A última versão da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), sancionada em 1996 e em vigor até hoje, completa 15 anos esta semana. Conhecido como Lei Darcy Ribeiro, em referência ao senador responsável pela relatoria do projeto, o dispositivo tem como tarefa principal orientar o ensino do país, fornecendo as bases jurídicas para efetivação do direito à educação. Vista por alguns especialistas como um avanço, há também quem questione seus termos e sua aplicação ao longo desses anos.
No campo do ensino superior, as principais divergências se situam entre o ensino privado e o ensino público. Enquanto os defensores das instituições privadas enxergam na LDB uma porta de entrada para sua expansão e diversificação, os apoiadores do ensino público apontam algumas dificuldades para a garantia do acesso universal à formação gratuita e de qualidade.
Para a a professora do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e especialista em estrutura e política do ensino superior, Líghia Horodynski-Matsushigue, “a LDB promoveu uma série de aberturas em relação ao ensino superior que, mais tarde, se tornaram deletérias para a educação brasileira como um todo”.
Já o consultor sênior do Instituto Latino-Americano de Planejamento Institucional (Ilape) e membro da Associação Brasileira das Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Celso Frauches, considera a LDB “uma lei do futuro”, que possibilitou a ampliação da atuação de instituições privadas de ensino superior no país.
Segundo o doutor em Educação e autor do livro “As reformas do Ensino Superior no Brasil”, Lalo Minto, um dos grandes problemas da LDB foi a flexibilização de vários elementos previstos na Constituição de 1988 que deveriam ter sido objeto de regulamentação. Como exemplos, ele cita a gratuidade do ensino e a diversificação das instituições de ensino superior.
Das 158 instituições de ensino que foram bem avaliadas, 77 são privadas e 81, públicas. Entre os estabelecimentos de ensino com resultado insatisfatório, 640 são privados e 43, públicos.
“Ao invés de se investir maciçamente em universidades, que eram consideradas caras e ineficientes, a LDB abriu uma brecha para que o ensino crescesse em instituições não-universitárias.” De acordo com ele, isso ajuda a entender o fenômeno da criação e expansão dos diferentes tipos de instituições, como faculdades, centros universitários, faculdades integradas, centros de ensino tecnológico – ocorridos na década seguinte à aprovação da Lei.
Uma das conseqüências dessa diversificação, aponta Minto, foi a separação entre ensino, pesquisa e extensão. “A indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão já era um problema histórico entre as instituições privadas. A LDB não apenas não alterou essa realidade, como facilitou a ampliação do setor, sem levar em consideração esse princípio.”
Por outro lado, acrescenta ele, os variados tipos de unidades de ensino produzem também níveis diferenciados de formação. “A formação em instituições não universitárias é algo que se reflete, geralmente, nos postos que essas pessoas vão ocupar no mercado de trabalho.”
Frauches avalia que essa ampliação foi positiva, pois por não estarem comprometidas com pesquisa e inovação, as instituições que surgiram se focaram em cursos de graduação de qualidade. “E fazem uma prestação de serviço muito boa”, acrescenta.
Educação a distância
Outro aspecto da LDB que alimenta ainda mais a polêmica entre públicas e privadas é a abrangência da educação a distância para o ensino superior.
Com a aprovação da LDB, a modalidade apresentou um crescimento vertiginoso. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o número de matrículas passou de 5.287, no ano 2000, para 838.125 em 2009.
Para Líghia, a formação à distância dos profissionais da educação básica já está afetando a forma como eles se colocam diante de uma sala de aula. “Ao contrário do que é feito no resto do mundo, onde a educação a distância é usada somente para algumas matérias e para compor currículos, no Brasil, ela tem formado integralmente alguns profissionais, sobretudo nas áreas de pedagogia e assistência social.”
Carreira Docente
O artigo 52 da LDB – que determina a exigência de, no mínimo, um terço de professores com titulação de mestrado ou doutorado e um terço trabalhando em regime integral para que as instituições sejam reconhecidas como universidades – é visto como um avanço por Frauches. Segundo ele, “essa medida obrigou a iniciativa privada a capacitar os professores para mestrado e doutorado”.
No entanto, afirma Líghia,“sabemos que isso não é cumprido em grande parte do ensino privado”. Segundo ela, muitas vezes a dedicação exclusiva é à instituição e não à pesquisa, como prevê a Lei. Outro fenômeno recorrente nas privadas, indica ela, é substituição de doutores por mestres, possibilitando o pagamento de salários mais baixos.
Um problema decorrente dessa exigência, segundo Frauches, é que o doutorado não garante uma formação de qualidade para o magistério superior. “Nos programas de doutorado oferecidos hoje raramente há uma disciplina voltada para metodologia do ensino e de aprendizagem. Temos excelentes pesquisadores, mas professores que não dão conta da complexidade de uma sala de aula do ensino superior”, afirma.
Acompanhe a cronologia da LDB, desde a sua primeira versão em 1961: