segunda-feira, 25 de abril de 2011

Falta igualdade para a democracia brasileira, diz Stédile

Guilherme Kolling
Marcelo G. Ribeiro/JC
 
''Brizola foi o primeiro homem público que fez uma lei de reforma agrária'', afirma Stédile.
''Brizola foi o primeiro homem público que fez uma lei de reforma agrária'', afirma Stédile.

Nome mais conhecido do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Pedro Stédile avalia que o Brasil tem uma democracia apenas formal, em que, apesar do direito ao voto, a população não conquistou igualdade de oportunidades. Crítico das diferenças sociais entre ricos e pobres, o líder do MST fala, nesta entrevista ao Jornal do Comércio, sobre as raízes do ativismo pela reforma agrária, das dificuldades do MST com a mudança no perfil da agricultura brasileira e projeta o futuro do movimento. Vê avanços no projeto dos governos petistas de Lula e Dilma Rousseff, que, para ele, estão substituindo o neoliberalismo pelo “neodesenvolvimentismo”. E aponta que falta envolvimento da sociedade e debate na imprensa e na universidade sobre o modelo de desenvolvimento do Brasil.

Jornal do Comércio - Qual é a sua avaliação do atual momento econômico do Brasil?
João Pedro Stédile -
O governo Lula fez uma política macroeconômica de reconciliação de classes. Garantiu os ganhos para aqueles 5% mais ricos e tirou da miséria os 40 milhões que dependem do Bolsa Família. E freou o neoliberalismo, recuperou o papel do Estado, do Bndes (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), que financiava privatizações, agora financia fábricas. O governo Dilma ganha as eleições no bojo da continuidade. Porém, isso tem limite. Não dá mais para apenas distribuir renda através do Bolsa Família. Tem que mudar o modelo. E tem que mexer na taxa de juros.

JC - E essa proposta no atual cenário de aumento de inflação?
Stédile -
Esse projeto neodesenvolvimentista da Dilma saiu perdendo para os setores conservadores do governo, que ganharam o primeiro round contra a inflação ao fazer um corte de R$ 50 bilhões no orçamento e ao aumentar a taxa de juros em 1 ponto percentual. O aumento da taxa Selic é uma burrice. Quem vai bater palma são os bancos, o resto da sociedade vai pagar para eles.

JC - Falta debate sobre o modelo de desenvolvimento?
Stédile -
A imprensa tem que ser mais criativa, propor o debate. Tem que discutir problemas de fundo, o agrotóxico - ninguém escapa, vai pegar também donos de jornal, de televisão, o câncer pega todo mundo. E levar esse debate para a universidade, que está de costas. Levar para as igrejas. Enfim, um mutirão de debate político e social. Estamos num momento de letargia na sociedade. Nem nas campanhas eleitorais se discute projetos.

JC - Qual é a sua avaliação da democracia brasileira?
Stédile -
É uma democracia formal, em que o povo brasileiro ganhou o direito de votar. Mas a população quer as mesmas oportunidades. Então, quando todo o povo brasileiro tiver a oportunidade de entrar na universidade, uma moradia digna, uma informação honesta, cultura, e não depender do Bolsa Família, aí viramos uma sociedade democrata.

JC - Falta igualdade na democracia brasileira?
Stedile -
Sem dúvida. A sociedade brasileira é a terceira mais desigual do mundo. É por isso que não consegue ser democrática.

JC - Como o senhor iniciou na luta pela reforma agrária?
Stédile -
Na Comissão Pastoral da Terra (CPT). Em 1978, Nonoai (RS), uma área indígena, tinha 700 posseiros pobres. E os índios se organizaram e expulsaram os posseiros, que, da noite para o dia, estavam na beira da estrada. Então, comecei a organizá-los, porque parte queria voltar para as terras indígenas, e aí dava morte; outra parte queria ir para o Mato Grosso, que era a proposta do governo. Nosso trabalho na militância social era: quem quiser continuar trabalhando aqui no Rio Grande, tem terra. E reivindicamos duas áreas públicas, remanescentes da reforma agrária do (ex-governador Leonel) Brizola, que tinham sido griladas.

JC - O senhor já falou da importância do Brizola para a reforma agrária. Foi na gestão dele o embrião desse movimento?
Stédile -
O embrião foi a colonização europeia no Rio Grande. Deu uma base para a democratização da propriedade, eles pegavam de 25 a 40 hectares, nem menos, nem mais. Isso criou uma base de sociedade mais justa. Não é por nada que Caxias do Sul tem um PIB mais elevado que o de toda a Metade Sul. Na década de 1960, Brizola retomou esse embate e foi o primeiro homem público que fez uma lei estadual de reforma agrária. Foram ocupadas muitas fazendas, a mais importante delas foi a Sarandi, tinha 24 mil hectares.

JC - E a denominação Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra?
Stédile -
De 1978 até 1984, em todo o Brasil, a CPT começou a juntar as lideranças desses movimentos e a fazer encontros. Quem deu a marca de Movimento dos Sem Terra foi a imprensa - começou a se noticiarem acampamentos dos “colonos sem-terra.” Quando fundamos o movimento nacional, em janeiro de 1984, já havia essa marca. Incluímos uma questão de classe: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

JC - Como está o MST hoje?
Stédile -
O MST sofreu percalços nos últimos 10 anos, houve mudanças na agricultura. Até a década de 1980, o que dominava era o capitalismo industrial. E o latifúndio improdutivo era uma barreira. Quando ocupávamos o latifúndio improdutivo, a burguesia industrial nos apoiava, porque éramos o progresso. A minha turma dividia terras, ia para o banco comprar máquinas, geladeira... E, na essência, essa é a proposta da reforma agrária clássica: dividir a área improdutiva para ela desenvolver as forças produtivas. Por isso, na maioria dos países da Europa, nos Estados Unidos e no Japão, quem tomou a iniciativa de fazer a reforma agrária foi a burguesia industrial, não os camponeses.

JC - Quais foram as mudanças no Brasil?
Stédile -
O movimento nasceu na década de 1980 no contexto de reforma agrária clássica. Por isso a burguesia industrial e a imprensa nos toleravam: “Ah, está certo, tem que ocupar mesmo.” Com o neoliberalismo, houve uma expansão das empresas transnacionais e do capital financeiro que veio tomar conta da nossa agricultura, desde os anos 1990. Quem tem a hegemonia da agricultura não é mais o capital industrial. Tanto que, na década de 1970, a economia brasileira vendia 80 mil tratores por ano. Quem comprava? O pequeno agricultor. Sabe qual foi a venda de tratores no ano passado? 36 mil. Então, aumentou a potência do trator e diminuiu o mercado. É um absurdo.

JC - Como isso afeta o MST?
Stédile -
Hoje, quando tem um latifúndio improdutivo, as grandes empresas transnacionais também chegam para disputar com a gente. Quando tentamos ocupar a Fazenda Ana Paula, 18 mil hectares improdutivos, acampamos e fomos despejados. Aí, a Aracruz comprou e encheu de eucaliptos. Quantos empregos gerou? Nenhum. Faz sete anos que tem eucalipto lá. Nenhuma renda para o município. Mas a Aracruz vai ganhar muito dinheiro no dia em que colher aquele eucalipto. Então, agora o MST enfrenta barreiras... Mudaram os inimigos de classe.

JC - E encolheu o MST?Stedile - Não, o movimento até que aumentou, mas a luta ficou mais difícil. Para desapropriar uma área ficou mais difícil, porque a força desses capitalistas pressiona para não ter desapropriação. Querem empurrar os pobres do campo para a cidade.

JC - Como o senhor projeta o futuro do movimento, com a presidente Dilma?
Stedile -
As vitórias do governo Lula (PT) e Dilma colocaram uma barreira ao neoliberalismo. Há uma tentativa de reconstruir o modelo de desenvolvimento, com lugar para mercado interno, distribuição de renda e indústria nacional. Mas isso ainda é uma vontade política. No nível macro, está havendo mudanças de rumo: não é mais o neoliberalismo, agora é o neodesenvolvimentismo. Na agricultura, estamos iniciando esse grande embate entre o modelo do agronegócio e o da agricultura familiar. Nossa esperança é que nos próximos dez anos a sociedade perceba que o agronegócio é inviável.

JC - Por quê?
Stédile -
Economicamente porque os únicos que ganham são as transnacionais. Pode dizer: “o Rio Grande produz 10 milhões de toneladas de soja”. E quem fica com o lucro se a soja sai daqui em grão? Voltamos a ser um simples exportador de grãos. Temos que exportar é o óleo de soja. A longo prazo, esse modelo de monocultura, que só beneficia a exportação, é inviável. Ou seja, não agrega valor e não distribui renda, concentra. E expulsa a população do campo. E, terceiro, o agronegócio tem uma contradição com o meio ambiente: só produz com veneno, que mata o solo, os vegetais e o ser humano pelos alimentos contaminados. Então, é uma questão social, e econômica e ambiental.

JC - Se o governo federal promover o assentamento reivindicado para as famílias sem terra, como fica o MST?
Stédile -
Vamos continuar lutando contra o latifúndio. Mas, ao mesmo tempo, temos que desenvolver, nas áreas de assentamento, programas que combinem com esse novo modelo: ter agroindústria, laticínio, reflorestar áreas degradadas, produzir alimentos saudáveis... Esse novo caminho que vamos trilhar é seguir a luta contra o latifúndio, implantando um novo modelo nos assentamentos.

JC - Isso depende mais do governo ou da sociedade?
Stedile -
Depende dos pobres do campo lutarem; do governo ter essa vontade política de deixar o agronegócio para o mercado, as políticas públicas de agricultura têm que estar voltadas para o pequeno agricultor; e depende de a sociedade perceber que a luta pela reforma agrária não pode ser criminalizada, porque é o progresso. É para garantir emprego, renda e comida farta e saudável. Tudo que o agronegócio não consegue.

