Em meio à segunda recessão desde 2009 e com uma série de escândalos que sacudiram a coalizão conservadora-liberal democrata, Londres, Liverpoll e Salford elegem prefeito e outros 181 municípios britânicos tem que renovar o mandato de cinco mil conselheiros. Uma derrota contundente deixaria o governo e sua estratégia de ajuste fiscal contra as cordas, mas a super-quinta eleitoral será também um teste para seu rival trabalhista, o líder da oposição, Ed Miliband. O artigo é de Marcelo Justo, direto de Londres.
Marcelo Justo - De Londres no CARTA MAIOR
Londres - Após dois anos de governo, o
primeiro ministro David Cameron enfrenta sua maior prova eleitoral
nesta quinta-feira. Em meio à segunda recessão desde 2009 e com uma
série de escândalos que sacudiram a coalizão conservadora-liberal
democrata, Londres, Liverpoll e Salford elegem prefeito e outros 181
municípios britânicos tem que renovar o mandato de cinco mil
conselheiros. Uma derrota contundente deixaria o governo e sua
estratégia de ajuste fiscal contra as cordas, mas a super-quinta
eleitoral será também um teste para seu rival trabalhista, o líder da
oposição, Ed Miliband.
Londres é a disputa mais importante. A favor de Cameron conta o fato de que o candidato conservador, o atual prefeito Boris Johnson, tem um alto índice de popularidade e vem mantendo distância do governo central. Em uma campanha muito marcada pela personalidade dos candidatos, Johnson conseguiu manter sua aura de excêntrico conservador, com maneirismos de classe alta e uma linguagem colorida próxima dos setores mais populares.
O candidato trabalhista, Ken “vermelho” Livingstone, uma das figuras mais idiossincráticas da política britânica, perdeu parte de sua popularidade devido a revelações sobre suas declarações de imposto de renda. Não caiu bem no eleitorado saber que um político apelidado de “vermelho”, que atacou a sonegação fiscal dos ricos, utilizava uma empresa semifictícia para pagar o imposto corporativo, muito menor que o de ganhos pessoais, por suas bem remuneradas colunas jornalísticas.
O impacto desta revelação foi demolidor para Livingstone que, desde fevereiro, está tentando reverter a vantagem aberta por Johnson no ápice do escândalo. No final de março, o governo nacional deu a ele uma ajuda involuntária com o orçamento anunciado pelo ministro de Finanças, George Osborne. Rebatizado pela imprensa como “o imposto da vovó”, e “orçamento dos ricos”, devido ao corte de impostos para os milionários e a redução de renda de aposentadorias, cristalizou a percepção de um governo de ricos que não entendia o impacto do ajuste que estava sendo implementado pela coalizão.
A este espetacular gol contra se agregaram a partir daí uma lista de desatinos que transitam entre a corrupção e a incompetência: o escândalo das escutas telefônicas do grupo Murdoch, um ministro da Cultura na corda bamba, caos nos aeroportos, uma ministra do Interior questionada e o anúncio da semana passada que a economia havia entrado em recessão.
Com esse pano de fundo, a mensagem de Livingstone tornou-se mais nacional do que local. Esta semana, ele apresentou dois grandes posters de David Cameron e Boris Johnson pintados como marcianos com o slogan “os tories (conservadores) vivem em outro planeta”. O líder trabalhista Ed Miliband, que joga muito nesta campanha eleitoral, atacou a estratégia de Johnson: “Ele quer que as pessoas pensem que ele não é conservador. Não aparece em público com David Cameron e em seu programa há apenas alguma referência a seu próprio partido. Mas é um típico prefeito conservador que aumentou o preço das passagens, cortou serviços e apoiou os ricos de Londres”, disse Miliband.
Nas últimas pesquisas, os trabalhistas conseguiram reduzir a diferença para cerca de dois pontos e tentam agora recuperar o voto trabalhista indeciso que poderia se inclinar pela abstenção ou aceitar que Boris Johnson é um “conservador diferente”.
As matemáticas “políticas” de uma eleição com tantas frentes são complicadas. Uma vitória em Londres pode salvar o cada vez mais atribulado primeiro ministro David Cameron. Mas, se a esta vitória, se somar uma desastrosa eleição nos 181 municípios e nas outras duas prefeituras, será difícil evitar a percepção de um veredito em nível nacional sobre a coalizão.
Para Ed Miliband, os números também podem resultar ambíguos e traiçoeiros. Em uma tentativa de minimizar as expectativas, o trabalhismo disse que pretende ganhar cerca de 300 vereadores a mais do que nas últimas eleições, mas os analistas políticos assinalam que os trabalhistas precisam que esse número chegue a 700 para que possam voltar a pretender o poder em nível nacional.
