terça-feira, 4 de maio de 2010

Exploração dos trabalhadores nos grandes magazines.....


Ligadas a grandes redes, oficinas tratam imigrantes como escravos

No merchandising na novela das oito ou numa propaganda no horário nobre, atores consagrados cumprem o script ignorando a cadeia de produção dos grandes magazines. No mesmo horário, diversos trabalhadores – em geral latino-americanos – terminam sua jornada, iniciada muitas vezes há 12 horas, para dar conta das demandas dos mesmos anunciantes. A cada peça costurada, chegam a ganhar míseros R$0,10 e precisam ignorar seus próprios limites por um salário que supra minimamente as suas necessidades.


Por Priscila Lobregatte no Portal Vermelho
A rotina desses milhares de trabalhadores estrangeiros que buscam uma nova vida no Brasil não tem nada de sombra e água fresca. Passando por graves problemas financeiros ou refugiando-se de guerras civis, eles chegam com poucos recursos e topam qualquer trabalho. Os que estão em situação mais delicada, procuram albergues ou instituições de assistência até conseguirem recursos para se manter. O caldo criado pela miséria, o desconhecimento, o medo e mesmo a promessa de tempos melhores faz de muitos deles reféns de um sistema espúrio de exploração.

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Quase escravos

As ruas do Bom Retiro, espécie de paraíso das sacoleiras, é a Meca de quem quer comprar roupas por preços abaixo da média. Mas, o custo dessa pechincha é alto para os trabalhadores que fornecem essas mercadorias tanto para as lojas do bairro da capital paulista quanto para grandes redes de vestuário.

 
MTE flagra trabalhadora em oficina do Bom Retiro  
Em pequenas oficinas, que por vezes também servem de moradia, amontoam-se vários homens, mulheres e mesmo crianças que trabalham e vivem num ambiente insalubre e desumano. Fiscais do Ministério do Trabalho estimam que existam entre oito mil e 10 mil oficinas na Grande São Paulo que empregam cerca de 80 mil a 100 mil sul-americanos. Dos 50 mil estrangeiros anistiados em 2009, cerca de 32% (16 mil) são bolivianos que vivem em São Paulo. E uma fatia considerável deles se espalha por essas fabriquetas que prestam serviços terceirizados a grandes lojas, como a Marisa.


A rede, autuada em março, foi a primeira em que os fiscais comprovaram casos análogos à escravidão em ambiente urbano. Por isso, foi multada em R$ 634 mil e os fiscais recomendaram sua inclusão na “lista suja”, que divulga os nomes de ruralistas e empresas que exploram esse tipo de trabalho.

“Há indícios de outras situações idênticas à constatada na Marisa nas redes C&A, Renner e Riachuelo”, disse ao jornal Folha de S.Paulo (18/03/2010) Renato Bignami, chefe da Seção de Fiscalização do Trabalho Substituto do Ministério do Trabalho e Emprego. Ações como essa fazem parte do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, incluído no Plano Nacional de Direitos Humanos.

Além das ações nacionais, Paulo Sérgio de Almeida, presidente do Conselho Nacional de Imigração do MTE, diz que a superintendência do ministério em São Paulo lançou projetos próprios como o Pacto pelo Trabalho Decente de Imigrantes. “Para isso, foi criada uma rede de entidades que assumiram responsabilidades na erradicação do trabalho escravo de imigrantes. As grandes cadeias de comércio do setor de vestiário foram convidadas a participar, já que de fato estas grandes redes devem monitorar suas cadeias produtivas de forma a não permitir a ocorrência de graves problemas como o uso de trabalhadores imigrantes em condições degradantes entre seus fornecedores”, declarou ao Vermelho.

Apesar do ineditismo do caso, a realidade da exploração dessa mão de obra não é novidade. “Temos denunciado essa situação desde 1990”, explicou ao Vermelho a presidente do Sindicato das Costureiras de São Paulo e Osasco, Eunice Cabral. E, para se ter uma ideia de como a exploração e a informalidade aumentaram, ela completa: “naquele ano, éramos em nossa base, 180 mil trabalhadores no mercado formal. Hoje somos 80 mil. E no mesmo período, a produtividade do setor cresceu assustadoramente, da mesma forma como diminuiu o número de pessoas empregadas formalmente. Para piorar, vale lembrar que nosso setor não usa tecnologia de ponta em sua totalidade; 50% são maquinários mais modernos, mas a outra metade é formada por máquinas obsoletas”.

 
  Eunice: Não queremos um trabalhador mendigo (por Sindicato das Costureiras)
O sindicato vem trabalhando junto a órgãos de fiscalização – como o MTE, o Ministério Público a Polícia Federal, entre outros – a fim de coibir essa prática. “É muito comum haver casos como o da Marisa, que alegou não ter conhecimento de tal situação pelo fato de o trabalho ser terceirizado várias vezes na cadeia produtiva. Mas, como não sabia? Os documentos levantados pelo Ministério mostram isso claramente. Outra coisa: a empresa nunca desconfiou de uma peça ser feita por um valor tão baixo?”, questiona.


“Em geral, o trabalhador recebe R$ 0,10 por peça, valor que pode chegar ao máximo de R$ 0,40 e pode ser vendida, por exemplo, a R$ 40,00 na loja, ou seja, um lucro altíssimo. Além da questão humana, existe também o problema da concorrência desleal que prejudica as empresas que procuram agir corretamente. É um dumping social e econômico e é contra isso que temos lutado”, esclarece Eunice.

Para os trabalhadores formais, o piso da categoria varia entre R$ 766,12 e R$ 850,65, dependendo da função exercida. Se quiser ganhar o menor salário tendo como referência o valor mais baixo (e comumente adotado) por peça (R$ 0,10), o trabalhador informal terá de produzir mais de 7.600 roupas. A fim de alcançar um valor como esse para sua sobrevivência, eles chegam a trabalhar 16 horas por dia, especialmente em épocas de maior demanda, como Natal ou Dia das Mães.

No estilo dos piores coronéis do interior do país, muitos desses patrões retêm os passaportes para garantir a manutenção dos empregados. Não bastasse toda essa situação degradante, há ainda os problemas de saúde, como a bissinose, uma reação fibrosa crônica dos pulmões à inalação de poeira de algodão que os tecidos soltam durante a fabricação das roupas. A doença, comum a quem trabalha no ramo sem proteção, pode ser confundida com a tuberculose e a falta de tratamento rápido e adequado pode levar à morte. “Além da questão respiratória, nossos trabalhadores podem sofrer de tendinite, varizes e há até mesmo casos de câncer vaginal. As mulheres pegam restos de tecidos e fazem almofadinhas para melhorar o conforto na cadeira, o que por vezes acaba levando à doença. Tudo isso advém das péssimas condições de trabalho”, alerta Eunice.

O meio em que se dá a exploração da mão de obra estrangeira é também ameaçador. Na feira da Kantuta, realizada pela comunidade boliviana no bairro do Pari, em São Paulo, carros de luxo têm em seus vidros e capô placas onde se lê, em espanhol e português, “admitem-se costureiros”. Tentar falar com eles é quase impossível. Ninguém quer assumir fazer parte desse submundo.

Entre os trabalhadores, a situação é ainda mais delicada. Mariela, nome fictício de uma boliviana de 24 anos, embora seja um desses trabalhadores, prefere não falar. “Ganho menos do que o piso, mas meu patrão é bom. Não tenho problema”, hesita. “Mas, minha prima trabalhava demais e ganhava muito pouco”, contorna, tentando fugir do assunto. Porém, reconhece: “emagreci muito desde que estou nisso porque trabalho bastante e acabo comendo pouco”.

Eunice vai além: “já recebi ameaças anônimas por telefone”, mas “não me preocupo porque quando topei estar à frente do sindicato, sabia que minha vida não seria normal. Ainda assim, enquanto eu cumprir esta função – e este é o pensamento de nossa diretoria – vou trabalhar para mudar essa situação. Não queremos um trabalhador mendigo, nem que os estrangeiros deixem o país, mas que tenham uma vida e um trabalho dignos e seus direitos assegurados”.

As garras do império se voltam para o Brasil...

O império retoma o ataque
Escrito por Wladimir Pomar - no Correio da Cidadania
 
Segundo notícias recentes, porta-vozes do sistema financeiro internacional estão alertando seus acionistas de que o mercado de ações brasileiro estaria formando uma bolha, a economia do Brasil estaria aquecida e o real supervalorizado. Em outras palavras, parece estar findando a lua de mel entre o sistema financeiro internacional e a política de crescimento do governo brasileiro, embora tal sistema tenha sido um dos que mais lucraram nos últimos anos.
 
