Escrito por Atilio A. Boron no Correio da Cidadania | |
O capitalismo tem legiões de apologistas. Muitos o são de boa fé,
produto de sua ignorância e pelo fato de que, como dizia Marx, o sistema
é opaco e sua natureza exploradora e predatória não é evidente aos
olhos de mulheres e homens. Outros o defendem porque são seus grandes
beneficiários e amealham enormes fortunas graças às suas injustiças e
iniqüidades. Há ainda outros (‘gurus’ financeiros, ‘opinólogos’ e
‘jornalistas especializados’, acadêmicos ‘pensantes’ e os diversos
expoentes desse "pensamento único") que conhecem perfeitamente bem os
custos sociais que o sistema impõe em termos de degradação humana e
ambiental. Mas esses são muito bem pagos para enganar as pessoas e
prosseguem incansavelmente com seu trabalho. Eles sabem muito bem,
aprenderam muito bem, que a "batalha de idéias" para a qual nos convocou
Fidel é absolutamente estratégica para a preservação do sistema, e não
aplacam seus esforços.
Para contra-atacar a proliferação de versões idílicas acerca do
capitalismo e sua capacidade de promover o bem-estar geral, examinemos
alguns dados obtidos de documentos oficiais do sistema das Nações
Unidas. Isso é extremamente didático quando se escuta, ainda mais no
contexto da crise atual, que a solução dos problemas do capitalismo se
consegue com mais capitalismo; ou que o G-20, o FMI, a Organização
Mundial do Comércio e o Banco Mundial, arrependidos de seus erros
passados, poderão resolver os problemas que asfixiam a humanidade. Todas
essas instituições são incorrigíveis e irreformáveis, e qualquer
esperança de mudança não é nada mais que ilusão. Seguem propondo o
mesmo, mas com um discurso diferente e uma estratégia de "relações
públicas" desenhada para ocultar suas verdadeiras intenções. Quem tiver
duvidas, olhe o que estão propondo para "solucionar" a crise na Grécia:
as mesmas receitas que aplicaram e continuam aplicando na América Latina
e na África desde os anos 80!
A seguir, alguns dados (com suas respectivas fontes) recentemente
sistematizados pelo CROP, o Programa Internacional de Estudos
Comparativos sobre a Pobreza, radicado na Universidade de Bergen,
Noruega. O CROP está fazendo um grande esforço para, desde uma
perspectiva crítica, combater o discurso oficial sobre a pobreza,
elaborado há mais de 30 anos pelo Banco Mundial e reproduzido
incansavelmente pelos grandes meios de comunicação, autoridades
governamentais, acadêmicos e "especialistas" vários.
População mundial: 6.800 bilhões, dos quais...
1,020 bilhão são desnutridos crônicos (FAO, 2009)
2 bilhões não possuem acesso a medicamentos (http://www.fic.nih.gov/)
884 milhões não têm acesso à água potável (OMS/UNICEF, 2008)
924 milhões estão "sem teto" ou em moradias precárias (UN Habitat, 2003)
1,6 bilhão não têm eletricidade (UN HABITAT, "Urban Energy")
2,5 bilhões não têm sistemas de drenagens ou saneamento (OMS/UNICEF,
2008)
774 milhões de adultos são analfabetos (http://www.uis.unesco.org/)
18 milhões de mortes por ano devido à pobreza, a maioria de crianças
menores de 5 anos (OMS).
218 milhões de crianças, entre 5 e 17 anos, trabalham precariamente em
condições de escravidão e em tarefas perigosas ou humilhantes, como
soldados, prostitutas, serventes, na agricultura, na construção ou
indústria têxtil (OIT: A eliminação do trabalho infantil: um objetivo ao
nosso alcance, 2006).
Entre 1988 e 2002, os 25% mais pobres da população mundial reduziram sua
participação na renda global de 1,16% para 0,92%, enquanto os opulentos
10% mais ricos acrescentaram mais às suas fortunas, passando de dispor
de 64,7% para 71,1% da riqueza mundial. O enriquecimento de uns poucos
tem como seu reverso o empobrecimento de muitos.
Somente esse 6,4% de aumento da riqueza dos mais ricos seria suficiente
para duplicar a renda de 70% da população mundial, salvando inumeráveis
vidas e reduzindo as penúrias e sofrimentos dos mais pobres. Entenda-se
bem: tal coisa se conseguiria se simplesmente fosse possível
redistribuir o enriquecimento adicional produzido entre 1988 e 2002 dos
10% mais ricos. Mas nem sequer algo tão elementar como isso é aceitável
para as classes dominantes do capitalismo mundial.
Conclusão: se não se combate a pobreza (que nem se fale de erradicá-la
sob o capitalismo) é porque o sistema obedece a uma lógica implacável
centrada na obtenção do lucro, o que concentra riqueza e aumenta
incessantemente a pobreza e a desigualdade sócio-econômica.
Depois de cinco séculos de existência eis o que o capitalismo tem a
oferecer. O que estamos esperando para mudar o sistema? Se a humanidade
tem futuro, será claramente socialista. Com o capitalismo, em
compensação, não haverá futuro para ninguém. Nem para os ricos e nem
para os pobres. A frase de Friedrich Engels e também de Rosa Luxemburgo,
"socialismo ou barbárie", é hoje mais atual e vigente do que nunca.
Nenhuma sociedade sobrevive quando seu impulso vital reside na busca
incessante do lucro e seu motor é a ganância. Mas cedo que tarde provoca
a desintegração da vida social, a destruição do meio ambiente, a
decadência política e uma crise moral. Ainda temos tempo, mas já não
tanto.
Atilio A. Boron é diretor do PLED, Programa Latinoamericano de Educación
a Distancia em Ciências Sociais, Buenos Aires, Argentina.
Website: http://www.atilioboron.com/.
Traduzido por Gabriel Brito, jornalista.
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Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
sexta-feira, 14 de maio de 2010
Saiba o que é o capitalismo
A decadência da Igreja Católica.....
O Papa, a Pedofilia e a Luta de Classes
Ao afirmar no avião
que o transportou a Portugal que “Os ataques contra a Igreja e o Papa
não vêm apenas do exterior, os sofrimentos vêm do interior da Igreja, do
pecado que existe na Igreja”, Bento XVI procurou sacudir as imensas
responsabilidades que têm na protecção dos sacerdotes que abusaram
pessoalmente de milhares de crianças confiadas à responsabilidade da
Igreja.
Sara Flounders, no bem documentado texto que hoje publicamos, acusa
Ratzinger de ser o principal responsável do encobrimento e protecção dos
sacerdotes que abusaram de crianças um pouco por todo o mundo.
Há mais de
150 anos, no Manifesto Comunista, Marx explicou que «toda a História da
humanidade foi uma História da luta de classes. (…) patrícios e plebeus,
senhores e servos, opressores e oprimidos (…) sempre se enfrentaram,
mantiveram a luta, umas vezes velada e outras franca e aberta. (…) A
moderna sociedade burguesa (…) substituiu as velhas classes, as
velhas condições de opressão, as velhas formas de luta por outras novas»
Uma luta feroz tem atormentado a Igreja Católica durante os últimos 25 anos, com alguns dos oprimidos sobreviventes de abusos sexuais durante a sua infância a exigirem, cada vez mais, que se actuasse contra sacerdotes individuais e, ultimamente, contra a poderosa hierarquia eclesiástica, incluindo bispos e cardeais que, constantemente, protegeram os violadores.
Uma luta feroz tem atormentado a Igreja Católica durante os últimos 25 anos, com alguns dos oprimidos sobreviventes de abusos sexuais durante a sua infância a exigirem, cada vez mais, que se actuasse contra sacerdotes individuais e, ultimamente, contra a poderosa hierarquia eclesiástica, incluindo bispos e cardeais que, constantemente, protegeram os violadores.
Esta exigência de justiça vinda de baixo conseguiu o impensável:
trazer á luz do dia papel do actual papa, Bento XVI, num punível
encobrimento internacional.
O marxismo é uma ciência que explica as relações de classe
subjacentes a factos sociais que parecem obscuros e distantes da luta
imediata dos trabalhadores. A actual controvérsia, por muito que se
esconda por detrás dos paramentos clericais, não deixa de ser uma luta
de classes no interior da Igreja Católica. Trata-se de uma pequena parte
da luta de classes global que aspira á absoluta igualdade de direitos e
de autoridade.
O que antes se aceitava por não haver outro remédio tornou-se hoje
insuportável. Os milhares de vítimas de abusos sexuais que hoje
denunciam casos de pedofilia eram crentes genuínos, filhos da classe
trabalhadora, sem qualquer possibilidade – até agora – de opor
resistência ou confessar às suas próprias famílias os delitos de que
foram vítimas. Eram crianças violadas em hospícios, reformatórios,
escolas para surdos-mudos e deficientes, escolas paroquiais locais e
igrejas.
Este desafio desde baixo contra o secretismo e a repressão é uma
clara ruptura com o passado. O mau-trato sexual permaneceu impune porque
as autoridades religiosas eram impunes. Em muitas escolas paroquiais as
violações eram clandestinas, mas os maus-tratos físicos, psicológicos e
as humilhações eram tão habituais que se tornaram a normalidade.
Logo que as vítimas sobreviventes começaram a falar os sacerdotes
que se colocavam ao seu lado foram silenciados e excluídos do ensino ou
de posições de poder. Mas a hierarquia eclesiástica – um pequeno grupo
que detém de forma absoluta a autoridade religiosa – não conseguiu
silenciar ou deter este movimento.
Praticamente, nenhuma das denúncias surgiu do exterior ou das
autoridades laicas, receosas de ofender uma instituição tão poderosa,
mas todas surgiram de indivíduos católicos sem qualquer poder no
interior da Igreja que recusaram continuar silenciosos. Apresentaram
queixas, fizeram declarações e, por último, fizeram queixas judiciais,
uma após outra.
A hierarquia eclesiástica, empenhada em defender o seu
inquestionável poder, exigiu silêncio absoluto. Ameaçou com a excomunhão
os que apresentassem queixa judicial e exigissem a intervenção das
autoridades civis. Este esforço para manter o controlo absoluto dos
sacerdotes defronta-se com uma luta interna muito mais ampla, que tenta
esclarecer quais são os interesses a que esta poderosa instituição se
devia submeter.
O escândalo internacional que hoje emociona a Igreja Católica inclui
provas irrefutáveis de dezenas de milhares de casos de violações
infantis e maus-tratos sexuais cometidos por milhares de sacerdotes. As
queixas apresentadas aconteceram ao longo de décadas. A luta mais
encarniçada começou nas cidades que até agora albergavam os crentes mais
devotos dos EUA. Daí passou à Irlanda, depois a Itália e, mais tarde a
regiões da Alemanha com fortes populações católicas.
