Após sete anos e muita polêmica, o Auditório Araújo Vianna volta à ativa
Milton Ribeiro no SUL21
O Auditório Araújo Vianna tem uma história longa e acidentada. O
primeiro Araújo foi uma concha acústica localizada na esquina ao lado da
Praça da Matriz com a rua Duque de Caxias, local onde hoje está a
Assembleia Legislativa. Tinha capacidade para 1.200 pessoas. Tratava-se
de uma bela construção de estilo neoclássico que contava com bancos
rodeados por caramanchões.
A ideia de sua construção surgiu em 1920 e materializou-se num
projeto de inspiração alemã elaborado por José Wiedersphan e Arnaldo
Boni. Seu nome é uma homenagem ao compositor gaúcho Araújo Vianna
(1871-1916). O projeto foi considerado revolucionário na época, pois
nunca tinha sido construída uma estrutura de tal porte em concreto
armado. A construção teve início em 1925 e a inauguração ocorreu no dia
19 de novembro de 1927. O antigo Araújo Vianna teve enorme participação
na vida cultural de Porto Alegre. Localizava-se bem no centro da cidade e
dava oportunidade a que pessoas de todas as classes assistissem a
apresentações musicais. Jamais um espetáculo levado no velho Araújo teve
cobrança de ingresso.
Grande público costumava ir à Praça da Matriz para assistir a famosas
“retretas” que ocorriam nas quartas e domingos. Nos dias de inverno, os
espetáculos se davam no meio da tarde e no verão, ao anoitecer. As
apresentações incluíam não apenas a Banda Municipal como também corais,
grupos folclóricos e teatrais. O palco servia para ensaio de óperas que
se apresentariam no Theatro São Pedro e que eram assistidas pelo
público. Em meados da década de 50, cresceu a necessidade de um novo
prédio para abrigar a Assembleia Legislativa. Ela deveria ficar próxima
às sedes do Executivo, Legislativo e Judiciário. E lá se foi um pedaço
peculiaríssimo de nossa cidade. O próprio poder público tratou de
eliminar aquele que seria um belo recanto do Centro Histórico da cidade.
A antiga estrutura foi demolida e a nova sede foi projetada pelos
arquitetos Moacir Moojen Marques e Carlos Maximiliano Fayet. Em 1959, o
Município e o Estado negociaram que o último construiria um novo
auditório em troca da cessão, pelo município, da área ao lado da Praça
da Matriz. Já no mês de outubro de 1960 foram retirados todos os bancos
do velho Araújo Vianna e em sequência, iniciou-se a demolição da concha
acústica.
A nova sede teria a capacidade quatro vezes maior do que a original e
foi inaugurada em 12 de março de 1964 com capacidade para 4500 pessoas.
Dias depois, já com o golpe de 64 em curso, o arquiteto Carlos
Maximiliano Fayet teria sido questionado por uma comissão militar que
alegava um suposto envolvimento do arquiteto com os comunistas. A razão
teria sido o fato de que o Araújo Vianna, quando visto do alto, teria a
forma de uma foice e um martelo. A partir dos anos 70, ele passou a
abrigar grandes shows da MPB, mas nos anos 80 passou a ter sua
utilização diminuída devido a falta de reformas.
A chuva e o frio do inverno gaúcho começaram a preocupar os
utilizadores do auditório. Muitos shows eram transferidos ou cancelados
por causa do mau tempo. Surgiu a ideia de uma cobertura, a qual foi
debatida durante 30 anos. Em meados dos anos 90, nas reuniões do
Orçamento Participativo no bairro Bom Fim, foi decidida a construção da
cobertura. Para estudar o projeto, foram contratados os arquitetos
responsáveis pela construção do auditório em 1964.
Na verdade, o Araújo aberto era um espaço adequado às necessidades da
época de sua construção. O auditório foi feito para ser aberto, com
concha acústica e sem cobertura, em substituição ao antigo da praça da
Matriz. E, afinal, qual é a idéia de uma concha acústica? Obviamente
shows acústicos. Era um projeto perfeito para apresentações de
orquestras, bandas, óperas, de pequenos conjuntos de choro e samba – ou
shows com pouca amplificação. Era um belo projeto, mas inadequado às
“necessidades” de som muito amplificado e grave, exigidos por nossa
cultura atual.
