domingo, 5 de dezembro de 2010

“Precisamos de um resgate dos Correios acima de partidos políticos e indicações”

  Gabriel Brito, da Redação do Correio da Cidadania  
 
Nos últimos dias, as fraturas internas da Empresa de Correios e Telégrafos, uma das maiores do mundo em serviços postais, voltaram a ser expostas ao público com a saída de seu diretor de Recursos Humanos. Paulo Bifano deixou o cargo fazendo duras acusações contra a atuação de Helio Costa, ministro das Comunicações, acusando-o de causar uma proposital paralisia na empresa com o intuito de desmoralizá-la e privatizá-la.
 
Em vista disso, o Correio da Cidadania conversou com Moyses Leme, do Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Correios e Telégrafos. Na conversa, ele endossa e aprofunda as acusações de Bifano, incluindo-o entre os principais culpados pelas crises que assolaram os Correios nos últimos anos. "Lamentavelmente, é graças ao PMDB que vemos esse caos, Helio Costa, Paulo Bifano, Carlos Henrique, toda a corja que ocupou a empresa".
 
Leme não poupa em nada as gestões recentes, listando uma série de debilidades atuais propositalmente negligenciadas. Cita casos para ilustrar a enorme promiscuidade política em torno da empresa e afirma que seriam necessários ao menos 30 mil novos funcionários para atender à demanda postal atual. O sindicalista ainda critica o tratamento dado aos servidores, pede o fim das terceirizações e ressalta a necessidade de a estatal efetuar, e não o mercado, a universalização definitiva dos serviços postais brasileiros. "40 milhões de brasileiros ainda não recebem correspondência em casa".
 
A entrevista completa com Moyses Leme pode ser conferida a seguir.
 
Correio da Cidadania: Para quem tem acompanhado, é notório que as brigas políticas internas têm afetado a atuação dos Correios, gerando inclusive deficiência nos serviços. Um estado de coisas similar já havia sido abordado pelo Correio da Cidadania no ano passado. O que tem acontecido na gestão da estatal?
 
Moyses Leme: Na verdade, esse tipo de problema é antigo na empresa. Quando se chega aos Correios, numa estrutura como a nossa, onde gira mais de 12 bilhões de reais por ano, têm-se dois caminhos a seguir. O primeiro é fazer um projeto de universalização dos serviços postais, com planejamento, inclusive das compras (que são milionárias), todo um caminho para ter êxito na gestão da empresa.
 
Infelizmente, na direção da empresa muitas pessoas vêm cumprir tarefas partidárias, envolvendo-se na administração para se beneficiar, em prol do partido ou às vezes do próprio bolso. Isso avançou e tem se alavancado, com brigas políticas enormes nos Correios, parando a empresa.
 
Agora, vai sair a duras penas um concurso público. De fato, houve problema na elaboração do concurso, que será nacional, quando sempre se fazia de forma regional. Teve um levante com todos os diretores nacionais, numa reunião interna em que cobraram soluções. E o diretor que se aliava à proposta de manter os Correios públicos, sem terceirizações, com frota própria, parando de privatizar as entregas, foi convidado a se retirar, o Marco Antonio Oliveira, um diretor que sempre defendeu esses princípios.
 
Depois, os diretores que permaneceram desenvolveram uma guerra pessoal. Recentemente, o Paulo Bifano, diretor de RH, o Carlos Henrique, presidente da ECT, e o próprio ministro Helio Costa, fizeram parte dessa discussão. E o Bifano, em entrevista recente à Folha, realmente colocou uma situação mais grave, acusando os outros dois de atrapalharem e sabotarem a empresa, impedindo a compra de veículos, os concursos, as licitações... E sabemos que hoje há uma terceirização de veículos na empresa, na qual vemos, incrivelmente, que quase todas as empresas contratadas são de Minas Gerais, estado do ministro das Comunicações. Essa terceirização também atinge a atividade-fim da empresa, situação agora agravada com os destemperos do diretor de RH, de acusá-los de sabotagem na empresa.
 
Correio da Cidadania: E você concorda com essa colocação do Bifano? Ele afirmou que os Correios têm mais de 4 bilhões de reais em caixa e mesmo assim não se fazem investimentos, além de a contratação de novos funcionários ser em ritmo mais vagaroso do que a demanda sugere. Tal fala converge com a sua ao Correio da Cidadania, no ano passado, de que a empresa de fato tem dinheiro pra investir tranquilamente em sua melhoria.
 
Moyses Leme: O que pensamos hoje em relação aos Correios é que a empresa tem sido sucateada. Temos 103 mil funcionários, precisamos urgentemente de concursos. O correio francês tem 300 mil trabalhadores, já o brasileiro tem 103 mil. A questão social da empresa tem ficado pra trás, assim como a do maquinário, da qualidade. Hoje, gastam-se bilhões de reais com aluguéis. E quando se procura quem são os donos dos imóveis, vemos Paulo Otavio, Nenê Constantino (empresários de Brasília do ramo imobiliário envolvidos em diversos escândalos dos governos locais Arruda e Roriz, com fortunas suspeitas de se originarem em diversos favorecimentos; ambos estão sob mira constante do Ministério Público), só pessoas envolvidas em processos complicados.
 
Os Correios gastam mais de 1 bilhão de reais em aluguéis, sendo que poderia ter seus próprios, e adequados, imóveis. Temos o know-how, o conhecimento de como fazer, mas de fato há pessoas sabotando a empresa, sabotando com S maiúsculo mesmo. E agora o próprio Bifano e o ministro sabotavam a empresa, buscando desqualificá-la e terceirizar os serviços.
 
Inclusive, a questão da universalização dos serviços postais deveria ser contemplada, de acordo com a portaria 1112 do Ministério das Comunicações, com todo um regramento sobre quantas agências devem ser abertas e quantos servidores contratados. Mas não vemos por parte do governo e do Ministério das Comunicações atuação nesse sentido, muito menos por parte da empresa.
 