Perturbador, e agora a receber um tratamento quase quotidiano nos media,
é a certeza de que o actual papa, Bento XVI, foi durante décadas
responsável pessoal pela ocultação, encobrimento e sigilo sobre os
depredadores sexuais. As condenações mais enérgicas provêm dos que,
apesar disso, se consideram parte integrante da Igreja Católica.
O teólogo liberal Hans Kung descreveu assim o papel do papa Bento
XVI no auge da ocultação e do silêncio que rodeava as violações: «Não
havia uma só pessoa em toda a Igreja Católica que soubesse de mais casos
de abusos sexuais que ele, visto que tais casos faziam parte do seu
trabalho diário. (…) O que ele não pode fazer é apontar o dedo aos
bispos e dizer-lhes que não fizeram o suficiente. Foi ele quem deu as
instruções na qualidade de Presidente da Congregação para a Doutrina da
Fé e, depois, voltou a dá-las como papa.»
Em 26 de Março de 2010, o editorial do National Catholic Reporter
afirmava o seguinte: «O Santo Padre tem de responder directamente, num
foro credível, às perguntas sobre qual foi a sua responsabilidade como
arcebispo de Munique (1977-1982), como perfeito da Congregação para a
Doutrina da Fé (1982-2005) e como papa (desde 2005 até hoje) pela
inépcia com que tratou a crise dos abusos sexuais do clero.»
Antes de em Abril de 2005 ter sido nomeado para o cargo máximo da
hierarquia católica, o papa Bento XVI era conhecido como o Cardeal
Joseph Ratzinger. Os seus adversários referiam-se a ele como «o pitbull»
e como o «rotweiller de Deus». Ratzinger era então um protegido da
extrema-direita do papa João Paulo II, que o nomeou para que impusesse a
disciplina e a autoridade eclesiástica numa instituição afundada numa
profunda agitação.
Durante 24 anos, Ratzinger presidiu à instituição mais poderosa e
historicamente mais repressiva da Igreja Católica, a Congregação para a
Doutrina da Fé, entidade que durante séculos tinha sido conhecida como o
Santo Ofício da Inquisição, responsável pelo estabelecimento de
tribunais religiosos para a condenação e a tortura de dezenas de
milhares de pessoas acusadas de bruxaria e heresia. A Inquisição deu
lugar a pogroms e expropriações massivas de judeus e muçulmanos. Foi
através deste Ofício no interior da Igreja que o papa João Paulo II
implantou uma moderna Inquisição.
Um vasto encobrimento perfeitamente documentado
A escala da criminosa conspiração internacional de silêncio
destinada a proteger delinquentes sexuais em série e a pôr os interesses
da Igreja acima da segurança e bem-estar das crianças ficou
perfeitamente documentada no ano passado com a forma como se tratou o
caso de abusos sexuais na Irlanda, um país maioritariamente católico.
Depois de anos de petições das vítimas de violações para que a
Igreja tomasse medidas e o governo julgasse os responsáveis e, depois de
uma série de actos censórios nos media irlandeses, o governo
de Dublin encomendou um estudo que demorou nove anos a fazer. Em 20 de
Maio de 2009 a Comissão publicou um relatório de 2.600 páginas.
Este relatório incluía testemunhos de milhares de antigos internos e
de responsáveis por mais de 250 instituições controladas pela Igreja. A
Comissão constatou que quer sacerdotes quer freiras católicas tinham
aterrorizado milhares de meninos e meninas ao longo de décadas e que os
inspectores do governo tinham fracassado na hora de cortar radicalmente
com as tareias, as violações e as humilhações crónicas e diárias. O
relatório qualificou as violações e os abusos sexuais de «endémicos» nas
escolas e nos orfanatos católicos dirigidos pela Igreja da Irlanda (www.childabusecommission.com/rpt/).
A grandeza dos abusos na Irlanda e a força do movimento que exigia o
seu reconhecimento fizeram com que o papa Bento XVI se visse forçado a
emitir uma débil desculpa, na qual são responsabilizados os bispos
irlandeses. Esta recusa em admitir a menor responsabilidade pelo seu
conhecido procedimento como dirigente – sempre insistiu no silêncio –
encolerizou milhões de católicos sinceros e fervorosos, e enfureceu
ainda mais uma oposição que há décadas está em crescendo no interior da
Igreja Católica.
Em Springfield (Massachusetts), o reverendo James J. Scahill – há
anos critico do encobrimento eclesiástico – respondeu durante um sermão à
frouxa desculpa, qualificando alguns clérigos de «criminosos» e pedindo
a demissão do papa Bento XVI:
«Devemos declarar pessoal e colectivamente que duvidamos muito da honestidade do papa e daquelas autoridades eclesiásticas que o estão a defender ou inclusivamente a partilhar responsabilidades em seu nome. Começa a ser evidente que, durante décadas, se não séculos, os dirigentes da Igreja ocultaram os abusos sexuais de crianças e menores para proteger a sua imagem institucional e a imagem do sacerdócio», disse Scahill (New York Times, 12 de Abril de 2010).
«Devemos declarar pessoal e colectivamente que duvidamos muito da honestidade do papa e daquelas autoridades eclesiásticas que o estão a defender ou inclusivamente a partilhar responsabilidades em seu nome. Começa a ser evidente que, durante décadas, se não séculos, os dirigentes da Igreja ocultaram os abusos sexuais de crianças e menores para proteger a sua imagem institucional e a imagem do sacerdócio», disse Scahill (New York Times, 12 de Abril de 2010).
Scahill acrescentou que tinha começado a falar claro depois dos seus
próprios paroquianos lhe contarem os abusos sexuais que tinham sofrido
durante décadas em Boston e lhe terem pedido que fizesse alguma coisa.
O Cardeal Bernard Law, da arquidiocese de Boston, teve um papel
destacado na protecção de sacerdotes implicados em abusos sexuais de
crianças para não sofressem qualquer castigo – nem religioso nem civil –
transferindo-os sigilosamente para outros lugares. Em 2002, este facto
converteu-se num escândalo nacional quando um juiz de Massachutts
permitiu a divulgação de milhares de páginas de documentos, memorandos e
declarações legais. Estes documentos mostravam uma clara tendência para
a ocultação, protectora dos culpados e marginaladora das vítimas, ao
revelar que, desde 1940, mais de 1.000 crianças tinham sofrido abusos
sexuais na arquidiocese, por parte de mais de 250 sacerdotes e
trabalhadores eclesiásticos. O cardeal Law foi obrigado a resignar de
forma pouco digna e a arquidiocese de Boston foi condenada a desembolsar
como indemnização a 552 vítimas, entre 85 e 100 milhões de dólares.
Esta multimilionária condenação, o aumento de escândalos noutras
cidades e a ampla cobertura mediática que os factos tiveram forçaram os
bispos norte-americanos a publicar uma «Declaração para a protecção de
crianças e jovens», na qual se instituía uma política de tolerância
zero, com expulsão imediata dos sacerdotes implicados mesmo que num só
daqueles actos. Mas a dita declaração não propôs nenhuma medida contra
os bispos que tinham encoberto os delitos.
O então cardeal Ratzinger que estava no Vaticano, recusou-se a dar
andamento a este modesto esforço de limpeza. Em vez disso, exigiu que
todas as acusações de abusos sexuais fossem transferidas para o Ofício
que presidia – a Congregação para a Doutrina da Fé – antes que os padres
fossem expulsos do sacerdócio. Um dos seus primeiros actos como papa
foi promover o cardeal de Boston, Bernard Law, a um lugar de prestígio
no Vaticano.
Numa carta de infausta memória enviada que Ratzinger enviou aos
bispos em 2001 e que tem sido profusamente citada, utilizou a sua
influência para que as alegações de abusos sexuais se mantivessem
secretas sob ameaça de excomunhão. Os sacerdotes acusados de delitos
sexuais e as suas vítimas receberam ordem para «manterem o mais estrito
silêncio» e «guardar silêncio perpétuo».
O padre Tom Doyle, um antigo advogado do Vaticano, denunciou esta
política da cúpula do Vaticano com as seguintes palavras: Trata-se de
uma medida explícita de encobrimento de casos de abusos sexuais infantis
por aprte do clero e de castigo para os que divulguem este tipo de
delito cometido por sacerdotes. Cada vez que se descobriam padres
delinquentes a resposta não era investigar os casos e julgá-los mas
transferi-los para outro sítio.
Negligência ou cumplicidade criminosa?
Qual é a dimensão dos delitos sexuais cometidos contra a juventude? É
a hierarquia eclesiástica culpada por ter ignorado o problema, isto é,
de negligência criminosa, ou de ter recusado tomar medidas quando teve
conhecimento dos delitos?
Um memorando assinado pessoalmente pelo então cardeal Ratzinger,
quando dirigia no Vaticano o poderoso Ofício e depois da centralização
de todos os casos, foi publicado em Abril e levantou um enorme
burburinho. Ratzinger anulou e interrompeu todas as acções que se
puseram contra um padre predador, o reverendo Lawrence C. Murphy.
Murphy foi acusado de abusar sexualmente de mais de 200 rapazes numa
escola para surdos-mudos de Milwaukee, apesar das petições a pedir a
sua expulsão, inclusive do seu bispo. Durante décadas, os antigos
estudantes tinham utilizaram uma linguagem de sinais e juramentos
escritos em reuniões com bispos e funcionários civis, em que pediam que o
padre Murphy fosse acusado e julgado por tais delitos.
Simultaneamente, soube-se em Itália que 67 antigos pupilos de uma
outra escola de surdos-mudos, em Verona, tinham acusado 24 padres e
religiosos leigos de repetidas violações que lhes infligiram desde os
sete anos.
Na Alemanha, mais de 250 casos de abuso sexual ocultado viram a luz
do dia durante os dois últimos meses, inclusive em distritos
directamente supervisionados pelo papa Bento XVI quando era bispo.
A publicidade internacional que rodeou o caso judicial de Boston e a
multimilionária condenação permitiram que muitas outras vítimas
tivessem possibilidade de sair à luz do dia e exigissem justiça. Desde
1950, mais de 4.000 sacerdotes foram acusados nos EUA de abuso de
menores e a Igreja Católica pagou mais de 2.000 milhões de dólares em
indemnizações às vítimas. Em 2007, a arquidiocese de Los Angeles
anunciou que tinha chegado a um acordo por 600 milhões de dólares com
uns 500 queixosos. Seis dioceses viram-se forçados a declarar bancarrota
e muitas outras a vender abundantes bens eclesiásticos para financiar
os acordos.
Muitos destes casos tinham sido descritos detalhadamente por uma
organização denominada Rede de Sobreviventes de Abuso Sexual por
Sacerdotes (SNAP na sua sigla em inglês). A SNAP é o grupo mais antigo e
numeroso de apoio às vítimas de abuso sexual pelo clero.
