terça-feira, 11 de março de 2008

A ILHA

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O texto abaixo me foi enviado pelo amigo Ricardo Melo. Dá uma excelente visão do que nós, da esquerda, pensamos sobre Cuba e o futuro do regime socialista. É o tipo de texto que vai fazer a turminha da direita e seus papagaios espumarem de ódio... Leiam e comprovem (a charge é do Angeli e não carece de comentários).( André Lux)

A ILHA


Torço para que os cubanos consigam preservar suas seus princípios de educação e saúde públicas, de prevalência das questões sociais sobre as particulares, da valorização de sua História. Torço para que não vendam por um punhado de dólares um sonho tão duramente construído. Que sigam sempre como um sinal luminoso de que uma outra sociedade é possível, com menos neon e mais escola, menos celebridades e mais saúde.

- por André Catani, do blog Lapse of Reason.

É claro que eu não podia deixar de tocar no assunto: Fidel, quem diria, renunciou ao poder em Cuba. Conheci alguns cubanos. Entre eles, uma que ficou amiga, a Rosabel. Quem me conhece um pouco sabe muito bem, sempre me agradou a idéia do que aconteceu em Cuba: dar uma banana bem dada a um bando de gringos chupins, e mostrar que dá pra ter alfabetização, dentes na boca, boa música, atletas decentes e vacinas de ponta sem dizer amém para o império (com i minúsculo mesmo). Viver lá não tem sido fácil, eu sei.

Cansei de ouvir da Rosabel as histórias (que até ela mesma protagonizou), de malas cheias dos confortos mínimos da "vida moderna", como sabonetes perfumados, abridores de lata, canetas hidrográficas e videocassetes, que cada cubano carregava ao voltar pra Cuba. Mas também ouvi de todos os cubanos que conheci, sempre sadios e divertidíssimos, a história de seu povo e de seu país de cabo a rabo, contada com um sentimento de orgulho e propriedade que me faziam passar vergonha. Isso sem falar no quanto sabem do mundo, das atualidades, de tudo que acontece por aí.

Queria estar errado, mas acho que Cuba não vai resistir. Eles vivem a poucos quilômetros do maior playground do mundo, que os sacaneia com suas dezenas de emissoras de rádio e tv de antenas voltadas para a ilha, enchendo a cabeça da meninada com os afetados da MTV e os "60 minutes" narrando histórias comoventes de cubanos molóides que não agüentaram o repuxo e correram pra abraçar o Mickey. Os jovens cubanos de hoje não são mais os filhos da revolução, mas os netos.

Uma coisa é ouvir da boca do seu pai as coisas que ele viveu. Outra é a história ser contada por sua avó. Uma coisa é ter visto um país com 25% de analfabetos erradicar o problema em vinte anos. Outra é ter nascido numa ilha onde não existem analfabetos. Não sei até onde ou até quando La Revolución poderá estender seus braços, mas algo me diz que bugigangas eletrônicas, grifes famosas e lucro desonesto têm poder de sedução um pouco maior. Travestido de "democracia", o velho, moribundo e asqueroso modelo econômico dominante entoa o seu canto de sereia para os netos mais incautos da revolução.

É mais do que compreensível que Cuba tenha enfurecido os Estados Unidos e o resto da corja dominante dos países "emergentes" (sempre penso num vaso sanitário...), como uma praga a ser dizimada a todo custo. Alguém já parou pra pensar por que motivo uma potência econômica descomunal como os EUA sempre estiveram tão interessados em embargar por mais de 50 anos uma ilhota perdida no Caribe? Por que aquela meia-dúzia de ilhéus socialistas causa comoção quando vira assunto no domingão regado a uísque 12 anos?

É simples: Fidel e o povo de Cuba apontam o dedo na cara do mundo e mostram que É POSSÍVEL construir uma sociedade em outras bases. Um país sem território, sem indústria, sem riquezas minerais pode, com decência e determinação, enfrentar por mais de meio século um embargo econômico covarde e mostrar excelência em áreas vitais como a saúde pública e a educação. Fico imaginando o que Cuba seria hoje, se o mundo capitalista não tivesse se rebaixado e se humilhado perante os EUA, e tivessem permitido aos cubanos o livre acesso a combustíveis, insumos e outras trocas comerciais e culturais estratégicas...

Torço muito para que os cubanos consigam preservar suas principais instituições. Seus princípios de educação e saúde públicas, de prevalência das grandes questões sociais sobre as particulares, da valorização incondicional de sua História. Torço para que sejam hábeis o bastante para não vender por um punhado de dólares um sonho tão duramente construído. Que sigam sempre como um sinal luminoso de que uma outra sociedade é possível, com menos neon e mais escola, menos celebridades e mais saúde.
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Afro Cubano Jazz - Kind of Afro Cubano Jazz @ 320

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01. Mongo Santamaria - Watermelon Man.mp3
02. Ray Barretto - La Cuna.mp3
03. The Art Blakey Percussion Ensemble - Cubano Chant.mp3
04. Orlando Poleo - El Buen Camino.mp3
05. Cedar Walton - Latin America.mp3
06. Paquito D'Rivera - Manceta.mp3
07. Santana - Para Los Rumberos.mp3
08. Ray Barretto - The Old Castle.mp3
09. Michel Camilo - Caribe.mp3
10. Los Super Seven - Teresa.mp3