Dentro dos Correios, vemos atividades terceirizadas, inclusive atividades-fim, o que não deveria ocorrer, mas sim concursos públicos. Um rombo de bilhões de reais gastos em aluguéis, em que mega-empresários, como Nenê Constantino e Paulo Octavio aqui em Brasília, são donos de imóveis, com agências convencionais fechando para abrir franquias de deputados, senadores, como Gim Argelo... Vamos dar nome aos bois. Fecham agências convencionais pra abrir as deles.
 
Correio da Cidadania: A empresa está completamente aparelhada no momento.
 
Moyses Leme: O que precisamos, de fato, é de um resgate dos Correios. Acabar com essa questão dos aluguéis absurdos, melhorar a tecnologia na empresa, dos sistemas. Do orçamento de 651 milhões, só se gastaram 150 milhões de reais, e faz tempo que não se compram equipamentos, mesmo com a centralização das compras.
 
Na área de equipamentos, eles não chegavam por causa da burocracia de tecnocratas da empresa, que não conseguiam fazê-los chegar aos setores dos Correios que os demandavam.
 
Portanto, precisamos de um planejamento e resgate da empresa acima de partidos políticos e indicações. Precisamos de um planejamento, a fim de universalizar os serviços postais e trazer a qualidade dos serviços dos Correios de volta, que é um dos melhores do mundo.
 
Correio da Cidadania: Até a ultramercadista revista Forbes a elegeu a melhor do mundo em serviços postais. Incrível, assim, que a empresa passe por tamanhas turbulências. A parasitagem política do PMDB tem algo a ver com esse cenário?
 
Moyses Leme: Ainda somos a melhor empresa mesmo. No correio americano, gastam cerca de 7 a 14 dias para entregar. Aqui, o período é de três a quatro dias, com toda a dificuldade. Mas chegamos ao fundo do poço. Não há planejamento, funcionários. Centraliza-se o planejamento, mas não há condições reais de executá-lo. Pelo menos tivemos reuniões com os diretores regionais aqui em Brasília, onde se redigiu um documento, listando o que havia de errado.
 
Um exemplo: se você manda uma correspondência de Santa Cecília, na capital de São Paulo, da rua tal, com um CEP de São José dos Campos, o que acontece? O funcionário sabe onde é a Santa Cecília, mas por causa do CEP manda errado pra São José, pra depois carimbar de volta, retornar ao remetente, que precisa mandar de novo a correspondência.
 
Não há frota de veículos, as terceirizações estão a todo vapor, um verdadeiro caos dentro da empresa, o que não permite o trabalho adequado.
 
Lamentavelmente, é graças ao PMDB que vemos esse caos nos Correio, ao senhor Helio Costa, ao Paulo Bifano, ao Carlos Henrique, toda a corja que ocupou a empresa.
 
Correio da Cidadania: As terceirizações continuam em alta, mas nas mesmas proporções que anteriormente?
 
Moyses Leme: Agora estão liberando contratações de terceirizados, até por determinação do Ministério Público. Isso é irregular e muito grave. Vamos fiscalizar unidade por unidade. Não pode haver essa entrega direta do serviço de correspondência, é algo grave.
 
Porque, sem que se leve a mal, sempre que há uma leva de contratações, são registrados problemas com assaltos, perda de objetos; são milhões de reais perdidos, não é brincadeira.
 
Correio da Cidadania: Dessa forma, você também estenderia as criticas ao Paulo Bifano, que saiu atirando contra o Helio Costa, acusando-o de sucatear propositalmente os serviços dos Correios, com a intenção de posteriormente privatizar mais uma rentável empresa pública?
 
Moyses Leme: Ele não teve cuidado, não teve respeito, não buscou em momento algum ouvir os funcionários. Também tem um grupo dentro da empresa que joga contra, não é só o pessoal de fora. Dentro também, jogando contra a valorização dos funcionários, só com uma fração deles possuindo plano de carreira e de salário... É preciso resgatar esses planos, também o de cargos, trazer de volta o ânimo dos trabalhadores de níveis médio, técnico e de terceiro grau.
 
Hoje, o cara entra como engenheiro nos Correios e em um ano sai para outra empresa. Por quê? Porque não há perspectiva de ascensão, os cargos comissionados são apenas de indicação política. Às vezes é gente que não tem conhecimento técnico, ou um conhecimento superior, e sim porque é sobrinho de senador, de alguém do alto escalão, sendo nomeado para uma empresa que movimenta bilhões de reais. E as pessoas ficam desmotivadas, porque, depois de um concurso público, todo o estudo e esforço não valem nada, pois nunca se irá para outro cargo, a não ser que a pessoa tenha um parente político ou coisa assim lá dentro. Tal situação precisa acabar.
 
É preciso retomar a política de plano de carreira, que dê condições de a pessoa ascender na empresa, melhorar o salário... Os Correios estão pagando muito mal, nos níveis médio, técnico e principalmente terceiro grau. Nós vemos no mundo os governos investindo bilhões de reais em seus correios. Aqui é o contrário: todos os anos sacam 400 milhões de reais da empresa. Um dinheiro que deveria ser investido em mais funcionários, melhores salários, mais agências, mais veículos próprios. Mas não! Hoje, a logística dos Correios é totalmente terceirizada, portanto, não temos controle algum sobre a logística da empresa.
 
Correio da Cidadania: Ou seja, a empresa está totalmente gerenciada no sentido de servir interesses particulares. Mesmo na condição de estatal, opera na prática de forma privatizada.
 
Moyses Leme: Por isso que defendemos o resgate de nossa própria logística de transporte terrestre, assim como uma outra logística de transporte aéreo, competindo com empresas do mercado internacional, como a Fedex. Precisamos discutir essa questão, as empresas internacionais disputam o filé mignon e nós temos de ficar com tudo, interior e capitais, enquanto eles só ficam nas capitais. Nós queremos taxá-los mais por isso também, de modo a reverter mais recursos à estrutura dos Correios. Até porque precisamos atender à necessidade de universalização dos serviços postais.
 
