terça-feira, 19 de agosto de 2008

As três crises

Cada vez mais intensos, os solavancos das finanças mundiais podem provocar crise sistêmica, e depressão semelhante à de 1929. A esta derrocada estão entrelaçadas a escassez de alimentos e da alta dos combustíveis. Vivemos as conseqüências de 25 anos de neoliberalismo. Mas quando diremos basta?

Ignacio Ramonet

Nunca havia acontecido antes. Pela primeira vez na história da economia moderna, três crises de grande amplitude – financeira, energética e alimentar – estão em conjunção, confluindo e combinando-se. Cada uma delas interage sobre as demais, agravando, de modo exponencial, a deterioração da economia real.

Por mais que as autoridades se esforcem em minimizar a gravidade do momento, o certo é que nos encontramos diante de um sismo econômico de magnitude inédita, cujos efeitos sociais, que mal começaram a se fazer sentir, explodirão nos próximos meses com toda a brutalidade. A numerologia não é uma ciência exata e o pior não costuma ser previsto, mas 2009 pode muito bem se parecer com o nefasto ano de 1929...

Como temíamos, a crise financeira continua aprofundando-se. Aos descalabros de prestigiosos bancos norte-americanos, como o Bear Stearns, o Merrill lynch e o gigante Citigroup, somou-se o recente desastre do lehman Brothers, quarto maior banco de negócios, que anunciou, em 9 de junho, um prejuízo trimestral de 2,8 bilhões de dólares. Como foi a primeira perda desde o lançamento de suas ações na Bolsa, em 1994, o resultado teve efeito de um terremoto financeiro, nos já violentamente traumatizados EUA.

A cada dia difundem-se notícias sobre novas quebras. Até agora, as entidades mais afetadas admitem prejuízos de quase 330 bilhões de dólares, e o Fundo Monetário Internacional estima que, para escapar da catástrofe, o sistema necessitará de cerca de 950 bilhões de dólares (o equivalente à metade do PIB do Brasil).

A crise começou nos Estados unidos, em agosto de 2007, com a desconfiança nas hipotecas de má qualidade (subprime) e propagou-se por todo o mundo. Sua capacidade de se transformar e se espraiar por meio da contaminação de complexos mecanismos financeiros faz com que se assemelhe a uma epidemia fulminante, impossível de controlar. As instituições bancárias já não emprestam dinheiro entre si. Todas desconfiam da saúde financeira de suas rivais.

Ao fugir dos mercados de ações e imóveis, os especuladores fazem apostas gigantescas em contratos para entrega futura de petróleo e alimentos. É a financeirização generalizada da produção capitalista

Apesar das injeções maciças de liquidez efetuadas pelos grandes bancos centrais, nunca se vira uma seca tão severa de dinheiro nos mercados. E agora o maior temor de alguns é uma crise sistêmica — ou seja, que o conjunto do sistema econômico mundial entre em colapso.

Da esfera financeira, o problema passou para o conjunto da atividade econômica. De um momento para outro, as economias dos países desenvolvidos sofreram um desaquecimento. A Europa encontra-se em franca desaceleração e os Estados Unidos estão à beira da recessão.

O setor imobiliário é onde melhor aparece a dureza desse ajuste. Durante o primeiro trimestre de 2008, o número de vendas de moradias na Espanha caiu 29%! Cerca de dois milhões de apartamentos e casas estão sem compradores. O preço das propriedades continua a desmoronar. O aumento dos juros hipotecários e os temores de uma recessão lançaram o setor numa espiral infernal, com ferozes efeitos em todas as frentes da imensa indústria da construção. Todas as empresas desses setores estão agora no olho do furacão. E assistem, impotentes, à destruição de dezenas de milhares de empregos.

Da crise financeira passamos à crise social. E políticas autoritárias voltaram a surgir. O Parlamento Europeu aprovou, em 18 de junho passado, a infame “diretiva retorno” [1]. Imediatamente, as autoridades espanholas declararam sua disposição em favorecer a saída da Espanha de um milhão de trabalhadores estrangeiros...

Em meio a essa situação de espanto, ocorre o terceiro choque do petróleo, com o preço do barril em torno de US$ 140. Um aumento irracional (há dez anos o barril custava menos de US$ 10) devido não apenas a uma demanda despropositada mas, especialmente, à ação de muitos especuladores, que apostam no aumento contínuo de um combustível em vias de extinção. Retirando-se da bolha imobiliária, que desinfla, os investidores alocam somas colossais em contratos para entrega futura de petróleo, o que pode levar o preço do barril a algo em torno de US$ 200. Ou seja: está ocorrendo uma “financeirizacão” do petróleo, com conseqüências como formidáveis aumentos de preços da gasolina, em muitos países, e a ira de pescadores, caminhoneiros, agricultores, taxistas e todos os profissionais mais afetados. Em muitos casos, eles exigem de seus governos ajudas, subsídios ou reduções dos impostos, com grandes manifestações e enfrentamentos.

Como se todo esse contexto não fosse bastante sombrio, a crise alimentar agravou-se repentinamente e chega para nos lembrar que o espectro da fome continua ameaçando quase um bilhão de pessoas. Em cerca de 40 países, a carência de alimentos provocou levantes e revoltas populares. A reunião de cúpula da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), foi incapaz, em 5 de junho, em Roma, de chegar a um consenso para retomar a produção de alimentos no mundo. Aqui também os especuladores, fugindo do desastre financeiro, têm parte de responsabilidade — porque apostam num preço elevado das futuras colheitas. Até mesmo a agricultura está se “financeirizando”.