Downloads abaixo:

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Filó Machado - Jazz de Senzala (2003)




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Brasil, 1968 (3): o assalto ao Céu, a descida ao Inferno




Mário Maestri

Sem lenço nem documento

Em 28 de setembro de 1968, no III Festival Internacional da Canção, da Globo, em São Paulo e acompanhado pelos Mutantes, Caetano Veloso apresenta a música "É proibido proibir", vestido de roupas de plástico colorido com colares exóticos no pescoço, enquanto um jovem estadunidense, ainda mais psicodélico, salta e berra no palco, como parte da coreografia. Da competição participava a canção finalista "Caminhando" ("Para não dizer que não falei das flores"), de Geraldo Vandré, que se tornaria uma espécie de hino da resistência. "Vem, vamos embora/ Que esperar não é saber/ Quem sabe faz a hora/ Não espera acontecer". As históricas vaias que recebe Caetano Veloso certamente interpretavam a consciência do público, formado quase exclusivamente por jovens, do distanciamento cada vez maior de parte da intelectualidade da resistência em refluxo. Em 1972, Elis Regina cantaria querer apenas "uma casa no campo, do tamanho ideal …". A defecção de seu parceiro Jair Rodrigues – "O morro não tem vez/ e o que ele fez já foi demais/ Mas olhem bem vocês/ Quando derem vez ao morro/ Toda a cidade vai cantar./" – seria ainda mais bucólica. Nos anos seguintes, apenas alguns artistas continuariam segurando a peteca e cutucando a onça com vara curta. Entre eles, sobretudo Chico Buarque, atacando nem que fosse com um despretensioso roquezinho, no estilo "Você não gosta de mim, mas sua filha gosta", ou com composições clássicas e duras como "Fado tropical", com Ruy Guerra, de 1972-73, ou "Cálice", de 1975, com Gilberto Gil. Seu "Apesar de você", de 1970, tornar-se-ia o hino da luta final contra a ditadura e da esperança de uma reparação dos crimes por ela cometidos que até hoje não se concretizou: "Hoje você é quem manda/ Falou, tá falado/ Não tem discussão"; "Você vai pagar e é dobrado/ Cada lágrima rolada/ Nesse meu penar".

O ano, que nascera sob o signo da vontade popular, concluía-se sob o tacão militar. A resistência iniciava sua descida aos infernos. Em 29 de agosto de 1968, tropas policiais e militares, poderosamente armadas, invadiam a Universidade de Brasília. As cenas registradas pela imprensa lembravam a ação das tropas de ocupação nazistas. Estudantes são obrigados a marchar com as mãos na cabeça e a deitar-se, sob as miras das armas. O golpe seria desferido dias mais tarde. Um anódino pronunciamento do deputado Márcio Moreira Alves, em 2 e 3 de setembro, pedindo o boicote da população ao desfile de Sete de Setembro, serve para que os militares apresentem o pedido de levantamento da imunidade do parlamentar, a fim de instaurarem o processo que desagravaria o pundonor castrense arranhado. Em 12 de dezembro, o Congresso Nacional rechaça o pedido aviltante. No dia seguinte, 13 de dezembro de 1968, o governo liquida o que restava de liberdade democrática. O caso Márcio Moreira Alves era uma justificativa.

No início do ano, em abril, o brigadeiro João Paulo Burnier propusera ao Parasar, serviço de salvamento da Aeronáutica, uma ampla campanha terrorista, com execuções individuais e atentados de massa, para fechar de todo o regime. O plano fora frustrado devido à oposição do capitão-aviador Sérgio Ribeiro Miranda de Carvalho, castigado e reformado pelo seu destemor. O Ato Institucional nº5 cerrou o Congresso, as Assembléias Legislativas, suspendeu o habeas-corpus, fortaleceu a censura, preparou o caminho para a repressão, para o aprisionamento, para a tortura, para a eliminação dos opositores.

O refluxo da mobilização popular tinha raízes muito mais profundas do que a repressão. Elas haviam passado despercebidas a uma oposição formada, em sua grande maioria, por jovens que apenas despertavam para a vida política. Desde inícios de 1968, após anos de recessão, a economia nacional expandia-se. A super-exploração dos trabalhadores, o ingresso de capitais internacionais, a reorientação da produção para a exportação, a abertura de novos mercados, relançavam a produção interna. O desemprego caía, a acumulação de capitais crescia, o empresariado nacional apegava-se ao regime que permitia aumentar fortemente seus ganhos. Agora, para os empresários, falar em democracia e direitos sindicais era uma indecência. Ao contrário, eles pediam, com insistência, mais repressão, chegando a financiar e participar diretamente da tortura, junto a policiais e militares. Nas décadas seguintes, a população nacional pagaria pateticamente a conta social e econômica do Milagre. Em meados de 1968, a expansão econômica e a repressão policial ganhavam vastos setores sociais, sobretudo das classes médias, para uma posição de apatia, se não de apoio inicialmente tíbio, a um regime militar que lhes prometia realizar os mais queridos desejos.

A queda da inflação, financiamentos habitacionais acessíveis e empréstimos a baixo custo permitiam que importantes setores das classes médias conquistassem o sonho da casa própria, do primeiro automóvel, da primeira viagem à Europa. Nos anos seguintes, ao visitar o Velho Mundo, os filhos do Milagre manter-se-iam distantes dos apestados banidos e exilados que eventualmente encontravam. Em 1969, em "Pequeno burguês", Martinho da Vila criticava o movimento estudantil, festejando a possibilidade de formar-se nas universidades pagas, incentivadas pela ditadura: "Dizem que sou burguês/ Muito privilegiado/ Mas burgueses são vocês". Também explícitos eram Dom e Ravel, em 1970, com "Eu te amo, meu Brasil, eu te amo/ Meu coração é verde, amarelo, branco, azul-anil/ Ninguém segura a juventude do Brasil". O claro sucesso de público dessas músicas registrava os novos ventos.

Em um cenário de progressão social, as classes médias fechavam comumente os olhos para a superexploração das classes operárias e para a repressão da oposição. Os militantes, que haviam nadado como peixe na água por entre uma população alçada contra o regime militar, sentiam-se agora como lambaris na frigideira. Nas Universidades, eram apontados com o dedo; antigos companheiros trocavam de calçada, para não serem vistos ou falarem com o famigerado subversivo. A expansão econômica neutralizaria importantes setores operários. Os baixos salários e os altos ritmos de produção foram vistos como uma quase libertação, por trabalhadores recém-chegados do campo. Jornadas de doze e mais horas de trabalho permitiam a aquisição de produtos de consumo durável, antes fora do alcance do orçamento popular — televisor, refrigerador etc. Sobretudo a expansão da indústria metal-mecânica criaria uma jovem aristocracia operária, bem paga relativamente. Ela se confrontaria poderosamente com o regime mais tarde, em fins dos anos 70, quando o retorno da inflação corroeria os salários.

Ousar lutar, ousar vencer

A modernização conservadora do país originaria um funcionalismo público federal bem remunerado, empregado nas grandes estatais, em expansão. O crescimento selvagem do ensino privado superior diminuía a pressão social devido à falta de vagas nas universidades públicas. As universidades federais foram reorganizadas, segundo padrões estadunidenses. Pela primeira vez criava-se uma burocracia acadêmica, bem paga e bem financiada, que mergulharia em grande parte, por mais de uma década, em um calmo e cômodo apoliticismo travestido de neutra cientificidade. Isolados socialmente, insensíveis ao novo contexto nacional, as organizações armadas travaram, a partir de 1969, o combate nas trevas a que se refere Jacob Gorender, em seu livro homônimo, pequeno clássico sobre aqueles duros anos. Presos entre o confronto dos grupos armados e a repressão, as organizações que não haviam se deixado arrastar pela aventura militarista tiveram suas possibilidades de intervenção duramente diminuídas, no contexto do confronto armado que se vivia no país. Incapazes de apresentarem um projeto político que interpretasse as necessidades das amplas massas e apresentasse formas de luta e de organização adaptadas à época, crescentemente isolada, a militância de esquerda caiu combatendo, foi aprisionada, tomou o caminho do exílio ou procurou sobreviver na dura situação de ditadura. Nos mais duros momentos, agoniados pelo peso da derrota, centenas de militantes permaneceram no país, organizando a resistência como podiam.

A ditadura do capital, que parecia vacilar em 1968, manter-se-ia ainda por longos anos, até 1985, quando a mobilização operária e popular conquistaria, finalmente, a redemocratização sem, porém, obter no momento da transição o direito a eleições diretas. Uma nova derrota ao substituir-se o regime militar por um governo que manteve no essencial as modificações institucionais empreendidas nos vinte anos de ditadura, em desfavor das classes subalternas, em favor dos privilegiados. De certo modo, simplesmente "se mudava tudo, para que tudo ficasse igual".

Aprofundada pela vitória da ofensiva neoliberal internacional de fins dos anos 1980, quarenta anos mais tarde, nesse 2008, a derrota de 1968 pesa ainda poderosamente sobre a vida nacional. Aquelas jornadas memoráveis são cada vez mais lembradas para, ainda com nostalgia condescendente, assinalar os muitos erros, os inúmeros enganos, para sugerir que jamais se devia ter combatido, que a batalha fora perdida de antemão – como é o caso de Zuenir Ventura, em seu best-seller ‘1968: o ano que não terminou’.

Neste 2008, permanece singularmente pertinente a concepção que sem "ousar lutar" não é possível vencer e que não há pior derrota que a sofrida sem combate. As jornadas de 1968, no Brasil e no mundo, não constituem simples sucessos históricos a serem narrados. Passados quarenta anos, 1968 permanece como esfinge enigmática, exigindo que sejam desvelados seus complexos sentidos. Como poderoso farol, segue ainda indicando, mesmo muito longe, no horizonte, o caminho seguro a ser seguido.

Mário Maestri é doutor em História pela UCL, Bélgica. É professor do curso e do programa de pós-graduação em História da UPF. Esteve preso, em 1968, quando estudante, e viveu, como refugiado, no Chile e na Bélgica, de 1971 a 1977.

E-mail: maestri@via-rs.net



Isso você não vê na Globo, nem na Veja...

CONTRA A VIOLÊNCIA DE ESTADO

Mais de 200 mil marcham contra Uribe na Colômbia

Em repudio às matanças perpetradas pelos paramilitares, milhares de colombianos protestaram contra o governo de Álvaro Uribe. Multidão chamou presidente de "lacaio imperialista". Jovens enfrentaram a polícia no fim do protesto. Pelo menos dez ficaram feridos.

BOGOTÁ - Como um rio furioso cujas águas tivessem estado represadas por anos, a maior multidão vista nos últimos tempos saiu às ruas de 21 cidades colombianas, no dia 6 de maço, para render tributo às vítimas dos paramilitares e de crimes de Estado.

Nesta capital, pelo menos 200 mil pessoas caminharam pela central Carrera Séptima rumo à Praça de Bolívar, que ficou cheia pelo menos três vezes ao longo de quase cinco horas, durante as quais os manifestantes lançaram duras críticas ao governo do presidente Álvaro Uribe.

As marchas que tinham sido qualificadas por altos funcionários governamentais como “de apoio à guerrilha”, foram uma verdadeira avalanche humana em que a maioria dos manifestantes acusou Uribe de ser aliado dos grupos paramilitares de extrema direita.

“Vamos à rua, derrubar o governo paramilitar”, gritavam centenas de estudantes da Universidade Nacional, enquanto milhares de trabalhadores de empresas estatais acusavam o mandatário colombiano de “fascista, lacaio imperialista”.

Organizadas pelo Movimento Nacional de Vítimas dos Crimes de Estado, as marchas tomaram um rumo inesperado quando os participantes se pronunciaram sobre os mais recentes acontecimentos políticos, incluída a crise diplomática com o Equador e a Venezuela. Inclusive, numerosos manifestantes marcharam ao grito de “Chávez sim, Uribe não”, no meio dos aplausos do grande público que se lotava cada lado da principal avenida da capital colombiana.

Jaime Caicedo, vereador de Bogotá pelo Pólo Democrático (esquerda) disse para La Jornada que a massiva mobilização era uma contundente resposta à idéia vendida pela mídia de que Uribe conta com o apoio majoritário dos colombianos. “Parece que os pesquisadores nunca perguntaram a opinião destas centenas de milhares de colombianos”, ironizou.

No cair da tarde, quando a manifestação na Praça de Bolívar já estava se dissolvendo, centenas de jovens tiveram um enfrentamento com a polícia, que literalmente tinha ocupado o centro da cidade. Os fatos derivaram para uma verdadeira batalha campal que deixou um saldo de pelo menos 10 feridos, vultosos danos em locais bancários e comerciais, e um número indeterminado de detidos.

Um dos organizadores da homenagem às vítimas, Iván Cepeda, filho do senador comunista Manuel Cepeda, assassinado em 1992, confessou para este correspondente que a magnitude da marcha superou suas expectativas e explicou que participaram, além de órfãos e viuvas, milhares de camponeses expulsos de suas terras pelas ações dos grupos paramilitares.

De acordo com cifras de organismos especializados, mais de quatro milhões de pessoas foram vítimas do êxodo forçado após centenas de massacres perpetrados pelos paramilitares. Atualmente, mais de 60 congressistas que apoiaram a eleição de Uribe estão presos ou são investigados por seus vínculos com os esquadrões da morte.

Cepeda acrescentou que também houve homenagens às vítimas dos paramilitares e dos crimes de estado em 150 cidades dos cinco continentes.

La Jornada entrevistou, também, um grupo de jovens associados ao movimento “Filhos e Filhas”. Alejandra Gaviria, cujo pai foi assassinado no início dos anos 80 na cidade de Medellín, disse que não permitirá que este crime seja esquecido. Explicou que até agora o assassinato de seu pai está impune. “Por isso, um dos nossos lemas é: nem perdão nem esquecimento, castigo para os assassinos”.

Também foram destaque nas marchas a grande quantidade de coloridas expressões culturais: pequenas representações da violência, música e dança.

Tradução: Naila Freitas / Verso Tradutores

segunda-feira, 10 de março de 2008

Tim Maia & os cariocas - amigo do rei


Créditos:SomBarato


1.Ter Você É Ter Razão
2.Essa Tal Felicidade
3.Ela É Carioca
4.Lindeza
5.Amigo Do Rei
6.Não Quero Dinheiro, Só Quero Amar
7.Telefone
8.Samba Do Avião
9.Azul Da Cor Do Mar
10.Valsa De Uma Cidade

*contribuição de Paulo Eduardo

"Mate 100 turcos, e descanse…"

Uri Avnery**

Lembrei-me, esta semana, daquela velha história de uma mãe judia, separando-se do filho convocado para servir o exército do czar contra os turcos.

“Não exija demais de você mesmo”, aconselhava ela ao filho. “Mate um turco, e descanse. Mate outro turco, e descanse outra vez…”

“Mas, mamãe”, diz o filho, “E se o turco me matar?”

“Matar você?”, ela grita, indignada. “Por quê? Que mal você fez a ele?!”

Não é piada (e esta não é semana para piadas). Aí está uma lição de psicologia. Lembrei-me dela, ao ler que Ehud Olmert declarou que o que mais o enfureceu foi a explosão de alegria em Gaza, depois do ataque em Jerusalém, no qual foram mortos oito estudantes yeshiva.

Antes disto, semana passada, o exército de Israel matara 120 palestinos na Faixa de Gaza, metade dos quais civis, além de dúzias de crianças. Não foi “mate um turco, e descanse”. Foi “mate 120 turcos, e descanse”. Isto, Olmert não entende.

A GUERRA DOS CINCO DIAS em Gaza (como disse o líder do Hamás) foi mais um curto capítulo da luta entre israelenses e palestinos. Este monstro sanguinário nunca está satisfeito. Quanto mais come, mais sente fome.

Este capítulo começou com o “assassinato seletivo” de cinco altos militantes, dentro da Faixa de Gaza. A “resposta” foi uma chuva de foguetes e, desta vez, não só sobre Sderot, mas também sobre Ashkelon e Netivot. A “resposta” à “resposta” foi a incursão pelo exército de Israel e a matança.

O objetivo declarado foi, como sempre, fazer parar os foguetes. O meio: matar o maior número possível de palestinos, para dar-lhes uma lição. A decisão baseou-se num tradicional conceito vigente entre os israelenses: mate civis, mate e mate, até que os líderes caiam. Cem vezes Israel já tentou esta “solução”; cem vezes fracassou.

Como se faltasse algum exemplo da loucura dos que divulgam este conceito, lá estava, na televisão, o ex-general Matan Vilnai, para “declarar” que os palestinos “trazem a Shoah para eles mesmos”.

A palavra Shoah, em hebraico, só significa uma coisa, em todo o mundo, e só uma: é o holocausto dos judeus, pelos nazistas. A fala de Vilnai incendiou o mundo árabe e provocou uma onda de choque. Também eu recebi dúzias de telefonemas e mensagens de e-mail, de todo o mundo. Como convencer as pessoas de que, no hebraico coloquial, na fala diária, Shoah significa “apenas” uma catástrofe, um grande desastre, e que o General Vilnai, que já foi candidato a presidente, nunca foi o mais inteligente dos homens?

Há alguns anos, o presidente Bush convocou uma “Cruzada” contra o terrorismo. Não sabia que, para centenas de milhões de árabes, a palavra “cruzada” evoca um dos maiores crimes jamais perpetrados na história humana, o horrendo massacre de muçulmanos (e judeus) pelos primeiros “cruzados”, nas vielas de Jerusalém. Um concurso de inteligência, entre Bush e Vilnai, provavelmente, acabaria empatado.

VILNAI NÃO ENTENDE o que significa a palavra “Shoah”, para os diferentes dele; e Olmert não entende por que houve júbilo em Gaza depois do ataque à escola yeshiva, em Jerusalém. Sábios como estes dois dirigem o Estado, o governo e o exército. Sábios como estes dois controlam a opinião pública, porque controlam a mídia. O que há de comum entre todos estes sábios: a mesma insensibilidade, a mesma cegueira, que os impede de ver o que sentem os não-judeus, os não-israelenses. Desta cegueira nasce a incapacidade para entender a psicologia do outro lado; e, depois, tampouco entendem as conseqüências de suas palavras e atos.

A mesma cegueira explica a incapacidade para entender por que o Hamás declarou-se vitorioso na Guerra dos Cinco Dias. Que vitória? Feitas as contas, morreram só dois soldados e um civil israelenses, e foram mortos 120 palestinos, combatentes e civis.

Mas a batalha travou-se entre um dos mais poderosos exércitos do mundo, equipado com o armamento mais moderno que há no planeta, contra umas poucas centenas de combatentes de milícias, com armamento primitivo. A retirada – e este tipo de combate sempre termina em retirada – sempre é uma vitória para o lado mais fraco. Aconteceu na Segunda Guerra do Líbano e aconteceu na Guerra de Gaza.

(Binyamin Netanyahu é autor de uma das “declarações” mais estúpidas da semana; exigiu que o exército de Israel “esqueça os movimentos de atrito e decida o combate”. Numa luta como esta, não há como decidir coisa alguma.)

O resultado real deste tipo de operação não se manifesta em números, em quantidades: tantos mortos, tantos feridos, tais e tais prédios destruídos. O resultado, aí, só tem expressão psicológica, resultados que não podem ser medidos e, portanto, são incompreensíveis para cabeças de generais: quanto ódio acrescentou-se ao ódio existente, quantos novos homens-bomba surgiram, quantos mais juraram vingança e converteram-se em bombas vivas – como o jovem de Jerusalém que acordou uma manhã, esta semana, arranjou uma arma, andou até a escola Mercaz Harav yeshiva, aquele ninho de onde nascem todas as colônias e “assentamentos”, e matou a maior quantidade de israelenses que conseguiu matar.

Agora, as lideranças políticas e militares de Israel reúnem-se para discutir o que fazer, como “responder”. Não tiveram nem terão qualquer idéia nova, porque políticos e generais são incompetentes para gerar idéias novas. Só sabem repetir as idéias de sempre, o que já fizeram centenas de vezes, e fracassaram centenas de vezes e fracassarão sempre.

O PRIMEIRO PASSO para sair deste círculo de loucura é começar a questionar os conceitos e métodos que Israel tem usado nos últimos 60 anos. E recomeçar a pensar, do começo, desde o início.

Isto sempre é muito difícil. E é ainda mais difícil para Israel, porque as lideranças em Israel não têm liberdade para pensar – o pensamento, em Israel, está sempre amarrado ao que pensem os líderes norte-americanos.

Esta semana, foi publicado um documento chocante: o artigo de David Rose em Vanity Fair. Ali está contado como, nos últimos anos, funcionários dos EUA têm ditado cada passo de lideranças palestinas, nos mínimos detalhes. Embora o artigo não toque nas relações EUA-Israel (uma omissão que, de fato, é surpreendente) sabe-se, mesmo que não se leia, que a ação norte-americana, nos mínimos detalhes, é coordenada com o governo de Israel.

Por que chocante? Em termos gerais, não há novidades, no artigo: (a) os norte-americanos mandaram que Mahmoud Abbas mantivesse as eleições parlamentares, para que Bush aparecesse como aquele que levou a democracia ao Oriente Médio. (b) O Hamás foi eleito – o que não se esperava que acontecesse. (c) Os americanos impuseram um boicote aos palestinos, para ‘desconstruir’ o resultado das eleições. (d) Abbas afastou-se um passo da política que lhe foi ordenada, sob auspícios (e pressão) da Arábia Saudita; e fez um acordo como o Hamás. (e) Os americanos cortaram-lhe as asas e obrigaram Abbas a entregar todos os serviços de segurança a Muhammad Dahlan, escolhido pelos norte-americanos para o papel de homem-forte na Palestina. (f) Os americanos deram armas e dinheiro a Dahlan, treinaram seus homens e ordenaram que criasse um golpe militar contra o Hamás na Faixa de Gaza. (g) O governo eleito do Hamás abortou o movimento e respondeu, o próprio Hamás, com um contra-golpe armado.

Até aí não há novidades. Tudo isto já era sabido. A novidade é que esta mistura de noticiário, boatos e apostas inteligentes apareça condensada em relatório bem-informado, formulado a partir de documentos oficiais dos EUA. É prova da abissal ignorância dos EUA, só comparável à abissal ignorância de Israel, quanto aos processos internos da Palestina.

George Bush, Condoleezza Rice, o neoconservador sionista Elliott Abrams e os generais norte-americanos, que nada sabem sobre coisa alguma, competem com Ehud Olmert, Tzipi Livni, Ehud Barak e com os generais israelenses, que sabem, sobre a Palestina, o que caiba do fundo à ponta dos canhões de seus tanques.

Os norte-americanos, enquanto isto, já destruíram Dahlan porque o expuseram como seu agente, na linha do “é um filho-de-puta, mas é o nosso filho-de-puta”. Esta semana, além do mais, Condoleezza detonou um golpe mortal contra Abbas. Ele anunciou, de manhã cedo, que estava suspendendo as negociações (tempo perdido) de paz com Israel – o mínimo que podia fazer, depois das atrocidades que o exército de Israel cometeu em Gaza. Rice, que soube disto quando tomava café da manhã na estimulante companhia de Livni, imediatamente convocou Abbas e ordenou que desdissesse o que acabava de dizer. Abbas obedeceu e expôs-se, ele mesmo, nu em pêlo, ao seu próprio povo.


A LÓGICA não foi dada ao povo de Israel no Monte Sinai. Mas, sim, foi dada no Monte Olimpo, aos antigos gregos. Apesar desta dificuldade local, tentemos aplicar aqui, alguma lógica.

O que o governo de Israel está tentando conseguir, em Gaza? Quer derrubar o Hamás (e, marginalmente, também quer que parem os foguetes e morteiros contra Israel).

Israel já tentou obter o que quer mediante um bloqueio total contra a população palestina, na esperança de que, assim, a população levantar-se-ia contra o Hamás. O plano falhou. O “plano B” seria reocupar toda a Faixa de Gaza. Mas isto custará um alto preço em vidas de soldados, preço mais alto, talvez, do que a opinião pública em Israel está disposta a pagar. Além disto, de nada adiantará, porque o Hamás reaparecerá no momento em que as tropas de Israel se retirarem. (Mao Tse Tung ensinava, como primeira lição na guerra de guerrilhas: “Se o inimigo avança, retrocede. Se o inimigo retrocede, avança.")

O único resultado da Guerra dos Cinco Dias foi o fortalecimento do Hamás e o aumento do apoio que recebe do povo palestino – não só na Faixa de Gaza, mas na Cisjordânia e também em Jerusalém. O Hamás tinha, sim, o que celebrar, naquela festa da vitória. Os foguetes não pararam. E aumentaram a capacidade de fogo e o alcance.

Mas suponhamos que a política de Israel tivesse dado certo e que o Hamás tivesse sido derrotado. E daí? Abbas e Dahlan não podem voltar sobre a cabine dos tanques israelenses como sublocatários da ocupação. Nenhuma empresa de seguros de vida os aceitará como segurados. E, se não voltarem, será o caos, do qual emergirão forças tão extremistas que, hoje, ainda nem as podemos imaginar.

Conclusão: o Hamás está lá. Não pode ser ignorado. Temos de construir um cessar-fogo com o Hamás. Não a partir de uma oferta ridícula, do tipo “se eles pararem primeiro, nós paramos depois”. Cessar-fogo, como o tango, precisa de dois. É preciso que haja um acordo prévio e detalhado que inclua a cessação de todas as hostilidades, armadas e outras, em todos os territórios.

Nenhum cessar-fogo será efetivo se não houver negociações, conversações, que têm de começar logo, e que levem a um armistício de longo prazo (a “hudna”) e à paz. Estas negociações não podem acontecer com o Fatah, e sem o Hamás; nem com o Hamás, e sem o Fatah. Portanto, é preciso que se construa um governo palestino em que se reúnam os dois movimentos. É preciso convocar personalidades que gozam da confiança de todo o povo palestino; Marwan Barghouti, por exemplo.

Não há uma única voz, nem entre as lideranças em Israel nem entre as lideranças nos EUA que se atreva a declará-lo abertamente. Mas esta política é precisamente o avesso, o contrário, da política em curso, pensada por EUA-Israel, e que proíbe até que Abbas converse com o Hamás. Portanto, continuaremos a ver o que temos visto.

Mataremos 100 turcos, e descansaremos. E, vez ou outra, algum turco nos matará, alguns de nós.

Por quê, pelo amor de deus?! Que mal Israel fez a eles?!


**Uri Avnery,85 anos, é membro fundador do Gush Shalom (Bloco da Paz israelense). Adolescente, Avnery foi combatente no Irgun e mais tarde soldado no exército israelita. Foi três vezes deputado no Knesset (parlamento). Foi o primeiro israelense a estabelecer contato com a liderança da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) em 1974. Foi durante quarenta anos editor-chefe da revista noticiosa Ha'olam Haze. É autor de numerosos livros sobre a ocupação israelense da Palestina, incluindo My Friend, the Enemy (Meu amigo, o inimigo) e Two People, Two States (Dois povos, dois Estados).


* URI AVNERY, 8/3/2008, "Kill a hundred Turks and rest…", na página de Gush Shalom [Grupo da Paz], em http://zope.gush-shalom.org/home/en/channels/avnery/1205012429/

Brasil, 1968 (2): o assalto ao Céu, a descida ao Inferno

Mário Maestri - CorreioDaCidadania




A cultura é do povo



A explosão de criatividade invadiu as artes, sobretudo a música, o teatro, o cinema, a produção editorial nacionais. Uma estética radical de raízes tupiniquins garantia momentos de glória ao cinema nacional. Nélson Pereira dos Santos filmara o clássico "Vidas Secas", em 1963, e Anselmo Duarte conquistara Cannes com o "Pagador de Promessas", de 1962. O quase menino Glauber Rocha dirigira "Terra em Transe", em 1967, e concluiria, em 1969, "O dragão da maldade contra o santo guerreiro". Filmaria a grande mobilização carioca de 1968 para projeto cinematográfico jamais concretizado. Bertolt Brecht era uma constante nos teatros nacionais com "Os fuzis da senhora Carrar", "Galileu Galilei", "A ópera dos três vinténs", "Mãe coragem e seus filhos". A dramaturgia nacional plantava raízes próprias com "Liberdade, liberdade" e "Arena conta Zumbi", de 1965; "Arena conta Tiradentes", de 1967; e com encenações explosivas como "Roda-viva", de 1968, objeto de ataques de grupos paramilitares direitistas.



Em um país de poucos leitores, com a televisão ainda engatinhando, o combate cultural enfuriava quando se tratava da música popular. Apenas parcialmente inconscientes do papel que cumpriam, Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Vanderléia e a turma da "Jovem Guarda" pregavam a despolitização e só pediam "que você me aqueça nesse inverno e que tudo mais vá para o inferno". A esquerda dominava totalmente o campo, com uma seleção que só aceitava craques: Caetano, Chico, Elis Regina, Jair Rodrigues, Gilberto Gil, Geraldo Vandré, Vinícius de Morais etc. Quando dos festivais da canção, a disputa politizada transformava-se em uma quase batalha campal.



Através da música, debatiam-se os projetos para o futuro do país. Em uma época sem cerimônias, iconoclasta, o público levantava-se contra os monstros sagrados que construía caso ousassem sair da linha, ou do que se pensava que fosse a linha. Em 28 de março de 1968, três dias antes do quarto aniversário do golpe, as polícias militares do Exército e da Aeronáutica invadem o restaurante do Calabouço, no Rio de Janeiro, e disparam à queima-roupa contra os estudantes, matando Édison Luís de Lima Souto, de 18 anos. No dia seguinte, sexta-feira, a antiga capital da República pára para que sessenta mil populares acompanhem a despedida ao secundarista. A resposta é violenta. Por diversos dias, a cidade tornou-se campo de acirrada batalha. De um lado, estudantes e populares. Do outro, polícia e exército. Universitários, secundaristas e populares são mortos. Ao deslocarem-se pelas ruas do Centro, os soldados protegem-se debaixo das marquises dos objetos atirados desde os edifícios. Um policial militar, a cavalo, morre ao receber na cabeça um pesado balde, ainda carregando cimento fresco, lançado desde um edifício em construção.



Cem mil contra a ditadura



A agitação estudantil alastra-se pelo Brasil, com manifestações nas principais capitais. Na quarta-feira, 26 de junho, o movimento alcança seu ápice. No Rio de Janeiro, cem mil manifestantes concentram-se na Cinelândia e desfilam pelo Centro, em uma demonstração permitida pelo governo. Cinqüenta mil pessoas protestam nas ruas de Recife. As grandes manifestações alcançam efeito inesperado. Dias mais tarde, uma comissão da "Passeata dos Cem Mil", do Rio de Janeiro, é recebida em Brasília pelo ditador Costa e Silva. Entre os membros da delegação, encontra-se um representante da UNE, entidade colocada na ilegalidade imediatamente após o golpe. Entretanto, o encontro não tem conseqüências.



A mobilização operária levara a oposição sindical a planejar um amplo movimento grevista para o fim do ano, quando da data-base de importantes categorias. A explosão das manifestações de junho aceleraria a greve. Em 16 de julho, José Ibrahim, presidente do sindicato dos metalúrgicos de Osasco, de 20 anos, ligado à organização militarista VPR, põe-se à frente de uma paralisação da COBRASMA, com ocupação da empresa e aprisionamento dos funcionários graduados, à qual aderem dez mil trabalhadores de outras indústrias. O movimento exige reajuste de 35%, reposição salarial cada três meses e outras reivindicações. A ditadura militar responde violentamente. Centenas de trabalhadores são presos e despedidos. A COBRASMA é invadida. José Ibrahim mergulhou na clandestinidade, de onde partiria mais tarde para o Chile e a seguir para a Bélgica. Zequinha, dirigente operário da COBRASMA, é preso e torturado. Após cinco dias, a greve quebrava-se. Uma segunda paralisação, em Contagem (MG), em outubro, é reprimida com facilidade. A greve geral do fim do ano jamais seria tentada.



No país, decresce a mobilização. Em 12 de outubro, o movimento estudantil, espinha dorsal da oposição, recebe forte golpe. Subestimando a repressão, a direção da UNE reúne, para seu 30° Congresso em um sítio em Ibiúna, cidadezinha do interior de São Paulo, milhares de delegados de todo o país. A prisão dos participantes permite a detenção das direções e o mapeamento das lideranças estudantis do norte ao sul da nação. No mesmo dia em que caía o congresso de Ibiúna, era varado pelas balas de um comando militar da VPR, diante de sua residência em São Paulo, o capitão estadunidense Charles Chandler, funcionário da CIA, ‘estudando’ Sociologia no Brasil.



Os dois acontecimentos ilustravam a orientação que viveria a resistência nos anos seguintes. Ações armadas de grupos de corajosos jovens militantes, isolados socialmente, pretendendo substituir o movimento de massas em refluxo. Em 2 de outubro, na capital mexicana, na Praça das Três Culturas, de duzentos a trezentos estudantes e populares foram massacrados pelo exército e policiais durante concentração, dez dias antes do início dos Jogos Olímpicos, que se realizaram sem quaisquer pruridos morais.



Sobretudo de 1969 a 1973, organizações de esquerda militaristas, inspiradas no foquismo guevarista, lançariam ações espetaculares - assaltos a bancos, seqüestros de embaixadores e de aviões, execuções de torturadores, guerrilhas rurais etc. - sem que os trabalhadores urbanos e rurais aderissem à proposta de luta armada imediata, milhões de anos-luz longe de suas consciências, necessidades e capacidade de organização na época. Isoladas, as organizações seriam dizimadas, uma após a outra, pela repressão, que se estenderia igualmente aos militantes voltados para a organização dos trabalhadores e classes populares. Por esses anos, automóveis da nova classe média ascendente invadiam as ruas, portando o autocolante "Brasil: ame-o ou deixe-o", distribuído pela repressão, simples tradução da consigna direitista estadunidense "America love it or leave it".



Para ler o primeiro artigo da série, clique aqui. Ou acesse via http://www.correiocidadania.com.br/content/view/1497/47/



Mário Maestri édoutor em História pela UCL, Bélgica. É professor do curso e do programa de pós-Graduação em História da UPF. Esteve preso, em 1968, quando estudante, e viveu, como refugiado, no Chile e na Bélgica, de 1971 a 1977. E-mail: maestri@via-rs.netEste endereço de e-mail está protegido contra spam bots, pelo que o Javascript terá de estar activado para poder visualizar o endereço de email

domingo, 9 de março de 2008

Classe média

Vídeo de animação para a música "Classe média", do cantor brasileiro Max Gonzaga

Os negócios nebulosos do Grupo Abril