Mas as vítimas de abuso não foram apenas crianças. Segundo o St.
Louis Post-Dyspach de 4 de Janeiro de 2003, foi feita uma sondagem
nacional dirigida por investigadores da Universidade de St Louis
financiada por algumas ordens de religiosas católicas. A sondagem
estimou que um «mínimo» de 34.000 freiras católicas, isto é 40% de todas
as freiras católicas dos EUA, tinham sofrido de alguma forma um trauma
sexual.
Vale a pena assinalar que a maioria dos testemunhos, das queixas
judiciais, das averiguações e das revelações de abusos sexuais tiveram
lugar no interior da própria Igreja Católica, e foi feita por antigas
vítimas. Muitos outros católicos – indignados – uniram-se a eles para
exigir a responsabilização de uma hierarquia clerical privilegiada que
vive obcecada pela protecção da sua posição, da sua autoridade e da sua
riqueza, em vez de proteger as crianças.
Na Europa existe uma corrente de opinião – cada vez mais numerosa –
que pretende levar o papa Bento XVI ao Tribunal Penal Internacional
(TPI) acusado do delito de proteger a Igreja e não as suas vítimas.
Geoffrey Robertson, membro do Conselho de Justiça das Nações Unidas e
presidente do Tribunal Especial da Serra Leoa, disse que julga ter
chegado o momento de questionar a imunidade papal.
Num artigo publicado no Guardian de 2 de Abril sob o título
«Sentemos o papa no banco dos réus», Robertson escreveu: «A imunidade
papal não pode continuar. O Vaticano deveria sentir o peso do Direito
Internacional. A pedofilia é um crime contra a humanidade. A anómala
pretensão de que o Vaticano é um Estado – e o papa um chefe de Estado
imune á lei – não resiste à menor análise.»
Naturalmente, vale a pena recordar que o Tribunal Penal
Internacional só apresentou acusações contra quatro países africanos que
estavam debaixo da mira do imperialismo.
O TPI ignorou os crimes de guerra norte-americanos no Iraque e no
Afeganistão, tal como os crimes israelenses contra civis palestinos e
libaneses. Como baluarte que é do imperialismo dos EUA à escala global,
parece pouco provável que o Vaticano tenha que responder perante a
justiça num futuro imediato.
Contra o movimento global pela justiça
Qual a função mais valorizada pelo imperialismo norte-americano
desempenhada pelo Vaticano na sociedade de classes?
Enquanto absolvia, encobria e transferia milhares de padres culpados
de abuso sexual de crianças, o papa Bento XVI aproveitou durante 25
anos o seu cargo de direcção na mais poderosa instituição eclesiástica, a
Congregação para a Doutrina da Fé, com o objectivo de eliminar de
paróquias, escolas e de qualquer posição de poder milhares de
sacerdotes, bispos e pessoas religiosas que, de alguma maneira, tinham
posições progressistas ou defendiam os direitos humanos e a dignidade
dos pobres e oprimidos.
Impediu que os teólogos, docentes, escritores e intelectuais
pudessem escrever, publicar e ensinar em instituições da Igreja. Os
bispos que tentaram utilizar a sua autoridade para promover uma mudança
social foram investigados por deslealdade e forçados a resignar.
Substitui-os o clero politicamente mais reaccionário, desejoso de
preservar a autoridade religiosa e o dogma.
Este foi um esforço da direita mais extrema para sufocar uma
corrente progressista conhecida como a «teologia da libertação», que
procurava alinhar a Igreja com os movimentos de libertação e com as
lutas anticolonistas e revolucionárias que varriam a África, a Ásia e a
América Latina, bem como com o movimento pelos direitos civis nos EUA.
Sacerdotes como o padre Camilo Torres da Colômbia – que escreveu,
dialogou e organizou o seu apostolado na tentativa de unir o catolicismo
e o marxismo revolucionário – foram considerados uma ameaça directa à
exploração capitalista. O padre Camilo Torres uniu-se à luta armada
contra a ditadura lacaia do imperialismo e morreu em combate.
Freiras activistas que dirigiam o Movimento Santuário de ajuda e
salvo-conduto para os emigrantes salvadorenhos que fugiam dos esquadrões
da morte também foram um objectivo a abater, como o foram igualmente
Philip e Tom Berrigan, dois sacerdotes sempre à beira da detenção, que
cumpriram penas de prisão juntamente com um grupo católico oposto à
guerra do Vietname.
Teólogos da libertação como o carismático Leonardo Boff, do Brasil,
sofreram a proibição eclesiástica de fazer declarações ou escrever.
Sacerdotes que disseram servir os pobres, como o padre Jean-Bertrand
Aristide, do Haiti, foram expulsos da sua ordem religiosa e forçados a
demitirem-se pelo crime de «glorificação da luta de classes». Samuel
Ruiz, o bispo de Chiapas (México), recebeu ordem para se abster de fazer
«interpretações marxistas».
Foi uma caça às bruxas e uma purga que tomou como alvo os activistas
contra o racismo e a favor da justiça social. No entanto, o
reaccionário bispo dissidente Richard Williamson, que negou publicamente
o Holocausto, foi calorosamente readmitido na Igreja.
Perante uma oposição cada vez maior em todos os estratos, esta
poderosa instituição que durante séculos protegeu as propriedades e os
privilégios das classes dirigentes ocidentais, utilizou com afinco
crescente as suas forças mais fanaticamente reaccionárias para combater
os que procuravam a mudança, a abertura, a igualdade e a atenção para as
necessidades dos pobres e dos oprimidos.
Sob a liderança do papa João Paulo II e depois do papa Bento XVI, a
Igreja Católica foi um aliado incondicional do imperialismo dos EUA,
opôs-se á construção socialista na Europa de Leste. Como contrapartida,
os poderosos media norte-americanos promoveram activamente e
ofereceram uma cobertura favorável à Igreja Católica, ao mesmo tempo que
diabolizavam os muçulmanos e outras religiões de povos oprimidos.
Em 2006, o papa Bento XVI apoiou a propaganda antimuçulmana que
Washington tinha exacerbado conscientemente para justificar a guerra e a
ocupação do Iraque e do Afeganistão. Num importante discurso papal,
Bento XVI citou um imperador bizantino do século XIV que tinha acusado o
profeta Maomé de apenas ter trazido ao mundo «coisas malignas e
desumanas».
A aliança com o imperialismo norte-americano forçou a Igreja
Católica a reviver os mais reaccionários excessos do seu próprio e
obscuro passado. Membros de grupos com ligações a esquadrões da morte e
ditaduras militares da América Latina e com o fascismo e a
extrema-direita da Europa – como a hermética seita Opus Dei e os
Legionários de Cristo – foram promovidos às mais altas posições no
Vaticano e no mundo.
Dois clérigos fascistas, Josemaria Escrivá – que se colocou ao lado
de Hitler durante a Segunda Guerra Mundial e organizou bandos fascistas
para caçar comunistas e sindicalistas revolucionários na Espanha de
Franco – e o cardeal croata Aloysius Stepinac – que ajudou a criar
campos de exterminação de judeus sérvios e ciganos – foram canonizados
como santos.
O facto de proteger e esconder sacerdotes que tinham abusado de
crianças ao mesmo tempo que obrigava à demissão as forças religiosas que
defendiam os direitos dos oprimidos e se aliavam com os seus movimentos
de libertação não é contraditório. A indulgência para com marginais e
criminosos e a dura repressão de progressistas são as duas caras de uma
mesma política de classe que consiste em defender a autoridade de uma
hierarquia estabelecida, uma política que a Igreja vem assumindo em cada
assunto social.
Uma visão repressora da sexualidade
Desde o esclavagismo em Roma à sociedade feudal europeia e, depois,
como instrumento fundamental da conquista imperial, a Igreja Católica é
uma instituição religiosa arreigada na sociedade de classes e no
patriarcado. Esta herança patriarcal constitui a base das suas posições
repressoras de todas as formas de expressão sexual humana. Quer se trate
de homossexuais ou heterossexuais, de casados ou solteiros, a Igreja
Católica arroga-se o direito de legislar todas as formas de expressão
sexual da sociedade.
Ao mesmo tempo que se recusava qualquer acção contra depredadores
sexuais porque isso punha em perigo a autoridade e a santidade do
sacerdócio, Ratzinger era o principal executor de arcaicas doutrinas
religiosas sobre a sexualidade e sobre a subordinação da mulher na
Igreja e na sociedade. Não permitiu a menor liberalização em questões de
controlo da natalidade, aborto, divórcio ou reconhecimento da
homossexualidade. No interior da Igreja estas regras impuseram-se
através do prisma do pecado e da culpa. Aos católicos homossexuais, aos
casados depois de um divórcio, aos que praticavam o controlo da
natalidade ou às mulheres que tinham abortado recusavam-se os
sacramentos e eram excluídos da Igreja ou excomungados.
O peso das instituições eclesiásticas com mais recursos económicos e
influência utilizava-se de forma agressiva na sociedade civil para
oposição à liberalização das leis do divórcio, e ao direito da mulher ao
controlo da natalidade e ao aborto. A Igreja Católica organizava e
financiava campanhas políticas contra o matrimónio homossexual e a
adopção de crianças por parte de casais homossexuais. E enquanto
proclamava o seu dever religioso de proteger os «nascituros», recusava a
protecção às crianças que estavam sob o seu controlo.
À medida que ia crescendo a onda de protestos pelos seus ataques
contra as crianças que supostamente deviam cuidar, este agrupamento
reaccionário tentava converter a sua criminosa ocultação dos crimes numa
luta contra os homossexuais, ao ligar a pedofilia – isto é, o abuso
sexual da infância – com a prática homossexual, de mútuo acordo, entre
os adultos.
No passado dia 14 de Abril, o cardeal Tarcísio Bernone, secretário
de estado do Vaticano, atribuiu a pedofilia à homossexualidade, que
tachou de «patologia». Numa conhecida carta aos bispos escrita em 1986, o
papa Bento XVI descreveu a homossexualidade como um «mal moral
intrínseco». Foi mesmo muito mais longe ao justificar e inclusive
incentivar violentos ataques contra os homossexuais ao afirmar que «nem a
Igreja nem a sociedade deveriam surpreender-se se aumentarem as
reacções irracionais e violentas» quando os homossexuais exigem direitos
civis.
Estes crimes contra todos os movimentos de povos oprimidos deverão
ser incluídos na cólera que hoje desperta a hierarquia eclesiástica.
Os anos de repressão, de caça às bruxas e intolerância organizada
fizeram com que a hierarquia católica perca cada vez mais apoios. Está
mais desnorteada que a sua própria congregação e totalmente alheada dos
valores da sociedade.