Portanto, é preciso que parem de meter a mão no dinheiro dos Correios, para que o utilizemos a fim de desenvolver os serviços postais em todos os municípios. Se não, quem vai fazer isso, a Fedex, a DHL?
 
Atualmente, 40 milhões de brasileiros não recebem suas correspondências diretamente em casa. Como fazemos? Por isso estamos mostrando, nós do sindicato e da federação, tal necessidade, de como é preciso desenvolver o mercado dos serviços postais.
 
Correio da Cidadania: A empresa precisaria contratar quantas pessoas para suprir plenamente suas necessidades de atendimento e caminhar para essa universalização?
 
Moyses Leme: Antes de responder a esta pergunta e falar do concurso que contratará uma quantidade razoável de pessoas, gostaria de lembrar dos demitidos de 97. Com a aprovação da lei Maria do Rosário, que está parada no Senado na mão do Inácio Arruda, conseguiríamos recolocar 4 mil trabalhadores demitidos injustamente no governo FHC, pelas mãos do Sérgio Motta. Que o diabo o tenha, pois não prestava mesmo.
 
Pois esses 4 mil demitidos merecem seus empregos de volta. E a lei está lá emperrada no Senado. No entanto, mesmo com a volta de todos, ainda não seria suficiente.
 
Para prestar um serviço de qualidade à população, o mínimo seriam 30 mil contratações.
 
A previsão do concurso é 8 mil, mas não dá, é muito pouco, estamos discutindo com a direção da empresa pelo menos 15 mil.
 
Correio da Cidadania: Além disso, é preciso garantir que as contratações se efetivem rapidamente após o concurso, o que nem sempre ocorre.
 
Moyses Leme: É preciso mesmo deixar isso claro, queremos que o concurso aconteça, que as pessoas recebam a oportunidade, mas que a qualidade melhore, pois hoje está difícil trabalhar lá.
 
Temos que ficar atentos, assim como a imprensa, que precisa esclarecer a população, que só aumenta, assim como o mercado cresce, como se vê nas obras pelas cidades, que não param de crescer; e não se vê contratação de funcionários. Infelizmente, isso acarreta uma péssima qualidade do serviço.
 
Além disso, há os problemas da terceirização, precarização do trabalho, malversação de recursos dentro da empresa, como no caso dos aluguéis de imóveis, em que se paga para o empresário construir, arcando-se com toda a obra, e depois os Correios ficam sem nada.
 
Veja o absurdo: os Correios, por exemplo, querem uma área de 1500m², fazem um contrato de cinco anos com uma empresa, que paga tudo relativo à obra durante esse tempo e depois apresenta uma fatura maior do que aquilo que foi efetivamente gasto, saindo num lucro enorme. Depois desses 5 anos, o dono tem um patrimônio imenso! Vai no banco, pega uma linha de crédito e faz um patrimônio de 5, 10 milhões de reais em 5 ou 10 anos. Isto é, mais uma forma de promover o repasse do dinheiro público ao setor privado.
 
Correio da Cidadania: Por mecanismos cada vez mais invisíveis.
 
Moyses Leme: É um absurdo o que tem acontecido na empresa. Fora a falta de controle nas franquias, que dão um prejuízo de mais de 1 bilhão por ano. Enfim, é muita coisa a ser resolvida.
 
Outro exemplo é o banco postal. Tem que sair do Bradesco, precisamos de parcerias com outros bancos, alguma solução. É uma exploração com os funcionários da empresa, pois não há horário bancário, caixa adequado, segurança, e o lucro fica todo com o Bradesco, outra picaretagem. E ainda postergaram a resolução disso para 2011.
 
Mas esperamos resolver essa questão já no ano que vem e estender o banco postal para cada município e distrito do país. Na última pesquisa que fiz, em 1750 municípios o único banco postal era o nosso. O banco postal tem de ser uma ferramenta importante, como são os bancos postais francês, japonês, chinês. No Brasil é que é uma sacanagem, com o perdão do termo. Você trabalha, corre todos os riscos e o lucro fica com o Bradesco. E com os outros apadrinhados também esquematizados.
 
Correio da Cidadania: Após todo esse apanhado das tendências privatizantes que têm dominado a estatal, como você acredita que a presidente eleita Dilma Rousseff deve tratar os Correios em seu mandato?
 
Moyses Leme: Nós temos muita confiança que a presidente Dilma possa resgatar a empresa. Mas, em primeiro lugar, não tem a menor condição de o Ministério das Comunicações ficar na mão do PMDB. Esse é o primeiro ponto, não tem condição (A entrevista foi realizada na segunda-feira, 29/11; no dia 30, Dilma Rousseff nomeou Paulo Bernardo, ex-ministro do Planejamento, para a pasta).
 
Em segundo lugar, o planejamento da empresa deve ser discutido com os trabalhadores. Eles sabem o que é melhor para a empresa, e não podem ser ouvidos somente depois de greves. Não pode ser por aí o tratamento com o trabalhador.
 
O terceiro ponto é investimento. Em imóveis próprios, em abrir novas agências, ter uma frota própria de transportes terrestre e aéreo. E investir na questão humana, com contratações, melhoria salarial em todos os níveis. Senão, vamos perder nossos profissionais para outras empresas. Precisamos oferecer plano de carreira, com condições de ascensão sem que se seja filho, neto, do rei ou coisa assim. Fazer concursos e dar espaço a muita gente boa que quer contribuir com a empresa.
 
Para que se tenha uma idéia, uma das coisas que dá muito lucro na empresa e que está sendo abandonada são as coleções de selos. Tem todo um mercado internacional de filatelia e esse setor nos nossos Correios está acabando! E sempre rendeu milhões de reais. É preciso recuperar tais aspectos também, relativos à história da empresa.
 
Acredito que a Dilma vai dar uma resposta positiva, com mobilização dos trabalhadores. Temos muito trabalho pela frente.
 
Correio da Cidadania: Acredita que a presidente irá combater essas privatizações disfarçadas?
 
Moyses Leme: Espero que ela acabe com isso. O Serra falou muito em estatização no período eleitoral, e ela ficou um pouco calada para não polemizar no momento.
 
Mas em reuniões que já tivemos com gente do PT, com os deputados Geraldo Magela, Erika Kokay, falou-se muito na manutenção da empresa pública. O senador Paulo Paim também é defensor dos Correios públicos e de qualidade.
 
Enfim, há um segmento que acredita em outro caminho, de um Correio eficiente, presente em todos os municípios e distritos do país, com muita capilaridade. Esse é o único caminho. Uma empresa pública com forte participação do Estado, que seja mais que uma empresa, e sim uma entidade que presta o serviço público com cidadania.
 
Correio da Cidadania: E a Dilma terá essa visão estratégica sobre a empresa?
 
Moyses Leme: Esperamos tanto que ela tenha essa visão como que ouça os trabalhadores, as entidades de classe, para que possamos de fato trilhar tal caminho. Muita gente sabe que esse é o caminho, inclusive ela. Esperamos que ela não traia a população e os trabalhadores, pelo contrário, que mantenha a empresa pública e faça os investimentos necessários, sabendo que o PMDB não tem condição nenhuma de assumir os Correios. Não se trata de querer impor esse ponto à presidente, mas já está comprovado, são coisas que já aconteceram. Eles não têm condições de administrar o Ministério das Comunicações, são muito incompetentes.
 
Correio da Cidadania: Dessa forma, o que pensa da atuação de Helio Costa no Ministério das Comunicações? Muitas figuras, a respeito de outros assuntos, o chamaram criticamente de ‘ministro da Globo’, uma vez que por diversas vezes se posicionou publicamente no sentido de tranqüilizar a mídia hegemônica em assuntos de seu interesse – além de ser ex-funcionário da emissora. Trata-se de um privatista nato, empenhado em transferir patrimônio público a grupos políticos de sua proximidade?
 
Moyses Leme: A gente viu isso. Durante todo seu período, ele deu seqüência às terceirizações, ao fim das garagens, impediu toda sorte de investimentos. O próprio Bifano, de outra ala do PMDB, foi quem fez as denúncias que vimos na imprensa nos últimos dias. Nem a gente sabia que a coisa era tão profunda assim, com tanto descaso do ministro em relação à empresa, falta de cidadania. Pior: ele não tinha respeito nem pela soberania do país, porque um Correio público também é questão de soberania. E respeito à população.
 
Portanto, queria dizer que nós trabalhadores esperamos que, de fato, as coisas mudem, que ocorram contratações, o fim das terceirizações, que possamos ter nossa logística terrestre e aérea e um maior diálogo. E que levem a sério o que falarmos, pois tudo que acontece hoje foi acusado com muita antecedência e não foi levado a sério por ninguém, diretor de RH, presidente, diretoria, conselho, governo...
 
Tudo que acontece agora na empresa nós estávamos criticando, relatando e denunciando há muito tempo. Conhecemos a situação de perto e queremos solução. O governo precisa dar atenção ao trabalhador, que tem conhecimento de causa.
 
Correio da Cidadania: Para isso é preciso abandonar, pelo menos em parte, a visão completamente mercantilizada das relações sociais que temos hoje em dia, retomando também, como você disse, o caráter humano de uma empresa pública.
 
Moyses Leme: Claro, é preciso considerar a questão social. A empresa é boa, tem tudo para avançar e crescer, pois também está num mercado que cresce cada dia mais. É possível fazer um trabalho com seriedade e profissionalismo. Por isso reforço a questão do plano de carreira, pois os trabalhadores costumam ter compromisso com a empresa. Em geral, quem tem compromisso com a empresa são os do segundo escalão, não os de cima. Esses vivem do status superior, não estão nem aí pra nada, apenas seguem ordens, já estão com a vida ganha, enfim, não querem nada.
 
Queremos renovação, com pessoas capacitadas, com condições de desempenhar as necessidades dos Correios, contratando funcionários e universalizando os serviços postais. É o que esperamos.
 
Correio da Cidadania: Alguns estados têm começado a cobrar, inclusive judicialmente, por uma resposta dos Correios, pois alguns de seus cidadãos vêm ficando sem receber suas correspondências. Por sua vez, a empresa alega que os próprios estados e municípios deixam de colaborar ao não fazerem o cadastro de todos os endereços de seu território. Algo tem sido feito para sanar os problemas?
 
Moyses Leme: Tem de ser feito. Os estados têm que contribuir também. Na verdade, não há o interesse nem da empresa, por meio do Ministério das Comunicações, e nem dos estados e municípios na questão postal.
 
Em Brasília, por exemplo, temos 500 mil pessoas que não recebem correspondência diretamente. A capital do país. Devido também à falta desse trabalho por parte dos municípios e dos legislativos. Tais questões só se resolvem com contratação de concursados e fim das terceirizações de atividades-fim, negativas para o cliente e a empresa.
 
É o que queremos mudar.
 
Correio da Cidadania: Você vê possibilidades de entrarmos em um ‘caos postal’?
 
Moyses Leme: Com concursos públicos e a contratação emergencial, mais a aprovação da lei dos trabalhadores demitidos em 97, penso que conseguiríamos dar uma melhor qualidade aos nossos serviços postais. Com mais respeito pela empresa e os trabalhadores e o fim do assédio moral, podemos evitá-lo.
 
Gabriel Brito é jornalista.
 

Mais uma imprescindível se foi....

Aos 92 anos, morre a ativista de direitos humanos uruguaia María Esther Gatti

A ativista de direitos humanos uruguaia María Esther Gatti, fundadora da Associação de Mães e Familiares de Uruguaios Presos durante a última ditadura militar do país (1973-1985), faleceu neste domingo (5/11) ao 92 anos, informou o Museu da Memória em comunicado .

"María Esther lutou incansavelmente pela aparição de sua filha, María Emilia Islas, seu genro, Jorge Zaffaroni, e sua neta Mariana Zaffaroni, sequestrados e desaparecidos na Argentina no dia 27 de setembro de 1976, durante a Operação Condor", consta no comunicado da entidade.