JC - Como o senhor avalia o papel da imprensa nesse processo?
Stedile
- Os quatro grandes grupos que controlam a imprensa no Brasil - Rede Globo, Estadão, Folha de S. Paulo e o grupo Abril - estão a mercê dos interesses do grande capital, das multinacionais e do capital financeiro. Para eles, não só o MST mas qualquer movimento social que lute contra esse modelo se transforma em inimigo. Quando os operários voltarem a lutar como fizeram em Jirau (usina que está em construção no Rio Madeira, em Rondônia), a hora que os sem-teto voltarem a lutar, a imprensa vai chamá-los de vândalos. Ninguém foi a Jirau pesquisar como os operários estavam vivendo. Mas quando colocaram fogo, a primeira coisa que fizeram foi chamá-los de vândalos. É um caso exemplar de como a imprensa criminaliza e tenta derrotar ideologicamente qualquer luta social.

JC - Mas tem havido perda de apoio de setores mais urbanos da sociedade, especialmente a partir de episódios de violência em ações do MST.
Stedile -
O movimento é contra qualquer tipo de violência, sobretudo, contra pessoas. Mas na mobilização de massas sempre há fatores incontroláveis.

JC - Qual é o seu conceito de burguesia?
Stedile -
A burguesia brasileira é aquele 1%, com as 5 mil famílias que controlam 48% do PIB brasileiro e que são subordinadas ao capital internacional. São as 100 maiores empresas que tiveram lucro de R$ 129 bilhões para dividir entre eles. 

Perfil

João Pedro Stédile, 57 anos, nasceu em Lagoa Vermelha (RS). Passou a infância e a adolescência no Interior, com a família, que produzia uva, trigo e produtos de subsistência. Aos 17 anos, veio para Porto Alegre estudar. Cursou Economia na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs) e formou-se em 1975. Estagiou e depois fez concurso para a Secretaria da Agricultura. Atuou na Comissão Estadual de Planejamento Agrícola (Cepa), estimulando o cooperativismo e viajando por todo o Estado.
 Ficou na Secretaria de Agricultura até 1984. Paralelamente, atuava junto aos sindicatos dos produtores de uva da região de Veranópolis, Bento Gonçalves e Caxias do Sul, a quem assessorava em um plano de cálculo do custo de produção. Sua militância foi influenciada pela Igreja, através Comissão Pastoral da Terra (CPT), onde atuou e através da qual se envolveu na questão da terra.
Com a redemocratização, nos anos 1980, diversos grupos, em todo o Brasil, se reuniram e formaram em janeiro de 1984 o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que luta pela reforma agrária e do qual Stédile é considerado um dos fundadores - embora não goste disso - e integra até hoje a coordenação nacional. Ele está radicado em São Paulo.

Um olhar verde sobre o jornalismo


A presença dos temas ambientais na mídia e a compreensão dos processos de sustentabilidade exigem profissionais bem formados e com uma profunda visão do papel social da mídia como referência e instrumento de transformações. Por Dal Marcondes

Verde deve ser a cor do jornalismo do século XXI. Não um jornalismo adjetivado de ambiental, praticado por jornalistas especializados em meio ambiente, mas o meio ambiente presente em todo o jornalismo. Os termos jornalismo ambiental e desenvolvimento sustentável são profundamente anacrônicos. Não é desenvolvimento se não for sustentável, assim como é precário o jornalismo que não incluir em suas variáveis a transversalidade ambiental. O jornalista, como um generalista que é, acaba adjetivando seu mister pelo simples fato de que deseja se destacar em uma ou outra área do conhecimento. Sempre haverá o jornalismo econômico, o esportivo, o social e muitas outras variáveis, mas deve estar fadado à extinção a prática exclusiva de uma vertente ambiental.
A mídia e os jornalistas têm um papel fundamental na construção do futuro dentro dos conceitos de sustentabilidade. A ex-primeira ministra da Noruega e diretora da Organização Mundial de Saúde, Gro Brundtland, em seu relatório sobre sustentabilidade definiu o termo de forma muito simples: “Ser sustentável é suprir as necessidades das atuais gerações sem comprometer a capacidade das gerações futuras em suprir suas próprias necessidades”.
O que isto quer dizer? De uma forma bastante simplista isto significa que a humanidade não vai se extinguir na atual geração de pessoas. Nós teremos filhos, netos e bisnetos, que por sua vez também irão se reproduzir. Todas estas gerações vão precisar de água potável, alimentos e todos os benefícios de uma civilização evoluída e tecnológica. Para isto deverão encontrar na natureza os recursos que serão necessários para satisfazer suas necessidades.
O jornalismo ambiental surgiu da necessidade de mostrar à sociedade, aos governos e às empresas que o modelo de desenvolvimento adotado durante o século XX é insustentável em longo prazo. Muitos ambientalistas dizem isto há anos, no entanto a mídia se faz surda diante da necessidade de uma reflexão mais profunda sobre este modelo e da necessidade de transformações. Os argumentos para o distanciamento da mídia dos temas referentes à sustentabilidade, aqui visto como um equilíbrio entre as vertentes econômica, social e ambiental, são de toda a ordem. Um deles, e muito forte, é que a mídia é uma das principais beneficiárias do modelo de desenvolvimento baseado nos princípios da “Sociedade de Consumo”. Isto porque a publicidade é uma das mais importantes ferramentas deste modelo e é esta a forma como a mídia se sustenta. Uma sociedade menos voraz e consumista talvez seja também uma sociedade com menos publicidade.
Na última década do século XX, inicialmente impulsionadas pela realização no Rio de Janeiro da Cúpula da Terra, também conhecida como Rio-92, surgiram as “mídias ambientais” e grandes jornais passaram a ter meio ambiente como uma de suas editorias. As mídias que atuam exclusivamente com pautas ambientais se estabeleceram e se desenvolveram dentro do mesmo princípio das mídias de resistência à ditadura nos anos 70. São jornais, revistas e sites que se mantém à margem do processo de comunicação de massa, mas que conseguem grande audiência entre os formadores de opinião na área de meio ambiente e sustentabilidade.
O jornalista sempre foi vanguarda nas conquistas políticas e sociais. No entanto, esta é uma fronteira mais espinhosa, exige conhecimento, formação e capacidade para lidar com a diversidade de variáveis que formam as sociedades e organizações complexas. No início acreditava-se que o jornalismo ambiental seria um vertente do jornalismo científico. Isto porque havia conceitos da biologia, da física, da geografia que precisavam ser dominados para a elaboração de boas reportagens ambientais. No entanto, a sustentabilidade ambiental não se restringe a um nicho social. É uma variável presente em todas as decisões humanas e que precisa ser explicitada como tal. A sociedade define o que deseja em termos de sustentabilidade quando estabelece seus padrões de consumo de energia, de matérias-primas, de embalagens, de alimentos etc. Tudo o que se faz tem impactos ambientais anteriores e posteriores ao consumo. O jornalista que pretende compreender este planeta megadiverso não pode simplesmente ter um olhar superficial sobre a realidade, deve compreender suas interfaces e sua cadeia de consequências.
No Brasil isto é ainda mais estratégico, na medida que a biodiversidade e os recursos naturais são as commodities do futuro e devem ser compreendidas como tal por toda a sociedade. A vanguarda desta transformação conceitual é formada por jornalistas capazes de compreender esta realidade e seguir atuando de forma objetiva na disseminação de informações e conhecimento para a  sociedade.  (Envolverde)

Dal Marcondes

Dal Marcondes é jornalista, diretor da Envolverde, passou por diversas redações da grande mídia paulista, como Agência Estado, Gazeta Mercantil, Revistas Isto É e Exame. Desde 1998 dedica-se a cobertura de temas relacionados ao meio ambiente, educação, desenvolvimento sustentável e responsabilidade socioambiental empresarial. Recebeu por duas vezes o Prêmio Ethos de Jornalismo e é reconhecido como um "Jornalista Amigo da Infância" pela agência ANDI.

domingo, 24 de abril de 2011

Morre o guru hindu Sathya Sai Baba aos 85 anos

Jorge Seadi no Sul21

Sathya Sai Baba, um dos líderes religiosos hindus mais respeitados,  morreu hoje (24) aos 85 anos em um hospital da calma cidade de Puttaparthi, local onde nasceu.
O líder religioso foi hospitalizado em março passado e na última semana com problemas renais e cardíacos. Na última semana seu estado de saúde piorou muito e sua morte era esperada para qualquer momento. A causa da morte foi uma parada cardiorrespiratória.
Sai Baba contava com milhares de seguidores na Índia e em outros países que lhe permitiu construir um império financeiro. Seus seguidores o consideravam a encarnação humana da trinidade hindu composta por Brahma, Vishnú e Shiva. Astros do cinema indiano, o ex-primeiro ministro Atal Behari Vajpayye e o craque do cricket Sachim Tendulkar eram seus fiéis seguidores.
Conhecido por seu cabelo estilo afro e sua túnica laranja, Sai Baba tinha partidários em vários países do mundo e sua popularidade cresceu na década de 70 com o movimento hippie. Hoje, tem seguidores em 100 países. Seu centro religioso é um local de peregrinação de muitas personalidades da Índia a tal ponto de a presidente Pratibha Patil e o primeiro-ministro, Manmohan Singh, terem ido ao último aniversário de Sai Baba. “Sathya Sai Baba era um líder espiritual que inspirou milhares de pessoas a, sem reunúncia a sua própria religião, levar uma vida de moral com amor e paz”, disse o primeiro ministro Singh. 
Porta-voz da Polícia de Puttaparthi confirmou que foi montado um forte aparato de segurança em volta do hospital onde morreu Sai Baba como prevenção de possíveis manifestações de seus seguidores.

Com informações do El Mundo, Espanha  

Reflexão de Fidel Castro: O Norte revolto e brutal


Estava lendo materiais e livros em abundância para cumprir minha promessa de continuar a Reflexão de 14 de abril sobre la Batalha de Girón, quando dei uma olhada nas notícias frescas de ontem, que são abundantes como todos os dias. É possível acumular montanhas delas em qualquier semana, que vão desde o terremoto no Japão ao triunfo de Ollanta Humala sobre Keiko, filha de Alberto Fujimori, ex-presidente do Peru.