Uma derrota em Londres seria um veredito não só sobre Livingstone, mas sobre o próprio Miliband. E se os nacionalistas escoceses ganharem no município de Glasgow, totem do trabalhismo desde o início do século XX, o golpe seria ainda mais devastador. Dado que a popularidade de Miliband (21%) está muito abaixo da de seu próprio partido em nível nacional (40%), crescerá a percepção de que o atual líder é mais um obstáculo do que um caminho para aproveitar a impopularidade da coalizão.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer
Londres é a disputa mais importante. A favor de Cameron conta o fato de que o candidato conservador, o atual prefeito Boris Johnson, tem um alto índice de popularidade e vem mantendo distância do governo central. Em uma campanha muito marcada pela personalidade dos candidatos, Johnson conseguiu manter sua aura de excêntrico conservador, com maneirismos de classe alta e uma linguagem colorida próxima dos setores mais populares.
O candidato trabalhista, Ken “vermelho” Livingstone, uma das figuras mais idiossincráticas da política britânica, perdeu parte de sua popularidade devido a revelações sobre suas declarações de imposto de renda. Não caiu bem no eleitorado saber que um político apelidado de “vermelho”, que atacou a sonegação fiscal dos ricos, utilizava uma empresa semifictícia para pagar o imposto corporativo, muito menor que o de ganhos pessoais, por suas bem remuneradas colunas jornalísticas.
O impacto desta revelação foi demolidor para Livingstone que, desde fevereiro, está tentando reverter a vantagem aberta por Johnson no ápice do escândalo. No final de março, o governo nacional deu a ele uma ajuda involuntária com o orçamento anunciado pelo ministro de Finanças, George Osborne. Rebatizado pela imprensa como “o imposto da vovó”, e “orçamento dos ricos”, devido ao corte de impostos para os milionários e a redução de renda de aposentadorias, cristalizou a percepção de um governo de ricos que não entendia o impacto do ajuste que estava sendo implementado pela coalizão.
A este espetacular gol contra se agregaram a partir daí uma lista de desatinos que transitam entre a corrupção e a incompetência: o escândalo das escutas telefônicas do grupo Murdoch, um ministro da Cultura na corda bamba, caos nos aeroportos, uma ministra do Interior questionada e o anúncio da semana passada que a economia havia entrado em recessão.
Com esse pano de fundo, a mensagem de Livingstone tornou-se mais nacional do que local. Esta semana, ele apresentou dois grandes posters de David Cameron e Boris Johnson pintados como marcianos com o slogan “os tories (conservadores) vivem em outro planeta”. O líder trabalhista Ed Miliband, que joga muito nesta campanha eleitoral, atacou a estratégia de Johnson: “Ele quer que as pessoas pensem que ele não é conservador. Não aparece em público com David Cameron e em seu programa há apenas alguma referência a seu próprio partido. Mas é um típico prefeito conservador que aumentou o preço das passagens, cortou serviços e apoiou os ricos de Londres”, disse Miliband.
Nas últimas pesquisas, os trabalhistas conseguiram reduzir a diferença para cerca de dois pontos e tentam agora recuperar o voto trabalhista indeciso que poderia se inclinar pela abstenção ou aceitar que Boris Johnson é um “conservador diferente”.
As matemáticas “políticas” de uma eleição com tantas frentes são complicadas. Uma vitória em Londres pode salvar o cada vez mais atribulado primeiro ministro David Cameron. Mas, se a esta vitória, se somar uma desastrosa eleição nos 181 municípios e nas outras duas prefeituras, será difícil evitar a percepção de um veredito em nível nacional sobre a coalizão.
Para Ed Miliband, os números também podem resultar ambíguos e traiçoeiros. Em uma tentativa de minimizar as expectativas, o trabalhismo disse que pretende ganhar cerca de 300 vereadores a mais do que nas últimas eleições, mas os analistas políticos assinalam que os trabalhistas precisam que esse número chegue a 700 para que possam voltar a pretender o poder em nível nacional.
Uma derrota em Londres seria um veredito não só sobre Livingstone, mas sobre o próprio Miliband. E se os nacionalistas escoceses ganharem no município de Glasgow, totem do trabalhismo desde o início do século XX, o golpe seria ainda mais devastador. Dado que a popularidade de Miliband (21%) está muito abaixo da de seu próprio partido em nível nacional (40%), crescerá a percepção de que o atual líder é mais um obstáculo do que um caminho para aproveitar a impopularidade da coalizão.
Tradução: Marco Aurélio Weissheimer