Por muito esforço que faça, a Igreja Católica já não poderá
recuperar o poder absoluto que teve há 500 ou há 100 anos, quando padres
e bispos não tinham que dar contas dos crimes contra mulheres,
escravos, servos, camponeses ou trabalhadores iletrados.
As desculpas cuidadosamente redigidas de forma a não assumir
qualquer responsabilidade, e os actos de relações públicas com umas
quantas e seleccionadas vítimas de abusos sexuais – onde tudo se
desenrola de acordo com um guião previamente preparado – não vão
resolver a crise que enfrenta a reaccionária cúpula da Igreja Católica.
Hoje, os que sofreram abusos sexuais têm finalmente voz, e também
têm aliados. www.workers.org/2010/world/pope_0429/
* Sara Flounders é co-directora do Centro de Acção Internacional
de Nova York e estudou durante 14 anos em escolas católicas nos Estados
Unidos.
Este texto foi publicado no jornal norte-americano
Worker’s World,
Tradução de José Paulo Gascão
quinta-feira, 13 de maio de 2010
A Função Social da Terra....
A Constituição e a função social da propriedade
O artigo 186 e seus incisos da
Constituição Federal estabelecem que a propriedade privada só tem seu
direito resguardado quando, junto com os padrões de produtividade, seja
cumprida a legislação ambiental e trabalhista e sua posse não gere
conflitos e atenda às demandas da coletividade. A negativa raivosa
desses valores traduz o perfil atrasado, arrogante e reacionário do
setor ruralista e remonta a comportamentos daqueles que, ao longo dos
séculos, exploraram e expropriaram direitos dos trabalhadores rurais e
da natureza. O artigo é de Alberto Broch e de Willian Clementino.
Alberto Broch e Willian Clementino na Carta Maior
Os latifundiários sempre se valeram da força
bruta contra a luta pela terra e, sob o argumento da defesa da
propriedade privada, praticam toda a sorte de violência, que, inclusive,
resultou no assassinato de milhares de sindicalistas, religiosos e
lideranças populares. Agora, eles incorporaram novas formas de reação à
reforma agrária.
A criação de um “observatório de inseguranças jurídicas” é um dos instrumentos institucionais lançados para defender um suposto direito de propriedade que estaria sendo usurpado por quadrilhas de invasores de terra. Os representantes dos ruralistas também estão desenvolvendo campanhas de mídia e financiando uma rede de assistência jurídica em defesa de suas propriedades. Eles chegaram a reivindicar o emprego de tropas da Força Nacional para sustentar um plano nacional de combate às “invasões” de terras.
A senadora Kátia Abreu (DEM/TO) justifica estas ações com o argumento de que “a garantia à propriedade é direito garantido pela Constituição Federal como direito fundamental”. Essa afirmação é de um cinismo exacerbado e uma desleal tentativa de confundir a opinião pública. Os ruralistas utilizam a previsão constitucional sobre o direito de propriedade como se esse fosse absoluto e incondicional. Isso não é verdade, pois os dispositivos constitucionais exigem o cumprimento integral da função social como requisito indispensável ao direito de propriedade e como componente do princípio da igualdade e dos direitos fundamentais.
O artigo 186 e seus incisos da Constituição Federal estabelecem que a propriedade privada só tem seu direito resguardado quando, junto com os padrões de produtividade, seja cumprida a legislação ambiental e trabalhista e sua posse não gere conflitos e atenda às demandas da coletividade. O contexto legal em que se insere a propriedade não justifica um empreendimento rural que, mesmo possuindo modernos instrumentos tecnológicos ou altos índices de produtividade e lucro, negue direitos trabalhistas ou explore o trabalho escravo, comprometa os recursos hídricos e a biodiversidade, não crie emprego ou ocupação produtiva e não contribua para a soberania alimentar do povo. Uma propriedade com esse perfil não serve aos direitos da coletividade, não atende aos predicados do bem-estar social e do Estado de Direito e não assegura o direito à vida.
A segurança jurídica da propriedade está condicionada ao cumprimento da função social e não constitui crime a ocupação de propriedades inexistentes perante a lei. É por isso, inclusive, que se diz ocupação e não invasão. É a ocupação de um espaço de terra não protegido pela lei e que, por isso, deve sofrer a intervenção do Estado, para fazer que ali sejam gerados direitos, bem-estar, dignidade e produção para seus ocupantes e para a coletividade.
Assim deve agir o Estado, por exemplo, nas terras onde, segundo denúncias na imprensa, a sra. Kátia Abreu protagonizou uma invasão de área pública, expulsando dezenas de antigos posseiros para constituir uma fazenda, mantida improdutiva. Esse comportamento, como outros semelhantes, não gera direitos ao dito proprietário. É um crime contra a coletividade e, para ser restabelecido o Estado de Direito, as terras precisam ser retomadas pelo Estado e devolvidas às famílias de sem-terras, que dependem daquela terra para viver.
A função social é um princípio instituído para determinar limites ao direito de propriedade, para que o direito de uns não seja exercido em detrimento dos direitos de outros. Toda propriedade deve ter uma função social e, sobretudo, as propriedades sobre a terra, pois essas são meios originários de vida e têm a natureza como bem de produção indispensável à sobrevivência humana. Esse princípio responde aos fins gerais e sociais atribuídos aos Estados modernos, faz parte da vontade do legislador constituinte de 1988, e está consagrado por inúmeros julgados do Poder Judiciário brasileiro.
A negativa raivosa desses valores traduz o perfil atrasado, arrogante e reacionário do setor ruralista e remonta a comportamentos daqueles que, ao longo dos séculos, exploraram e expropriaram direitos dos trabalhadores rurais e da natureza. Essas ações de arbítrio e privilégios sempre se valeram das benesses do Estado de outros artifícios desprovidos de base legal e ética.
Para assegurar a segurança jurídica no campo, o Estado tem a obrigação de exercer seu papel constitucional de fiscalizar e exigir o dever positivo dos proprietários de cumprir a função social da terra. Ele também precisa intervir nas áreas onde houver descumprimento da lei, desapropriando as terras e fortalecendo a reforma agrária para gerar direitos ao povo e desenvolvimento sustentável para o País.
(*) Alberto Broch é presidente da Contag. Willian Clementino é secretário de Política Agrária da Contag
A criação de um “observatório de inseguranças jurídicas” é um dos instrumentos institucionais lançados para defender um suposto direito de propriedade que estaria sendo usurpado por quadrilhas de invasores de terra. Os representantes dos ruralistas também estão desenvolvendo campanhas de mídia e financiando uma rede de assistência jurídica em defesa de suas propriedades. Eles chegaram a reivindicar o emprego de tropas da Força Nacional para sustentar um plano nacional de combate às “invasões” de terras.
A senadora Kátia Abreu (DEM/TO) justifica estas ações com o argumento de que “a garantia à propriedade é direito garantido pela Constituição Federal como direito fundamental”. Essa afirmação é de um cinismo exacerbado e uma desleal tentativa de confundir a opinião pública. Os ruralistas utilizam a previsão constitucional sobre o direito de propriedade como se esse fosse absoluto e incondicional. Isso não é verdade, pois os dispositivos constitucionais exigem o cumprimento integral da função social como requisito indispensável ao direito de propriedade e como componente do princípio da igualdade e dos direitos fundamentais.
O artigo 186 e seus incisos da Constituição Federal estabelecem que a propriedade privada só tem seu direito resguardado quando, junto com os padrões de produtividade, seja cumprida a legislação ambiental e trabalhista e sua posse não gere conflitos e atenda às demandas da coletividade. O contexto legal em que se insere a propriedade não justifica um empreendimento rural que, mesmo possuindo modernos instrumentos tecnológicos ou altos índices de produtividade e lucro, negue direitos trabalhistas ou explore o trabalho escravo, comprometa os recursos hídricos e a biodiversidade, não crie emprego ou ocupação produtiva e não contribua para a soberania alimentar do povo. Uma propriedade com esse perfil não serve aos direitos da coletividade, não atende aos predicados do bem-estar social e do Estado de Direito e não assegura o direito à vida.
A segurança jurídica da propriedade está condicionada ao cumprimento da função social e não constitui crime a ocupação de propriedades inexistentes perante a lei. É por isso, inclusive, que se diz ocupação e não invasão. É a ocupação de um espaço de terra não protegido pela lei e que, por isso, deve sofrer a intervenção do Estado, para fazer que ali sejam gerados direitos, bem-estar, dignidade e produção para seus ocupantes e para a coletividade.
Assim deve agir o Estado, por exemplo, nas terras onde, segundo denúncias na imprensa, a sra. Kátia Abreu protagonizou uma invasão de área pública, expulsando dezenas de antigos posseiros para constituir uma fazenda, mantida improdutiva. Esse comportamento, como outros semelhantes, não gera direitos ao dito proprietário. É um crime contra a coletividade e, para ser restabelecido o Estado de Direito, as terras precisam ser retomadas pelo Estado e devolvidas às famílias de sem-terras, que dependem daquela terra para viver.
A função social é um princípio instituído para determinar limites ao direito de propriedade, para que o direito de uns não seja exercido em detrimento dos direitos de outros. Toda propriedade deve ter uma função social e, sobretudo, as propriedades sobre a terra, pois essas são meios originários de vida e têm a natureza como bem de produção indispensável à sobrevivência humana. Esse princípio responde aos fins gerais e sociais atribuídos aos Estados modernos, faz parte da vontade do legislador constituinte de 1988, e está consagrado por inúmeros julgados do Poder Judiciário brasileiro.
A negativa raivosa desses valores traduz o perfil atrasado, arrogante e reacionário do setor ruralista e remonta a comportamentos daqueles que, ao longo dos séculos, exploraram e expropriaram direitos dos trabalhadores rurais e da natureza. Essas ações de arbítrio e privilégios sempre se valeram das benesses do Estado de outros artifícios desprovidos de base legal e ética.
Para assegurar a segurança jurídica no campo, o Estado tem a obrigação de exercer seu papel constitucional de fiscalizar e exigir o dever positivo dos proprietários de cumprir a função social da terra. Ele também precisa intervir nas áreas onde houver descumprimento da lei, desapropriando as terras e fortalecendo a reforma agrária para gerar direitos ao povo e desenvolvimento sustentável para o País.
(*) Alberto Broch é presidente da Contag. Willian Clementino é secretário de Política Agrária da Contag
Um freio à exploração das teles....
Decreto autoriza Telebrás a entrar no mercado de banda larga
O Diário Oficial da União desta quinta-feira (13) publica o decreto presidencial que cria o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL). Por meio dele, o governo pretende baixar o preço do acesso à internet de alta velocidade e triplicar o número de domicílios conectados à rede, passando dos atuais 15 milhões para 35 milhões até 2014. Pelo decreto, o governo autoriza a Telebrás a entrar no mercado de acesso a internet em alta velocidade em localidades onde inexiste oferta adequada destes serviços.