O desconfiômetro deve nos conduzir a uma análise mais cuidadosa do assunto, de modo a descobrir se há razões reais para o alerta, ou se se trata de jogada política, tendo em vista possíveis mudanças na política monetária brasileira. O Banco Central se apressou a tranqüilizar o sistema financeiro internacional, afirmando que o Brasil pode adotar medidas que impeçam um crescimento superior a 2% ao ano, desde que retire os incentivos fiscais e aumente a taxa Selic, a taxa básica de juros.
 
Ou seja, o Banco Central, numa penada, mudou toda a perspectiva de crescimento do país. Por um lado, avisou ao governo que a política monetária deve manter tranqüilos os acionistas dos bancos internacionais. Por outro, informou aos empresários que não devem investir na ampliação de sua capacidade produtiva. Primeiro, porque isso pode causar fricções com o sistema financeiro internacional. E depois porque vale mais a pena aplicar no jogo de ações da bolsa de valores, que lhe garante um rentismo certo.
 
Estranhamente, essa encenação entre o sistema financeiro internacional e o Banco Central brasileiro ocorre no momento em que o PT acena para a possibilidade, com a continuidade do governo democrático e popular, de adotar medidas para reduzir de forma mais consistente os juros e a especulação financeira, estimular os investimentos produtivos para aumentar a oferta e continuar estimulando a demanda através do crédito.
 
Em outras palavras, o sistema financeiro e o Banco Central comunicaram à candidatura Serra que podem dizer publicamente que os planos de crescimento da candidatura Dilma não passam de euforia sem base na realidade. Algo, aliás, que já vem fazendo parte da campanha da oposição e da grande imprensa a respeito da implementação do PAC. Portanto, as notícias parecem ter mais motivação política do que econômica e financeira.
 
É evidente que a redução do ritmo de crescimento e a elevação das taxas de juros podem ter um efeito perverso sobre o emprego, a renda dos trabalhadores, o endividamento das famílias, o mercado interno. Ou seja, tudo que já se conhece da política levada a cabo, por vários anos, pelos governos Collor e FHC. A posição a adotar, num caso como esse, seria pressionar o governo para manter firmeza em sua política de crescimento, rebaixamento dos juros e enquadramento do sistema financeiro em seu papel de financiador da produção.
 
Apesar disso, intelectuais às voltas com a crise de ideais preferem atacar a política de crédito do governo, concordando com o sistema financeiro internacional quanto à possibilidade de uma bolha na venda a longo prazo. Além de a admitirem, para demonstrá-la utilizam o famoso método do absurdo, argumentando que ela pode estourar, se o emprego e a renda dos endividados não crescerem e se os investimentos produtivos voltados para o mercado interno não ocorrerem. Em outras palavras, se o pára-quedas não abrir, o saltador se esborrachará; se o freio não funcionar, o caminhão baterá; se o trilho abrir, o trem descarrilará. O absurdo pode ir ao infinito.
 
A política de crédito tem por base justamente as políticas de investimentos produtivos, rebaixamento dos juros, crescimento do produto interno, crescimento dos empregos, ampliação da renda e do mercado interno, configurando um novo projeto nacional que combine o desenvolvimento das forças produtivas, com distribuição de renda e ampliação dos direitos democráticos. Nesse processo, a disputa entre os interesses populares e os interesses capitalistas se manterá em tensão permanente, sendo difícil prever por quanto tempo tais interesses poderão ser harmonizados num projeto comum.
 
De qualquer modo, a intelectualidade tem um papel fundamental na análise do desenvolvimento desse processo, colocando-se firmemente ao lado dos interesses populares e buscando as táticas que os ajudem a evitar as armadilhas que o capital financeiro, em especial, vai antepor para tentar romper o projeto comum. Se algum dia o projeto se romper, a única forma de conservar a razão e ganhar a maioria do povo será fazer com que a responsabilidade por tal rompimento seja clara e totalmente dos interesses capitalistas.
 
Para tanto, a intelectualidade de esquerda necessita voltar a enxergar sua existência como uma expressão da divisão social, da divisão de sociedade em classes. Procurar se referenciar à classe ou às classes que representa, consciente ou inconscientemente. Ela não pode intervir nos rumos da História sem compreender e representar interesses e necessidades históricas de classe, sem aderir a tais interesses, nem ligar-se organicamente a eles.
 
Pela ausência de uma análise de classe mais acurada da sociedade brasileira, e pela ação da síndrome do manual, há entre nós uma miríade de intelectuais que não conseguem enxergar a realidade como ela é, nem os desvios que ela impõe à política para alcançar os objetivos estratégicos. Com isso, como vimos, podem negar-se a si próprios e a seus interesses de classe, e argumentar como os liberais e os neoliberais. O que pode ser dramático, nos momentos em que o império contra-ataca.
 
Wladimir Pomar é escritor e analista político.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

EZLN - Exército Zapatista de libertação Nacional e seu novo jornal na web...

“Desinformar-se e enfrentar a investida dos meios de comunicação capitalistas”


Jornalista que acompanha os zapatistas fala sobre a importância do trabalho de contra-informação para as batalhas que se passam “abajo y a la izquierda”
 Das periferias para o centro, a comunicação alternativa vai buscando brechas para transferir o poder da palavra dos maiores aos pequenos. Modificando a ordem dos caminhos da comunicação, o movimento zapatista, do México, experimentou, na década de 1990, a possibilidade de, por meio da internet, ser ouvido no mundo desde sua realidade local.

Uma das protagonistas dessa ação foi Gloria Muñoz Ramírez, jornalista que acompanha o Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN)desde seu levante em 1994, no estado de Chiapas. Gloria segue militando na contra-informação. Seu mais novo projeto é dirigir a revista mensal  Desinformémonos.

Em janeiro deste ano, o Brasil de Fato iniciou um intercâmbio de conteúdo com a publicação. Com versão na web (http://desinformemonos.org), a iniciativa envolve colaboradores de inúmeras partes do planeta e é traduzida para o português, grego, italiano, inglês, francês, alemão, e a língua indígena tseltal, bastante falada no sul do México.

A seguir, a diretora de Desinformémonos fala sobre esse projeto internacional e a experiência acumulada em anos junto aos zapatistas.


Brasil de Fato – Pode nos falar um pouco de como nasceu o projeto Desinformémonos?

Gloria Muñõz – Consideramo-nos uma ferramenta de luta por um mundo melhor, ou seja, por um mundo justo, livre e democrático. Aderimos às batalhas que se passam “abajo y a la izquierda”, à margem do poder e dos poderosos. Estamos do lado da autonomia dos povos, pelo direito a decidir sobre nossos próprios destinos. Somos, sem ambiguidades, fruto de uma luta que, desde 1º de janeiro de 1994, nos transformou: o levantamento do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN). E é no terreno da “desinformação” que atuaremos.
 

Por que “Desinformémonos”?


Pegamos o nome emprestado de Mario Benedetti [poeta e escritor uruguaio morto em maio do ano passado]. Estávamos preparando esse projeto quando fomos surpreendidos pela triste notícia de sua morte. Pusemos pra tocar um CD com seus poemas, gravado para La Casa de las Américas, como uma singela homenagem a esse grande poeta e lutador das causas justas. De repente, no meio da incipiente edição dessa revista, lá estava o poema: desinformémonos hermanos/ hasta que el cuerpo aguante/ y cuando ya no aguante/ entonces decidámonos/ carajo decidámonos/ y revolucionémonos.

Depois, veio o jogo de palavras. Desinformar-se e enfrentar a investida dos grandes meios de comunicação capitalistas, aqueles que nos dizem o que, como, quando, onde e por que, do ponto de vista – e para benefício – dos poderes políticos e econômicos, dirigido àqueles que se creem os donos do mundo. “Desinformémonos”: desfazer-nos do que nos oferecem e munirmo-nos de Outra Informação, geralmente invisível, na qual os depoimentos dos “ninguéns”, como diz Eduardo Galeano [jornalista e escritor uruguaio] são o que nos dá sentido e corpo, horizonte e destino. Os povos têm suas próprias vozes e eles mesmos se encarregam de que os demais as escutem. O que nos propusemos em Desinformémonos é ser olhado e ouvido... caixinhas de ressonância. Escutar, como diria o estimado escritor [inglês] John Berger, “as vozes da terra... sempre em baixo”. Sem confundir, como ele mesmo nos alerta, “a intenção deliberada de desinformar com o estar desinformado”. A resistência, nos disse no processo de inauguração desse espaço, “está em saber escutar a terra. A liberdade é descoberta pouco a pouco, não do lado de fora, mas nas profundidades da prisão”.   