A Operação Condor foi uma aliança entre os regimes militares da América do Sul — Brasil, Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai — criada com o objetivo de coordenar a repressão a oposicionistas dessas ditaduras instaladas no Cone Sul.

Uma das lutas de María Esther foi para saber do paradeiro de sua neta Mariana, sequestrada quando tinha apenas 18 meses. Depois de muito tempo procurando, finalmente localizou a neta em 1992 e consegui a restituição de sua identidade e o processo dos sequestradores.

Além da busca pela neta, a ativista ficou conhecida pela campanha pela anulação da Ley de Caducidad, como é chamada no Uruguai a medida que anistiu os agentes da repressão da ditadura.

"Não se pode perder jamais a esperança e muito menos a vontade de lutar", disse María Esther em março deste ano ao comemorar a inauguração de uma biblioteca e o aniversário de 35 anos de Mariana. Até o fim de sua vida, ela buscou o paradeiro de sua filha María Emília.

Seu corpo será velado entre hoje e amanhã na Universidade da República em Montevidéu, segundo o site de notícias uruguaio Observa.

Fonte: OperaMundi

Janis Joplin & Jorma Kaukonen - The Typewriter Tape - 1964



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1. Trouble In Mind 3:44
2. Long Black Train 3:59
3. Kansas City Blues (False Start) 0:19
4. Kansas City Blues 3:01
5. Hesitation Blues 4:18
6. (Strumming) 0:14
7. Nobody Knows When You're Down 3:18
8. Daddy, Daddy, Daddy 3:58

Recorded on June 30, 1964



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Janis Joplin - Vocals
Jorma Kaukonen - Guitar
Margareta Kaukonen - Typewriter

A primeira gavação de Janis, com Jorma Kaukonen, o futuro guitarrista de Jefferson Airplane, gravado na casa dele e com Margareta Kaukonen fazendo a percussão com uma máquina de escrever.




Créditos: Loolo

O filme que inspirou "Tempos Modernos" de Chaplin



A nós a liberdade - 1931



SINOPSE
Um rico industrial é chantageado por causa do seu passado, recebendo então a ajuda de um antigo companheiro de prisão. Encantadora comédia satírica em estilo opereta, dirigido e escrito por René Clair, um dos mais admirados cineastas franceses de todos os tempos, o primeiro a ser eleito para a Academia Francesa. "A Nós a Liberdade" influenciou decisivamente Charles Chaplin ao fazer Tempos Modernos, tornando-se também uma poderosa denúncia à sociedade moderna mecanizada.

DADOS DO ARQUIVO
Diretor: René Clair
Áudio: Francês
Legendas: Português
Duração: 104 min.
Qualidade: DVDRip
Tamanho: 634 MB
Servidor: Megaupload (3 partes)

