da base, na Casa Civil, mas, nem ele nem o chefe da Casa Civil, Carlos Pestana, falaram sobre o assunto, apesar de o esboço do projeto já estar pronto. A orientação é falar apenas quando a proposta estiver concluída.
Em declarações já dadas à imprensa, o governo deixou transparecer o desejo de diminuir o valor das RPVs para 20 salários mínimos e aumentar o prazo de pagamento para 120 dias. A pré-proposta foi, imediatamente, repudiada pelas categorias dos servidores.
Segundo a presidente do Cpers, Rejane de Oliveira, os precatórios só existem por falha no cumprimento dos direitos dos trabalhadores por parte do estado ao longo dos anos. Portanto, ela defende, em nome da entidade, que “é impossível pedir mais sacrifícios à categoria”. Rejane disse ainda que, ao não pagar os precatórios, o governo já obrigou os trabalhadores a abrirem mão dos valores a que tinham direito em troca das Requisições de Pequeno Valor (RPV). “Somos contra qualquer alteração no pagamento das RPVs, porque já abrimos mão uma vez”, reforçou.
Nas mais recentes declarações de representantes do governo Tarso surgiu a intenção de definir um montante anual para o pagamento das RPVs, seguindo o definido pela Emenda Constitucional 62, no que diz respeito ao pagamento de precatórios. Os que não fossem pago este ano, por exemplo, entrariam na fila do próximo ano. Mais uma vez, a sugestão do governo não agradou aos gaúchos.
“Isto é uma afronta aos direitos dos trabalhadores. Já nos foi retirado o direito de receber o valor integral (dos precatórios). Agora, querem uma medida para empurrar mais uma vez com a barriga?”, critica a presidente do Cpers Rejane de Oliveira.
A posição do Sinapers (Sindicato dos Servidores Aposentados e Pensionista do RS) é a mesma. “Não é bom porque hoje não tem uma fila de RPVs. Elas entram e têm que ser pagas. Ao estabelecer este percentual de 1,5% da Receita Líquida, forma uma nova fila. Assim terá outro calote. Além do calote dos precatórios, terá o calote das RPVs”, compara o assessor jurídico do Sinapers, Ricardo Bertelle. Para ele, um pouco de boa vontade política poderia dar outro desfecho para o problema da dívida dos precatórios e RPVs. “A Constituição Federal, no artigo 100, parágrafo 16, diz que a União poderá assumir a dívida de precatórios e renegociá-la com o estado”, afirmou, lembrando a afinidade partidária entre os governos federal e estadual, o que, segundo Bertelle, fortaleceria a alternativa.
Na visão do presidente da Comissão Especial dos Precatórios Judiciais no RS, na Assembleia Legislativa gaúcha, deputado Frederico Antunes (PP), uma possibilidade seria o governo repensar sua posição sobre as Parcerias Público Privadas (PPPs) para encaminhar as grandes obras do governo. Com isso, diz ele, sobrariam mais recursos para pagamento de dívidas como as de precatórios e RPVs. “Eu disse para a Miriam (Marroni) que não podemos mexer no volume que tem hoje desta dívida. O estado deve cumprir as suas obrigações com recursos além do Orçamento. Vou apresentar o debate sobre as PPPs novamente à Comissão de Serviços Públicos”, falou.

terça-feira, 26 de abril de 2011

A trincheira de Jean Wyllys

O nome dele não é Bolsonaro

Jean Wyllys de Matos Santos é um sujeito tranquilo, bem humorado, que defende idéias sem alterar a voz, as mais complexas, as mais simples, baiano, enfim. Ri, como todos os baianos, da pecha da preguiça, como assim nomeiam os sulistas um sentimento que lhes é desconhecido: a ausência de angústia. Homossexual assumido, Jean cerra fileiras no pequeno e combativo PSOL, a única trincheira radical efetivamente ativa na política brasileira. E é justamente no Congresso Nacional que o deputado Jean Wyllys, eleito pelos cidadãos fluminenses, tem se movimentado numa briga dura de direitos civis, a luta contra a homofobia.
Cerca de 200 homossexuais são assassinados no Brasil, anualmente, exclusivamente por serem gays. Entre eles, muitos adolescentes.
Mas o Brasil tem pavor de discutir esse assunto, inclusive no Congresso, onde o discurso machista une sindicalistas a ruralistas, em maior ou menor grau, mas, sobretudo, tem como aliado as bancadas religiosas, unidas em uma cruzada evangélica. Os neopentecostais, como se sabe, acreditam na cura da homossexualidade, uma espécie de praga do demônio capaz de ser extirpada como a um tumor maligno. O mais incrível, no entanto, não é o medievalismo dessa posição, mas o fato de ela conseguir interditar no Parlamento não só a discussão sobre a criminalização da homofobia, mas também o direito ao aborto e a legalização das drogas. Em nome de uma religiosidade tacanha, condenam à morte milhares de brasileiros pobres e, de quebra, mobilizam em torno de si e de suas lideranças o que há de mais lamentável no esgoto da política nacional.
Jean Wyllys se nega a ser refém dessa gente e, por isso mesmo, é odiado por ela. Contra ele, costumam lembrar-lhe a participação no Big Brother Brasil, o inefável programa de massa da TV Globo, onde a debilidade humana, sobretudo a de caráter intelectual, é vendida como entretenimento. Jean venceu uma das edições do BBB, onde foi aceito por ser um homossexual discreto, credenciado, portanto, para plantar a polêmica, mas não de forma a torná-la um escândalo. Dono de um discurso político bem articulado, militante da causa gay e intelectualmente superior a seus pares, não só venceu o programa como ganhou visibilidade nacional. De repórter da Tribuna da Bahia, em Salvador, virou redator do programa Mais Você, de Ana Maria Braga, mas logo percebeu que isso não era, exatamente, uma elevação de status profissional.
Na Câmara dos Deputados, Jean Wyllys, 36 anos, baiano de Alagoinhas, tornou-se a cara da luta contra a homofobia no Brasil, justamente num momento em que se discute até a criminalização do bullying. Como se, nas escolas brasileiras, não fossem os jovens homossexuais o alvo principal das piores e mais violentas “brincadeiras” perpetradas por aprendizes de brucutus alegremente estimulados pelo senso comum. Esses mesmos brucutus que, hoje, ligam para o gabinete do deputado do PSOL para ameaçá-lo de morte.
Abaixo, a íntegra de uma carta escrita por Jean ao Jornal do Brasil, por quem foi acusado, por um colunista do JB Wiki (seja lá o que isso signifique), de “censurar cristãos”. O texto é uma pequena aula de civilidade e História. Vale à pena lê-lo:
Em primeiro lugar, quero lembrar que nós vivemos em um Estado Democrático de Direito e laico. Para quem não sabe o que isso quer dizer, “Estado laico”, esclareço: O Estado, além de separado da Igreja (de qualquer igreja), não tem paixão religiosa, não se pauta nem deve se pautar por dogmas religiosos nem por interpretações fundamentalistas de textos religiosos (quaisquer textos religiosos). Num Estado Laico e Democrático de Direito, a lei maior é a Constituição Federal (e não a Bíblia, ou o Corão, ou a Torá).
Logo, eu, como representante eleito deste Estado Laico e Democrático de Direito, não me pauto pelo que diz A Carta de Paulo aos Romanos, mas sim pela Carta Magna, ou seja, pelo que está na Constituição Federal. E esta deixa claro, já no Artigo 1º, que um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é a dignidade da pessoa humana e em seu artigo 3º coloca como objetivos fundamentais a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. A república Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos princípios da prevalência dos Direitos Humanos e repúdio ao terrorismo e ao racismo.
Sendo a defesa da Dignidade Humana um princípio soberano da Constituição Federal e norte de todo ordenamento jurídico Brasileiro, ela deve ser tutelada pelo Estado e servir de limite à liberdade de expressão. Ou seja, o limite da liberdade de expressão de quem quer que seja é a dignidade da pessoa humana do outro. O que fanáticos e fundamentalistas religiosos mais têm feito nos últimos anos é violar a dignidade humana de homossexuais.