Por Fidel Castro Ruz no Vermelho

O Peru é grande exportador de prata, cobre, zinco, estanho e outros minerais; possui grandes jazidas de urânio que poderosas transnacionais aspiram a explorar. Do urânio enriquecido saem as mais terríveis armas que a humanidade já conheceu e o combustível das centrais eletronucleares que, apesar das advertências dos ecologistas, estavam sendo construídas a ritmo acelerado nos Estados Unidos, Europa e Japão.

Obviamente, não seria justo culpar o Peru por isto. Os peruanos não criaram o colonialismo, o capitalismo e o imperialismo. Tampoco se puede culpar o povo dos Estados Unidos, que também é vítima do sistema que engendrou ali os políticos mais imprudentes que o planeta já conheceu.

Em 8 de abril último, os senhores do mundo deram à luz seu costumeiro informe anual sobre as violações dos “direitos humanos”, que motivou uma aguda análise no sitio Rebelión, assinada pelo cubano Manuel E. Yepe, baseado na resposta do Conselho de Estado da China, enumerando fatos que demonstram a desastrosa situação de tais direitos nos Estados Unidos.

“…Os Estados Unidos são o país onde os direitos humanos são mais agredidos, tanto em seu próprio país como em todo o mundo, e são uma das nações que menos garantem a vida, a propriedade e a segurança pessoal de seus habitantes.

“Anualmente, uma em cada cinco pessoas é vítima de um crime, a taxa mais alta do planeta. Segundo dados oficiais, as pessoas com mais de 12 anos sofreram 4,3 milhões de atos violentos.

“A delinquência cresceu alarmantemente nas quatro maiores cidades do país (Filadélfia, Chicago, Los Ângeles e Nova Iorque) e se registraram notáveis aumentos em comparação com o ano anterior em outras grandes cidades (Saint Louis e Detroit).

“O Tribunal Supremo decidiu que a posse de armas para a defesa pessoal é um direito constitucional que não pode ser ignorado pelos governos estaduais. Noventa milhões dos 300 milhões de habitantes do país possuem 200 milhões de armas de fogo.

“No país foram registrados 12 mil homicidios causados por armas de fogo, enquanto 47 por cento dos roubos foram cometidos igualmente com o uso de armas desse tipo.

“À sombra da seção de “atividades terroristas” do Patriot Act, a tortura e a extrema violência para obter confissões de suspeitos são prácticas comuns. As condenações injustas se evidenciam nas 266 pessoas, 17 delas já no corredor da morte, que foram absolvidas graças a exames de DNA.

“Washington advoga pela liberdade na Internet para fazer da rede de redes uma importante ferramenta diplomática de pressão e hegemonia, mas impõe estritas limitações no ciberespaço em seu próprio território e trata de estabelecer un cerco legal para lidar com o desafio que representa Wikileaks e seus vazamentos.

“Com uma alta taxa de desemprego, a proporção de cidadãos estadunidenses que vive na pobreza alcançou um nível récorde. Um em cada oito cidadãos participou no ano pasado dos programas de cupons para alimentos.

“O número de famílias acolhidas em centros para desamparados aumentou 7 por cento e as familias tiveram que permanecer mais tempo nos centros de acolhida. Os delitos violentos contra estas famílias sem teto aumentam sem cessar.

“A discriminação racial permeia cada aspecto da vida social. Os grupos minoritários são discriminados em seus empregos, tratados de maneira indigna e não são levados em conta para promoções, benefícios ou processos de seleção de emprego. Um terço dos negros sofreu discriminação em seus lugares de trabalho, embora somente 16 por cento se atreveu a apresentar queixa.

“A taxa de desemprego entre os brancos é de 16,2 %, entre hispanos e asiáticos de 22 %, e entre os negros é de 33 %. Os afroamericanos e os latinos representam 41 por cento da população carcerária. A taxa de afroamericanos cumprindo prisão perpétua é 11 vezes mais alta que a de brancos.

“90 por cento das mulheres sofreu discriminação sexual de algum tipo em seu lugar de trabalho. Vinte milhões de mulheres são vítimas de violação, quase 60 mil presas sofreram agressão sexual ou violência. A quinta parte das estudantes universitárias são agredidas sexualmente e 60 por cento das violações em campus universitários ocorre nos dormitórios femininos.

“Nove em cada dez estudantes homossexuais, bissexuais ou transexuais sofrem assédio no centro escolar.

“O Informe dedica um capítulo a recordar as violações dos direitos humanos de que é responsável o governo dos Estados Unidos fora de suas fronteiras. As guerras do Iraque e do Afeganistão, dirigidas pelos EUA, causaram dados exorbitantes de vítimas entre a população civil destes países.

“As ações ‘antiterroristas’ dos EUA incluíram graves escândalos de abuso a prisioneiros, detenções indefinidas sem acusações ou julgamentos em centros de detenção como o de Guantânamo e outros lugares do mundo, criados para interrogar os denominados ‘presos de valor elevado’ onde se aplicam as piores torturas.

“O documento chinês também recorda que os EUA violaram o direito a existir e desenolver-se da população cubana sem acatar a vontade mundial expressa pela Assembleia Geral da ONU durante 19 anos consecutivos sobre ‘A necessidade de pôr fim ao bloqueio econômico, comercial e financeiro contra Cuba’.

“Os EUA não ratificaram convenções internacionais sobre os direitos humanos como o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher; a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e a Convenção sobre os Direitos da Criança.

“Os dados apresentados pelo governo chinês demonstram que o funesto histórico dos EUA neste terreno o desqualifica como ‘juiz dos direitos humanos no mundo’. Sua ‘diplomacia dos direitos humanos’ é pura hipocrisia de dois pesos e duas medidas a serviço de seus interesses imperiais estratégicos. O governo chinês aconselha o governo dos EUA a tomar medidas concretas para melhorar sua própria situação em direitos humanos, que examine e retifique suas atividades nesse terreno e detenha seus atos hegemônicos que consistem em utilizar os direitos humanos para interferir nos assuntos internos de outros países.”

O importante desta análise, a nosso juízo, é que se faça tal denúncia em um documento assinado pelo Estado chinês, um país de 1 bilhão e 341 milhões de cidadãos, que possui 2 trilhões de dólares em suas reservas monetárias, sem cuja cooperação comercial o império afunda. Parecia-me importante que nosso povo conhecesse os dados precisos contidos no documento do Conselho de Estado chinês.

Se Cuba o dissesse, careceria de importância; levamos mais de 50 anos denunciando esses hipócritas.

Martí tinha dito há 116 anos, em 1895: “…o caminho que se há de fechar, e o estamos fechando com nosso sangue, da anexação dos povos de nossa América ao Norte revolto e brutal que os despreza…”
“Vivi dentro do monstro, e conheço suas entranhas”.

Fidel Castro Ruz
23 de abril de 2011, 19h32
Fonte: Cubadebate
Tradução da Redação do Vermelho

Filme Indiano

Ratoeira
(Elippathayam)
Elippathayam
Poster
Sinopse
Drama indiano que discute os sentimentos humanos a partir de histórias envolvendo ratos e os moradores de uma antiga casa, de uma familia tradicional e decadente. O personagem central é Unni, um homem que não consegue conviver tranquilamente com seu egocentrismo, e incapaz de lidar com as demandas de um mundo em transição.

  Créditos e Legendas Exclusivas de KEROUAC - MAKINGOFF
Screenshots (clique na imagem para ver em tamanho real)

Elenco
Informações sobre o filme
Informações sobre o release
Karamana Srada, Jalaja, Rajam K, Nair, Prakash, SomanGênero: Drama
Diretor: Adoor Gopalakrishnan
Duração: 115 minutos
Ano de Lançamento: 1981
País de Origem: India
Idioma do Áudio: Malaiala
IMDB: http://www.imdb.com/title/tt0082318/
Qualidade de Vídeo: DVD Rip
Vídeo Codec: XviD
Vídeo Bitrate: 1787 Kbps
Áudio Codec: MPEG1/2 L3
Áudio Bitrate: 132 kbps 48 KHz
Resolução: 640 x 464
Aspect Ratio: 1.379
Formato de Tela: Tela Cheia (4x3)
Frame Rate: 25.000 FPS
Tamanho: 1.564 GiB
Legendas: Em anexo
  
Coopere, deixe semeando ao menos duas vezes o tamanho do arquivo que baixar.
 
O torrent e a legenda por email

Médicos e pacientes pressionam IPE por melhorias no plano de saúde


Plano de saúde dos servidores gaúchos já foi considerado o melhor do país

Paulo Germano | paulo.germano@zerohora.com.br

A direção do Instituto de Previdência do Estado (IPE), responsável por um dos maiores planos de saúde do Rio Grande do Sul, está pressionada entre médicos e usuários. Do lado dos profissionais credenciados, pesam os pedidos por correção da tabela de procedimentos. Do lado dos pacientes, crescem reclamações a respeito da demora em busca de atendimento. A dimensão do problema fica evidente quando se olha o tamanho da carteira de segurados: quase 1 milhão de pessoas.

Não é mais a mesma a reputação do IPE, o plano de saúde dos servidores gaúchos que já foi considerado o melhor do país. Parte desse abalo deve-se ao pagamento oferecido aos médicos e à conduta de uma parcela dos profissionais. Eles reclamam que o instituto paga mal, mas resistem em deixar o quadro de credenciados. Resultado: algumas práticas questionáveis já estão de tal forma entranhadas no cotidiano de alguns consultórios que nem os pacientes conseguem perceber as distorções.
 
 "Pelo IPE, não paga nem o
consultório", diz presidente do Simers


Um agravante para o problema é que o IPE tem remunerado seus médicos com valores abaixo dos de mercado – o que aguça o embate entre a instituição e entidades como o Sindicato Médico (Simers). Na prática, os maiores prejudicados são os usuários do plano, que atende a quase 1 milhão de pessoas no Estado inteiro.