Este é o saldo deplorável de 25 anos de neoliberalismo: três veneosas crises entrelaçadas. Já está na hora de os cidadãos gritarem: “Basta!”.



[1] "Europa se blinda ante los inmigrantes”, Sami Naïr, El País, Madri, 18 de junho de 2008.

Governos de LHS e Yeda Crusius: “Piso dos Professores é um Exagero”



Por Douglas Maçaneiro.

O Governo de SC, assim como o do RS, alega que o novo PISO Salarial Nacional do Magistério Público (Professores da Rede Pública Estadual e Municipal) “é muito alto”. O valor aprovado em julho, no valor de R$ 950,00, que deve ser implementado gradualmente até 2010, ainda não é um salário de respeito em se levando em conta os anos de congelamento e perdas de direitos laborais. Mas, se depender dos secretários do PSDB do RS e de SC, integrantes do CONSED (Conselho de Sec. De Estado e da Educação), este piso “é um exagero” e deverá ser derrubado no Supremo.

O salário base no Estado de SC, por exemplo, é de apenas R$ 509 – o quarto pior valor hora/aula do país, enquanto que a situação dos professores do Rio Grande do Sul é ainda pior. Além de perceberem um salário base menor que o mínimo, a Governadora Yeda Crucius, do PSDB/RS, que acaba de reajustar seu próprio salário em mais de 143% (por cento), entrou com uma Ação de Inconstitucionalidade alegando ser o Piso Salarial dos professores “um exagero” e pugnou pela autonomia dos Estados para estabelecer tabela de pagamentos de seus servidores.

Situação semelhante ocorre em Santa Catarina, onde o Governo LHS (PMDB/PSDB/DEM), esperneou e já articula planos para frustrar a aplicação da Lei Federal com mais ações judiciais, contra o Piso Nacional, intensificando os ataques contra o plano de carreira e a seguridade social dos Trabalhadores em Educação, como vem fazendo desde o início de sua magistratura. Se tiverem que aplicar o novo piso, certamente, o magistério não mais contará com o já diluído plano de carreira, um dos raros direitos que restaram ao magistério depois da privatização do fundo previdenciário em Junho/ 2008 (IPREV). Será, pelo visto, mais uma longa jornada para conseguir aplicar a nova Lei, e ainda, de forma que seja equiparada ao plano de carreira.

Os dois Estados possuem elevadíssimo crescimento econômico em comparação com a média nacional, ostentando posição entre os seis maiores em produção de riquezas, no país. Porém, ao contrário do que se poderia imaginar, o desempenho em relação ao PIB, não se reverte em melhorias da qualidade da educação pública, e continua entre as últimas posições. A ordem dos secretários de educação desses governos para as classes populares é mesmo o de formar mão de obra barata - nada além de corpos úteis e omissos!

O Piso de R$ 950,00, sancionado para os professores, já não é "aquela coisa", em se tratando dos anos de congelamento salarial, destruição progressiva do plano de carreira e "golpes do baú da previdência” (este último, iniciado pelo Governo Federal), anos de gastos com atendimentos médicos e remédios para tratar doenças adquiridas em ambientes de trabalho e os anos de gastos com formação, pesquisa e atualização. Mas, os secretários de Educação de alguns governos, reunidos no CONSED, acham que R$ 950,00 é muito para um professor ganhar. E os R$ 12.000,00, é pouco para um(a) governador(a)?

Estima-se que a nova Lei acarretaria um acréscimo de R$ 40 mi, a serem aplicados a mais na Educação catarinense, bem menos do que é gasto em publicidade enganosa do Governo catarinense (LHS a Um Voto da Cassação. Gazeta de Joinville. Disponível em: http://www.gazetadejoinville.com.br/geral_179-17.htm. Último acesso em 06.08.2008). E bem menos do que já foi desviado dos cofres públicos, durante a gestão de Yeda Crucius, no RS.

Como se vê, no Sul do país, o remédio para a Educação é a Eutanásia!

*Professor de História e bacharel em Direito.

The Anthology - 2008

The Anthology - 2008
Parte1 -..- Parte2
Parte3 -..- Parte4




Disco 1
1. Hymn of the Seventh Galaxy (Corea) – 3:31
2. After the Cosmic Rain (Clarke) – 8:25
3. Captain Señor Mouse (Corea) – 9:01
4. Theme to the Mothership (Corea) – 8:49
5. Space Circus, Pts. 1 & 2 (Corea) – 5:42
6. The Game Maker (Corea) – 6:46
7. Vulcan Worlds (Clarke) – 7:51
8. The Shadow of Lo (White) – 7:32
9. Beyond the Seventh Galaxy (Corea) – 3:13
10. Song to the Pharaoh Kings (Corea) – 14:21

Track 1 - 6: from Hymn of the Seventh Galaxy (1973, complete)
Track 7 - 10: from Where Have I Known You Before (1974)

Disco 2
1. Dayride (Clarke) – 3:25
2. Sofistifunk (White) – 3:51
3. No Mystery (Corea) – 6:10
4. Celebration Suite Part I & II (Corea) – 14:01
5. Medieval Overture (Corea) – 5:14
6. Sorceress (White) – 7:34
7. The Romantic Warrior (Corea) – 10:52
8. Majestic Dance (Di Meola) – 5:01
9. The Magician (Clarke) – 5:29
10. Duel of the Jester and the Tyrant Part I & II (Corea) – 11:26

Track 1 - 4: from No Mystery (1975)
Track 5 - 10: from Romantic Warrior (1976, complete)





* Chick Corea - Electric piano, Fender Rhodes, Acoustic piano, organ, Yamaha organ, Harpsichord,
Gongs, Hohner Clavinet, Synthesizers, Mini Moog, ARP Odyssey, Marimba, Polymoog

* Stanley Clarke - Electric bass, Fuzz, bass, Bell-tree, Hand bells, Yamaha organ, Chimes, Acoustic bass,
Alembic bass with Instant Flanger, Piccolo bass

* Al Di Meola - Electric guitar, Acoustic 12-string guitar, Acoustic guitar, Soprano guitar, Hand bells, Slide whistle

* Bill Connors - Electric and acoustic guitars

* Lenny White - Drums, Percussion, Congas, Bongos, Marimba, Timpani, Timbales, Hand bells,
Snare drum, Suspended cymbals, Alarm clock.

Créditos: LooloBLog

Ney Matogrosso - Vinte e Cinco (1997)



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segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Consumidores, uni-vos!

Há um truque banal no recém-lançado "manifesto" dos publicitários. Ao apresentar a propaganda como base da liberdade de expressão, ele despreza público e sociedade. Mas ignora os movimentos pela radicalização da democracia — que exigem, inclusive, um novo padrão de propaganda

Ivana Bentes


Custou, mas apareceu, o "manifesto" dos publicitários, que se dizem ameaçados pela tentativa de regulamentação da publicidade por parte dos órgãos de defesa do consumidor e da saúde pública.

A retórica e estratégia são conhecidas: qualquer tentativa do Estado de regular a mídia (seja a faixa etária indicativa de programas na TV, seja a veiculação de publicidade de cigarros, bebida alcoólica, gordura trans ou uma cota de filmes brasileiros na TV); qualquer movimento social que ameace os lucros exorbitantes da publicidade e a liberdade de empresa são considerados "censura" e "ataque a liberdade de expressão".

Em nova embalagem, a velha retórica. De forma grosseira, as emissoras de TV já tinham veiculado anúncio dizendo que o governo queria "tirar o direito do telespectador de escolher seus programas", diante da proposta em votação no Congresso de uma cota para conteúdo brasileiro nas TVs a cabo.

Como se os pacotes com enlatados e programas comprados pelas emissoras tivessem algum grau de "escolha" e participação do espectador, obrigado ainda a levar no pacotão que compra uma porcentagem de lixo cultural adicional.

Mas o manifesto dos publicitários vai mais longe. Faz uma inversão ainda mais espetacular ao esvaziar totalmente o lugar de poder (o zapping é um deles) que está nas mãos da audiência e do público. O verdadeiro "produto" que é "vendido" para os anunciantes a peso de ouro e que sequer é mencionado no texto.

Os publicitários escamoteiam que sociedade é quem produz valor simbólico e real. Conteúdos, opiniões, produtos, mídia — inclusive de graça e de forma colaborativa, com as novas formas de produção e difusão da cultura

O manifesto tenta nos convencer do contrário. Não, não somos nós — a audiência o espectador, o público e a sociedade — que sustentamos o mercado e a mídia e sim "a publicidade" em si. São eles, os mediadores, os publicitários, diz o manifesto, os verdadeiros protagonistas dessa história.

Transformados em arautos da democracia e da "livre expressão", os publicitários defendem no seu manifesto que "é a publicidade que viabiliza, do ponto de vista financeiro, a liberdade de imprensa e a difusão de cultura e entretenimento para toda a população. É a publicidade que torna possível a existência de milhares de jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão, assim como de outras expressões da mídia." (!!!)

Ou seja: para os publicitários, estamos num cenário em que os mediadores são os protagonistas todo-poderosos da sociedade! Para eles, é a publicidade o esteio da democracia (e não o contrário: a radicalização da democracia que vai democratizar inclusive a publicidade corporativa). Que vende quase qualquer coisa, que cria necessidades, fidelidades, hábitos e valores, estilos mais ou menos predadores... É essa publicidade que quer se "auto-regulamentar"?

Os publicitários escamoteiam que é o espectador, a audiência, o público, a sociedade que produz valor simbólico e real. Conteúdos, opiniões, produtos, mídia — inclusive de graça e de forma colaborativa, hoje, com as novas formas de produção e difusão da cultura livre pós-internet. Produtos que, aliás, podem ser acessados diretamente, sem a mediação da publicidade tradicional.

A campanha sequer cogita os movimentos que exigem saber a origem da mão-de-obra dos produtos, a forma da produção, o caráter transgênico ou não. Ou seja: liberdade de sabermos o que ingerimos, vestimos, lemos, consumimos

O manifesto dos publicitários não discute o que poderia ser uma publicidade democrática ou com objetivos "públicos" e não simplesmente predadora ou visando o lucro imediato. Sequer cogita a emergência de uma série de movimentos e ativistas, que batalham no campo do consumo. Exigindo rótulos explicativos e indicativos dos venenos que ingerimos e que a publicidade vende sob um lindo design e letras miúdas.

Movimentos que exigem saber a origem da mão-de-obra de certos produtos, a forma de produção, a origem natural ou modificada, transgênica ou não, com ou sem agrotóxicos, etc. Ou seja: a liberdade de sabermos o que afinal ingerimos, calçamos, vestimos, lemos, vemos, consumimos.

Movimentos que mostram que o preço embutido da publicidade encarece os produtos de forma exorbitante! O que também não é dito no manifesto, ou seja, que somos nós que pagamos a própria publicidade que consumimos.

Incutindo o medo. Com décadas de atraso em relação a outros países, e apesar do lobby poderoso, a propaganda de cigarros foi proibida na mídia brasileira. O que não levou à falência nem as emissoras de TV e jornais, nem as fábricas de cigarros (que passaram a apoiar festivas de música e produtos culturais).

O fim da propaganda de cigarro também não levou a uma diminuição da "liberdade de expressão" de ninguém. Quem quer fuma, mas diminuiu-se, sim, os riscos de câncer de pulmão em nível planetário.

Ninguém deixará de tomar sua bebida alcoólica. Mas o consumo será balizado por outras forças, que não simplesmente o bombardeamento diário da publicidade ostensiva e reiterativa

Agora, a batalha é proibir a publicidade de bebidas alcoólicas, sendo o alcoolismo uma epidemia de ricos e pobres, no Brasil. Ninguém deixará de tomar sua cerveja, cachaça, vinho, whisky, o que for. Mas, sem dúvida, o consumo será balizado por outras forças, que não simplesmente o bombardeamento diário da publicidade ostensiva e reiterativa.

Ao tentarem neutralizar a força do consumidor e se colocarem na "origem" da liberdade de expressão e como fonte primordial de sustentação da mídia democrática, os publicitários fazem uma peça de marketing ruim e corporativa, distorcida.

Esquecem, que o telespectador e a audiência, o público, o "prossumidor" (o consumidor que se tornou produtor e publicista) está mobilizado e é a nova forca de transformação no capitalismo midiático e imaterial.

A Mídia somos nós, a liberdade de expressão não tem nada a ver com propaganda de cerveja ou de gordura trans! Mesmo parados diante da TV estamos trabalhando para a audiência. O poder de consumo, de produção, criação e difusão está em toda a sociedade. É a sociedade que deve ser empoderada! Ao invés da defesa incondicional da "perenidade" do mercado publicitário, principalmente num capitalismo da abundância e da emergência da economia da gratuidade.

Precisamos de uma nova publicidade: de democratização, colaborativa e feita pelo próprio consumidor. O que falta são mais movimentos de consumidores e telespectadores — para exigir, opinar, protestar e pressionar

O estágio atual é de politização do consumo! Não precisamos de manifesto de publicitários defendendo sua corporação e propondo "adequar" os cursos de Comunicação a suas exigências, adestrando os jovens a um complexo industrial/publicitário em crise. Precisamos de uma nova publicidade, de democratização, colaborativa e feita pelo próprio consumidor.

O que falta são mais movimentos de consumidores, de telespectadores que pudessem exigir, opinar, protestar e pressionar os fabricantes de produtos e os publicitários. Algo que o anonimato e a impessoalidade da audiência não estimulam.

Como dar credibilidade a um manifesto que apaga o consumidor como fonte de poder e valor e coloca no seu lugar...os publicitários. Ou que demoniza o Estado, que quer regular e restringir certas propagandas?

O Manifesto dos Publicitários torna-se uma jogada de marketing ruim, pois:

Para os publicitários, não existe comunicação sem publicidade!

Para os publicitários, a proibição de anunciar bebida alcoólica vai levar a mídia a falência!

Para os publicitários, sem a publicidade não existe "liberdade de expressão"!

Para os publicitários, para não "desaquecer" o mercado não se pode intervir nem restringir certos anúncios, como o de "bebidas alcoólicas, remédios, alimentos, refrigerantes, automóveis, produtos para crianças, entre outras".

Um Civita e um Marinho, com seus ternos cinzas, vozes monocórdias e rostos descansados, adentraram a nossa casa, pela concessão pública que lhes demos, para fazer sua própria publicidade e anunciar essa estranha contrafação

Seria o equivalente a dizer que para não "desaquecer" o mercado de drogas não se pode intervir no sistema de venda, de tráfico de armas e de corrupção existente. Pois esse é um mercado aquecidíssimo e que movimenta zilhões, sem publicidade!

"Seria demais pedir a um anunciante que proponha o desestímulo ao consumo", nas palavras de Gilberto Leifert, presidente do Conar, ao vender o texto — ou, melhor, a publicidade dos publicitários. Perfeito, é essa a lógica do Manifesto!

"O objetivo central é sempre o fortalecimento da indústria da comunicação", completa o texto, ou seja, a manutenção de um mercado publicitário "perene" a qualquer custo. A mesma lógica "desenvolvimentista" que ainda é dominante na política, apesar de ultrapassada e discutível.

Os publicitários querem criar uma confusão entre as liberdades individuais, o "risco escolhido" (consumir, viver e morrer, ter prazer fumando cigarro, ingerindo gordura trans, bebendo ou usando drogas leves e pesadas, por vontade própria), a "liberdade de expressão" (que tem a ver com a possibilidade da pluralidade e da autonomia). Capturam a defesa legítima dessas liberdades com a sua defesa de "liberdade comercial", mesmo que essa liberdade das empresas afronte a saúde pública e a construção do comum.

É muito preocupante que os publicitários transformem a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e o Congresso em inimigos públicos número um de sua categoria! Ou seja, o que está sendo descartado são as questões de saúde pública! E a construção do interesse "comum".

Estranhamente os publicitários não falam em democratizar as verbas públicas destinadas as suas empresas e que são repartidas entre uns poucos veículos de comunicação. Essa repartição pouco democrática do bolo nem sequer é mencionada. Ou seja, o Estado só incomoda quando quer regular para todos, não quando privilegia poucos.

O manifesto dos publicitários que ganhou ampla repercussão na própria TV, em horário nobre, teve dois garotos-propaganda de peso. Um Civita e um Marinho, donos de corporações de mídia e TV, com seus ternos cinzas, voz monocórdia e rosto descansado, adentraram a nossa casa, pela concessão pública que lhes demos, para fazer a sua própria publicidade e anunciar essa estranha contrafação.

domingo, 17 de agosto de 2008


Os futuros domínios da mente


Flávio Gikovate


1. A psiquiatria é uma especialidade médica que faz fronteira com a neurologia, por um lado, e com a filosofia, por outro. Estivemos muito ocupados com seu conteúdo intrínseco, qual seja, o dos conflitos derivados de eventuais experiências traumáticas individuais, uma vez que a psicanálise foi o grande evento do século XX. Além de nos alertar para os dilemas pessoais, trouxe para o domínio da ciência algumas das grandes questões humanas, tais como o significado dos sonhos e a existência do inconsciente, os inexoráveis conflitos entre pais e filhos, a sexualidade e os problemas derivados da necessidade de repressão deste impulso para a viabilização da vida em sociedade, etc.

Creio que estamos chegando perto do fim deste tipo de reflexão sobre nossa condição. Penso que os grandes conflitos existenciais, sempre tratados pela filosofia, tomarão vulto enorme, uma vez que nossos conflitos são ínfimos diante de temas como o do medo da morte, a insignificância cósmica da condição humana, o desamparo físico e metafísico que nos envolve, etc. A reflexão filosófica passará a ser o centro, enquanto que os eventuais conflitos individuais serão a periferia daquilo que será analisado em nossa subjetividade. Exatamente o oposto do que fazemos hoje.
Por outro lado, os avanços da neurofisiologia e da farmacologia daí derivada nos trarão importantes reforços terapêuticos de natureza essencialmente orgânica. Não só os quadros depressivos e ansiosos poderão ser combatidos com eficiência crescente, mas também distúrbios de natureza alucinatória, delirante, e mesmo aqueles relacionados com a idade - entre os quais ressalta o prejuízo da memória. Cirurgias cerebrais para tratamento de sintomas específicos, relacionados não só com a epilepsia, serão realizadas com freqüência crescente. Ou seja, boa parte daquilo que hoje constitui a psiquiatria se bandeará na direção da neurologia.
Não é o caso, porém, de superdimensionarmos estes dados de previsão. O grande mistério de como as células cerebrais são capazes de gerar isto que chamamos de pensamento ainda continuará sem desvendamento. A hipótese de que algo de imaterial - a alma - tenha nos penetrado e se exerça através do sistema nervoso continuará a ser aventada, pois é mais ou menos assim que nos percebemos: portadores de uma lado material e outro, o da mente pensante, que parece totalmente separado do corpo.

2. Este setor aparentemente não material da nossa atividade cerebral, aquele que se compõe de percepções externas e internas que alimentam o pensamento, o raciocínio e a lógica, continuará a ser muito importante. Duas modificações são previsíveis: a primeira será no sentido de aprimoramento do rigor lógico, hoje muito descuidado. Isto é grave, pois tem gerado equívocos inadmissíveis causadores de grandes sofrimentos. Quando pensamos mal concluímos de modo errado e somos incapazes de levar adiante nossos projetos de vida. A eles se transferem nossos equívocos racionais.

A outra modificação consistirá na crescente importância que assumirão os chamados fenômenos paranormais. Telepatia, premonição, materialização estão entre os processos psíquicos que indiscutivelmente existem, mas que não temos a menor idéia dos ingredientes nele contidos. Não creio que saberemos muito sobre eles nas próximas décadas. Porém, conseguiremos nos livrar dessa forma simplista de pensar, que é a de que só existem as coisas cuja explicação fomos capazes de nos apropriar. Assim sendo, conviveremos com estes fenômenos, que serão parte integrante de nossa vida cotidiana. Poderemos nos treinar para a comunicação telepática com aquelas pessoas que nos interessem, poderemos mudar objetos de lugar através da força do pensamento, poderemos levar mais a sério nossas previsões acerca do futuro. Tudo isto gerará novos e imprevisíveis avanços e trará também novas dores, novas disputas e talvez um novo tipo de poder; isto porque os "dons" paranormais não serão iguais entre os humanos.

3. Nossa mente será povoada com lembranças de situações que efetivamente vivenciamos, com pensamentos lógicos que fomos capazes de construir e também com dados que nos chegaram pela via telepática. Chegarão vindos de outras mentes. Poderão ser mentes iguais às nossas. Mas poderão ser de seres que habitam outros planetas em outros sistemas estelares. É muito provável que existam seres extraterrenos e que venhamos a nos comunicar com eles em breve; e talvez isto se dê exatamente pela via telepática.

Da mesma forma, não é impossível que sejamos capazes de nos comunicar com eventuais espíritos que porventura nos rodeiam. Não será fácil distinguir entre o que seja imaginação, telepatia com terrenos, telepatia com extraterrenos e telepatia com eventuais espíritos. É bem provável que o pensamento religioso sofra enormes modificações, de modo que serão pouco convincentes os textos místicos tradicionais. Deverão surgir novas doutrinas, que atrairão as grandes multidões. Elas estarão cada vez mais disponíveis para isso, uma vez que os novos processos psíquicos de natureza paranormal nos darão a impressão de estarmos, de novo, cercados por brutais mistérios e rodeados de magia e de espiritualidade.

4. O reacender desta visão mágica e mística da vida trará consigo várias conseqüências. Uma delas será o fim da idéia de que o pensamento lógico é o único meio de chegarmos ao conhecimento - e este tipo de pensar, quando exercido será, como disse, mais rigoroso. Estará sendo reforçado o pensamento do tipo indutivo, mais rico e criativo do que a dedução. As artes florescerão depois de um longo período de aridez que já está em curso.

Em decorrência deste tipo de visão mais religiosa da vida - e também em conseqüência dos processos ligados aos limites energéticos e ecológicos do planeta - nossa tendência materialista atual sofrerá radical reversão. As pessoas se aperceberão, de modo definitivo, que os bens materiais para além dos indispensáveis não são capazes de trazer os benefícios sugeridos. A corrida consumista acabará. Ser muito apegado aos bens materiais voltará a ser visto como coisa fútil e menor. É provável que uma visão mais clara das questões metafísicas e religiosas trará aos nossos espíritos um certo tipo de alívio e serenidade que desconhecemos.
Desta forma, o trabalho também mudará de conotação. Deixará de ser visto como a maior virtude, como o que de melhor temos para fazer com nossa inteligência, agora entretida com telepatia e também com equipamentos eletrônicos cada vez mais sofisticados e interessantes. A automação diminuirá cada vez mais as oportunidades de trabalho no mundo concreto que nos cerca. É curioso prever que isto coincidirá com as alterações em nossa subjetividade que também trarão um menor apego do homem às coisas materiais e ao trabalho que é o veículo para sua aquisição.

5. Muitos dos bens produzidos em decorrência dos recentes avanços tecnológicos são relacionados com o lazer. E mais do que isto, têm a ver com entretenimentos individuais, solitários. As crianças hoje já se ocupam mais com a televisão e com os computadores do que com as outras crianças - e mesmo com os pais. Este dado objetivo da nossa nova realidade é fundamental, pois finalmente nos permite uma visão individual do ser humano. Sempre nos vimos como uma parte de um todo maior. No amor romântico, éramos a "metade" da laranja. Sempre nos sentimos incompletos e isto nos impediu de nos reconhecermos como inteiros, como unidade. Aprendemos a conceber a salvação com algo que viria de fora, do outro; isto é, que o indivíduo não se resolve em si mesmo.
Num primeiro instante este individualismo crescente apareceu como algo nefasto, como um subproduto negativo, como um alto preço que estávamos pagando pelo nosso progresso tecnológico. Com o passar das décadas, poderemos perceber que estávamos muito enganados. Perceberemos que o individualismo é, em primeiro lugar, nossa verdade maior. Isto nos levará a uma revisão definitiva do fenômeno amoroso tal como o conhecemos. A idéia de fusão de duas criaturas para formar a unidade romântica será facilmente relacionada com um anseio regressivo relacionado com nossa origem - fusão da mãe e seu feto. O amor adulto será respeitoso dos direitos e do modo de ser dos indivíduos. Será próximo do que hoje chamamos de amizade e será muito mais gratificante do que imaginamos.

Perceberemos que o sexo é um fenômeno essencialmente individual e que as práticas que envolvem trocas de carícias não têm a importância que a ele atribuímos. Tornar-se-á um fato simples e será praticado entre criaturas de sexo oposto ou do mesmo sexo de acordo com os desejos de cada um. Será visto como algo totalmente isolado do amor, podendo - ou não - a ele se acoplar. A igualdade no modo de ser e de se comportar de homens e mulheres será inevitável, ressalvadas apenas as diferenças que são da biologia. Viveremos a igualdade possível para criaturas desiguais.
A vaidade, ingrediente importante da nossa sexualidade que nos leva a desejar muito o destaque e o exibicionismo de todo o tipo, será melhor entendida, de modo que ficará essencialmente relacionada com nossas funções corpóreas. A vaidade intelectual, que tanto mal tem feito ao nosso modo de pensar, será desprezada e rejeitada como o pior dos males. O controle sobre essa vaidade nociva será outro ingrediente que, junto com a diminuição do materialismo, tenderá para conduzir as pessoas numa direção de menos disputa e mais companheirismo. Os prazeres intelectuais crescerão juntamente com a espiritualidade e o ressurgimento das artes. Será, porém, livre deste danoso ingrediente da vaidade.

6. Talvez a mudança mais inesperada e radical que as décadas vindouras irão assistir seja aquela relacionada com o pensamento - e com a prática - moral. Vivemos sob o domínio de um modo de pensar que atribui à generosidade o papel de virtude, sendo o egoísmo o vício. Sabemos que a humanidade se divide essencialmente entre estes dois tipos, onde predomina uma ou outra destas posturas. A proporção das pessoas desta ou daquela forma é mais ou menos a mesma, distribuída igualmente entre os sexos. Egoístas se alimentam das dádivas dos generosos. Estes se sentem melhores e superiores por causa disso. Os primeiros se sentem espertos e um tanto humilhados com seu procedimento, que é típico das crianças ainda fracas e dependentes. Na realidade, compõe-se uma espécie de recíproca dependência, uma vez que os que se dispõem a dar mais do que recebem necessitam deste tipo de auto-afirmação. Alianças deste tipo se estabelecem no amor e também nas relações profissionais.

Voltaremos a pensar, como Aristóteles o fez há 24 séculos, que a virtude está na temperança, no meio. Qualquer desvio, tanto na direção do excesso como de escassez daquela propriedade, será entendido como vício igual. Generosidade e egoísmo são, pois, vícios complementares. A virtude será o ponto de justiça. Só os justos serão vistos como portadores de um modo de ser equilibrado, onde não predomina nem a vaidade intelectual e nem as fraquezas operacionais. O desaparecimento dos generosos trará como conseqüência inevitável o fim dos egoístas; estes não terão a quem parasitar e tratarão de evoluir. Finalmente desaparecerá este duplo modo de se comportar e de pensar que hoje tanto nos confunde e nos impede de educar nossos filhos. Com qual modelo irão eles se identificar quando o pai é de um modo e a mãe do outro?
Pessoas justas construirão famílias onde a justiça irá prevalecer, onde os privilégios indevidos não existirão. Pessoas justas construirão ambientes de trabalho onde não irão mais acontecer de uns fazerem a maior parte do esforço e outros levarem os louros e as glórias. Pessoas justas não se deixam explorar. Exigem direitos iguais aos que atribuem aos outros. Não querem mais e nem menos do que aquilo que merecem. Pessoas justas construirão sociedades mais justas, nas quais as diferenças de talento definirão privilégios para uns, mas não às custas da miséria dos menos dotados.

Até aí o discurso parece o de um homem de bem sonhando com um mundo melhor, que poderá ou não ocorrer. O que me deixa fascinado é que acredito que isto irá acontecer mesmo que não seja este o desejo daqueles que nos governam; e mais, irá acontecer independente da vontade dos nossos intelectuais e pensadores. Acontecerá em virtude das alterações nos processos econômicos mundiais e será simultâneo, pois se dará ao mesmo tempo de todos os cantos do planeta. Acontecerá não por vontade dos humanistas e sim por causa dos desígnios das novas leis da economia.
A "globalização" que estamos assistindo é processo irreversível. A competição entre empresas, países, modos de produção tenderá a crescer cada vez mais. O que acontecerá dentro das empresas? Elas terão que desenvolver um sistema de convívio interno extremamente competente e cooperativo para que possam se tornar competitivas em relação à concorrência. Ora, o desenvolvimento deste ambiente cooperativo só será possível se os participantes daquele grupo de trabalho forem justos. Se forem, como hoje, egoístas e generosos, viverão às turras, uns explorando e se sentindo pouco competentes para o trabalho efetivo enquanto que outros se sentirão competentes e mal reconhecidos pelos seus feitos. A recíproca rivalidade e inveja é responsável por tensões e competições internas que tornarão pouco competitivas as empresas assim constituídas e que necessitam de toda a energia para a disputa externa.

As empresas terão que ser como times de futebol - ou de qualquer outro esporte - onde o interesse coletivo terá que prevalecer sobre os óbvios e fortes interesses individuais. As pessoas finalmente compreenderão que o seu sucesso depende mais do que tudo do sucesso do grupo. Com isto surgirá, por necessidade e não por ideologia ou convicção, a prazerosa sensação de solidariedade e cooperação. Serão sentimentos que tenderão a se estabelecer porque são muito agradáveis. As empresas demitirão aqueles que não se integrarem neste sistema cooperativo capaz de promover a máxima produtividade e fazer delas vitoriosas nas crescentes competições do mercado internacional. Os egoístas terão que se reformar sob pena de ficarem sem trabalho. Os generosos não poderão mais exercer suas peculiaridades porque não existirão pessoas diferentes deles no ambiente de trabalho.

Aos poucos, e sem que nos apercebamos, todos teremos nos tornado pessoas justas. E isto acontecerá pelo caminho mais inesperado, qual seja, o do estabelecimento de um modo de vida de tal forma competitivo - derivado das novas regras da economia mundial - em que não poderemos mais sustentar a antiga divisão entre generosos e egoístas.

Flávio Gikovate é médico psicoterapeuta, pioneiro da terapia sexual no Brasil.

Conheça o Instituto de Psicoterapia de São Paulo.

Confira o programa "No Divã do Gikovate" que vai ao ar todos os domingos das 21h às 22h na Rádio CBN (Brasil), respondendo questões formuladas pelo telefone e por e-mail gikovate@cbn.com.br

Email: instituto@flaviogikovate.com.br


A educação e a nova classe gerencial



Victor Alberto Danich

Num mundo dominado por teorias que colocam o Estado como coadjuvante da economia de mercado, o aparelho da legitimação e justificação da dominação abarca a ideologia e a política.

Historicamente, no processo de constituição das sociedades nacionais dependentes, as oligarquias que foram entrelaçando seus interesses ao modelo liberal, desenvolveram uma consciência alienada sujeita aos moldes ideológicos e culturais, tanto da Europa como dos Estados Unidos. Para esses grupos oligárquicos, a Nação era algo que devia constituir-se conforme o modelo político daqueles países, centrado numa visão alienada e impregnada de uma vocação hegemônica, pautada numa concepção formal e vergonhosa de soberania territorial. O atual modelo neoliberal criou uma nova burguesia apátrida, que se expressa não apenas como uma consciência alienada, senão como a exteriorização da mesma em diferentes formas de alienação cultural. Os membros desta “burguesia gerencial” excluíram toda idéia de soberania e de Nação. Sua pátria é a sociedade dos negócios que operam indistintamente tanto na América como na Ásia, cuja visão de futuro é a eficácia traduzida em bons dividendos e “choques de gestão”, no qual todo sentimento humano ou toda dimensão da vida real dos povos ou das pessoas se dissolve em função da produtividade. São tecnocratas, administradores, investigadores de mercado, racionalizadores e especuladores, que ligam seu próprio destino aos grandes mercados e as transações globais.

Cidadãos do dinheiro, não estão alienados ao modelo dos centros hegemônicos, senão que são a própria ideologia da eficiência monopólica aplicadas a todo tipo de sociedade, mimetizando sua profissão em qualquer região geográfica, com outro idioma e com outra gente. Nesta nova realidade, a classe média “pequeno burguesa” que se encontra no meio do caminho dos setores mais explorados da sociedade e daqueles que possibilitam essa exploração, pendula entre a consciência alienada e os valores de seu próprio povo, por um lado submetida ao modelo dominador, e por outro, na procura ideológica de uma inserção no destino comum da nação despojada. O conhecimento, como formação profissional limitada, configura técnicos treinados sem referências sociais, que os levam a acreditarem na incapacidade de avaliar o contexto no quais os problemas sociais surgem. Esta forma de educação faz crer que estes problemas são resultado da ineficiência da própria sociedade ou do Estado, neutralizando dessa forma o surgimento de qualquer tipo de descontentamento coletivo.

Em contrapartida se instala o discurso da “elevação do nível de educação”, da busca da “excelência no ensino” e a “modernização do plano de estudos”, que apenas pretende justificar a privatização da educação, de modo a transformar os estudantes em trabalhadores acríticos identificados apenas com os interesses do mundo dos negócios.

Nas sociedades assim formatadas, as classes dominantes tendem a ligar os sistemas de poder a mecanismos ideológicos e culturais que, indistintamente, procuram homogeneizar a consciência dominadora, legalizando-a e justificando-a como se fosse um fato natural os sistemas de poder. No entanto, a consciência popular, articulada na luta permanente e dolorosa contra a ruptura de sua identidade, deve ter o apoio incondicional e solidário dos intelectuais comprometidos com formas superiores e pragmáticas da verdadeira democracia, que permita, sem condicionantes, uma saída coletiva de igualdade e dignidade para todos.

Victor Alberto Danich é sociólogo.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

John Coltrane - Traneing In (1957)

http://i35.tinypic.com/2cmsv1z.jpg


http://i37.tinypic.com/keys7l.jpg


John Coltrane - Traneing In (1957)
Genre: Jazz / hard bop
MP3 / 320Kbps / RS.com: 86mb / covers


Músicos:
John Coltrane (saxophone),
Red Garland (piano),
Paul Chambers (bass),
Arthur Taylor (drums)

Faixas:
1. Traneing In 12:34
2. Slow Dance 5:27
3. Bass Blues 7:46
4. You Leave Me Breathless 7:23
5. Soft Lights and Sweet Music 4:41

Uploader: redbhiku


Mahmud: Imortal!





Por Elaine Tavares.

“Venham companheiros de correntes e tristezas
Caminhemos para a mais bela margem
Nós não nos submeteremos
Só podemos perder
O ataúde”.

Ele era assim. Essa voz poderosa chamando para a revolução. Queria ver seu povo livre, soberano, feliz. Queria de volta a sua Palestina, não como concessão de algum político bonzinho, mas porque esse é o direito do povo, usurpado em 1948 pela criação do Estado de Israel. Mahmud Darwish, poeta, guerreiro, anjo, criança, renitente, insistente. Encantou no último sábado (dia 9) quando seu coração, pesado de tanta dor, deixou de bater. Mas, enganam-se aqueles que pensam que Mahmud vivia por conta de seu coração. Não. Ele vivia pelas palavras que criava, pelas construções poéticas que erguia e, estas, nunca haverão de morrer.

Ninguém disse nada, mas quando os olhos de Mahmud apagaram para este mundo, abriram-se para a velha aldeia onde nasceu, Al Barwua, de onde sua família foi expulsa pelas armas de Israel. Um lugar que não existe mais, a não ser nos sonhos do menino que nunca a esqueceu. Encravado no coração da Galiléia, o povoado é hoje um acampamento judeu. Mas, para Mahmud sempre foi seu torrão natal, seu ninho. E é possivelmente lá que agora ele passeia, entre as oliveiras.

“Registra-me
Sou árabe
O número de minha identidade é cinqüenta mil
Tenho oito filhos
E o nono... virá logo depois do verão
Vais te irritar por acaso?”

Mahmud foi o poeta palestino que de forma mais radical imortalizou a dor e a luta de seu povo. Até porque nunca se limitou a ser apenas um escrevinhador. Era um animal político, absolutamente conectado com as ações e com a vida real. Seu canto poético brotava das vísceras à mostra, do homem pé-no-chão, do palestino encarcerado, do humano grávido de esperanças. Suas palavras nunca foram criações estéticas. Eram o gume cortante de uma vida real, expressa em sangue e lágrimas. Seu poema nos arranca da apatia e nos convida a lutar, concretamente.

“Ainda verte a fonte do crime.
Obstruam-na!
E permaneçam vigilantes
Prontos para o combate”

Pois agora a mão que rasgava em fogo o papel com o grito da Palestina ocupada já não escreverá mais. Mas precisa? Seu canto de liberdade está cravado na terra fértil dos corações que sonham com o ainda-não, e dali nunca fugirão. Mahmud passeia em Al Barwa. Mahmud passeia nas terras antigas, onde vivia uma gente livre. Mahmud passeia nas cabeças das gentes e grita, com elas. Mahmud imortal, imenso, menino, homem, pura vontade de ser aquilo que sempre foi: palestino, livre, soberano. Porque a liberdade, afinal, vive lá dentro, no profundo do humano. Mahmud! Presente! Sua alma imortal dançará no dia da vitória!

“selvagens... árabes”
sim! Árabes
e estamos orgulhosos
e sabemos como empunhar a foice
como resistir
inclusive sem armas
e sabemos como construir a fábrica moderna
a casa
o hospital
a escola
a bomba”