Quando da ocorrência dos primeiros shows com som amplificadíssimo,
estes passaram a perturbar o sossego dos moradores do Bonfim, o que
acabou por inviabilizar a utilização do auditório em horários noturnos.
Fez-se a a nova cobertura, que foi inaugurada em 4 de outubro de 1996,
com um histórico show de João Gilberto. A capacidade passou a ser de
três mil pessoas sentadas. A técnica utilizada na cobertura foi a
utilização de lona tensionada, o que já fazia prever uma futura reforma,
devido a sua durabilidade limitada.
Mas o pior é que, em razão do esticamento da lona e de seu formato de
meia parábola invertida, ela tornou-se acusticamente inviável.
Internamente, a cobertura refletia o som em todas as direções. Além
disso, o auditório continuava inevitavelmente redondo e, portanto,
devolvia o som da traseira da plateia para o palco. O palco, em concha,
projetava o som para a platéia, mas ele retornava de forma caótica.
Quando chovia, o ruído interno era insuportável.
Em 1997, o Parque Farroupilha foi tombado como Patrimônio Histórico e
Cultural do Município. Como parte integrante do Parque, o auditório
passou a ter sua preservação garantida. A lona que cobria o Araújo
Vianna, segundo laudo técnico da SMOV, perdeu sua validade em julho de
2002. O risco era de que, em caso de chuva mais persistente, a pressão
sobre a lona rompesse os cabos, que teriam um efeito de chicote sobre o
público. No início de 2005, o auditório foi interditado pela Prefeitura
de Porto Alegre. A lona passou a servir apenas aos pombos do parque.
Hoje foi construída uma nova cobertura com um sanduíche de materiais
que provê o isolamento acústico para os shows de volume sonoro mais
alto. Também foram tratadas as reflexões da cobertura curva e o retorno
de som para o palco. Dentre os requisitos para a reforma do auditório,
estavam a reforma interna — incluindo palco e cadeiras, assim como
banheiros, camarins e áreas de apoio — e externa, com cobertura
acusticamente tratada para evitar transtornos aos moradores, além de
melhorias no entorno do auditório. A nova cobertura acústica é fixa,
feita em madeira, poliuretano expandido e resina impermeável. O local
tem capacidade para 3 mil pessoas (cerca de 4300 quando for misto,
composto por cadeiras e pista), 2 bares, novos camarins, novos banheiros
e acessibilidade para cadeirantes numa área de 5000 m².
O diretor da Opus Promoções, Carlos Konrath, citou que esta é a
primeira parceria público-privada do setor cultural da cidade. A Opus
dividirá o espaço com a Prefeitura, ficando com 75% do calendário anual
do Araújo pelo período de dez anos. Haverá também um conselho gestor com
participação paritária dos dois parceiros. Como atrações trazidas pela
Prefeitura, já estão confirmados o show de inauguração, com os artistas
citados abaixo, e mais Tom Zé no dia 3 de outubro. A programação da Opus
abre no dia 22 de setembro com Maria Rita cantando Elis Regina, e segue
com nomes como Paulinho da Viola, Roupa Nova e outros.
O concerto de inauguração desta quinta-feira, 20 de setembro, às 18h,
envolverá nomes marcantes da cena musical gaúcha, muitos deles com
biografia ligada ao auditório. São eles: Carlinhos Carneiro, Edu K,
Wander Wildner, Hermes Aquino, Gelson Oliveira, Nico Nicolaiewsky, Nei
Van Soria, Gloria Oliveira, Raul Elwanger, Charles Máster, Nelson Coelho
de Castro, Zé Caradípia e Elisa, Júlio Reny, King Jim, Tonho Crocco,
Cláudio Heinz e Júlia Barth (Replicantes), Elaine Geissler, Tiago
Ferraz, Hique Gómez, Antônio Villeroy e Bebeto Alves.