O IPE em números:
Um dos sistemas de previdência mais antigos do país, o IPE foi criado por Flores da Cunha em 1931

Usuários: 976 mil
Médicos cadastrados: 7,2 mil
Consultas/mês: 260 mil
Atendimentos/mês: 1 milhão
Orçamento de 2011: R$ 1,1 bilhão
Receita mensal: R$ 87,1 milhões*
Despesa mensal: R$ 84 milhões*
Saldo no Fundo de Assistência à Saúde: R$ 331,4 milhões*
Servidores estaduais que contribuem: 350 mil
Desconto no contracheque: 3,1%
Prefeituras e Câmaras Municipais conveniadas: 330
Servidores municipais que contribuem: 45 mil

*Dados referentes ao mês de fevereiro


>>>Leia a reportagem completa na edição de Zero Hora deste domingo

sábado, 23 de abril de 2011

Ensino técnico. Qualidade e quantidade, só o Estado

Brizola Neto no TIJOLACO

O Globo anuncia hoje o lançamento, em maio, do Programa Nacional de Ensino Técnico, o Pronatec. Posto aí em cima uma entrevista, dada em fevereiro, pela Presidente Dilma Rouseff, em que ela explica os objetivos do programa e – muito importante – conecta a educação profissional à formação geral, com a ideia de escolas de dois turnos – o regular e o profissionalizante.
É, como se vê, uma medida que já vem sendo gestada desde o início do ano. Mas é, antes ainda, uma questão que se arrasta, no Brasil, há quase 80 anos, sem que tenha sido solucionada de forma adequada.
Já nos anos final dos anos  30, o país vivia o dilema entre dois modelos de educação profissional e tecnológica. De um lado, o Ministro da Educação, Gustavo Capanema, defendendo que o Estado o assumisse diretamente e o fizesse associado à educação dita “formal”; de outro, o “grupo industrial”, formado por dirigentes empresariais paulistas de vanguarda, como Roberto Simonsen e Euvaldo Lodi, que sustentava que o próprio empresariado – garantidos os recursos para isso – seria o melhor para gerir essa qualificação profissional.
 
A solução do Sistema “S” – Senai, Senac, etc – foi a predominante. E se provou de alta qualidade, ao longo de décadas. A outra vertente, ainda que de maneira periférica, também se mostrou um vitoriosa, embora restrita, com a criação, em 1942, da Escola Técnica Nacional – hoje o Cefet – que proporcionava visão mais ampla e teórica da atividade industrial ao lado do ensino convencional. Tanto que, nos anos 70, passou a ter um acesso tão disputado que, praticamente, só a classe média a ela conseguia ter acesso, pela admissão concorridíssima, quase a tornar obrigatórios os cursos de preparação.
Da mesma forma, a partir do fim dos anos 80, o Sistema “S” foi deixando de ser uma alternativa de formação de profissionais qualificados. Se antes a necessidade era tão intensa que algumas oficinas do Senai era envidraçadas para atrair a atenção dos passantes e  captar alunos, a crise econômica acabou com a quase total “garantia de emprego” com que contavam os egressos do sistema. De outro lado, o preço desta formação passou a se tornar proibitivo – mais ainda por não assegurar contratação imediata em bons padrões salariais.
Afinal, excetuando as vagas gratuitas proporcionadas por acordos com o Governo, que atinge apenas metade das vagas, fazer um curso profissionalizante nestas instituições  passou a ter um custo proibitivo. O ex-presidente Lula, por exemplo, dificilmente teria condições de fazer hoje um curso de torneiro mecânico. Por dois meses e 160 horas aula, o custo desta aprendizagem no Senai chega a R$ 1,3 mil.
O esforço feito pelo Governo Lula para criar cursos de qualificação profissional, muito embora tenha sido e seja ainda positivo, esbarra nos limites da inexistência, fora do setor estatal e semi-estatal (como o Sistema “S”)  de estruturas capazes de fazê-lo com qualidade e eficiência. Em geral, acaba-se por produzir apenas profissionais para funções muito básicas, embora nossa demanda seja, cada vez mais, por mão-de-obra de média/alta qualidade, capaz de se adequar às estruturas mais exigentes, competitivas e tecnológicas da atividade industrial e de serviços.
O Governo Lula produziu muitos avanços. Primeiro, acabou com a virtual proibição aos Estados de fazerem ensino técnico, pela restrição imposta por FHC de que arcassem com todo o custeio. Depois, expandiu a rede de escolas técnicas federais de maneira expressiva e faz subir de 113 mil para 219 mil o número de matrículas, entre 2003 e 2009 (não tenho os números de 2010).
Mas era preciso um passo adiante, uma decisão. E Dilma a tomou, ao que parece, com o Pronatec.
A formação profissional de qualidade – e isso é inseparável da formação do ser humano – vai passar a ser uma causa de Governo, à qual as instituições públicas e semi-públicas devem se integrar.
E dou, desde já, uma sugestão: porque não convovar a Petrobras, as universidades públicas estaduais e federais do Rio de Janeiro e as indústrias da cadeia petroleira, inclusive a naval,  para fazermos uma grande Escola Técnica de Petróleo e Gás no Rio de Janeiro, para formar a mão de obra que o setor já  necessita e vai precisar com o pré-sal?
Sem prejuízo do Prominp, que dá formação básica, essencialmente, temos de formar centenas, milhares de profissionais de alta qualidade para as plataformas e refinarias. E temos conhecimento para isso. Ali, em Itaboraí, onde se ergue o pólo petroquímico que será a maior refinaria brasileira, a pouca distância do pólo naval de Niteroi/São Gonçalo e do Centro de Pesquisa da Petrobras, há espaço e proximidade para fazer uma escola de alto padrão, fisica e pedagogicamente conectada com as necessidades do setor.
A oportunidade está aí. E os recursos também, pois o Fundo Social para o qual irão boa parte das receitas do pré-sal tem destinação obrigatória também para esta área da educação, da ciência e da tecnologia.

Bertolino: Maurício Grabois e os devaneios de um jornalista


Por coincidência, acabo de ler o que seria o diário de Maurício Garbois, no exato momento em que a revista CartaCapital chega às bancas com este tema como matéria de capa. O texto, intitulado "Devaneio na selva" e assinado por Lucas Figueiredo, comenta “O diário do Araguaia”, tema anunciado como “exclusivo”. O assunto, no entanto, não é novo. Quando escrevi a biografia de Maurício Grabois, publicada em 2004 pela editora Anita Garibaldi, deparei com informações que davam conta desse diário.

Reprodução
carta capital - araguaia
A capa da revista CartaCapital desta semana traz a reportagem de Lucas Figueiredo sobre o diário de Maurício Grabois no Araguaia
 
Por Osvaldo Bertolino*no Portal Vermelho

Recebi, anonimamente, trechos do que seriam as anotações do comandante militar da Guerrilha do Araguaia, mas, impossibilitado de verificar a veracidade do documento, não usei as informações.

Segundo o jornalista Hugo Studart, que escreveu o livro A Lei da Selva, trata-se uma cópia preservada por um militar. Em artigo publicado pela revista Brasil História, edição de março de 2007, ele diz que o destino e principalmente o teor do diário ficaram ocultos por três décadas. “O diário foi encontrado pelas tropas que mataram Grabois, dentro de suas roupas, já estufado pela umidade. O documento chegou a Marabá no final da tarde de 25 de dezembro de 1973, para ser encaminhado na primeira hora do dia seguinte ao Centro de Informações do Exército (CIE), em Brasília”, diz ele.

Segundo Studart, um capitão da área de informações pediu o material emprestado aos colegas para examiná-lo e, sem consultar os superiores, convocou cinco soldados para que atravessassem a madrugada copiando o conteúdo à mão. Pela manhã devolveu o documento. O diário original desapareceu dos arquivos do CIE, provavelmente destruído no crematório ocorrido em fins de 1974, por ordem do presidente Ernesto Geisel, para ocultar os combates no Araguaia. Restou a cópia (mais tarde datilografada), preservada nos arquivos pessoais daquele capitão. Três oficiais superiores, antigos membros da Comunidade de Informações que tiveram acesso aos originais antes da cremação, atestam a autenticidade do conteúdo que consta na cópia.

O último combate

O jornalista diz que Grabois começou o diário três semanas após a chegada do Exército. Ele esmerou-se nos detalhes dos crimes cometidos pela repressão no Araguaia, a principal razão que levou os generais do regime militar mandar destruir a maior parte dos documentos sobre a Guerrilha, incluindo o diário do seu comandante militar. Studart descreveu o documento como rico na descrição das receitas de alimentos e medicamentos utilizadas pelos guerrilheiros, assim como na transcrição de poemas e letras de canções invocadas no cotidiano das selvas.

Grabois escreveu até dia do seu último combate, em 25 de dezembro de 1973, quando, segundo escreveu João Quartim de Moraes no prefácio da biografia que fiz, o Brasil vivia o tempo dos assassinos, dos curiós, dos sérgios fleury e congêneres. Era “também o tempo dos verdadeiros heróis, dos que em vida se comoviam até as lágrimas com a imensa miséria e o indizível sofrimento dos humilhados, dos famélicos, dos sem-infância e sem-esperança, mas que, na hora do combate final, caem de pé, olhando a morte na cara”. Grabois morreu no grande combate que ficou conhecido como o “Chafurdo de Natal”.

Descrevi, no livro, a cena nestes termos:

“No início da operação, batizada de 'Sucuri', instalou-se na região um sujeito chamado Marco Antônio Luchini, enviado como engenheiro do Incra. Era na verdade o major Sebastião Rodrigues de Moura, o Curió, ferrenho anticomunista que em 1961, como tenente, foi preso por participar da trama que tentou impedir a posse presidencial de João Goulart. No golpe de 1964, ele participou ativamente da conspiração e chegou ao CIEx. Frio e sanguinário, ficou famoso na região por receber de pistoleiros as cabeças, mãos e dedos decepados dos guerrilheiros para os quais pagava de 10 a 50 mil cruzeiros – dependendo da importância política da vítima.