Quem são os colaboradores do projeto?

Bom, somos pessoas de muitas partes do mundo. Nosso ponto de vista pretende ser global e abarcar lutas e resistências dos cinco continentes. Atualmente, tocam esse projeto homens e mulheres do México, Argentina, Brasil, Estados Unidos, Alemanha, França, Espanha e Itália, com colaboradores na Grécia, Palestina, Turquia, Irã, Bélgica, Chile, Grã Bretanha, República Árabe Saaráui e Honduras.
 
Em sua experiência junto aos zapatistas, foi possível acompanhar como eles utilizaram de maneira muito hábil a internet para comunicar suas posições para todo planeta. Como isso se deu?

A ideia do uso da internet pelos zapatistas nasceu como um mito que, em muitos sentidos, persiste ainda hoje. Em 1994, a internet ainda era algo muito incipiente e os primeiros comunicados do EZLN eram xerox distribuídos a nós jornalistas na cidade de San Cristóbal de las Casas, em Chiapas. Com o tempo, um exército de mulheres e homens anônimos se incumbiu de difundir as palavras zapatistas pela internet. Na selva em que vivem os zapatistas, não havia sequer luz, que dirá um computador. Assim, o mérito da difusão da palavra zapatista no ciberespaço não é propriamente zapatista, mas de todos que acreditaram nesse movimento e fizeram circular seus comunicados e pronunciamentos. Atualmente, algumas comunidades em resistência têm acesso à internet, mas isso é algo relativamente novo e não pode ser generalizado.
 
De que maneira a internet pode fazer frente aos meios de comunicação tradicionais em favor dos movimentos sociais?
Esse ciberespaço, ainda que criado pela elite, tem servido de ferramenta, vínculo e ponte para os setores da base nos últimos quinze anos. As lutas e a resistência dos povos campesinos e indígenas, dos migrantes, trabalhadores, estudantes, jovens e um longo etcétera, transitam pela rede produzindo identificações onde menos se esperava, isso apesar do acesso à internet ainda estar longe de ser uma realidade, ao menos nos países do chamado Terceiro Mundo. Mas isso não é necessariamente uma carência. Provavelmente não necessitam dessa “conexão”. O que desejamos com Desinformémonos é aproveitar esse espaço virtual, não apenas por falta de recursos para nascer em papel, como gostaríamos, mas porque reconhecemos nesse meio uma alternativa para conhecer o outro, a outra, suas histórias e tragédias, de um lado ao outro do planeta. Desejamos, como diria o mestre do jornalismo [bielo-russo] Ryszard Kapuscinski, “converter-nos imediatamente, desde o primeiro momento, em parte de seus destinos”. Afinal, somos os mesmos, as mesmas. E estamos na mesma situação. Entretanto, a internet, ao menos no México e em muitos países da América Latina, não é um meio acessível para toda a população. Nas áreas rurais e nos bairros de periferia, as pessoas não estão conectadas à rede. Essa é a razão, creio, de que o principal meio de comunicação popular, por excelência, continua sendo o rádio e de que, até agora, não haja espaço para se substituir a comunicação alternativa em papel. Insisto que estou falando do mundo dos de baixo.

É por isso que na Desinformémonos criamos uma revista de bairro e comunitária em PDF, com o objetivo de que seja distribuída em comunidades que não têm acesso à internet. Essa singela revista pode ser distribuída como “folhas soltas” ou pregada em algum muro como jornal-mural.

Com a dificuldade de transmitir mensagens ao grande público, como os movimentos sociais são mostrados hoje nos grandes meios de comunicação mexicanos?

Os movimentos sociais não aparecem nos grandes meios de comunicação do México e, quando aparecem, são satanizados e desprestigiados. Poderia dizer que apenas o jornal La Jornada (considerando os meios de comunicação massiva, não os marginais nem alternativos) dá espaço para as lutas sociais do país. É por isso que, cada vez mais, os movimentos vêm criando seus próprios meios, para que sua palavra seja conhecida. Ao mesmo tempo, crescem os meios alternativos, livres e independentes, ainda que com muitas limitações.
 
Nas revoltas de Oaxaca, a tomada das rádios foi a primeira ação dos movimentos mobilizados. O que isso pode significar?
A Assembleia Popular dos Povos de Oaxaca (APPO) não apenas tomou as rádios e até mesmo a televisão comercial; ela criou uma rede de meios de comunicação. Essa rede serviu não só para difundir suas causas, mas para convocar, organizar as barricadas e as marchas e, sobretudo, a defesa da ocupação que mantiveram no centro da cidade. Tomar as rádios e a televisão foi muito significativo para mostrar a força popular do movimento, mas foi ainda mais relevante a forma como conseguiram conduzir a relação com as rádios alternativas, principalmente com a Radio Plantón, que é hoje um exemplo do grande poder que um meio dessa natureza pode significar, de “abajo y a la izquierda”, de dentro do próprio movimento.

Você acredita que os movimentos de esquerda conhecem a importância da comunicação em um processo de mudança?

Acredito que os movimentos de esquerda estão cada vez mais conscientes da importância de uma comunicação do e para o movimento. Entretanto, acredito que enfrentamos grandes desafios, pois muitas vezes não comunicamos entre nós mesmos o que está acontecendo, não fazemos grande esforço para ultrapassar as barreiras impostas e fazer com que nossa palavra chegue “a outros como nós”. Na minha opinião, esse é um grande desafio, e devemos nos preocupar em não estar à margem, mas em atingir cada vez mais gente, sem preconceitos nem esteriotipização. Nunca sabemos onde ou quando haverá ressonância, temos que procurar por isso permanentemente. Ao mesmo tempo, acredito que outro desafio é a manipulação da linguagem feita pelos movimentos sociais de esquerda. Acho que devemos nos arriscar mais, jogar com as palavras e com as imagens, não ser tão sérios, mas ter a capacidade de rirmos, de sermos irônicos, de dar espaço ao jogo e à palavra lúdica. Esse, finalmente, foi outro dos ensinamentos dos zapatistas que, desde o princípio, comunicam-se com uma linguagem diferente, que incluem desde um conto, até uma piada ou uma canção.

domingo, 2 de maio de 2010

A microsoft e o trabalho escravo....

Os desafios da sustentabilidade na cadeia de valores: a Microsoft e os adolescentes escravos na China

Recebido por email do vereador João Couto de Candiota-Rs, extraido do sitio http://www.brasilautogestionario.org/




Trabalhadores adolescentes exautos dormindo durante os 10 minutos diarios de pausa
Fonte: SustentaNews – 

No Youtube há um vídeo promocional muito interessante da Microsoft que mostra uma visão de futuro de um mundo sustentável, no qual as soluções da empresa desempenham um papel fundamental. É um mundo clean, no qual as tecnologias de comunicação se integram para gerar uma conectividade quase absoluta, dispensando o uso do papel e poupando o tempo das pessoas para se dedicar a plantar jardins no alto dos prédios. O vídeo, tecnicamente muito bem feito, impressiona, mas ao mesmo tempo traz de imediato uma reflexão: onde estão os pobres? Onde está a sujeira que se esconde por debaixo do tapete (verde) do mundo “sustentável” da Microsoft?
No último dia 13 de abril o National Labor Committee, um grupo de pressão dos Estados Unidos dedicado a investigar e expor as más práticas trabalhistas das empresas americanas, revelou o outro lado do mundo perfeito desenhado pela Microsoft. Um impressionante relatório revela como adolescentes com idades entre 14 e 16 anos trabalham na China como escravos em condições subumanas para produzir periféricos para grandes empresas de tecnologia, sendo justamente a Microsoft a maior delas.
O relatório se chama “China’s Youth Meet Microsoft:  KYE factory in China produces for Microsoft and other U.S. Companies” e traz relatos e fotografias chocantes que resumem três anos de investigações na fabrica da empresa KYE, em  Dongguan, importante cidade industrial no sul da China. A denúncia é de que a fabrica emprega cerca de mil estudantes secundários como “aprendizes” para trabalhar em jornadas de até 15 horas produzindo mouses, webcams e outros periféricos.
O restante dos trabalhadores da fábrica é composto por mulheres na faixa de 18 a 25 anos, constantemente submetidas a assedio sexual por parte da equipe de segurança. Os adolescentes “aprendizes” recebem cerca de 1 real por hora de trabalho, o qual descontado o custo da alimentação servida pela empresa, se reduz a cerca de R$ 0,85/hora.  Normalmente eles ficamj trabalhando por períodos de três meses, durante o qual dormem na fabrica em dormitórios descritos como “sujos  e primitivos”.
A rotina é militar. Os trabalhadores são proibidos de falar entre si, de escutar música, atender a celular ou ir ao banheiro fora dos 10 minutos autorizados durante o dia. As condições de trabalho são terríveis e durante o verão o calor passa fácil dos 30 graus, o que torna mais fatigante o ritmo necessário para cumprir a meta obrigatória de 2.000 mouses da Microsoft por turno para cada grupo de 20-30 adolescentes.
Obviamente, como destaca o National Labor Committee, a direção da KYE diz que as condições da fabrica são “excelentes” e estão de acordo com as leis trabalhistas chinesas. As mulheres trabalhadoras, por sua vez, a descrevem como uma “prisão”, da qual procuram escapar o mais rápido possível. E como sempre os códigos de ética da Microsoft e dos outros clientes da KYE são simplesmente ignorados.
Mouses da Microsoft fabricados pelos adolescentes semi-escravos
Mas por que recrutar adolescentes e mulheres jovens? Porque teoricamente eles são mais submissos e fáceis de controlar. Os adolescentes são recrutados para períodos de três meses de “aprendizagem” em escolas técnicas por toda a China. Quando chegam para trabalhar descobrem que terão uma vida bem dura e com cada um dos seus passos controlados. Eles são “multados” por cada erro ou transgressão às regras internas da fábrica.
São condições de trabalho que de certa forma emulam as existentes nas unidades fabris dos primórdios da Revolução Industrial. A diferença é que os produtos fabricados são a ponta de lança da indústria mais moderna do planeta. Modernidade e arcaísmo convivendo simbioticamente para produzir as benesses da nossa vida tecnológica.
Não dá para imaginar que a Microsoft conscientemente compactue com esta situação. Mas o relatório lembra que é uma prática comum que grandes contratantes mantenham inspetores de qualidade no piso das fábricas subcontratadas. E pergunta: “A Microsoft tem um desses inspetores de qualidade na fábrica da KYE? E, em caso afirmativo, por que a Microsoft permite que estas condições degradantes e ilegais persistam no processo de fabricação de seus produtos?”
Esta história ilustra um dos grandes desafios de se implementar processos sustentáveis de maneira séria e perene: como influenciar de maneira efetiva a cadeia de valor de forma a que os padrões de sustentabilidade sejam realmente adotados por todos os elos? Da próxima vez que pensar em comprar um mouse da Microsoft  como poderei ter a certeza de que não foram feitos por adolescentes semi-escravos?
O relatório “China’s Youth Meet Microsoft:  KYE factory in China produces for Microsoft and other U.S. Companies.” Pode ser lido (e baixado) aqui.

As riquezas do Irã em gás natural:



 EUA miram a principal energia do mundo futuro


Por Finian Cunningham [*]
 
O arranque programado para este mês dos furos da China National Petroleum Company (CNPC) do campo de gás de South Pars, no Irã, poderia ser tanto um arauto como uma explicação de desenvolvimentos geopolíticos muito mais vastos.
 
Antes de mais nada, o projeto de US$5 bilhões – assinado no ano passado após anos de arrastamento da parte dos gigantes da energia ocidental Total e Shell sob a sombra das sanções dos EUA – revela o principal sistema arterial da futura oferta e procura mundial de energia.
 
Muitos críticos há muito suspeitavam que a razão real para o envolvimento militar dos EUA e de outros países ocidentais no Iraque e no Afeganistão é controlar o corredor energético da Ásia Central. Até agora, o foco parecia ser principalmente o petróleo. Há por exemplo afirmações que um planeado pipeline do Mar Cáspio para o Mar Arábico através do Afeganistão e do Paquistão é o prêmio principal por trás campanha militar aparentemente fútil dos EUA naqueles países.
 
Mas o que mostra o partenariado CNPC-Irã é que o gás natural é prêmio principal que será essencial para a economia do mundo, e especificamente o fluxo de duas vias deste combustível para o Leste e Oeste da Ásia Central rumo à Europa e à China.
 
Michael Economides, editor do Energy Tribune de Huston é um dos numerosos observadores da indústria que está convencido de que o gás natural ultrapassará o petróleo como a principal fonte primária de energia, não apenas nas próximas décadas como ao longo dos próximos vários séculos.
 
Ele destaca a recente previsão da International Energy Agency (IEA), com sede em Paris, que reviu dramaticamente em 100 por cento as suas estimativas das reservas globais de gás natural. Economides atribui este enorme aumento a rápidas melhorias tecnológicas em extrair de campos de gás até agora inacessíveis. Afirma que a IEA estima quantidades de gás natural para 300 anos de abastecimento da atual procura mundial. "Se alguém simplesmente fantasiar quaisquer contribuições futuras de ordens de grandeza dos maiores recursos na forma de hidratos de gás, é fácil ver como é quase certo que o gás natural evolua até ser o primeiro combustível da economia mundial", acrescenta.
 
A importância crescente do gás natural como fonte de energia tem sido firme e inexorável desde há muitos anos. Entre 1973 e 2007, a contribuição do petróleo para a oferta mundial de energia caiu de 46,1 por cento par 34,0 por cento, com o aumento da utilização de gás natural a colmatar aquele declínio, segundo a IEA. Outras fontes, tais como a Energy Information Administration (IEA), com sede nos EUA, prevêem que o consumo de gás natural triplicará entre 1980 e 2030, data em que mais provavelmente tornar-se-á a fonte de energia primária preferencial para as necessidades industriais e públicas.
 
Há razões sólidas para o gás natural (metano) estar a tornar-se o rei dos combustíveis fósseis. Em primeiro lugar, tem um poder calorífico muito maior do que o petróleo ou o carvão. Ou seja, mais calor produzido por unidade de combustível. Em segundo lugar, é o combustível mais limpo, pois emite 30 por cento menos dióxido de carbono [NT] em comparação com o petróleo em comparação com o petróleo e 45 por cento menos em comparação com o carvão. Em terceiro lugar, o gás é mais eficiente para o transporte, tanto como matéria primária forma comprimida ao longo de pipelines enterrados como combustível para veículos.
 
Todas as agências de energia reconhecem que as primeiras fontes do gás natural do futuro estão no Oriente Médio e na Eurásia, incluindo a Rússia. A EIA com sede nos EUA coloca as reservas de gás natural nestas regiões como nove a sete maiores do que aquelas no total da América do Norte – as quais são uma das principais fontes deste combustível.
 
Dentro do Oriente Médio, o Irã é sem dúvida o principal possuidor de reservas de gás. O seu campo de South Pars é o maior do mundo. Se convertido em barris de petróleo equivalentes, o South Pars do Irã tornaria diminutas as reservas do campo petrolífero de Ghawar, na Arábia Saudita. Este é o maior campo de petróleo do mundo e, desde que entrou em operação em 1948, Ghawar tem sido efetivamente o coração pulsante do mundo para o abastecimento de energia primária. Na era que se aproxima de domínio do gás natural sobre o petróleo, o Irão retirará à Arábia Saudita da condição de principal fornecedor de energia do mundo.
 
Tanto a Europa como a China posicionam-se para serem rotas tronco para o gás iraniano e da generalidade da Ásia Central. A infraestrutura já está a moldar-se para refletir isto. O gasoduto Nabucco está planejado para fornecer gás do Irã (e do Azerbaijão) via Turquia e Bulgária transportando-o para a Europa Ocidental (assinalando um fim ao domínio russo). O Irã também exporta gás via gasodutos separados para a Turquia e a Armênia e também está a procurar negócios de exportação com outros países do Golfo, incluindo os Emirados Árabes Unidos e Oman. Outra rota principal é o chamado gasoduto da paz, do Irã para o Paquistão e a Índia, através do qual o Irã exportará este combustível para dois dos mais populosos países da região. Mas talvez a perspectiva mais irresistível para o Irã seja o gasoduto de 1.865 quilômetros que fornece gás natural do Turquemenistão através do Uzbequistão e do Cazaquistão para a China e que deve operar a plena capacidade em 2012. O Sul do Turquemenistão tem uma fronteira de 300 km com o Irã e já tem um acordo de exportação de gás com Teerã. Se o desenvolvimento do campo gasista iraniano-chinês de South Pars puder ser incorporado nos gasodutos  transnacionais acima mencionados, isso confirmaria o Irã como o coração pulsante da economia mundial na qual o gás é a fonte de energia primária. Isto é potenciado ainda mais pela procura de gás da China, em crescimento rápido, a qual a EIA prevê que podia estar dependente de importações em mais de um terço do seu consumo de gás natural em 2030.
 
Neste contexto de um grande realinhamento da economia energética mundial – no qual haverá uma diminuição contínua do papel dos EUA – a retórica tronitroante de Washington acerca de democracia e paz e guerra ao terror ou alegadas armas nucleares iranianas pode ser vista como uma tentativa desesperada para esconder o seu medo de que esteja destinado a ser um grande perdedor. Cercar o Irã com guerras e ameaçar o fornecimento de gás para o provável maior futuro consumidor de gás – a China – é o assunto real. As ações dos Estados Unidos são vistas mais exatamente como o encostar de uma faca nas artérias energéticas de uma economia mundial que os EUA não são mais capazes de dominar.
 
Um novo aspecto desta história é a posição da Rússia. Com as suas próprias vastas reservas de gás natural, ela pode ser vista como um competidor do Irã. Comprovadamente menos bem posicionada do que o Irã para o fornecimento tanto à Europa como à China, a Rússia é, no entanto um grande ato e tem estado insistentemente a cortejar a China com um acordo de exportação desde 2006. Contudo, como observa Economides, "as negociações entre os dois países tem sido intermitentes e, especialmente, a construção do gasoduto tem sido penosamente lenta".
 
Mas as ambições da Rússia em expandir as suas exportações de gás natural podem explicar porque ela tem mostrado ser um aliado caprichoso do Irã. A posição ambivalente de Moscou em relação a sanções dos Estados Unidos contra o Irã sugere que a Rússia tem a sua própria agenda destinada a embaraçar a república islâmica como um rival regional na energia.
 
18/Março/2010
 
[NT] O dióxido de carbono não é um poluente. Assim, não é por causa do CO2 que o gás natural é mais limpo.
 
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sábado, 1 de maio de 2010

A marca classista do 1º de Maio - Parabéns aos lutadores trabalhadores...

Altamiro Borges, do seu blog

“Se acreditais que enforcando-nos podeis conter o movimento operário, esse movimento constante em que se agitam milhões de homens que vivem na miséria, os escravos do salário; se esperais salvar-vos e acreditais que o conseguireis, enforcai-nos! Então vos encontrarei sobre um vulcão, e daqui e de lá, e de baixo e ao lado, de todas as partes surgirá a revolução. É um fogo subterrâneo que mina tudo”. Augusto Spies, 31 anos, diretor do jornal Diário dos Trabalhadores.

“Se tenho que ser enforcado por professar minhas idéias, por meu amor à liberdade, à igualdade e à fraternidade, então nada tenho a objetar. Se a morte é a pena correspondente à nossa ardente paixão pela redenção da espécie humana, então digo bem alto: minha vida está à disposição. Se acreditais que com esse bárbaro veredicto aniquilais nossas idéias, estais muito enganados, pois elas são imortais''. Adolf Fischer, 30 anos, jornalista.

“Em que consiste meu crime? Em ter trabalhado para a implantação de um sistema social no qual seja impossível o fato de que enquanto uns, os donos das máquinas, amontoam milhões, outros caem na degradação e na miséria. Assim como a água e o ar são para todos, também a terra e as invenções dos homens de ciência devem ser utilizadas em benefício de todos. Vossas leis se opõem às leis da natureza e utilizando-as roubais às massas o direito à vida, à liberdade e ao bem-estar”. George Engel, 50 anos, tipógrafo.

“Acreditais que quando nossos cadáveres tenham sido jogados na fossa tudo terá se acabado? Acreditais que a guerra social se acabará estrangulando-nos barbaramente. Pois estais muito enganados. Sobre o vosso veredicto cairá o do povo americano e do povo de todo o mundo, para demonstrar vossa injustiça e as injustiças sociais que nos levam ao cadafalso”. Albert Parsons lutou na guerra da secessão nos EUA.

As corajosas e veementes palavras destes quatro líderes do jovem movimento operário dos EUA foram proferidas em 20 de agosto de 1886, pouco após ouvirem a sentença do juiz condenando-os à morte. Elas estão na origem ao 1º de Maio, o Dia Internacional dos Trabalhadores. Na atual fase da luta de classes, em que muitos aderiram à ordem burguesa e perderam a perspectiva do socialismo, vale registrar este marco histórico e reverenciar a postura classista destes heróis do proletariado. A sua saga serve de referência aos que lutam pela superação da barbárie capitalista.

A origem do 1º de Maio está vinculada à luta pela redução da jornada de trabalho, bandeira que mantém sua atualidade estratégica. Em meados do século XIX, a jornada média nos EUA era de 15 horas diárias. Contra este abuso, a classe operária, que se robustecia com o acelerado avanço do capitalismo no país, passou a liderar vários protestos. Em 1827, os carpinteiros da Filadélfia realizaram a primeira greve com esta bandeira. Em 1832, ocorre um forte movimento em Boston que serviu de alerta à burguesia. Já em 1840, o governo aprova o primeiro projeto de redução da jornada para os funcionários públicos.

Greve geral pela redução da jornada

Esta vitória parcial impulsionou ainda mais esta luta. A partir de 1850, surgem as vibrantes Ligas das Oito Horas, comandando a campanha em todo o país e obtendo outras conquistas localizadas. Em 1884, a Federação dos Grêmios e Uniões Organizadas dos EUA e Canadá, futura Federação Americana do Trabalho (AFL), convoca uma greve nacional para exigir a redução para todos os assalariados, “sem distinção de sexo, ofício ou idade”'. A data escolhida foi 1º de Maio de 1886 - maio era o mês da maioria das renovações dos contratos coletivos de trabalho nos EUA.

A greve geral superou as expectativas, confirmando que esta bandeira já havia sido incorporada pelo proletariado. Segundo relato de Camilo Taufic, no livro “'Crônica do 1º de Maio”, mais de 5 mil fábricas foram paralisadas e cerca de 340 mil operários saíram às ruas para exigir a redução. Muitas empresas, sentindo a força do movimento, cederam: 125 mil assalariados obtiveram este direito no mesmo dia 1º de Maio; no mês seguinte, outros 200 mil foram beneficiados; e antes do final do ano, cerca de 1 milhão de trabalhadores já gozavam do direito às oito horas.

“Chumbo contra os grevistas”, prega a imprensa

Mas a batalha não foi fácil. Em muitas locais, a burguesia formou milícias armadas, compostas por marginais e ex-presidiários. O bando dos “'Irmãos Pinkerton” ficou famoso pelos métodos truculentos utilizados contra os grevistas. O governo federal acionou o Exército para reprimir os operários. Já a imprensa burguesa atiçou o confronto. Num editorial, o jornal Chicago Tribune esbravejou: “O chumbo é a melhor alimentação para os grevistas. A prisão e o trabalho forçado são a única solução possível para a questão social. É de se esperar que o seu uso se estenda”.

A polarização social atingiu seu ápice em Chicago, um dos pólos industriais mais dinâmicos do nascente capitalismo nos EUA. A greve, iniciada em 1º de Maio, conseguiu a adesão da quase totalidade das fábricas. Diante da intransigência patronal, ela prosseguiu nos dias seguintes. Em 4 de maio, durante um protesto dos grevistas na Praça Haymarket, uma bomba explodiu e matou um policial. O conflito explodiu. No total, 38 operários foram mortos e 115 ficaram feridos.

Os oito mártires de Chicago

Apesar da origem da bomba nunca ter sido esclarecida, o governo decretou estado de sítio em Chicago, fixando toque de recolher e ocupando militarmente os bairros operários; os sindicatos foram fechados e mais de 300 líderes grevistas foram presos e torturados nos interrogatórios. Como desdobramento desta onda de terror, oito líderes do movimento - o jornalista Auguste Spies, do “'Diário dos Trabalhadores”', e os sindicalistas Adolf Fisher, George Engel, Albert Parsons, Louis Lingg, Samuel Fielden, Michael Schwab e Oscar Neebe - foram detidos e levados a julgamento. Eles entrariam para a história como “Os Oito Mártires de Chicago”.

O julgamento foi uma das maiores farsas judiciais da história dos EUA. O seu único objetivo foi condenar o movimento grevista e as lideranças anarquistas, que dirigiram o protesto. Nada se comprovou sobre os responsáveis pela bomba ou pela morte do policial. O juiz Joseph Gary, nomeado para conduzir o Tribunal Especial, fez questão de explicitar sua tese de que a bomba fazia parte de um complô mundial contra os EUA. Iniciado em 17 de maio, o tribunal teve os 12 jurados selecionados a dedo entre os 981 candidatos; as testemunhas foram criteriosamente escolhidas. Três líderes grevistas foram comprados pelo governo, conforme comprovou posteriormente a irmã de um deles (Waller).

A maior farsa judicial dos EUA

Em 20 de agosto, com o tribunal lotado, foi lido o veredicto: Spies, Fisher, Engel, Parsons, Lingg, Fielden e Schwab foram condenados à morte; Neebe pegou 15 anos de prisão. Pouco depois, em função da onda de protestos, Lingg, Fielden e Schwab tiveram suas penas reduzidas para prisão perpétua. Em 11 de novembro de 1887, na cadeia de Chicago, Spies, Fisher, Engel e Parsons foram enforcados. Um dia antes, Lingg morreu na cela em circunstâncias misteriosas; a polícia alegou “suicídio”. No mesmo dia, os cinco “'Mártires de Chicago” foram enterrados num cortejo que reuniu mais de 25 mil operários. Durante várias semanas, as casas proletárias da região exibiram flores vermelhas em sinal de luto e protesto.

Seis anos depois, o próprio governador de Illinois, John Altgeld, mandou reabrir o processo. O novo juiz concluiu que os enforcados não tinham cometido qualquer crime, “tinham sido vitimas inocentes de um erro judicial”. Fielden, Schwab e Neebe foram imediatamente soltos. A morte destes líderes operários não tinha sido em vão. Em 1º de Maio de 1890, o Congresso dos EUA regulamentou a jornada de oito horas diárias. Em homenagem aos seus heróis, em dezembro do mesmo ano, a AFL transformou o 1º de Maio em dia nacional de luta. Posteriormente, a central sindical, totalmente corrompida e apelegada, apagaria a data do seu calendário.

Em 1891, a Segunda Internacional dos Trabalhadores, que havia sido fundada dois anos antes e reunia organizações operárias e socialistas do mundo todo, decidiu em seu congresso de Bruxelas que “no dia 1º de Maio haverá demonstração única para os trabalhadores de todos os países, com caráter de afirmação de luta de classes e de reivindicação das oito horas de trabalho”. A partir do congresso, que teve a presença de 367 delegados de mais de 20 países, o Dia Internacional dos Trabalhadores passou a ser a principal referência no calendário de todos os que lutam contra a exploração capitalista.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

O agronegócio e a exploração da terra....

O monopólio da terra e a produção de agrocombustíveis
 
A principal mudança na oligarquia rural no Brasil tem sido a presença crescente do capital internacional na indústria dos agrocombustíveis
 
Por Maria Luisa Mendonça na Caros Amigos
 
Os velhos usineiros, agora travestidos de empresários “modernos”, em conseqüência da propaganda sobre as supostas vantagens do etanol brasileiro, intensificam suas campanhas internacionais para vender o produto. Recentemente, ganharam um reforço especial com o anúncio do governo sobre acordos trabalhistas e de zoneamento ambiental. Porém, um breve relato sobre as principais tendências do setor é suficiente para mostrar que essas são apenas medidas de fachada.
 
As características que historicamente marcaram a oligarquia rural no Brasil permanecem inalteradas. Ou seja, o monopólio da terra, a exploração do trabalho e de recursos naturais estratégicos. A principal mudança tem sido a presença crescente do capital internacional na indústria dos agrocombustíveis. Há alguns anos, verifica-se um aumento do ritmo de aquisições no setor sucro alcooleiro, com crescimento na participação de empresas estrangeiras e aumento na concentração do poder econômico de determinados grupos.
 
Dados do Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool e Açúcar de Minas indicam que a participação de empresas estrangeiras na indústria da cana no Brasil cresceu de 1% em 2000 para 12% na safra 2007/2008. Outro levantamento da Pricewaterhouse Coopers revela que existem cerca de 450 usinas no Brasil, controladas por 160 empresas nacionais e estrangeiras, e que o controle estrangeiro chegaria a 15%, incluindo participação acionária em grupos nacionais. De acordo com estudo do grupo KPMG Corporate Finance, de 2000 a setembro de 2009, ocorreram 99 fusões e aquisições de usinas no Brasil. Entre estas, 45 negociações aconteceram no período de 2007 a 2009 e em 22 casos ocorreu a compra de uma usina nacional por um grupo estrangeiro.
 
Maiores produtores
Em outubro de 2009, a empresa francesa Louis Dreyfus Commodities anunciou a compra de cinco usinas da Santelisa Vale, de Ribeirão Preto (SP), para aumentar sua produção de cana no Brasil. A fusão criou o grupo LDC-SEV Bioenergia, tornando-se o segundo maior produtor mundial de açúcar e etanol. O grupo pretende produzir 40 milhões de toneladas de cana-deaçúcar por ano e tem participação acionária das famílias Biaggi e Junqueira, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do banco Goldman Sachs. Essa fusão aumenta para 20% a participação de empresas estrangeiras no setor.
 
Uma nova característica da indústria do etanol, se comparada ao Pró-Alcool da década de 1970, é a aliança entre setores do agronegócio com empresas petroleiras,  automotivas, de biotecnologia, mineração, infra-estrutura e fundos de investimento. Nesse cenário, não existe nenhuma contradição desses setores com a oligarquia latifundista, que se beneficia da expansão do capital no campo e do abandono de um projeto de reforma agrária.
 
Em 2009, a empresa petroleira britânica British Petroleum (BP) anunciou que irá produzir etanol no Brasil, com investimento de US$ 6 bilhões de dólares nos próximos dez anos. A BP irá atuar por meio da Tropical Bioenergia, em associação com o Grupo Maeda e a Santelisa Vale, em Goiás, que contam com uma área de 60 mil hectares para a produção de cana no estado.
 
Em julho de 2009, a Syngenta divulgou a aquisição de terras para produzir mudas de cana-deaçúcar na região de Itápolis (SP). O projeto inclui a produção de mudas transgênicas e pretende se expandir para outros estados, como Goiás, Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso do Sul.
 
Concentração empresarial
No início de 2010, ocorreram novas fusões. Em janeiro, a multinacional agrícola Bunge anunciou a compra de quatro usinas do Grupo Moema, incluindo a usina Itapagipe, que tinha participação acionária de 43,75% da empresa norte-americana Cargill. Com a negociação, a Bunge passará a controlar 89% da produção de cana do Grupo Moema,
estimada em 15,4 milhões de toneladas por ano.
 
Em fevereiro, foi anunciada a fusão da ETH Bioenergia, do grupo Odebrecht, com a Companhia Brasileira de Energia Renovável (Brenco), que pretende se tornar a maior empresa de etanol no Brasil, com capacidade para produzir três bilhões de litros por ano. Alguns dos acionistas da Brenco são Vinod Khosla (fundador da Sun Microsystems), James Wolfensohn (ex-presidente do Banco Mundial), Henri Philippe Reichstul (ex-presidente da Petrobras), além da participação do BNDES. Já a Odebrecht tem sociedade com a empresa japonesa Sojitz. O novo grupo irá controlar cinco usinas: Alcídia (SP), Conquista do Pontal (SP), Rio Claro (GO), Eldorado (MS) e Santa Luzia (MS).
 
O conglomerado ainda participa da construção de um alcoolduto entre o Alto Taquari e  o porto de Santos, e pretende instalar usinas na África. A empresa pretende captar R$ 3,5 bilhões até 2012, dos quais pelo menos 20% virão do BNDES, além de outros R$ 2 bilhões que o banco já investiu anteriormente na Brenco.
 
Nessa mesma linha, em fevereiro de 2010, a gigante petroleira holandesa Shell anunciou uma associação com a Cosan para a produção e distribuição de etanol, com o objetivo de produzir quatro bilhões de litros até 2014. Ao divulgar a operação, a nota da Shell afirmava que pretende criar “um rio de etanol, correndo desde as plantações no Brasil até a América do Norte e a Europa”. Apesar da repercussão internacional da prática de trabalho escravo na Cosan, a empresa segue como líder no setor.
 
Seguindo essa tendência, a Vale anunciou que pretende produzir diesel a partir do óleo  de palma na região amazônica a partir de 2014, por meio de uma parceria com a empresa Biopalma da Amazônia S.A. A intenção é produzir 500 mil toneladas de óleo de palma por ano. Parte do combustível será utilizada nas locomotivas da estrada de ferro e nas minas de Carajás, no Pará.
 
Monocultivo da cana
Em relação ao avanço territorial do monocultivo de cana, dados da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) mostram que, em 2006, eram 4,5 milhões de hectares e, em 2008, chegaram a 8,5 milhões de hectares. Na safra de 2009 houve um aumento de 7,1% em relação a 2008.
 
Essa expansão é estimulada por recursos públicos. Entre 2008 e 2009, estima-se que o setor sucroalcooleiro tenha recebido mais de R$ 12 bilhões do BNDES. Essa verba é extraída, em grande medida, do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Segundo a CONAB, 45,08% da safra foi destinada à produção de açúcar e 54,9%, à produção de etanol, que resultou em 25,87 bilhões de litros do produto. A expansão da área plantada foi de 6,7%, ou cerca de 473 mil hectares. A maior expansão ocorreu na região do Cerrado, principalmente em Mato Grosso do Sul (38,80%) e Goiás (50,10%).
 
Dados do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig), da Universidade Federal de Goiás, indicam que o ritmo atual de desmatamento do Cerrado poderá elevar de 39% para 47% o percentual devastado do bioma até 2050. A pesquisa demonstra ainda que a destruição do Cerrado coloca em risco a disponibilidade de recursos hídricos para o Pantanal e a Amazônia, pois esses biomas estão interligados.
 
Trabalho escravo
As usinas de cana se tornaram campeãs em trabalho escravo nos últimos anos. De acordo com dados da Campanha Nacional de Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2007, dos 5.974 trabalhadores resgatados da escravidão no campo brasileiro, 3.060 ou 51%, foram encontrados no monocultivo da cana-de-açúcar. Em 2008, dos 5.266 resgatados, 2.553, ou 48% dos trabalhadores mantidos escravos no país estavam em plantações de cana. De janeiro a junho de 2009, o número era de 951 trabalhadores, que representavam 52% do total. Ao final de 2009, o Ministério do Trabalho registrou a libertação de 1.911 trabalhadores nas usinas de cana nos estados de Goiás, Mato Grosso, Pernambuco, Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
 
Em 2009, o Ministério do Trabalho inclui grandes usinas na chamada “lista suja” do  trabalho escravo. Uma delas foi a Brenco, que tem participação acionária de 20% do BNDES. Entre 2008 e 2009, o BNDES liberou R$ 1 bilhão para usinas da Brenco em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás. Ao mesmo tempo, o Grupo Móvel expediu 107 autos de infração contra a empresa, que é presidida pelo ex-presidente da Petrobras, Henri Philippe Reichstul. Apesar da prática de trabalho escravo, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, anunciou a continuidade do financiamento para a Brenco.
 
Em 31 de dezembro de 2009, foi a vez do grupo Cosan – a maior empresa do setor sucroalcooleiro do país, com produção anual de 60 milhões de toneladas de cana. Apesar da prática de trabalho escravo, a Cosan recebeu R$ 635,7 milhões do BNDES em junho de 2009, para a construção de uma usina de etanol em Goiás. O BNDES manteveo financiamento para a Cosan, mesmo após a evidência de trabalho escravo. A Cosan possui 23 usinas, controla os postos da Exxon (Esso do Brasil) e teve um faturamento de R$ 14 bilhões de reais em 2008.
 
Em outubro de 2009, o Grupo Móvel libertou 55 trabalhadores escravizados na Destilaria Araguaia (chamada anteriormente de Gameleira), no Mato Grosso. Segundo o auditor fiscal Leandro de Andrade Carvalho, que coordenou a operação, os trabalhadores estavam sem receber salário há três meses. Essa foi a terceira libertação realizada em oito anos na mesma usina. A Destilaria Araguaia pertence ao Grupo Eduardo Queiroz Monteiro (EQM) – um grande conglomerado econômico com sede em Pernambuco. O grupo controla outras usinas em Pernambuco, Tocantins e Maranhão,
além de participar como acionista em veículos de comunicação, como o jornal Folha de Pernambuco, a Rádio Folha de Pernambuco, Folha Digital de Pernambuco e Agência Nordeste.
 
Em junho de 2009, fiscais do Ministério do Trabalho e do Ministério Público  detectaram irregularidades em usinas fiscalizadas na região de Ribeirão Preto, em São Paulo, entre elas a Bazan, Andrade, Central Energética Moreno Açúcar e Álcool, e Nardini Agroindustrial. As usinas não forneciam equipamento adequado (como luvas, sapatos e caneleiras) e foram constatadas irregularidades no pagamento da jornada de trabalho.
 
Os trabalhadores declararam que cortam cerca de 20 toneladas de cana por dia. Os fiscais também registraram condições precárias de moradia, como superlotação, locais com risco de incêndio e falta de condições de higiene.
 
Ainda em 2009, o Ministério Público do Trabalho (MPT) conseguiu uma liminar que obriga a usina São Martinho, em Limeira (SP), a corrigir irregularidades trabalhistas. Durante fiscalizações nas safras de 2007 e 2008, o MPT constatou a falta de equipamentos de proteção, de segurança no trabalho, de cuidados médicos, de condições de higiene e de alimentação adequadas. A ação judicial inclui ainda a condenação da empresa ao pagamento de R$2 milhões aos trabalhadores por dano moral.
 
Para ler a reportagem completa e outras matérias confira a edição de abril da revista Caros Amigos, já nas bancas, ou clique aqui e compre a versão digital da Caros Amigos.


 

Cidadão Boilesen (2009)



Do Blog DocVerdade


(Brasil, 2009, 92min - Direção: Chaim Litewski)
Finalmente na Web!
 
Estivemos presentes no festival "É Tudo Verdade", no CCBB em Brasília, e vimos o ganhador do prêmio de melhor documentário nacional - "Cidadão Boilesen", que conta o envolvimento da classe empresarial brasileira com o pior dos anos de chumbo da ditadura Brasileira.
Henning Boilesen, figura representativa na alta roda paulistana, carismático, presidente do grupo Ultra (Ultragás) participou ativamente (inclusive presencialmente) na OBAN (Operação Bandeirante) que visava aniquiliar qualquer forma de pensamento que discordasse da ditadura.
O filme mostra que ele, assim como empresários da Camargo Correa, Folha de São Paulo, entre muitos outros, financiaram a repressão, que torturou e assassinou estudantes, professores e militantes de esquerda no Brasil.
Boilesen, diferentemente de quase todos, foi punido, sendo assassinado pelos militantes do MRT e ALN.

Um documentário excepcional e imperdível.
(Sinopse original do docverdade)


Torrent

Agradecemos a Diego P. pela indicação do Link do torrent

O Irã, o Brasil e ‘a bomba’

Pepe Escobar: O Irã, o Brasil e “a bomba”

30/4/2010, Pepe Escobar, “The Roving Eye”, Asia Times Online
http://www.atimes.com/atimes/Middle_East/LD30Ak01.html