Créditos: Hilarius no laranja psicodélica

LINKS
Parte 1
Parte 2
Parte 3

sábado, 4 de dezembro de 2010

Leilão da Banda H aumenta conflito entre governo e empresas de telefonia móvel

Igor Natusch no Sul21

O choque de interesses entre governo federal e as operadoras de telefonia móvel teve um novo capítulo no decorrer desta semana. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) não aceitou as alegações do Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (SindiTelebrasil) e manteve o edital de licitação para a chamada Banda H, marcado para o dia 14 de dezembro. A Banda H é a última faixa de frequência de telefonia disponível para a tecnologia de terceira geração, conhecida como 3G.
O leilão divide a Banda H em 15 áreas, em um total de 165 lotes. Pelas regras do edital, as empresas que já exploram tecnologias 3G – Vivo, Oi, Tim e Claro – não podem participar da primeira etapa do leilão. O edital privilegia operadores que não trabalham com tecnologia 3G, permitindo que elas possam tentar arrematar os lotes sem a concorrência de empresas já estabelecidas nessa faixa de mercado. As teles que já exploram o serviço só poderão participar caso não haja nenhum novo interessado na frequência.
Frequência estratégica
O Plano Nacional de Banda Larga trabalha com três objetivos básicos. Além de melhorar a qualidade dos serviços e diminuir o valor final para o consumidor, há uma grande preocupação em aumentar a abrangência da banda larga no Brasil. No momento, a cobertura está concentrada no Sul e Sudeste, regiões onde a renda per capita é maior. Para que essa realidade se modifique, o governo federal aposta em tecnologias que ampliem o alcance da banda larga, além de propor um novo marco regulatório para as telecomunicações. Nesse sentido, a utilização de novos espectros de frequência, como a banda H e a faixa dos 450 Megahertz, de longo alcance, pode ser decisiva para disseminar a internet em ambientes rurais.
O uso da Banda H é considerado estratégico para o fortalecimento do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), pois pode acelerar a chegada da internet rápida em áreas ainda não contempladas. Dentro da política de aumentar a competitividade no setor, a Anatel optou por priorizar no leilão as operadoras que ainda não têm licença para oferecer o serviço. As teles atuais, caso desejem concorrer, poderão participar apenas a partir de uma segunda fase do leilão caso a primeira fase for deserta – ou seja, se nenhuma empresa ainda sem licença apresentar proposta pelas concessões. Como a Nextel já deu sinais de que deve apresentar proposta pela frequência, é remota a possibilidade das teles terem a chance de oferecer lances pela Banda H.
As empresas de telefonia móvel excluídas desejam participar do processo desde a primeira fase e deixam bem clara a insatisfação. Ao todo, seis entidades (Claro, TIM, Oi, CTBC Celular, Vivo e o sindicato SindiTelebrasil) pediram a impugnação do edital da banda H. Nas petições, as empresas solicitam à Anatel ampla participação das prestadoras de serviços de telefonia móvel na licitação além de questionar o fato de o edital não permitir a devolução em caso de aquisição de faixas acima do teto estabelecido. Curiosamente, nenhum dos pedidos solicita a suspensão do leilão da banda H. Os pedidos de impugnação foram negados pela comissão especial da Anatel encarregada de coordenar o leilão.
SindiTelebrasil aguarda documentos
O diretor executivo do SindiTelebrasil, Eduardo Levy, declarou na quinta-feira (2) que vai esperar a entrega de documentos da Anatel para decidir se vai tomar medidas judiciais contra o leilão da Banda H. Os documentos solicitados referem-se aos estudos feitos pela Anatel para a elaboração do edital do leilão.
Segundo ele, mesmo com a Anatel negando a participação das teles na primeira fase do leilão da Banda H, não é interesse das operadoras de telefonia inviabilizar o processo. Além da licitação da faixa em questão, serão incluídas também cotas restantes de outras faixas de frequência já licitadas, as quais podem receber lances das empresas que já atuam na faixa 3G.
“Nós entendemos que participando do leilão, a sociedade vai ganhar porque vai haver maior competição”, disse Levy, em entrevista ao jornal O Globo. “Não significa necessariamente que vamos ganhar, mas queremos participar do jogo”. De qualquer modo, o interesse nas sobras de outras frequências pode levar a SindiTelebrasil a um recuo estratégico. Está sendo estudada também a possibilidade de requerer judicialmente a intervenção apenas no leilão da Banda H, permitindo a continuidade da licitação de outras frequências. A entidade deve decidir no começo da próxima semana se entrará ou não com ação na Justiça contra a decisão da Anatel.
Não é de hoje, de qualquer modo, que a situação provoca desconforto nas empresas de telefonia móvel. Em outubro, durante o evento Futurecom 2010, o presidente da Associação Nacional de Operadoras Celulares (Acel), Luiz Eduardo Falco, já tinha deixado clara sua contrariedade com a situação. “Você prestigiar quem está entrando é muito justo, mas desprestigiar quem está há muito tempo no mercado não faz sentido. Ninguém (das teles) gostou”, afirmou.
O assessor especial do comitê gestor do projeto de inclusão digital da Presidência da República, Nelson Fujimoto, considera natural que o edital privilegie quem ainda não explora os serviços 3G. “O governo busca ampliar a competição para que os preços caiam sem prejudicar a qualidade do serviço. Já tomamos ciência das reclamações, obviamente, mas elas ainda estão na esfera administrativa, nada foi judicializado”, garante.
Ações na Justiça
Não é o caso, certamente, de outros aspectos relacionados com o Plano Nacional de Banda Larga. No momento, duas ações na Justiça, ambas impetradas pela SindiTelebras, tentam barrar tanto a participação da Telebras no PNBL quanto a aplicação do Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU 3), que trata do aumento progressivo do acesso à telefonia fixa e móvel. As ações, que correm na Justiça Federal do Rio de Janeiro, tentam evitar que a Telebras se torne a única operadora da PNBL, além de alegar que o PGMU 3 vai contra a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) e os contratos de concessão em vigor.
Em entrevista ao Sul21, o presidente do Conselho de Administração da Telebras, Cezar Alvarez, criticou a postura das empresas de telefonia. “As operadoras tentam fazer com que o governo não governe, tentam forçar o governo a deixar de cumprir seu papel”, criticou. “Esse é um mercado público, relativo a um serviço essencial e estratégico, não apenas para as comunicações, mas até mesmo para a democracia”.
“O tema, infelizmente, foi judicializado pelo SindTelebras”, lamenta Nelson Fujimoto. Garante, porém, que só teve conhecimento das ações por meio dos jornais. “Não fomos citados ainda”, garante. “Não vemos motivos para mudar prazos. Claro que estamos sempre abertos para conversar com a entidade, mas não vamos discutir com a faca no pescoço”, assegura.
Nelson Fujimoto, do comitê de inclusão digital da Presidência, diz estranhar que as empresas tenham aceitado o PGMU anterior, que tratava a internet como serviço de telefonia, e agora se oponham a essa mesma categorização. “Algumas dessas reclamações precisam ser melhor esclarecidas”, acredita Fujimoto. Lembrando que os serviços de telefonia são os mais citados em órgãos de defesa do consumidor, ele diz que a atitude da SindiTelebrasil não é “republicana”. “Trata-se de uma ação prévia, sem conhecimento. Não penso que isso seja salutar para a democracia”, diz.

Quando a terra é o limite. Zapata e a Revolução Mexicana


América Latina Rebelde
Felipe Deveza
Felipe Deveza

Vestido com roupas típicas dos charros mexicanos, por baixo de um enorme sombrero e uma carabina na mão, Emiliano Zapata foi aguerrido defensor dos princípios revolucionários que mobilizaram os camponeses mexicanos.
Como um dos principais símbolos da Revolução que sacudiu o México cem anos atrás, Zapata representou em sua própria imagem uma das faces mais radicais deste processo, a luta camponesa pela democratização da terra.
O capitalismo na América Latina tem uma história diferente do que na Europa, aparece de fato no final do século XIX, quando os grandes monopólios capitalistas influenciavam os governos e avançavam sobre outros países. Os ingleses e franceses dividiam a África, a Ásia era disputada por russos, ingleses, japoneses e franceses e a América Latina sofria a expansão do grande irmão do norte, que no México apoderava-se das minas, dos portos, do petróleo e da agricultura.
Porfírio Diaz, o presidente que a Revolução Mexicana varreria do país, abriu as portas para o capital estrangeiro e o latifúndio cresceu sobre as pequenas propriedades e as terras comunais dos camponeses e indígenas.
A luta dos camponeses do sul, da qual Zapata foi o principal líder, começou com a reivindicação de antigos títulos das propriedades tomadas pelos latifundiários durante o regime de Porfírio Diaz, reivindicando a repartição dos latifúndios e a manutenção das propriedades comunais, os Ejidos.[1]
Nascido na pequena localidade de Anenecuilco, no Estado de Morelos, a cerca de 100 quilômetros do centro da Cidade do México, Zapata começou sua atividade revolucionária como representante eleito da junta de defesa das terras de sua comunidade, formando um pequeno exército, que em 1910 apoiaria o liberal Francisco Madero contra Porfírio Diaz. Após a fraude eleitoral, Zapata atendeu o chamado às armas de Madero, sublevou-se em Morelos e controlou parte da região.
Madero foi uma continuidade de Porfírio Diaz com um verniz liberal, não entregou as terras aos camponeses e nem sequer modificou a estrutura do Estado e do Exército. Grande parte dos antigos militares e funcionários porfiristas continuaram no governo.