Por trás da operação estava o general Antônio Bandeira. Curió foi, possivelmente, a figura que mais encarnou o espírito da “guerra suja”, que rasgou todas as leis e princípios que regem os conflitos militares e os direitos básicos do ser humano. Curió ainda iria participar de outras atrocidades praticadas pela ditadura – como a “chacina da Lapa”, quando em 1976 a repressão assassinou dirigentes do PCdoB em São Paulo – e se estabelecer na região, onde foi eleito deputado, dominou o garimpo de Serra Pelada à força e fundou uma cidade em homenagem ao seu nome – Curionópolis.

No dia 25 de dezembro de 1973, Curió comandava a patrulha que, no final daquela manhã chuvosa, por volta das onze horas e vinte cinco minutos, encontrou o grupo de guerrilheiros. O major viu entre eles aquele que o relatório do CIEx classificou como o comandante militar da Guerrilha, que destacava-se dos demais pela idade – estava com 61 anos. Maurício Grabois recebeu um tiro de fuzil no braço esquerdo, abaixou-se, puxou o revólver e de joelhos atirou até ser atingido mortalmente na cabeça. Apropriadamente, o oficial que presenciou a cena proclamou: “Foi a morte de um lutador”.

No início do dia 25 de dezembro de 1973, exatamente seis anos depois do desembarque de Maurício Grabois no Araguaia, dos 69 guerrilheiros enviados à região 41 estavam vivos, 20 mortos, 7 presos e um – João Carlos Borgeth, o “Paulo Paquetá” – havia fugido. No tiroteio contra a Comissão Militar naquela manhã de Natal, dos 15 que estavam no grupo dez sobreviveram. Os mortos foram, além de Maurício Grabois, seu genro Gilberto Olímpio Maria, Líbero Giancarlo Castiglia, o “Joca” – que chegou com ele e Elza Monnerat à região em 1967, e possivelmente foi preso ainda com vida –, Paulo Mendes Rodrigues e Guilherme Gomes Lund. Os demais guerrilheiros estavam acampados num local mais abaixo ou realizando tarefas nas redondezas.”

Para escrever a biografia, consultei muitas fontes, conversei demoradamente com pessoas que conviveram com Grabois e mergulhei fundo em seus escritos. A impressão que fiquei é de um homem à frente do seu tempo, de rara capacidade intelectual, de caráter sólido e totalmente envolvido com a causa que embala a humanidade desde tempos imemoriais: a luta pelo futuro. É daqueles que, como disse o escritor Monteiro Lobato na carta enviada a Caio Prado Júnior quando este estava na prisão, quanto mais a gente conhece, mais admira. “A regra é ao contrário: à proporção que a gente vai conhecendo um homem, vai se decepcionando – vendo-lhe as falhinhas...”, disse.

Formulação de Karl Marx

No caso de Grabois e de seus contemporâneos que reorganizaram o Partido Comunista do Brasil em 1943, na Conferência da Mantiqueira, e em 1962, aplica-se muito bem a formulação de Karl Marx, na obra O dezoito brumário de Luis Bonaparte, de que a tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. “Os homens fazem sua própria história, mas não a fazem como querem; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado”, diz ele.

Esse é ponto: Grabois se destaca nos noticiários por ter participado até à morte naquela que é considerada a mais dura linha de resistência à ditadura de 1964, a Guerrilha do Araguaia, mas o seu legado oprime o cérebro dos que procuram esvaziar as suas ideias. O conjunto da sua obra nem sempre é devidamente valorizado – uma opção da mídia que, sabemos muito bem, não tem o menor interesse em retratar o alcance da Guerrilha do Araguaia.

Chutes teóricos de Lucas Figueiredo

O que causa estranheza é a opção de CartaCapital de entregar esse assunto ao jornalista Lucas Figueiredo, que se revelou um desconhecedor das elementares informações que possibilitariam um juízo mais em conformidade com os fatos descritos no diário. Já no início da matéria, ele deduz que Grabois ilude-se sobre o ânimo das “massas”, que seriam “a miserável população local que quer cooptar para fazer a revolução comunista no Brasil”. Devaneio maior, impossível.

Bastaria raciocinar não mais que cinco minutos para saber que uma “revolução comunista” era o que menos estava em questão naquele movimento. Se for para ser mais rigoroso, é possível dizer que Lucas Figueiredo não se deu sequer ao trabalho de evitar chutes teóricos para qualificar a luta armada no Sul do Pará. Seria o caso de perguntar: onde ele leu, ouviu ou obteve tal informação? Se diz que Grabois e seus camaradas queriam “fazer a revolução comunista”, deveria explicar o que vem a ser isso. É o velho vício da mídia, de disparar preconceitos sem a menor preocupação.

O esperto jornalista

Para Lucas Figueiredo, “tudo conspirava contra os guerrilheiros”, mas o ingênuo Grabois “julgava que a situação era ‘favorável’”. O esperto jornalista diz que “fica patente” no diário “que, entre o sonho e a realidade, Grabois abraça o primeiro e renega a segunda, um gesto bonito para um idealista, mas fatal para um comandante militar”. Bem, quando o assunto chega a esse tom professoral, é preciso tomar cuidado. Como sabemos, professores nem sempre gostam de ser contestados. Mas alguns pontos são tão falseados que, mesmo com esse risco, não dá para não comentar.

Lucas Figueiredo descreve Grabois como um ser tão incapacitado intelectualmente que passava horas de seu dia a ouvir as transmissões da Rádio Tirana e acreditava nas notícias que chegavam “da distante e fechada Albânia comunista”. “Grabois chega a acreditar que não só ele e seus companheiros ouvem a propaganda vermelha da Tirana (sic), a ‘melhor fonte de informações’”, escreve. Aqui a desinformação assusta. Bastaria um rápida busca na internet para saber que o PCdoB montara um sofisticado sistema de transmissão de informações, via Rádio Tirana, que vinham exatamente de onde Grabois estava. Dizer, como faz Lucas Figueiredo, que Grabois tomava propaganda como informação é o cúmulo do descaso.

Uma confusão primária

Para o jornalista, a capacidade do comandante “de se entregar ao autoengano parece infinita”. “O diário mostra que ele confundia o apoio logístico dado pela população local, que realmente existiu durante um tempo, com a nunca efetivada adesão à luta”, diz ele. Lucas Figueiredo poderia ter assistido ao documentário Camponeses do Araguaia – a Guerrilha vista por dentro (veja aqui do lado, na coluna da esquerda), do qual participei como responsável pelas entrevistas, para ver que Grabois tinha razão. Deveria também ler os documentos sobre o caráter daquela resistência para saber que ninguém, muito menos o comandante, queria que a população aderisse “efetivamente” à luta. É uma confusão primária, sabe-se lá com qual propósito.

O texto se lança em outros devaneios de menor intensidade, como as descrições de Grabois sobre as dificuldades enfrentadas na mata e a busca incessante por comida. Aí Lucas Figueiredo voa tão baixo que é impossível alcançá-lo. “O diário revela um guerrilheiro obcecado por comida”, diz ele. Depois dessa triste passagem, ele volta a atacar Grabois, “um comandante rigoroso, sobretudo com os outros”.

Palavreado rasteiro, chulo

Aparece novamente um ser ingênuo e incapacitado a ponto de escrever regras como “garantir o autoabastecimento” e “levar a cabo ações armadas contra o inimigo”. “Espera que os estudantes e profissionais liberais de pouca idade levados pelo PCdoB para a mata sejam verdadeiros Rambos”, escreve. “E quando não o são, Grabois os chama de ‘problema’, ‘acovardado’, ‘pouco desenvolto’ ‘ingênuo’ e ‘um tanto lerdo de raciocínio’”, diz o jornalista, fazendo citações descontextualizadas e demonstrando que leu o diário de forma artificial.

Mas, segundo Lucas Figueiredo, Garbois era tão estulto que “quando se tratava de analisar a si próprio como comandante e o PCdoB como Estado-Maior da guerrilha, era generoso”. O palavreado é rasteiro, chulo. “Se os 69 combatentes ‘inexperientes’ – pelo menos isso ele admitia – seguissem à risca as ordens emanadas da cúpula vermelha e da inspiração do ‘mestre da guerra popular' Mao Tse Tung, seria ‘impossível’ perder a luta contra o rolo compressor liderado pelo Exército e apoiado pela Aeronáutica, Marinha, Polícia Federal e as PMS de três estados”, escreve. Quantos devaneios!

Dignidade humana personalizada

Para finalizar, Lucas Figueiredo atribui às chuvas as derrotas sofridas pela repressão em suas duas primeiras campanhas. E na operação final fica-se com a impressão de que os bandos comandados por Curió é que estavam certos. “Em fevereiro de 1973, às vésperas do início da campanha definitiva dos militares, (Grabois) aceita em sua mente (sic) o jogo do tudo ou nada. ‘No final, como nos filmes de mocinho, tudo acabará bem. Se não acabar... azar nosso’”, escreve ele.

Grabois não merecia isso tudo. Se pudesse dizer algo para o comandante da Guerrilha do Araguaia, utilizaria ideias e palavras de Monteiro Lobato na carta a Caio Prado Júnior. Cada ato seu o eleva mais. Morreu por ser digno, honesto em uma era de desonestos, corajoso nesse tempo de covardes, limpo em um século de sujeiras. Eu aqui, da minha insignificância, Grabois, te beijo a mão comovido – como se beijasse a mão da própria dignidade humana personalizada.

*Osvaldo Bertolino é jornalista, pesquisador da Fundação Maurício Grabois e editor do portal desta instituição (grabois.org.br).

Fonte: Blog O outro lado da notícia

Download Leia aqui a íntegra do diário de Maurício Grabois

sexta-feira, 22 de abril de 2011

141 anos do nascimento de Lenin.