Seus discursos de ódio têm servido de pano de fundo para brutais assassinatos de homossexuais, numa proporção assustadora de 200 por ano, segundo dados levantados pelo Grupo Gay da Bahia e da Anistia Internacional. Incitar o ódio contra os homossexuais faz, do incitador, um cúmplice dos brutais assassinatos de gays e lésbicas, como o que ocorreu recentemente em Goiânia, em que a adolescente Adriele Camacho de Almeida, 16 anos, que, segundo a mídia, foi brutalmente assassinada por parentes de sua namorada pelo fato de ser lésbica. Ou como o que ocorreu no Rio de Janeiro, em que o adolescente Alexandre Ivo, que foi enforcado, torturado e morto aos 14 anos por ser afeminado.
O PLC 122 , apesar de toda campanha para deturpá-lo junto à opinião pública, é um projeto que busca assegurar para os homossexuais os direitos à dignidade humana e à vida. O PLC 122 não atenta contra a liberdade de expressão de quem quer que seja, apenas assegura a dignidade da pessoa humana de homossexuais, o que necessariamente põe limite aos abusos de liberdade de expressão que fanáticos e fundamentalistas vêm praticando em sua cruzada contra LGBTs.
Assim como o trecho da Carta de Paulo aos Romanos que diz que o “homossexualismo é uma aberração” [sic] são os trechos da Bíblia em apologia à escravidão e à venda de pessoas (Levítico 25:44-46 – “E, quanto a teu escravo ou a tua escrava que tiveres, serão das gentes que estão ao redor de vós; deles comprareis escravos e escravas…”), e apedrejamento de mulheres adúlteras (Levítico 20:27 – “O homem ou mulher que consultar os mortos ou for feiticeiro, certamente será morto. Serão apedrejados, e o seu sangue será sobre eles…”) e violência em geral (Deuteronômio 20:13:14 – “E o SENHOR, teu Deus, a dará na tua mão; e todo varão que houver nela passarás ao fio da espada, salvo as mulheres, e as crianças, e os animais; e tudo o que houver na cidade, todo o seu despojo, tomarás para ti; e comerás o despojo dos teus inimigos, que te deu o SENHOR, teu Deus…”).
A leitura da Bíblia deve ensejar uma religiosidade sadia e tolerante, livre de fundamentalismos. Ou seja, se não pratica a escravidão e o assassinato de adúlteras como recomenda a Bíblia, então não tem por que perseguir e ofender os homossexuais só por que há nela um trecho que os fundamentalistas interpretam como aval para sua homofobia odiosa.
Não declarei guerra aos cristãos. Declarei meu amor à vida dos injustiçados e oprimidos e ao outro. Se essa postura é interpretada como declaração de guerra aos cristãos, eu já não sei mais o que é o cristianismo. O cristianismo no qual fui formado – e do qual minha mãe, irmãos e muitos amigos fazem parte – valoriza a vida humana, prega o respeito aos diferentes e se dedica à proteção dos fracos e oprimidos. “Eu vim para que TODOS tenham vida; que TODOS tenham vida plenamente”, disse Jesus de Nazaré.
Não, eu não persigo cristãos. Essa é a injúria mais odiosa que se pode fazer em relação à minha atuação parlamentar. Mas os fundamentalistas e fanáticos cristãos vêm perseguindo sistematicamente os adeptos da Umbanda e do Candomblé, inclusive com invasões de terreiros e violências físicas contra lalorixás e babalorixás como denunciaram várias matérias de jornais: é o caso do ataque, por quatro integrantes de uma igreja evangélica, a um centro de Umbanda no Catete, no Rio de Janeiro; ou o de Bernadete Souza Ferreira dos Santos, Ialorixá e líder comunitária, que foi alvo de tortura, em Ilhéus, ao ser arrastada pelo cabelo e colocada em cima de um formigueiro por policiais evangélicos que pretendiam “exorcizá-la” do “demônio”.
O que se tem a dizer? Ou será que a liberdade de crença é um direito só dos cristãos?
Talvez não se saiba, mas quem garantiu, na Constituição Federal, o direito à liberdade de crença foi um ateu Obá de Xangô do Ilê Axé Opô Aforjá, Jorge Amado. Entretanto, fundamentalistas cristãos querem fazer uso dessa liberdade para perseguir religiões minoritárias e ateus.
Repito: eu não declarei guerra aos cristãos. Coloco-me contra o fanatismo e o fundamentalismo religioso – fanatismo que está presente inclusive na carta deixada pelo assassino das 13 crianças em Realengo, no Rio de Janeiro.
Reitero que não vou deixar que inimigos do Estado Democrático de Direito tente destruir minha imagem com injúrias como as que fazem parte da matéria enviada para o Jornal do Brasil. Trata-se de uma ação orquestrada para me impedir de contribuir para uma sociedade justa e solidária. Reitero que injúria e difamação são crimes previstos no Código Penal. Eu declaro amor à vida, ao bem de todos sem preconceito de cor, raça, sexo, idade e quaisquer outras formas de preconceito. Essa é a minha missão.

Jean Wyllys (Deputado Federal pelo PSOL Rio de Janeiro)