Além desses, há outros três
objetivos delegados à estatal: 1) implementar a rede privativa de
comunicação da administração pública federal; 2) prestar apoio e suporte
a políticas públicas de conexão à internet em banda larga para
universidades, centros de pesquisa, escolas, hospitais, postos de
atendimento, telecentros comunitários e outros pontos de interesse
público e 3) prover infraestrutura e redes de suporte a serviços de
telecomunicações prestados por empresas privadas, Estados, Distrito
Federal, municípios e entidades sem fins lucrativos.
De acordo com o decreto, o programa tem, entre os objetivos, massificar o acesso à internet de alta velocidade, acelerar o desenvolvimento econômico e regional, promover a inclusão digital, reduzir as desigualdades sociais regionais, promover a geração de emprego e renda e aumentar a competitividade das empresas brasileiras.
Para alcançar esses objetivos, o PNBL atuará regulamentando e desenvolvendo a política industrial e a infraestrutura da rede. Além disso, prevê incentivos fiscais e financiamentos para o setor. A definição das metas e prioridades do plano ficará a cargo do Comitê Gestor do Programa de Inclusão Digital (CGPID), que é presidido pela Casa Civil e composto por 12 órgãos federais – entre eles os ministérios da Fazenda, do Desenvolvimento, da Saúde e da Secretaria de Assuntos Estratégicos.
A próxima etapa prevista para o PNBL é a criação do Fórum Brasil Digital, que terá representantes do governo, de empresas e de usuários para debater questões que precisem ser equacionadas e novos temas que surjam durante a implementação do plano. A expectativa do governo é de que esse fórum seja instalado em junho.
Inclusão digital
O PNBL é visto por especialistas do setor como o maior incentivo que já se promoveu no Brasil a favor da inclusão digital. Passados mais de 10 anos da privatização da telefonia no país, o acesso à internet rápida ainda é um privilégio.
Uma série de estudos recentes da PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios) de 2008, do IBGE, CGI (Comitê Gestor da Internet) e do Sistema de Coleta de Informações (Sici) da Anatel demonstram o alto grau de concentração da internet banda larga nas regiões mais ricas.
O alto custo da banda larga é um dos fatores para o atraso brasileiro. O gasto médio com internet rápida representa 4,58% da renda mensal per capita no Brasil enquanto na Rússia esse índice é menos da metade: 1,68%. Já em relação aos países desenvolvidos, essa mesma relação fica em torno de 0,5%, ou seja, o brasileiro gasta proporcionalmente quase dez vezes mais para ter acesso à internet rápida.
Dos 58 milhões de domicílios existentes no Brasil, 79% não tinham acesso à internet (46 milhões). O acesso à banda larga é extremamente desigual em termos regionais no país: em alguns Estados mais isolados, como Roraima e Amapá, o acesso nos domicílios é praticamente inexistente. Enquanto São Paulo tem 3,8 milhões de domicílios com banda larga (29,4%), Roraima tem apenas 347 (0,3%) e o Amapá, 1.044 (0,6%). Nos estados do Nordeste, os acessos em banda larga não chegam a 15% dos domicílios. Já nos estados do Sul e Sudeste, a penetração varia entre 20% e 30% dos domicílios.
Dos 8,6 milhões de domicílios rurais, apenas 266 mil têm acesso à internet em banda larga (3,1% do total). A faixa dos pequenos municípios concentra mais de 92% da população sem acesso, equivalentes a 39,2 milhões de pessoas.
Ou seja, em pleno século 21, o principal fluxo de informações e conhecimentos à disposição da humanidade está, no Brasil, fora do alcance da grande maioria da população. Daí a importância dos investimentos governamentais no setor, já que está mais do que provado que a iniciativa privada não tem interesse em investir na inclusão digital.
Da redação do sitio Vermelho
com agências
De acordo com o decreto, o programa tem, entre os objetivos, massificar o acesso à internet de alta velocidade, acelerar o desenvolvimento econômico e regional, promover a inclusão digital, reduzir as desigualdades sociais regionais, promover a geração de emprego e renda e aumentar a competitividade das empresas brasileiras.
Para alcançar esses objetivos, o PNBL atuará regulamentando e desenvolvendo a política industrial e a infraestrutura da rede. Além disso, prevê incentivos fiscais e financiamentos para o setor. A definição das metas e prioridades do plano ficará a cargo do Comitê Gestor do Programa de Inclusão Digital (CGPID), que é presidido pela Casa Civil e composto por 12 órgãos federais – entre eles os ministérios da Fazenda, do Desenvolvimento, da Saúde e da Secretaria de Assuntos Estratégicos.
A próxima etapa prevista para o PNBL é a criação do Fórum Brasil Digital, que terá representantes do governo, de empresas e de usuários para debater questões que precisem ser equacionadas e novos temas que surjam durante a implementação do plano. A expectativa do governo é de que esse fórum seja instalado em junho.
Inclusão digital
O PNBL é visto por especialistas do setor como o maior incentivo que já se promoveu no Brasil a favor da inclusão digital. Passados mais de 10 anos da privatização da telefonia no país, o acesso à internet rápida ainda é um privilégio.
Uma série de estudos recentes da PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios) de 2008, do IBGE, CGI (Comitê Gestor da Internet) e do Sistema de Coleta de Informações (Sici) da Anatel demonstram o alto grau de concentração da internet banda larga nas regiões mais ricas.
O alto custo da banda larga é um dos fatores para o atraso brasileiro. O gasto médio com internet rápida representa 4,58% da renda mensal per capita no Brasil enquanto na Rússia esse índice é menos da metade: 1,68%. Já em relação aos países desenvolvidos, essa mesma relação fica em torno de 0,5%, ou seja, o brasileiro gasta proporcionalmente quase dez vezes mais para ter acesso à internet rápida.
Dos 58 milhões de domicílios existentes no Brasil, 79% não tinham acesso à internet (46 milhões). O acesso à banda larga é extremamente desigual em termos regionais no país: em alguns Estados mais isolados, como Roraima e Amapá, o acesso nos domicílios é praticamente inexistente. Enquanto São Paulo tem 3,8 milhões de domicílios com banda larga (29,4%), Roraima tem apenas 347 (0,3%) e o Amapá, 1.044 (0,6%). Nos estados do Nordeste, os acessos em banda larga não chegam a 15% dos domicílios. Já nos estados do Sul e Sudeste, a penetração varia entre 20% e 30% dos domicílios.
Dos 8,6 milhões de domicílios rurais, apenas 266 mil têm acesso à internet em banda larga (3,1% do total). A faixa dos pequenos municípios concentra mais de 92% da população sem acesso, equivalentes a 39,2 milhões de pessoas.
Ou seja, em pleno século 21, o principal fluxo de informações e conhecimentos à disposição da humanidade está, no Brasil, fora do alcance da grande maioria da população. Daí a importância dos investimentos governamentais no setor, já que está mais do que provado que a iniciativa privada não tem interesse em investir na inclusão digital.
Da redação do sitio Vermelho
com agências
Capitalismo selvagem.....
Boaventura de Souza Santos
bsantos@facstaff.wisc.edu
O Fascismo Financeiro
Do sitio Sul21
Há doze anos publiquei, a convite
do Dr. Mário Soares, um pequeno texto (Reinventar a Democracia) que,
pela sua extrema actualidade, não resisto à tentação de evocar aqui.
Nele considero eu que um dos sinais da crise da democracia é a
emergência do fascismo social. Não se trata do regresso ao fascismo do
século passado. Não se trata de um regime político mas antes de um
regime social. Em vez de sacrificar a democracia às exigências do
capitalismo, promove uma versão empobrecida de democracia que torna
desnecessário e mesmo inconveniente o sacrifício. Trata-se, pois, de um
fascismo pluralista e, por isso, de uma forma de fascismo que nunca
existiu. Identificava então cinco formas de sociabilidade fascista, uma
das quais era o fascismo financeiro. E sobre este dizia o seguinte.
O fascismo financeiro é talvez o mais
virulento. Comanda os mercados financeiros de valores e de moedas, a
especulação financeira global, um conjunto hoje designado por economia
de casino. Esta forma de fascismo social é a mais pluralista na medida
em que os movimentos financeiros são o produto de decisões de
investidores individuais ou institucionais espalhados por todo o mundo
e, aliás, sem nada em comum senão o desejo de rentabilizar os seus
valores. Por ser o fascismo mais pluralista é também o mais agressivo
porque o seu espaço-tempo é o mais refractário a qualquer intervenção
democrática. Significativa, a este respeito, é a resposta do corrector
da bolsa de valores quando lhe perguntavam o que era para ele o longo
prazo: “longo prazo para mim são os próximos dez minutos”. Este
espaço-tempo virtualmente instantâneo e global, combinado com a lógica
de lucro especulativa que o sustenta, confere um imenso poder
discricionário ao capital financeiro, praticamente incontrolável apesar
de suficientemente poderoso para abalar, em segundos, a economia real ou
a estabilidade política de qualquer país.
A virulência do fascismo financeiro
reside em que ele, sendo de todos o mais internacional, está a servir de
modelo a instituições de regulação global crescentemente importantes
apesar de pouco conhecidas do público. Entre elas, as empresas de
rating, as empresas internacionalmente acreditadas para avaliar a
situação financeira dos Estados e os consequentes riscos e oportunidades
que eles oferecem aos investidores internacionais. As notas atribuídas –
que vão de AAA a D – são determinantes para as condições em que um país
ou uma empresa de um país pode aceder ao crédito internacional. Quanto
mais alta a nota, melhores as condições. Estas empresas têm um poder
extraordinário. Segundo o colunista do New York Times, Thomas Friedman,
«o mundo do pós-guerra fria tem duas superpotências, os EUA e a agência
Moody’s». Moody’s é – uma dessas agências de rating, ao lado da Standard
and Poor’s e Fitch Investors Services. Friedman justifica a sua
afirmação acrescentando que «se é verdade que os EUA podem aniquilar um
inimigo utilizando o seu arsenal militar, a agência de qualificação
financeira Moody’s tem poder para estrangular financeiramente um país,
atribuindo-lhe uma má nota».
Num momento em que os devedores públicos
e privados entram numa batalha mundial para atrair capitais, uma má
nota pode significar o colapso financeiro do país. Os critérios
adoptados pelas empresas de rating são em grande medida arbitrários,
reforçam as desigualdades no sistema mundial e dão origem a efeitos
perversos: o simples rumor de uma próxima desqualificação pode provocar
enorme convulsão no mercado de valores de um país. O poder
discricionário destas empresas é tanto maior quanto lhes assiste a
prerrogativa de atribuírem qualificações não solicitadas pelos países ou
devedores visados. A virulência do fascismo financeiro reside no seu
potencial de destruição, na sua capacidade para lançar no abismo da
exclusão países pobres inteiros.
Escrevia isto a pensar nos países do
chamado Terceiro Mundo. Não podia imaginar que o fosse recuperar a
pensar em países da União Europeia.
quarta-feira, 12 de maio de 2010
Informe da CNTE(Confederação Nacional dos Trabalhadores na Educação)
Desvios de recursos da educação: velha chaga social |
terça-feira, 11 de maio de 2010
A mídia corporativa com os dias contados???
Autoregulamentação mostra fragilidade política da mídia
Finalmente os donos da mídia se deram
conta de que os dias de farra grossa podem estar contados. A bandeira
rota da autoregulamentação é a primeira demonstração de fraqueza dos
empresários após muitos anos de soberba e arrogância.
Laurindo Lalo Leal Filho na Carta Maior
Seguem os convescotes dos donos da mídia em
defesa das suas liberdades empresariais, com a dócil conivência de
jornalistas a eles submissos. O mais recente aconteceu esta semana na
Câmara dos Deputados. Depois de tantas reuniões e debates realizados
apenas neste ano surgiu finalmente a proposta que porá fim a todos os
dilemas e angústias em que vive o setor: ele poderá ser, finalmente,
autoregulamentado.
A descoberta foi verbalizada por um funcionário da Editora Abril, com ares de sensação. Para quem defende um processo real de democratização da comunicação trata-se de uma grande vitória. Finalmente os donos da mídia se deram conta de que os dias de farra grossa podem estar contados. A bandeira rota da autoregulamentação é a primeira demonstração de fraqueza dos empresários após muitos anos de soberba e arrogância. Ao vermos seu lançamento, da forma que foi feito, só nos resta o socorro da velha imagem, também desgastada, mas ainda útil: crêem eles que estão entregando seus anéis à sociedade para salvar os dedos.
Doce ilusão. Não há mais, nos movimentos sociais envolvidos na luta pela real liberdade de expressão, quem se iluda com essa proposta empresarial. Todos sabemos que sem a presença da sociedade, através do Estado, estabelecendo normas democráticas para o funcionamento da mídia, nada mudará. Dou três exemplos, entre inúmeras situações, em que jamais haverá reparação através da autorregulamentação: correção de notícias destituídas de fundamento, mas de interesse dos donos em jornais e revistas; exibição de matérias jornalísticas na TV, com os mesmos interesses, onde é ouvido um lado apenas da questão (exemplo: Jornal Nacional e a escolha do padrão digital para a TV brasileira) e a inexistência de debate no rádio comercial sobre o papel das rádios comunitárias, só a sua criminalização.
Sobre o primeiro exemplo, um caso relatado nesta semana é emblemático: o jurista Dalmo Dallari conta no Observatório da Imprensa uma demanda que fez ao jornal O Estado de São Paulo solicitando a correção de uma notícia sobre a pena que Cesare Battisti deveria cumprir na Itália, caso venha a ser extraditado. O jornal disse que seria de 28 anos quando na verdade a pena é de prisão perpétua, inexistente no Brasil. "Um erro grave", diz Dallari. E tem razão. "Em termos jurídicos, Cesare Batistti não pode ser extraditado para a Itália para cumprir uma pena que é proibida pela Constituição brasileira".
O pedido de correção foi enviado no dia 19 de abril e reiterado no dia 22. No dia 5 de maio a carta ainda não havia sido publicada. Para Dallari "a recusa de publicação de meu pedido de correção da informação errada é uma forma de censura, surpreendente num órgão de imprensa que insiste em se colocar como vítima da censura".
Diante desse e de outros inúmeros casos de desconsideração dos veículos diante das reclamações do público, fico a pensar se a tal da autoregulamentação não servirá apenas para que o descaso por empresa não se torne generalizado e organizado para todo o setor. Afinal seriam os mesmos agentes privados, que hoje negam respostas aos leitores, ouvintes e telespectadores em seus veículos, os responsáveis por autoregulamentar o conteúdo de todos os veículos.
Em seu lugar, propostas como a da criação de um órgão regulador para o audiovisual, comum nas grandes democracias, e leis precisas em relação à imprensa são mais do que urgentes. Nada as substitui. Só dessa forma se restabelecerá um minimo de equilíbrio entre a sociedade e o poder dos meios de comunicação. Ou como dizia Henri Dominique Lacordaire (1802-1861): "entre o forte e o fraco, entre o rico e o pobre, entre o servo e o senhor, a liberdade escraviza, é a lei que liberta".
A descoberta foi verbalizada por um funcionário da Editora Abril, com ares de sensação. Para quem defende um processo real de democratização da comunicação trata-se de uma grande vitória. Finalmente os donos da mídia se deram conta de que os dias de farra grossa podem estar contados. A bandeira rota da autoregulamentação é a primeira demonstração de fraqueza dos empresários após muitos anos de soberba e arrogância. Ao vermos seu lançamento, da forma que foi feito, só nos resta o socorro da velha imagem, também desgastada, mas ainda útil: crêem eles que estão entregando seus anéis à sociedade para salvar os dedos.
Doce ilusão. Não há mais, nos movimentos sociais envolvidos na luta pela real liberdade de expressão, quem se iluda com essa proposta empresarial. Todos sabemos que sem a presença da sociedade, através do Estado, estabelecendo normas democráticas para o funcionamento da mídia, nada mudará. Dou três exemplos, entre inúmeras situações, em que jamais haverá reparação através da autorregulamentação: correção de notícias destituídas de fundamento, mas de interesse dos donos em jornais e revistas; exibição de matérias jornalísticas na TV, com os mesmos interesses, onde é ouvido um lado apenas da questão (exemplo: Jornal Nacional e a escolha do padrão digital para a TV brasileira) e a inexistência de debate no rádio comercial sobre o papel das rádios comunitárias, só a sua criminalização.
Sobre o primeiro exemplo, um caso relatado nesta semana é emblemático: o jurista Dalmo Dallari conta no Observatório da Imprensa uma demanda que fez ao jornal O Estado de São Paulo solicitando a correção de uma notícia sobre a pena que Cesare Battisti deveria cumprir na Itália, caso venha a ser extraditado. O jornal disse que seria de 28 anos quando na verdade a pena é de prisão perpétua, inexistente no Brasil. "Um erro grave", diz Dallari. E tem razão. "Em termos jurídicos, Cesare Batistti não pode ser extraditado para a Itália para cumprir uma pena que é proibida pela Constituição brasileira".
O pedido de correção foi enviado no dia 19 de abril e reiterado no dia 22. No dia 5 de maio a carta ainda não havia sido publicada. Para Dallari "a recusa de publicação de meu pedido de correção da informação errada é uma forma de censura, surpreendente num órgão de imprensa que insiste em se colocar como vítima da censura".
Diante desse e de outros inúmeros casos de desconsideração dos veículos diante das reclamações do público, fico a pensar se a tal da autoregulamentação não servirá apenas para que o descaso por empresa não se torne generalizado e organizado para todo o setor. Afinal seriam os mesmos agentes privados, que hoje negam respostas aos leitores, ouvintes e telespectadores em seus veículos, os responsáveis por autoregulamentar o conteúdo de todos os veículos.
Em seu lugar, propostas como a da criação de um órgão regulador para o audiovisual, comum nas grandes democracias, e leis precisas em relação à imprensa são mais do que urgentes. Nada as substitui. Só dessa forma se restabelecerá um minimo de equilíbrio entre a sociedade e o poder dos meios de comunicação. Ou como dizia Henri Dominique Lacordaire (1802-1861): "entre o forte e o fraco, entre o rico e o pobre, entre o servo e o senhor, a liberdade escraviza, é a lei que liberta".
Laurindo Lalo Leal Filho, sociólogo e
jornalista, é professor de Jornalismo da ECA-USP. É autor, entre outros,
de “A TV sob controle – A resposta da sociedade ao poder da televisão”
(Summus Editorial).
segunda-feira, 10 de maio de 2010
Contra o fechamento da E.E.Arnaldo Farias-Bagé-RS
O Berço da Desigualdade está na Desigualdade do berço
Marcio Abip
Querem fechar nossa Escola
Talvez seja porque somos pobres,
Não em espírito, porque nesta Alma lhes afirmo: vai um pouco da ternura, da alegria, da benevolência
de uma Legião de duzentos e vinte Anjos...
De anjos sapecas, brincalhões, daqueles que aprontam de vez enquando,
de Anjos, ora bolas, Crianças!!
Quem sabe não seja por isso que queiram fechar nossa Escola, pergunta-me Chiquinho referindo-se as travessuras que sempre estão matutando fazer...
Talvez Chiquinho, talvez...e calo-me como só os adultos sabem calar.
Querem fechar nossa Escola
Dizem: as leis mudaram, as normas são outras, as certidões são diferentes, temos que prestar contas pros auditores, pros ministérios, para ordens superiores, para província...além do que perderemos dinheiro em manter esta Escola...
Tristes homens sós e seus pesos, suas preces de espírito vazias e suas vidas de mil moedas...
“Os Lírios não nascem das Leis”
25 ¶ Por isso vos digo: Não andeis cuidadosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o mantimento, e o corpo mais do que o vestuário? 26 Olhai para as aves do céu, que nem semeiam, nem segam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não tendes vós muito mais valor do que elas? 27 E qual de vós poderá, com todos os seus cuidados, acrescentar um côvado à sua estatura?
Querem fechar nossa Escola
Talvez o consigam talvez não...
Quem sabe ainda há tempo para que estes senhores compreendam, pensem com o íntimo de suas consciências que não querem ver estas crianças nas ruas, no trabalho infantil, na prostituição, no mundo das drogas, nas esquinas pedindo esmolas, sendo violentadas, sendo-lhes roubado diariamente a inocência e a alegria de estarem vivas e Sendo...A estes senhores lhes dizemos:
31 Não andeis, pois, inquietos, dizendo: Que comeremos, ou que beberemos, ou com que nos vestiremos? 32 (Porque todas estas coisas os gentios procuram). De certo vosso Pai celestial bem sabe que necessitais de todas estas coisas; 33 Mas, buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas. 34 Não vos inquieteis, pois, pelo dia amanhã, porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal.
Nos dirão: ninguém é insubstituível!
Pois lhes afirmo o contrário, cada um de nós Educadores desta Escola construímos vínculos de Alma com nossas crianças e estes laços ninguém consegue substituir...Somos Gentes, não números.
Os justos residirão para sempre na terra. Salmo 37:29
CONFIRA MAIS INFORMAÇÕES NO BLOG DA ESCOLA...
Talvez seja porque somos pobres,
Não em espírito, porque nesta Alma lhes afirmo: vai um pouco da ternura, da alegria, da benevolência
de uma Legião de duzentos e vinte Anjos...
De anjos sapecas, brincalhões, daqueles que aprontam de vez enquando,
de Anjos, ora bolas, Crianças!!
Quem sabe não seja por isso que queiram fechar nossa Escola, pergunta-me Chiquinho referindo-se as travessuras que sempre estão matutando fazer...
Talvez Chiquinho, talvez...e calo-me como só os adultos sabem calar.
Querem fechar nossa Escola
Dizem: as leis mudaram, as normas são outras, as certidões são diferentes, temos que prestar contas pros auditores, pros ministérios, para ordens superiores, para província...além do que perderemos dinheiro em manter esta Escola...
Tristes homens sós e seus pesos, suas preces de espírito vazias e suas vidas de mil moedas...
“Os Lírios não nascem das Leis”
25 ¶ Por isso vos digo: Não andeis cuidadosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o mantimento, e o corpo mais do que o vestuário? 26 Olhai para as aves do céu, que nem semeiam, nem segam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não tendes vós muito mais valor do que elas? 27 E qual de vós poderá, com todos os seus cuidados, acrescentar um côvado à sua estatura?
Querem fechar nossa Escola
Talvez o consigam talvez não...
Quem sabe ainda há tempo para que estes senhores compreendam, pensem com o íntimo de suas consciências que não querem ver estas crianças nas ruas, no trabalho infantil, na prostituição, no mundo das drogas, nas esquinas pedindo esmolas, sendo violentadas, sendo-lhes roubado diariamente a inocência e a alegria de estarem vivas e Sendo...A estes senhores lhes dizemos:
31 Não andeis, pois, inquietos, dizendo: Que comeremos, ou que beberemos, ou com que nos vestiremos? 32 (Porque todas estas coisas os gentios procuram). De certo vosso Pai celestial bem sabe que necessitais de todas estas coisas; 33 Mas, buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas. 34 Não vos inquieteis, pois, pelo dia amanhã, porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal.
Nos dirão: ninguém é insubstituível!
Pois lhes afirmo o contrário, cada um de nós Educadores desta Escola construímos vínculos de Alma com nossas crianças e estes laços ninguém consegue substituir...Somos Gentes, não números.
Os justos residirão para sempre na terra. Salmo 37:29
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Frei Betto sobre a familia....
Família virtual |
Escrito por Frei Betto - Correio da Cidadania | |
A desinstitucionalização da família é um dos aspectos mais marcantes da
crise da modernidade. O que é, hoje, uma família? Onde estão os vínculos
inquebrantáveis da instituição agregadora de avós, pais, filhos, tios,
primos e netos?
A reconfiguração dos papéis sexuais, a instabilidade dos laços
conjugais, o divórcio, o recasamento, fragmentam o núcleo familiar. As
crianças circulam entre vários lares autônomos em contato com diferentes
adultos que lhes transmitem, como valores, tantas opiniões e atitudes
divergentes que elas ficam absolutamente convencidas de que tudo é
relativo.
A crise do modelo familiar tradicional decorre de fatores como a
emancipação da mulher, que já não depende do marido para se sustentar;
do desprestígio da autoridade paterna; da igualdade de direitos das
pessoas; o que embaralha e mina a antiga hierarquia de papéis definidos
entre avós, pais, mães, filhos e tios.
Essa atomização do núcleo familiar desordena o conceito de autoridade, o
exercício da obediência, o patriarcalismo outrora dominante. A família
é, agora, um agrupamento funcional de trocas afetivas e interesses
econômicos. Nela, os deveres específicos de cada um perdem nitidez. Os
rituais de entrelaçamento e consolidação – refeições em comum,
frequência dominical ao culto religioso, férias conjuntas, celebrações
de aniversários etc. – se esfumaçam sem que seja introduzida nova
liturgia de estreitamento de vínculo familiar.
O que é hoje um lar? Um espaço de moradia onde cada um se locomove de
acordo com seus interesses individuais. No lugar da mesa posta com a
família em torno, a geladeira como provedora de abastecimento; no lugar
da sala como espaço de convívio, o quarto individual como local de
refúgio, onde cada um se esconde entretido com a parafernália
eletrônica, como TV e internet, que substitui, pelo relacionamento
virtual, a sociabilidade calcada na alteridade.
A solidão deixa de ser um recuo à ação solidária e nutrição cultural
para funcionar como abrigo de evasão solitária.
Outra causa de desagregação da família tradicional é o poder exercido
pelo império televisivo. A TV é o "terceiro pai" que desempenha forte
influência na formação de crianças e adolescentes. Desloca o núcleo
familiar da sua relação de alteridade (conversas em torno da mesa, na
varanda, na calçada ou no quintal; jogos de tabuleiro ou baralho;
recital de música ou teatro improvisado etc.) para a confluência de
todos rumo à tela da TV.
A família real cede lugar à virtual. E em muitas famílias nem há mais
justaposição; há um aparelho de TV em cada quarto, atomizando as
relações e dificultando o diálogo.
A democracia neoliberal – essa que se baseia na aquisição de bens
materiais e permite a todos avaliarem seu grau de liberdade segundo sua
proximidade ou distância do mercado – impõe-se à família através da TV,
anulando os rituais fundados no afeto e na cumplicidade de sangue.
Já não vigora a autoridade paterna a decidir o que, na TV, convém ou não
às crianças. Nem há debate familiar. Cada um decide, a seu bel prazer, o
tempo e o conteúdo de sua voluntária sujeição à TV, em detrimento de
diálogo familiar, leitura, oração, diversão, exercício físico ou
desempenho social (visitas, frequência ao clube, biblioteca, teatro
etc).
A família atual tende a ignorar seus parentes, não se interessa por
eles, embora alimente grande apreço pelos novos "parentes" a quem, quase
diariamente, abre portas e corações: William Bonner e Fátima Bernardes;
Hebe Camargo e Faustão; Luciano Huck e Luciana Gimenez; Datena e Boris
Casoy; e toda a plêiade de heróis e heroínas de telenovelas, programas
infantis e desenhos animados.
Esses novos tios e tias têm a vantagem de serem sempre divertidos e
educados; não pedem dinheiro emprestado, não bebem as nossas bebidas nem
comem a nossa comida; não ocupam espaço; não nos convocam às suas
doenças; mostram-se sempre saudáveis e risonhos; são ricos e famosos.
Como a realidade é cada vez mais virtual, podemos até sentir-lhes o
perfume...
Freud ficaria confuso se voltasse hoje. Já não temos necessidade de
"matar o pai" ou "odiar o irmão". Basta discar o número fatal que exclui
um "brother" ou trocar de canal a cada vez que aquele chato ou aquela
megera aparece no vídeo.
Todas as noites milhões de telespectadores se nutrem abnegadamente dessa
sopa de entretenimento – telenovelas, programas humorísticos,
esportivos etc. – temperada de tudo isso que falta à sua vida real: o
grande amor, a emoção, o desafio, o ideal, a beleza, a roda da
fortuna...
E la nave va. A vida prossegue. Por dentro da TV. Do lado de fora,
demitidos do papel de protagonistas, de sujeitos históricos, aceitamos
ser meros espectadores instados a consumir. Ou melhor, a conjuntamente
sumir. E deixar que ídolos virtuais vivam por nós.
Frei Betto é escritor, autor de "A arte de semear estrelas" (Rocco),
entre outros livros. http://www.freibetto.org/
Copyright 2010 – FREI BETTO - É proibida a reprodução deste
artigo em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem
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Contato – MHPAL – Agência Literária (
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Os USA e a dominação no Oriente Médio....
Ahmadinejad diz “obrigado América”
Immanuel Wallerstein
As relações entre o Irã e os
Estados Unidos têm sido turbulentas durante quase 60 anos. Antes da
Segunda Guerra Mundial, o xá do Irã, Reza Xá Pahlevi, tentou manobrar
entre as exigências e as pressões externas da Grã Bretanha, da União
Soviética e Alemanha. Quando explodiu a guerra, ele declarou a
neutralidade do Irã. Isto levou à invasão aliada soviético-britânica em
1941. Os aliados forçaram o xá a abdicar em favor de seu filho.
As forças soviéticas permaneceram no norte do Irã e, em 1946, exigiram uma concessão petrolífera aí. Os britânicos consideravam que o Irã era parte de sua esfera de influência e controlavam a muito rentável Companhia Anglo-Iraniana de Petróleo (AIOC). A guerra fria havia começado e os britânicos se negaram a admitir a pretensão soviética. As forças soviéticas se retiraram do Irã, mais ou menos como parte do acordo firmado em Yalta no qual haveria uma divisão de esferas de influência.
No entanto, em 1951, Mohammed Mossadegh assumiu o cargo de primeiro ministro, como chefe do Partido Nacionalista, e nacionalizou a AIOC, uma jogada à qual se opôs o xá, Mohammed Reza Pahlevi. Na luta entre ambos, Mossadegh obteve o suficiente respaldo popular para marginar o xá e forçá-lo a um exílio de fato.
Nesse momento, os britânicos, com efeito, estavam cedendo seu papel aos Estados Unidos em todo o Oriente Médio. Foi então que a CIA orquestrou um golpe de Estado no Irã em 16 de agosto de 1953 e fez arranjos para que o xá regressasse a Teerã e assumisse de novo o controle político pleno. A nacionalização do petróleo foi cancelada e se reinstalou a empresa britânica no Irã.
O xá do Irã se tornou um firme aliado dos Estados Unidos e suprimiu toda a oposição política. Nesse momento, os Estados Unidos não se opunham às ambições nucleares do xá, e tampouco Israel o fazia. O regime do xá se tornou mais e mais opressivo e isto resultou eventualmente em uma revolução nacionalista em 1979 encabeçada pelo aiatolá Khomeini. Para os revolucionários, um dos principais agravos era a subordinação dos interesses nacionais do Irã às políticas estadunidenses, como ocorreu após o golpe orquestrado pela CIA em 1953.
O xá caiu e logo, em novembro de 1979, foi invadida a embaixada estadunidense. Os diplomatas que se achavam em seu interior foram tomados como reféns pelo regime iraniano. Estiveram como reféns 444 dias. Desde então, têm sido hostis as relações entre ambos os países. Em 1980, o governo iraquiano de Saddam Hussein atacou o Irã, com o respaldo material do governo estadunidense.
A guerra foi longa e sangrenta e terminou oito anos depois mais ou menos empatada. Pouco depois o Iraque invadiu o Kuwait, em parte para aliviar os custos da guerra. O Iraque esperava que os Estados Unidos entendessem estas ações, mas em lugar disso se viu mergulhado na primeira Guerra do Golfo.