Do blog de Zequinha Barreto


Companheirada hoje 22 abril completa 141 anos do nascimento de um dos homens mais brilhantes da política, um herói e guia do proletariado no caminho para a libertação, me referimo a Vladimir Ilyich Ulyanov, mais conhecido como Lenin.
Transformador do Partido Obrero Social Demócrata de Russia em Partido Comunista, como se denominava Marx y Engels tal como disse o proprio Lenin, fervoroso marxista que lutou enconadamente contra o reformismo, o revisionismo, o anarquismo e contra o “infantilismo da esquerda” com a mesma força que lutava contra a burguesía  e o capital; criador de aportes universais que complementam conceitos económicos do marxismo como o descubrimento de uma fase más atroz do capitalismo a  que chamou de imperialismo. Transformador Social Democrata Partido dos Trabalhadores da Rússia, Partido Comunista, como Marx e Engels eram conhecidos como disse Lênin, um fervoroso marxista, que lutou amargamente contra o reformismo, o revisionismo do anarquismo, e contra o "infantilismo da esquerda" com o mesmo força que foi contra a burguesia e criador contribuições de capital complementar universal conceitos econômicos do marxismo como a descoberta de uma fase terrível do capitalismo, que ele chamou de imperialismo.
Lenin foi líder e condutor da Revolução de Outubro o Revolución Bolchevique de 1.917 na Russia que tirou do poder o governo reformista da burguesía e pequena burguesía que havía derrotado varios meses antes, revolução que permitiu construir um estado socialista poderoso na linha  do marxismo e de experiencias práticas de exercicio de poder pela classe trabalhadora como a Comuna de Paris de 1.871 e que pouco tempo depois se transforou em  Unión de Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS); Lenin é o fundador da  III Internacional que se opos a  guerra imperialista mundial do momento (I guerra mundial). Lênin era o líder e maestro da Revolução de Outubro ou Revolução Bolchevique de 1917 na Rússia, que transfere o poder ao governo reformista da burguesia e a pequena burguesia que haviam derrubado  meses antes de uma revolução que permitiu a construção de um poderoso Estado socialista, sob a orientação do Marxismo e experiências práticas de exercício do poder pela classe operária como a Comuna de Paris de 1871 e logo depois se tornou a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), Lenin também é fundador da Terceira Internacional, que se opôs a guerra imperialista mundial.
Entre essas contribuições são essenciais para examinar agora as características que fizeram Lenin sobre o imperialismo: a fase do capitalismo monopolista, a fusão do capital bancário e o capital industrial para criar o capital e a burguesia financeira, as exportações do capital sobre a exportação de bens , a formação de associações de capitalistas-monopolistas que são donos do mundo (corporações transnacionais), o emprego do colonialismo territorial dos países poderosos para satisfazer as suas necessidades saque das matérias-primas.
. Os homens e mulheres trabalhadores, camponeses, estudantes, intelectuais, revolucionários e amantes da paz, progresso e dignidade dos seres humanos tem um herói  proporções gigantescas de Lenin a 141 anos após seu nascimento continua a guiar a revolução antes que estremecerá a burguesia.

¡Viva Lenin! Viva Lênin!

Quatro notas latinoamericanas


Uma epopéia latino-americana: soldados e patriotas cubanos, sob o comando do então jovem Fidel Castro, derrotaram os invasores em 66 horas. Foto: Reprodução.

1 – Praia Girón: Primeira derrota militar dos EUA na América Latina

Na madrugada de 15/abril/1961, há 50 anos – passados então dois anos e pouco do triunfo da Revolução Cubana -, aviões camuflados como se fossem cubanos bombardearam aeroportos militares da Ilha e, logo em seguida, tropas mercenárias sob orientação do Pentágono e da CIA (serviço de inteligência) desembarcaram na Baía de Cochinos. Seriam “insurgentes cubanos” retomando o domínio de Cuba, conforme informavam entusiasmadas as agências de notícias.
A farsa durou pouco. Em 66 horas, os militares e patriotas cubanos, sob o comando direto do então jovem Fidel Castro, derrotaram os invasores e a grande maioria se rendeu. O combate decisivo deu-se no dia 19 na Praia Girón, foi a primeira derrota militar do império estadunidense na América Latina, uma epopéia latino-americana.
O sonho do governo norte-americano era reconhecer de imediato o “governo provisório” a ser declarado pelos invasores numa “zona libertada” e, com respaldo da então submissa OEA (Organização dos Estados Americanos), prestar ajuda militar aos “rebeldes” cubanos. Eram os tempos do glamoroso John Kennedy alimentando os sonhos de mudança em Cuba, ou seja, a volta do neocolonialismo. Hoje, mais de meio século depois, continuam tentando e sonhando…
(Pena que façanhas como essa não possam chegar ao conhecimento do povo brasileiro de forma mais ampla, devido à censura dos monopólios privados de comunicação).

2 – Senado do Uruguai derruba anistia aos torturadores

Foi um parto traumático. Depois de uma polêmica imensa, o Senado do Uruguai decidiu, no dia 12/abril, pelo apertado escore de 16 a 15, derrubar a chamada Lei de Caducidade, que durante 25 anos garantiu a vigência de anistia aos repressores da ditadura uruguaia (1973-1985), impedindo que fossem a julgamento acusados de crimes de lesa humanidade – sequestros, torturas, desaparições e assassinatos de opositores políticos. A decisão terá que passar ainda na Câmara dos Deputados e ser sancionada pela Presidência.
A Lei de Caducidade estava respaldada por dois referendos populares, isto é, tinha sido confirmada duas vezes pelo eleitorado do país, o que sinaliza o grau de enfrentamento em torno da decisão do Senado. O senador Fernández Huidobro, ex-tupamaro, surpreendeu ao anunciar que votou com a governista Frente Ampla por disciplina partidária, seguindo a posição da maioria, mas renunciaria a seu mandato, lembrando que a maioria do povo uruguaio, nos dois plebiscitos, aprovou a anistia aos repressores.
Chegou-se a prever o veto presidencial, no caso da aprovação na Câmara, mas tal hipótese foi descartada pelo presidente José Mujica, também um ex-guerrilheiro, eleito pela mesma Frente Ampla que patrocinou a derrubada da lei.

3 – Os “10 mandamentos” da segurança argentina
Ilustração Página/12.

O jornal Página/12 (edição de 29/março) criou o que chamou os “10 mandamentos” da segurança do governo da Argentina, com base na orientação da ministra da Segurança, Nilda Garré, no que diz respeito à atuação das forças policiais diante dos chamados “conflitos sociais”, ou seja, greve de trabalhadores, protestos de caráter sindical, ocupação de terras, ocupação de prédios na luta por moradia popular, fechamento de ruas, manifestações populares, etc. Em síntese, diálogo e não repressão policial, dentro da ótica de defesa dos Direitos Humanos, de acordo com a política oficial do governo federal. (No “IX mandamento”, “funcionário político” quer dizer uma pessoa designada pelas autoridades dos órgãos de segurança).
I – Não portarás armas de foto;
II – Não usarás pistolas lança-gases;
III – Só usarás balas de borracha para defesa;
IV – Deverás estar identificado;
V – No utilizarás veículos sem identificação;
VI – Garantirás a livre cobertura jornalística;
VII – Não impedirás a tomada de imagens;
VIII – A intervenção policial será progressiva;
IX – Um funcionário político coordenará as ações;
X – Antes de tudo, dialogarás.

4 – Correa: SIP quer “mentir, caluniar e ficar na impunidade”

Declarações no sábado, dia 16, em seu programa de rádio, do presidente do Equador, Rafael Correa, um dos presidentes da América Latina que vivem sob bombardeio cerrado dos monopólios dos meios privados de comunicação:
“A SIP (Sociedade Interamericana de “Prensa” – Imprensa), apesar de ter nome bonito, não representa nem os jornalistas nem os cidadãos, e sim os donos dos principais jornais da América (…) É o sindicato dos donos de jornais, empresários que produzem em vez de batatas, informação, mas que perseguem uma finalidade, lucro, dinheiro (…) Esses senhores, que são empresários como quaisquer outros, por manejar meios de comunicação, se crêem acima do bem e do mal”. Enfatizou que não cederá ante a lógica do poder dos meios de comunicação, que pretendem colocar-se acima da lei, “mentir, caluniar e ficar na impunidade”. (Com base em matéria do sítio da TV Telesur).

(*) Jadson Oliveira é jornalista baiano e vive viajando pelo Brasil, América Latina e Caribe. Atualmente está em Buenos Aires. Mantém o blog Evidentemente (blogdejadson.blogspot.com).

Caminhos para a descolonização da América Latina


Por Elaine Tavares - jornalista - Revista Pobres & Nojentas

A sétima edição das Jornadas Bolivarianas discutiu este ano um tema árduo e muito pouco palatável: a presença imperialista na cultura latino-americana. A idéia foi dar um panorama de como o império vai consolidando sua forma de ser na capilaridade da vida cotidiana através da escola, dos meios de comunicação, da vestimenta, da comida, da indústria do entretenimento, da moda etc... Como um conta-gotas, misturando-se aos diversos aspectos da vida cultural, grande parte das vezes sem usar a força bruta, o modo de vida do império toma conta das gentes, até parecer ser natural esquecer os mitos locais, os pratos típicos, a maneira de viver, as brincadeiras, e até a língua. A cultura, expressão material da realidade humana, na América Latina, segue cativa do colonialismo e a tarefa de descolonização mostra-se, às vezes, grande demais, para os países que continuam sem uma alternativa política nacional/popular. Nestas Jornadas, discutiu-se a situação dramática da América Central, as tentativas de mudança na América do Sul e a proposta ainda solitária de Cuba, que desde há 50 anos busca a criação de um pensamento próprio, baseado na cultura nacional. O totalmente novo ficou por conta da perspectiva indígena, que desde os anos 90, assoma na América Latina, recuperando elementos chave de sua cultura ancestral.
Poucas pessoas desconhecem a força da cultura estadunidense na vida da América Latina. Desde que proclamaram sua independência da Inglaterra, em 1776, os Estados Unidos da América do Norte decidiram trilhar o caminho da rapina e da dominação. Como foi o primeiro país a realizar o feito de se libertar da colônia em todo o território do “mundo novo”, nada poderia ser mais natural que os demais povos o vissem como um exemplo a ser seguido. Mas, o que veio logo depois já deveria ter servido como um sinal de que as famosas “13 colônias”, agora livres e unificadas, também iriam arvorar-se a disputar o cargo de donas do mundo. A doutrina do “destino manifesto” - que tinha por princípio defender a idéia de que os colonos norte-americanos de origem calvinista teriam sido eleitos por Deus para comandar todos os povos da terra, com a missão civilizatória de ocupar os territórios situados entre os oceanos Atlântico e Pacífico – levou à trágica conquista do Oeste, com a destruição de nações indígenas inteiras. O massacre dos povos locais expandiu o território e aguçou a pretensão de fazer daquele país um império. Naqueles dias, os governantes já faziam uso de armas químicas como bem mostra essa célebre frase do presidente Benjamin Franklin "Se faz parte dos desígnios da Providência extirpar esses selvagens para abrir espaço aos cultivadores da terra, parece-me oportuno que o rum seja o instrumento apropriado. Ele já aniquilou todas as tribos que antes habitavam a costa". E assim foi.
Poucos anos depois da independência, já no século XIX, outra doutrina expansionista iria ganhar corpo, a doutrina Monroe, que pregava a idéia de a “América para os americanos”. No discurso, os governantes estadunidenses afirmavam a necessidade da independência das terras latino-americanas, mas, na verdade, tudo o que queriam era anexá-las aos seu círculo de poder, já configurado como imperialismo.
Assim, em 1820, quando a América Latina dava consequência ao sonho de libertação, o governo estadunidense invadia o que hoje é o Texas, ocupando também a Califórnia, o Novo México, Nevada, Arizona e Utah. Com esta segunda incursão expansionista (a primeira foi a que anexou os territórios indígenas do centro do país) roubava grande parte das terras mexicanas, conformando pela força das armas e da destruição o seu atual território. Nesse sentido, em 1850 os EUA já eram um império, no modo de operar e na política de disseminação da cultura de dominação.
Terminada a operação de ocupação das terras mexicanas, os dirigentes do país se voltaram para a América Latina recém liberada. As guerras de independência já tinham sido travadas e os estados-nação começavam a formar-se. Era necessário, na visão dos estadunidenses, que alguém ficasse no comando e esse alguém eram eles, coisa já definida por deus no destino manifesto. É a Nicarágua, em 1855, o primeiro país a ser ocupado pelas tropas do já formado império, pelas mãos do mercenário William Walker que desembarca e se faz presidente, distribuindo terras aos fazendeiros do sul dos EUA. Depois, em 1898, é a vez de Cuba, tirada da Espanha e transformada em quintal estadunidense, um protetorado que durou até 1933. No mesmo ano de 98, o Havaí também é ocupado, sendo colônia até hoje.
Quando o século XX nasceu, trouxe com ele a sede de expansão do império estadunidense, que nunca mais parou. Intrigas muito bem urdidas lograram a separação do Panamá da Colômbia e lá ficou o pequeno país, com a riqueza de um canal ligando os dois oceanos, nas mãos do império. Como bem lembrou Rafael Cuevas Molina, da Universidade Central da Costa Rica, presente nas Jornadas Bolivarianas, a América Central passou a ser um espaço estratégico para os Estados Unidos e desde então, nunca mais conseguiu caminhar com as próprias pernas. A cada tentativa de garantir soberania, os países eram invadidos e submetidos aos desejos dos governantes estadunidenses.
Pouco depois da Primeira Guerra Mundial, num mundo devastado pelo conflito, os Estados Unidos iniciaram outra estratégia de dominação na América Latina. A proposta era conquistar corações e mentes pela via da cultura. Enriquecido pela indústria da guerra, os EUA deram linha para a indústria cultural. Inicia-se um período de ouro no cinema, no qual os filmes eram produzidos para propagandear o “modo americano de ser”. O mito do mundo livre, das oportunidades para todos, da democracia, vai se construindo e invadindo a América Latina. O círculo do far west (corrida para o oeste) demoniza os índios, transformando-os em assassinos sanguinários, enquanto os cowboys (vaqueiros) era pintados como heróis. A completa inversão de valores. Em toda América Latina esses produtos culturais se popularizaram e em pouco tempo as crianças sabiam mais de John Wayne do que de seus vizinhos. Estava aberta a veia da dominação “limpa”. Igualmente, os açucarados filmes românticos mostravam o jeito de ser da sociedade estadunidense, gravando nas cabeças latino-americanas o desejo de ser como aqueles heróis que infestavam os cinemas de todos os países. No campo da comunicação de massa, o rádio também reproduzia a propaganda do “mundo livre” e com ela, introduzia nos países as megaempresas que iriam dominar economicamente cada pedaço desse chão. No Brasil, o repórter Esso, noticiário diário, era um fenômeno de audiência. Só o que se noticiava ali, sob a chancela da Esso, era considerado verdade.
E é essa forma de dominação - que ocorre num terreno aparentemente invisível - que as Jornadas Bolivarianas se propuseram discutir. Compreender qual o alcance desta política ainda hoje nos países latino-americanos e encontrar as brechas para sair do atoleiro da dominação cultural.
 
A América Central
 
Na franja de terra que separa as Américas do Sul e do Norte, a vida nunca foi fácil, desde a dominação espanhola. Depois, com a influência estadunidense, as condições de vida das gentes só pioraram. Sem os “patrões” europeus, os países da América Central e do Caribe passaram a ser dominados pelas grandes empresas estadunidenses, principalmente as chamadas bananeiras. No controle da economia, elas ainda tinham pleno domínio da política e elegiam e derrubavam governos ao seu bel prazer. Eram um estado dentro do estado. Assim, as regiões que antes eram espaços das culturas Caribe, Chicha, Maya, Kuna e outras, passam a receber mão de obra escrava vinda da Jamaica, já inoculada com a cultura britânica, a qual tinha absorvido com a colonização. Com o enclave bananeiro, o modo de vida que passou a ser hegemônico foi o estadunidense. “O planejamento urbano, a religião, a cultura, a arquitetura, a língua, tudo estava ligado com a vida nos Estados Unidos”, diz o professor da Universidade Nacional da Costa Rica, Rafael Cuevas Molina.
Segundo ele foi Augusto César Sandino o primeiro a se insurgir contra essa dominação que já extrapolava o campo do território e se espraiava pela via da cultura. Quando no início do século XX os EUA invadem outra vez a Nicarágua para tomar conta do canal e desde ali frear a revolução mexicana, Sandino aparece com seu “pequeno exército louco”, dando vida a um nacionalismo latino-americanista e antiimperialista, capaz de mostrar que seria possível a vida sem as megaempresas e sem o domínio do mal nominado “Tio Sam” (já que irmão de nossa pátria ele não, como dizia Alí Primera). E é essa idéia que vai incendiar as lutas populares nos anos 60 por toda a América Central com o surgimento dos movimentos armados de libertação nacional.
O resultado de décadas de lutas insurgentes, praticamente todas derrotadas, é o que se vê na realidade atual. A constituição de um Estado terrorista, que torna naturalizada a cultura da violência e da discriminação. Os anos 80, que marcaram o derrocamento das propostas revolucionárias, ainda trouxeram consigo as reformas neoliberais, esgarçando um pouco mais o frágil tecido social. O resultado disso é uma identidade cultural esfacelada, o que torna ainda mais fácil a dominação. E, se a bananeiras já não tem mais poder na América Central, o espaço foi tomado pelas empresas maquiladoras, que seguem trabalhando no mesmo velho ritmo: trabalho precário, produção de coisas que as gentes jamais usarão e esgotamento total das pessoas. O que sobra é a violência, a pobreza, o crime organizado e as gangues juvenis. Sem horizontes de futuro, os jovens ou se matam ou migram. E, de um jeito ou de outro vão se transformando em uma cópia mal feita dos jovens empobrecidos do centro do poder. “Na América Central, hoje, os ricos sonham com Nova Iorque, os de classe média sonham com Miami e os pobres com o que vêem na TV. Isso é uma mostra segura de que há um mal estar cultural. Todos, de alguma forma, imitam a vida dos EUA”.
 
A comunicação é a via de transmissão do imperialismo
 
Se nos anos 30 os EUA iniciaram sua corrida às mentes do povo latino-americano pode-se dizer que isso segue sendo feito num ritmo frenético. Usando a velha tática da repetição, a indústria cultural estadunidense continua hegemônica em praticamente todos os países. O cinema exporta o modo estadunidense de ser, os programas de televisão, as séries, os desenhos animados, as teorias culturais, os movimentos artísticos, a estética, a filosofia. Tudo é colonizado. E, os meios de comunicação bombardeiam o cérebro das pessoas diuturnamente. Romper essa dominação colonial requer mudanças drásticas na vida dos países, ensina o jornalista uriguaio/venezuelano Aram Aharonian, um dos formuladores da proposta da Telesur – um canal de televisão latino-americano.
Para Aram é impossível mudar qualquer coisa nos países que vivem dominados culturalmente, se não houver primeiro uma mudança radical de paradigma. “Há mais de 40 anos que não temos uma teoria nova na comunicação. Tudo copiamos dos gringos”. Essa formulação teórica tem de ser própria, fruto da realidade local. Já basta de pensar com a cabeça mergulhada num mundo que não é nosso.
Mas, fazer isso tampouco é fácil, uma vez que o império, ao ser confrontado com novas teorias e paradigmas usa de todas as armas para absorver o impacto, usando-as para contra-atacar. “Nós pudemos ver isso quando na Telesur colocamos nossos apresentadores de maneira bem informal, como são os latino-americanos. Não passaram dois meses e lá estava a CNN em espanhol copiando nossa forma de fazer, e usando isso contra nós”. Assim, nossa tarefa parece ser cada dia mais desafiadora.
Aharonian adverte que se no mundo da arte, da cultura e da comunicação estamos cada dia mais enfeitiçados pelo sistema hegemônico, a única saída parece ser liberar os 1.400 cm cúbicos de cérebro que cada um tem. É a capacidade de pensar com a própria cabeça que definirá o futuro. Aram mostrou que mesmo a comunicação dita alternativa, que fez sucesso em determinado momento, acabou se domesticando. “As rádios comunitárias se profissionalizaram e não são mais o espaço popular, os sindicatos se conformem em ter apenas um boletim, a palavra está sequestrada pelas empresas. Estamos cegos de nós mesmos. Não sabemos quem somos e não cremos em nós mesmos. É isso que precisa mudar”.
Uma comunicação libertadora precisa ter o compromisso de manejar ela mesma a agenda informativa. Os espaços alternativos não podem ser marginais, precisam almejar ao universal. O grande desafio é deixar de copiar conteúdos e formas. Criar o próprio estilo e a partir daí criar redes de comunicação que possam chegar ao maior número de pessoas. “Nós vivemos a síndrome da praça sitiada. Ocorre que ela não está mais sitiada, nós podemos romper o sítio. Mas, para isso, temos de criar nosso próprio paradigma. Já basta de choramingar e de gritar palavras de ordem. Vamos produzir conteúdo de qualidade e formar redes. Assim, superaremos a dominação cultural”.
No campo do cinema a ordem parece ser a mesma. Sérgio Santeiro, cineasta brasileiro que bebe na proposta estética e filosófica de Glauber Rocha - como se pode ver no seu deslumbrante curta metragem “Paixão” (http://youtu.be/AS3Oep2cCsw ) - desafia a se constituir uma estética própria, fora dos padrões “roliudianos”, que dêem conta da realidade latino-americana e que provoquem o desconforto gerador da mudança. Glauber, de alguma forma, conseguiu isso no seu tempo, mas a nova geração precisa encontrar outro caminho, original. Outra estética para vencer a lógica da violência e do medo imposta pela arte cinematográfica estadunidense. Igualmente a proposta do pensamento crítico e próprio, na senda do ensinamento de Simón Rodriguez, que pregava como um louco a máxima: “Basta de imitar. Há que criar”.
 
A proposta cubana
 
Faz mais de 50 anos que a pequena ilha caribenha, Cuba, busca um caminho original. Até o triunfo da revolução, a mídia, comandada pelos EUA, confundia o mundo e os cubanos sobre o que passava no país. Na ilha se podia viver em inglês, como lembrou o vice-ministro da Cultura, Fernando Rojas. Depois não. A revolução, pela proposta de liberdade que carregava, foi definindo uma identidade que até então só aparecia nos escritos de José Martí. Hoje, depois de acertos e erros, a cultura cubana segue rechaçando o neocolonialismo que se expressa na invasão do ar via televisão desde Miami, mas busca estabelecer uma relação dialógica com a cultura dos EUA. “Nós acreditamos que é preciso conhecer muito bem essa cultura para podermos conformar um anti-imperialismo. Mas, a proposta é enfrentar a colonização cultural com o melhor do pensamento socialista, fazendo assomar a rumba, o guagancon e o balé nacional de Cuba”.
Segundo Fernando, a ilha de Cuba já superou os tempos em que se buscava importar a experiência socialista do leste. Atualmente, incorporados os elementos da afro descendência, dos indígenas, dos descendentes dos colonizadores, as forças políticas do campo e a cultura popular urbana, tem-se a cultura cubana, tomada por uma liderança coletiva anticolonialista e anti-imperialista. “Em Cuba há uma questão que nos parece vital. Todas as pessoas têm acesso à cultura. Nós não dizemos: crê. Dizemos: lê. E, com isso, os cubanos recebem gratuitamente o melhor da cultura, inclusive a dos EUA. Fundamos escolas de arte em todo o país, na montanha e na capital. E esse acaba sendo nosso desafio. Afinal, temos de pensar em como sustentar isso economicamente”.
Em Cuba as políticas culturais significam esforços estatais e públicos. Vem daí a Casa das Américas, a escola de Cinema e outras milhares de instituições de cultura de base. “Como tudo isso custa, agora andamos pensando em cobrar do público para ver um teatro, por exemplo. Mas é coisa simbólica, nada comparada ao mundo capitalista no qual é praticamente impossível aos trabalhadores freqüentarem o teatro”.
A polêmica em Cuba agora passa pela discussão do direito de autor. Segundo Fernando, existem manifestações da cultura popular que precisam de proteção e que não podem ser apropriadas por este ou aquele. São construções coletivas. “Mas esse ainda é um debate ainda inicial”. Para o vice-ministro, a originalidade cubana está no fato de o governo ter uma política cultural que possibilita a liberdade criativa e a garantia do acesso ilimitado à cultura. É uma aposta na qualidade da vida das pessoas, pois, com isso, elas se tornam pessoas melhores. Ele ressaltou que Cuba vive sob bloqueio econômico, mas não cultural. Todo o lixo produzido no império chega às casas cubanas e, por isso, esse campo de batalha é tão importante. Vencer aí é fazer meio caminho no rumo da sustentação da nova sociedade.
 
O paradigma andino
 
Se a questão do enfrentamento do império passa pelo desafio de sermos originais, o mundo indígena tem muito a contribuir para esse debate. Foi o que mostrou a socióloga aymara Silvia Rivera Cusicanqui na sua exposição. Segundo ela os índios há muito que deixaram de ser estudo de caso e sua cosmovisão assoma como uma proposta de vida absolutamente diferente da que foi pregada pelo mundo ocidental, europeu. Muito antes da invasão já havia muitas culturas aqui nestas terras, com histórias milenares, que, mesmo sob a dominação, mantiveram-se vivas e hoje saem da obscuridade, oferecendo novas formas de viver no mundo. Sua originalidade consiste justamente na diferença radical. Enquanto a filosofia ocidental busca o uno, o mundo andino, por exemplo, trabalha com a idéia do terceiro incluído: ou seja, os contrários podem sim conviver e se encontrar.
Silvia defende a idéia de que a cultura é um sistema de significados que não tem como passar pelo mercado. É o imaginário, o desejo das comunidades, mas ao mesmo tempo é o que se torna real pela força da arte humana. Segundo ela, na Bolívia, a esquerda não tem falado em imperialismo ao discutir as mazelas do tempo presente. “Falam em pós-colonialismo, mais encobrindo do que revelando o que está por trás de tudo isso”. Ela conta que os povos indígenas da Bolívia sabem muito bem que a identidade naquele país é uma questão política de primeira grandeza. E tanto que conforme são os dirigentes mudam as cifras sobre a porcentagem de indígenas no país. Já houve momentos em que a porcentagem foi de 19%, pulando no ano seguinte para 68%. O trágico é que o racismo contra o índio é algo internalizado também na esquerda, até porque suas fileiras são formadas por gente que tem o pensamento colonizado também.
Nos Andes, as comunidades vivem sob outro paradigma, fora da dualidade maniqueísta ocidental. “Para nós é fundamental o conflito das dualidades, porque isso é a energia que nos move”. Entre os indígenas das comunidades andinas a cultura é parte da forma de organizar a vida. Nos tempos mais remotos, mesmo as obras públicas sempre eram precedidas de grandes festas, de encontros com dança, música, imagens e gestos, tudo recheado do simbólico e do sagrado. Mesmo a religião é múltipla, com deuses de muitas faces, que são anjos e demônios ao mesmo tempo, porque é esse conflito que move a vida. Coisas bastante difíceis de serem assimiladas pelos cérebros formatados na mentalidade ocidental. Palavras desconcertantes para os 1.400 cm cúbicos de racionalidade instrumental. “Para nós o futuro é algo que está atrás, porque não sabemos dele, o passado é algo que está à frente, pois dele temos conhecimento. E o presente é o que de fato importa”. Para Silvia a tarefa de descolonização dos estados na América Latina é árdua e difícil, mas esta é uma batalha que precisa ser travada. Derrubar o colonialismo, o racismo, o preconceito. No território que serpenteia junto à cordilheira dos Andes, as comunidades estão descobrindo suas potencialidades, estão recuperando suas formas de organizar a vida. “É bobagem pensar que não podemos ser modernos. Podemos sim. Comunitários e modernos. Temos nossos paradigmas e nossa cultura. Mas, o fato é que nós vimos o mundo ao contrário. Nossa lógica é “al revés”. Isso precisa ser entendido e respeitado”.
 
Desafios do presente
 
A experiência indígena pode parecer desconcertante num primeiro momento, já que coloca o mundo de pernas para o ar. Mas a idéia de convivência dos contrários parece ser a única possível num mundo onde as diferenças se afirmam cada vez mais. Transitar neste território conflituoso e desde aí criar o novo é também desafiador. A nova sociedade sonhada pela racionalidade marxista precisa levar em conta esse paradigma indígena, precisa incorporar as demandas destas comunidades que assomam cada dia com mais força. Desconhecer esse mundo é apostar no fracasso. Assim já foi com Simón Bolívar, quando subestimou a força dos lañeros venezuelanos e foi derrotado por eles. Só depois de voltar do Haiti, com os ensinamentos dos revolucionários negros sobre a necessidade de incorporar a cultura local é que Bolívar logrou a confiança dos indígenas e, com eles, abriu caminhos para a libertação. Foi assim com Artigas, na Banda Oriental, que, conhecendo e respeitando a cosmovisão Charrua, trouxe os indígenas para fazer real o sonho da liberdade. Tanto Bolívar quanto Artigas respeitaram de verdade a forma de viver dos indígenas, não fizeram mero uso instrumental, como se vê por aí. Esse pode ser o segredo.
Em toda a América Latina vive e pulsa uma Abya Yala, um espaço de propostas que exigem mudanças radicais na forma de raciocinar sobre a realidade. Outra episteme, outra forma de conhecer. Não necessariamente precisa-se aceitar toda a cosmovisão que vem destes povos milenares aqui nestas terras, mas fundamentalmente há que se incorporar essas formas de ver a realidade. Os indígenas querem estar no mundo, fazer parte da planetização da vida boa e bonita. Mas eles precisam ser compreendidos na sua cultura. Assim, no conflito destes contrários, mundo indígena X mundo colonizado, talvez se possa chegar ao novo tão esperado. Uma América Latina descolonizada, livre do imperialismo, aberta para o presente.