Plano de Ayala e a Revolução Agrária

A partir desse momento os revolucionários comandados pelo então General Zapata anunciam, em novembro de 1911, o Plano de Ayala, um programa de Revolução Agrária que não reconhece a legitimidade do governo de Madero, tratando-o como traidor; e proclama a imediata restituição das terras roubadas pelos latifundiários e a distribuição dos latifúndios entre as comunidades, ejidos e camponeses pobres.
Influenciado pelos ideais anarquistas propagados pelo jornal La Regeneración, de Ricardo Flores Magón, Zapata eleva a luta dos camponeses mexicanos a uma guerra persistente contra a tirania, adota o lema "Terra e Liberdade" e, no sul do México, passa a agrupar homens em torno da democratização da terra.
A frente do Exército Libertador do Sul, que chegou a ter quase 30 mil homens em armas, os zapatistas não fizeram concessões, desconheceram Madero e logo depois, o governo de Huerta, que derrubou e matou Madero. Com a posterior derrota de Huerta, também não aliou-se a Venustiano Carranza. Enfim, Zapata não aceitou remendos no programa aprovado pelos camponeses de Morelos, sublevando-se contra um após outro presidente que não reconhecia os termos da Revolução Agrária que representava e pela qual lutava o Exército Libertador do Sul.
Em 1914, após desferirem inúmeras derrotas ao exército do Governo (chamado de "federais"), Pancho Villa desde o norte e Zapata a partir do sul entraram com as suas tropas na capital mexicana e tomaram o Palácio do Governo. Pela primeira vez na história dois camponeses com programas radicais de reforma agrária e democracia popular conseguiam formar exércitos e conquistar o poder central. A aliança dos dois generais populares prometia novas perspectivas para o México revolucionário. Esse é o momento clímax de toda a história da revolução mexicana e que suscita importantes debates e controvérsias. Por que a revolução não avançou, não transformou de maneira radical a estrutura social mexicana e instaurou algo próximo ao que depois conheceríamos como socialismo? Muitos explicam o retrocesso posterior pelos limites políticos do campesinato e sua falta de maturidade política para exercer o poder. Outros pelos limites do ideário anarquista que influenciava os comandantes zapatistas.
O professor de história Adolfo Gilly afirmaria que após a retirada de Villa e Zapata a Revolução Mexicana estaria interrompida, retrocedendo e se institucionalizando aos moldes dos governos burgueses, não seguindo o rumo das transformações sociais radicais que a aliança entre os dois generais populares parecia prometer.
Carranza e o General Obregón conseguem imprimir uma derrota à Divisão Norte de Pancho Villa em Celaya, obrigando-o a retornar ao norte. Zapata retrocede suas tropas ao Estado de Morelos e Obregón retoma a Capital. Os zapatistas, durante vários anos, mantêm suas posições em Morelos desde seu quartel em Tlaltizapan. Com a cooptação de parte das lideranças, os zapatistas vão perdendo posições, perdem o controle de Cuernavaca e passam à resistência guerrilheira.
O General Jesus Guajardo, fingindo simpatizar-se com a causa zapatista, marca um encontro com Zapata na fazenda de Chinameca, em Morelos. Guajardo arma uma emboscada e Zapata é assassinado com centenas de tiros. Essa traição é lembrada como uma das maiores da história mexicana. Até hoje um muro cravejado pelas balas que foram em direção ao revolucionário e uma estátua de Zapata montado em seu cavalo ornamentam orgulhosamente o centro do povoado de Chinameca.

Zapata e a questão do poder

Zapata viveu o interregno entre duas épocas, antes e depois da Revolução Russa de 1917: entre os ideais anarquistas, a expansão imperialista estadunidense e a primeira experiência socialista da história.
Para os anarquistas da época de Zapata, alguns mitos acerca do poder faziam parte fundamental da doutrina anarco-sindicalista e parecem ter influenciado os revolucionários, e em parte explicam a derrota do movimento de Zapata.
No caso de Flores Magón, o mais influente anarquista do país e inspirador da parte mais radical da Revolução Mexicana, o Estado era o grande mal, origem de toda corrupção, ganância e imoralidade. A redenção mesclava anarquia com comunalismo indígena. O Estado Maior zapatista estava influenciado por esse tipo de concepção e naturalmente mirava com muita desconfiança o exercício do poder.
Emiliano Zapata controla a capital ao lado de Pancho Villa, mas não toma o poder, toma o palácio do governo sob custódia, senta na cadeira presidencial, depois observa Pancho Villa sentado nela e ambos se retiram, deixando o exercício do poder para a pequena burguesia, que logo compõe com antigos inimigos e retrocede em grande parte as conquistas da Revolução.
Tanto Zapata, como Pancho Villa jamais aceitaram por muito tempo cargos executivos na administração das áreas que liberavam com seus exércitos. Governar e como governar não estava definido no programa zapatista. Não exerceram o poder e logo que puderam, os que governaram em seu lugar retomaram o controle militar, cooptaram lideranças, e institucionalizaram a antiga ordem social com um verniz democrático.
É claro que as massas populares que se levantaram em armas, particularmente os camponeses, não retornariam as suas casas sem nada. O antigo sistema porfirista fora profundamente abalado. O regime que surgiria depois da Revolução iria ano após ano reestruturando antigos privilégios, mas precisou conceder algumas conquistas sociais ao povo mexicano, como as oito horas de trabalho semanal e o salário mínimo.
A luta de Zapata não foi em vão, garantiu anos depois que muitas terras reclamadas pelos camponeses permanecessem no sistemas de ejidos, onde a terra é trabalhada de maneira coletiva e sua propriedade inalienável. Os camponeses que seguiram Zapata jamais baixaram suas armas completamente, volta e meia uma rebelião camponesa surge, reivindica a memória de Zapata e segue a luta pela democratização das terras.
Atualmente o governo pró-gringo de Calderón tem organizado diversos festejos em comemoração ao centenário da Revolução Mexicana, mas Emiliano Zapata, pelo que representa, é menos propagandeado que outros personagens da história mexicana, como os heróis da independência, Morelos e Hidalgo. Em plenas comemorações do centenário, o pequeno museu que fica ao lado de onde assassinaram Zapata está praticamente abandonado. Mas, independente do governo, o povo mexicano, e particularmente os camponeses de Morelos não esquecem a luta de Zapata, e por muitos lugares seguem cantando nos Corridos, uma espécie de Cordel mexicano, as façanhas do General.
Traduzimos trechos de dois famosos Corridos. Um apresenta o Plano de Ayala e outro que fala de Zapata quando criança.
Corrido do Plano Ayala
(Corrido del plan Ayala)