tradução de Caia Fittipaldi no Viomundo

O ministro das Relações Exteriores do Brasil Celso Amorim foi tão polido quando preciso e claro, em conferência conjunta de imprensa, ao lado de seu contraparte Manouchehr Mottaki em Teerã nessa 5ª.-feira. Amorim disse que “o Brasil está interessado em participar de uma solução apropriada para a questão nuclear iraniana.”
“Apropriada” é palavra em código para “dialogada” – não uma quarta rodada de sanções lançada pelo Conselho de Segurança da ONU, muito menos a opção militar, que o governo Barack Obama insiste, com estridência, em manter à mesa. Assim, ao posicionar-se como um mediador em busca de solução pacífica, o governo brasileiro põe-se em rota de colisão “soft” com o governo Obama.
O presidente Luiz Inacio Lula da Silva do Brasil estará em visita a Teerã, mês que vem. Aos olhos dos falcões do “pleno espectro de dominação” nos EUA, é anátema. Tanto quanto para a ‘mídia’ ocidental de direita, veículos brasileiros inclusos, que não se cansam de martelar Lula, non-stop, por sua iniciativa de política exterior.
Pouca diferença faz que, mais uma vez, Amorim tenha repetido, com destaque, que absolutamente não há consenso na chamada “comunidade internacional” quanto a isolar Teerã. “Comunidade”, mais uma vez nesse caso significa Washington e uns poucos países europeus. O Sul global vota pelo diálogo. O Movimento dos Não-alinhados [ing. Non-Aligned Movement (NAM)] é unanimemente contrário a mais sanções. O Grupo dos 172 (todos os países exceto o Grupo dos 20) é também contra mais sanções.
O Brasil e a Turquia, ambos contrários a novas sanções, ocupam atualmente lugares não-permanentes no Conselho de Segurança da ONU. A posição de ambos é idêntica, em essência, à de China e Rússia – que são membros permanentes do Conselho de Segurança. A tática russa de nada deixar transpirar, e a da China, que concordou com “discutir” pacotes de sanções, têm sido distorcidas e mal interpretadas pela mídia corporativa e vendidas como se esses países estivessem aceitando as exigências de Washington.
Não aceitaram. No encontro dos BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) em Brasília, há menos de duas semanas, esses países mais uma vez definiram que a ‘solução’ de novas sanções não é solução, e repetiram que toda a questão deve ser decidida pela Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA).
Em Teerã, Mottaki e Amorim também discutiram a proposta iraniana de troca de combustível nucelar, como “medida para construir confiança” que beneficiaria o Irã, em relação a Washington e capitais europeias. O Brasil ofereceu-se para enriquecer urânio para o Irã.
O problema é que a nova rodada de sanções está sendo discutida em New York exclusivamente entre os cinco membros permanentes mais a Alemanha – e só depois dessa fase a discussão será aberta aos membros não permanentes, como Brasil, Turquia e Líbano, que mês que vem assumirá o assento rotativo do Conselho de Segurança.
O xis da questão
Cada ator tem suas próprias razões para opor-se às sanções. Moscou – que já fornece ao Irã tecnologia de reatores nucleares, além de armas –, sabe que, mais cedo ou mais tarde Washington terá de aceitar o óbvio; que o Irão, produtor chave de energia, é uma potência regional natural. Para Pequim, o Irã é assunto de segurança nacional energética; mais sanções põem sob risco a estabilidade regional e caem na categoria de delírios-desejos da secretária de Estado Hillary Clinton.
Nova Delhi dificilmente não terá visto, até agora, que, no Afeganistão, Washington embarcou em aliança sem volta com Islamabad; a Índia, portanto, precisa de um Irã estável como contrapoder, para enfrentar a influência do Paquistão no Afeganistão, onde o Paquistão pode, outra vez, reengajar os Talibã. Brasília quer expandir os negócios com Teerã; e Lula, por sua vez, não abre mão da ideia de que mais sanções só farão abrir caminho para mais guerra, não para evitar guerras.
Os diplomatas, na mais recente reunião dos BRICs, tocaram no xis da questão. Os líderes dos BRICs – o poder atual, novo, multipolar que seriamente se tem dedicado em manter sob xeque as ambições de hegemonia dos EUA – avaliaram atenta e cuidadosamente todos os sinais complexos, desde a carta “secreta” do supremo do Pentágono Robert Gates a Obama, em janeiro passado, na qual revisa as opções militares “que continuam à mesa” contra o Irã, até o discurso do almirante Mike Mullen, da Junta de Comando do Estado-maior, na Columbia University, que disse que o ataque sempre seria sua “última escolha”. Avaliaram o nível de ansiedade de Washington. E concluíram que os EUA não atacarão o Irã.
Talvez estejam errados. Por trás de espessa cortina de espelhos e fumaça na mídia corporativa, há furiosa luta de gatos em curso em Washington, entre os ativistas do “espectro de plena dominação” – desde is militares ao pessoal do Instituto “American Enterprise”. Mas só discutem uma coisa: quando atacarão o Irã, ou mais cedo, ou mais tarde.
Entre os falcões está decidido que Washington jamais permitirá ao Irã “adquirir capacidade nuclear”. É o mesmo que falar de guerra preventiva. O “crime” do Irã, até aqui, teria sido já ter um programa de energia nuclear aprovado pelo Tratado de Não-proliferação e inspecionado como se ante o juiz do Juízo Final.
Nesse cenário de ansiedade altíssima, não importa que o Líder Supremo do Irã aiatolá Ali Khamenei tenha recentemente pregado o total desarmamento global e repetido sua fatwa, contra, até, o uso de armas de destruição em massa. São haram (proibidas) nos termos da lei islâmica.
O Pentágono, via Gates, insiste na ofensiva – ameaçando o Irã com uma explícita “todas as alternativas continuam à mesa”, quer dizer, bomba atômica incluída; e Obama, em obra prima de duplifalar orwelliano, acrescentou que os EUA “manteremos nosso [poder nuclear] de contenção”, como “incentivo” para Irã e Coreia do Norte. Incentivo ao suicídio seppuku, quem sabe?
Assim sendo, o que acontecerá?
Mês que vem, em New York, haverá nova revisão do Tratado de Não-proliferação. O governo Obama já começou a pressionar o Brasil para que aceite um protocolo adicional. O Brasil recusou.
Na essência, o Tratado de Não-proliferação é extremamente assimétrico. Nações que pertençam ao clube da bomba atômica recebem tratamento VIP, em relação aos demais. O protocolo adicional aumenta ainda mais essa discriminação – e dificulta até a pesquisa para finalidades pacíficas, nas nações não-nucleares.
O Brasil que – diferença crucial nesse contexto – ostenta tradição pacifista – defende o direito de qualquer país soberano adquirir “capacidade de tecnologia nuclear”. Foi onde o Irã subiu ao barco, conforme todas as evidências disponíveis. Assim sendo, o Brasil está em evidente rota de colisão com Washington, no que tenha a ver com o Tratado revisto de Não-proliferação. Para Brasília, seria submeter-se à interferência estrangeira.
Quanto às sanções, Washington precisa cair na real. Acreditar que os BRICs ou países da Ásia ou Europa deixarão de comprar gás e petróleo do Irã; que não venderão gasolina ao Irã, e que os bancos iranianos não encontrarão meios de continuar a operar na economia global (eles têm parceiros, por exemplo, nos Emirados Árabes Unidos e na Venezuela) é viver no País das Maravilhas.
As majors chinesas do petróleo já vendem gasolina diretamente ao Irã. Em 2012, o Irã terá dobrado a produção de gasolina, depois de expandir 10 refinarias, e está investindo cerca de 40 bilhões na construção de sete novas refinarias. O Irá continuará no negócio dos produtos do petróleo – principalmente com as “stans” da Ásia Central. O que mostra, por exemplo, que pode importar gasolina contornando o sistema bancário internacional.
E, sobretudo, há o mercado negro. Jordânia e Turquia contrabandeiam rios de petróleo para fora do Iraque ‘sancionado’ durante os anos 90s. Com novas sanções sobre o Irã, será a vez de uma nova geração de iraquianos ganharem a sorte grande. Quanto à ditadura militar do mulariato em Teerã, os mulás adorarão consumir seus lucros de energia para reforçar seu escudo protetor.
Os líderes dos BRICs – Lula entre eles – podem, sim, ter visto a estrada por trás da cortina de espelhos e fumaça. Bomba? Mas que bomba? Todos sabem que o Irã não pode fabricar uma bomba, por exemplo, em Natanz, não, com certeza, enquanto as instalações forem inspecionadas até o esqueleto descarnado pela IAEA. Suponha-se que o Irã supere a Coreia do Norte, engane todos os inspetores, dê um chapéu no Tratado de Não-proliferação e decida fabricar uma bomba em local secreto. Precisariam de quantidades enormes de água e energia – e os satélites lá estão, para ver qualquer movimentação desse tipo.
Os líderes dos BRICs já concluíram, isso sim, que Washington nada pode fazer quanto a o Irã adquirir “capacidade nuclear”, além de invadir o país, em edição conjunta remix das operações Tempestade no Deserto + Choque e Pavor, e provocar um banho de sangue para troca de regime.
Nem rodadas e mais rodadas de sanções conseguirão excluir essas opções. Bombas “de precisão” israelenses, dos EUA ou híbridas, poderão, no máximo, atrasar um pouco o processo iraniano – e, isso, sem considerar as muitas possibilidades de retaliação. Tudo isso considerado, só há uma solução viável.
Washington tem de sentar-se à mesa com Teerã com o tal “punho aberto” realmente aberto e examinar todas as opções diplomáticas, à busca de um pacote abrangente de segurança para o Oriente Médio – pacote o qual, é claro, terá de incluir a total desnuclearização; quer dizer, fim, também, para as bombas atômicas “secretas” de Israel.
Difícil, só, saber se o governo Obama – acossado pelos falcões da guerra por todos os lados – sobreviverá a esse desafio.