Os Estados Unidos se encontraram ao mesmo tempo enfrentado o Iraque e o Irã. Quando Al Qaeda lançou seu ataque em 11 de setembro, o governo de Bush acusou o Iraque e o Irã de estar em conluio com Al Qaeda ainda que esta fosse hostil a ambos os regimes. Os Estados Unidos invadiu o Afeganistão em 2001 e o Iraque em 2003 com a suposta esperança de conseguir regimes amigáveis em ambos os países que lhe deram respaldo em sua luta continuada com o Irã, que havia empreendido sérios esforços para obter armas nucleares.
Isto posto, onde estamos hoje? Os iraquianos realizaram eleições e estão, no momento, negociando o futuro governo. Quando os vários partidos de forte base xiitas quiseram levar a cabo diálogos de negociação, foram a Teerã. Uma das razões aludidas foi que não queriam que os Estados Unidos os ouvissem com seus dispositivos de escuta. Parece que não lhes preocupava que os ouvissem os dispositivos de escuta iranianos. O maior partido, que tem um forte respaldo nas áreas sunitas, anunciou recentemente que também visitará o Irã. E o governo iraniano obrigou aos partidos xiitas a que incluam políticos sunitas em qualquer governo que se forme.
Não se trata de que o Irã esteja controlando a política iraquiana. Longe está disso, mas após uma prolongada ocupação estadunidense ocorre que o Irã tem mais influência no Iraque que os Estados Unidos. O Irã está especialmente agradecido aos Estados Unidos por haver eliminado o inimigo mais temido que tinha no Iraque: Saddam Hussein.
No Afeganistão, os Estados Unidos colocou no poder Hamid Karzai. Do ponto de vista estadunidense, ele era a pessoa ideal, de fato o único que tinha a possibilidade de resistir com êxito aos talibãs e manter unido o Afeganistão. Ele mesmo procede da etnia pashtún e é alguém desejoso de fazer acordos com os vários senhores da guerra que dominam as zonas onde não há pashtunes.
Depois das recentes eleições, houve acusações de que Karzai havia manipulado os resultados e que era muito tolerante com a corrupção e o cultivo de drogas. Os Estados Unidos lhe pôs forte pressão para que modificasse algumas de suas políticas. Quê foi o que ele fez? Convidou Ahmadinejad a visitar Kabul, disse que ele mesmo poderia unir-se aos talibãs, e abertamente denunciou os militares estadunidenses por suas horríveis matanças de civis.
Devido a que os Estados Unidos não têm ninguém que possa substituí-lo, teve que reconsiderar e tentar restabelecer relações com Karzai. O general McChrystal, comandante das forças estadunidenses aí, investiu muito para conseguir pelo menos uma vitória parcial sobre os talibãs. Depois de nove anos de envolvimento estadunidense (e da OTAN) no Afeganistão, seu aliado mais seguro joga a carta iraniana contra Washington, e não parece que haja muito que possa fazer os Estados Unidos a respeito.
Entretanto, Ahmadinejad enfrenta forte oposição no interior do país e tem estado trabalhando duro para suprimi-la. E os Estados Unidos estão em uma campanha importante para alcançar sanções contra o Irã devido a sua negativa a abandonar o desenvolvimento de reatores nucleares. Quais são os resultados da campanha de sanções (e mais) encabeçada pelos Estados Unidos e respaldada com vociferação por parte de Israel?
No Irã, fortaleceu-se muito a mão política de Ahmadinejad no interior, e lhe permite assumir a posição de defensor da soberania iraniana. E apesar de toda a pressão que tem posto os Estados Unidos, parece duvidoso que a Rússia e a China (em especial a China) respaldem sanções sérias (isto é, que não sejam só nominais). Entretanto, os israelitas expressam, corretamente, que o tempo está do lado do Irã em sua tentativa de converter-se uma potência nuclear.
Trinta anos de política exterior estadunidense contra o Irã tem mostrado ser contraproducente. (Ou talvez devamos falar de quase 60 anos.) O Irã é mais forte hoje que nunca, em grande parte, devido às políticas estadunidenses. Se vocês fossem Ahmadinejad, não diriam “obrigado América?”
As forças soviéticas permaneceram no norte do Irã e, em 1946, exigiram uma concessão petrolífera aí. Os britânicos consideravam que o Irã era parte de sua esfera de influência e controlavam a muito rentável Companhia Anglo-Iraniana de Petróleo (AIOC). A guerra fria havia começado e os britânicos se negaram a admitir a pretensão soviética. As forças soviéticas se retiraram do Irã, mais ou menos como parte do acordo firmado em Yalta no qual haveria uma divisão de esferas de influência.
No entanto, em 1951, Mohammed Mossadegh assumiu o cargo de primeiro ministro, como chefe do Partido Nacionalista, e nacionalizou a AIOC, uma jogada à qual se opôs o xá, Mohammed Reza Pahlevi. Na luta entre ambos, Mossadegh obteve o suficiente respaldo popular para marginar o xá e forçá-lo a um exílio de fato.
Nesse momento, os britânicos, com efeito, estavam cedendo seu papel aos Estados Unidos em todo o Oriente Médio. Foi então que a CIA orquestrou um golpe de Estado no Irã em 16 de agosto de 1953 e fez arranjos para que o xá regressasse a Teerã e assumisse de novo o controle político pleno. A nacionalização do petróleo foi cancelada e se reinstalou a empresa britânica no Irã.
O xá do Irã se tornou um firme aliado dos Estados Unidos e suprimiu toda a oposição política. Nesse momento, os Estados Unidos não se opunham às ambições nucleares do xá, e tampouco Israel o fazia. O regime do xá se tornou mais e mais opressivo e isto resultou eventualmente em uma revolução nacionalista em 1979 encabeçada pelo aiatolá Khomeini. Para os revolucionários, um dos principais agravos era a subordinação dos interesses nacionais do Irã às políticas estadunidenses, como ocorreu após o golpe orquestrado pela CIA em 1953.
O xá caiu e logo, em novembro de 1979, foi invadida a embaixada estadunidense. Os diplomatas que se achavam em seu interior foram tomados como reféns pelo regime iraniano. Estiveram como reféns 444 dias. Desde então, têm sido hostis as relações entre ambos os países. Em 1980, o governo iraquiano de Saddam Hussein atacou o Irã, com o respaldo material do governo estadunidense.
A guerra foi longa e sangrenta e terminou oito anos depois mais ou menos empatada. Pouco depois o Iraque invadiu o Kuwait, em parte para aliviar os custos da guerra. O Iraque esperava que os Estados Unidos entendessem estas ações, mas em lugar disso se viu mergulhado na primeira Guerra do Golfo.
Os Estados Unidos se encontraram ao mesmo tempo enfrentado o Iraque e o Irã. Quando Al Qaeda lançou seu ataque em 11 de setembro, o governo de Bush acusou o Iraque e o Irã de estar em conluio com Al Qaeda ainda que esta fosse hostil a ambos os regimes. Os Estados Unidos invadiu o Afeganistão em 2001 e o Iraque em 2003 com a suposta esperança de conseguir regimes amigáveis em ambos os países que lhe deram respaldo em sua luta continuada com o Irã, que havia empreendido sérios esforços para obter armas nucleares.
Isto posto, onde estamos hoje? Os iraquianos realizaram eleições e estão, no momento, negociando o futuro governo. Quando os vários partidos de forte base xiitas quiseram levar a cabo diálogos de negociação, foram a Teerã. Uma das razões aludidas foi que não queriam que os Estados Unidos os ouvissem com seus dispositivos de escuta. Parece que não lhes preocupava que os ouvissem os dispositivos de escuta iranianos. O maior partido, que tem um forte respaldo nas áreas sunitas, anunciou recentemente que também visitará o Irã. E o governo iraniano obrigou aos partidos xiitas a que incluam políticos sunitas em qualquer governo que se forme.
Não se trata de que o Irã esteja controlando a política iraquiana. Longe está disso, mas após uma prolongada ocupação estadunidense ocorre que o Irã tem mais influência no Iraque que os Estados Unidos. O Irã está especialmente agradecido aos Estados Unidos por haver eliminado o inimigo mais temido que tinha no Iraque: Saddam Hussein.
No Afeganistão, os Estados Unidos colocou no poder Hamid Karzai. Do ponto de vista estadunidense, ele era a pessoa ideal, de fato o único que tinha a possibilidade de resistir com êxito aos talibãs e manter unido o Afeganistão. Ele mesmo procede da etnia pashtún e é alguém desejoso de fazer acordos com os vários senhores da guerra que dominam as zonas onde não há pashtunes.
Depois das recentes eleições, houve acusações de que Karzai havia manipulado os resultados e que era muito tolerante com a corrupção e o cultivo de drogas. Os Estados Unidos lhe pôs forte pressão para que modificasse algumas de suas políticas. Quê foi o que ele fez? Convidou Ahmadinejad a visitar Kabul, disse que ele mesmo poderia unir-se aos talibãs, e abertamente denunciou os militares estadunidenses por suas horríveis matanças de civis.
Devido a que os Estados Unidos não têm ninguém que possa substituí-lo, teve que reconsiderar e tentar restabelecer relações com Karzai. O general McChrystal, comandante das forças estadunidenses aí, investiu muito para conseguir pelo menos uma vitória parcial sobre os talibãs. Depois de nove anos de envolvimento estadunidense (e da OTAN) no Afeganistão, seu aliado mais seguro joga a carta iraniana contra Washington, e não parece que haja muito que possa fazer os Estados Unidos a respeito.
Entretanto, Ahmadinejad enfrenta forte oposição no interior do país e tem estado trabalhando duro para suprimi-la. E os Estados Unidos estão em uma campanha importante para alcançar sanções contra o Irã devido a sua negativa a abandonar o desenvolvimento de reatores nucleares. Quais são os resultados da campanha de sanções (e mais) encabeçada pelos Estados Unidos e respaldada com vociferação por parte de Israel?
No Irã, fortaleceu-se muito a mão política de Ahmadinejad no interior, e lhe permite assumir a posição de defensor da soberania iraniana. E apesar de toda a pressão que tem posto os Estados Unidos, parece duvidoso que a Rússia e a China (em especial a China) respaldem sanções sérias (isto é, que não sejam só nominais). Entretanto, os israelitas expressam, corretamente, que o tempo está do lado do Irã em sua tentativa de converter-se uma potência nuclear.
Trinta anos de política exterior estadunidense contra o Irã tem mostrado ser contraproducente. (Ou talvez devamos falar de quase 60 anos.) O Irã é mais forte hoje que nunca, em grande parte, devido às políticas estadunidenses. Se vocês fossem Ahmadinejad, não diriam “obrigado América?”
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