Autor: Leonardo Kosta

Em mil novecentos e onze
antes do Natal
O general Emiliano
lançou o plano libertador
Foi na Vila de Ayala
que o Exército do Sul
pôs em letra e em papel
o que em pólvora escreveu
Porque Francisco Madero
aprisionou a liberdade
que com canhões e sangue
o povo conquistou
Não derramamos o sangue
para entregar-lhe o poder
nem para que nos governe
sua mesquinha vontade
Por isso o chefe Zapata
logo o desconheceu
porque a pele de ovelha
o lobo já a tirou
Não queremos acordos
com a gente do patrão
mais vale andar sós
que com tanto safado
A palavra de Emiliano
diz que agora sim nos dão
toda a terra e a água
que usurpou tanto ladrão
Que vivam todas as comunidades
com esta revolução
que morram as fazendas,
os senhores e os patrões.
Corrido do pequeno Zapata
(Corrido de Zapata niño)
Venho cantar aos senhores
uma nova novidade
é que Zapata está vivo,
mas vivo de verdade.
Quando os velhos proseiam
estórias que o vento levou
gostam de falar de Zapata
que muito pequeno se anunciou
Cuida o povo da sua lenda
com cuidadoso fervor.
desbasta, vai polindo
e guarda em uma canção.
(...)
Nos diz e anda dizendo
algum velho dizedor
que Zapata muito cedo
se destacou um libertador.
Em Anenecuilco foi,
miserríssima comunidade
perto da Vila de Ayala
onde Zapata nasceu.
Sendo muito pequeno, nos dizem,
Emiliano presenciou
como espoliava o pai
a injustiça do patrão.
(...)
Zapata, a criança, não entende
a injustiça do patrão:
Como o toma a terra?
Quando aqui sempre viveu?
Zapata criança prega
ao peão à união
e recuperar a terra
que a cobiça tomou.
Não seja idiota, disse o pai.
Tudo pode o senhor.
Tudo têm os amos
Ao índio, só a dor
Então disse Zapata,
com surpreendente decisão:
Quando eu for grande,
a terra, a tomarei do patrão!

Zapatistas de ontem e de hoje

Originalmente o termo zapatismo denominava às tropas comandadas por Emiliano Zapata e seus seguidores, relacionados posteriormente ao agrarismo mexicano.
Desde 1994, quando um grupo guerrilheiro denominado Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) levantou-se em armas em Chiapas, o termo zapatismo tem se confundido com esse grupo.
Atualmente os neo-zapatistas, como também são conhecidos, encontram-se cercados pelo exército, mantendo certa simpatia internacional, mas sem um projeto revolucionário e uma perspectiva concreta para o México.

Referências:
CÓRDOVA, Arnaldo. La ideologia de la Revolución Mexicana , México, DF: ERA, 1991.
GILLY, Adolfo. La Revolución Interrumpida, México: Era, 2007.
KATZ, F. La guerra secreta en México. México: Era, 1981.
REED, John. Mexico Rebelde , Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
TAIBO II, Paco Ignacio. Pancho Villa - Uma Biografia , São Paulo: Planeta, 2007.
WOMACK, John. Zapata y la Revolución Mexicana, Mexico: Siglo Veintiuno, 1985.
Corridos: Zapata Hoy. Disco de Pilar Pellicer y Tribu. 1980. Todo o corrido, inclusive com som está disponível na internet: http://www.bibliotecas.tv/zapata/corridos/corr01.html
[1] Ejidos - Em diversos países da América Latina, formas de propriedade coletiva da terra sobreviveram à conquista, ao período colonial e chegaram ao século XX. No Peru e Bolívia essas terras da comunidade e trabalhadas coletivamente têm o nome de Ayllu. No México são denominadas de Ejidos.

Da tragédia das chuvas à resistência organizada de um povo







  “VIVER VIVENDO E, NÃO, VIVER MORRENDO!”  (citação de H. Chávez)

Helena Iono
Direto de Caracas
 



O que está ocorrendo nos últimos dias na Venezuela, fortemente vitimada por temporais e chuvas intermitentes merece uma atenção especial do mundo como indicador do altíssimo nível de desequilíbrio eco-ambiental atingido no nosso planeta, e por outro lado, de surpreendente resistência social organizada para reverter tamanha tragédia humana.

Antes de iniciar, para abrir a mente dos que querem uma informação objetiva e verdadeira, é preciso partir da premissa de que o povo e o governo venezuelano não são apenas vítimas dessa catástrofe natural, mas de uma constante guerra dos grandes meios de comunicação que não dão trégua, mesmo diante da dor humana, como abutres contando friamente o número de mortos, inventando e atacando sistematicamente o governo revolucionário.

Nos últimos 10 dias, choveu na Venezuela, particularmente nos estados próximo ao Caribe como nunca nos últimos 40 anos, um volume de água equivalente a 1 ano de chuvas, após meses de intensa e anormal seca, parte do efeito El Niño, dentro desse trágico panorama global de destruição ecológica, que tem levado ao banco dos réus, desde Cancun aos protestos mundiais de rua: o sistema industrial das grandes potências capitalistas, o interesse privado e a ambição do lucro.

Somam-se a tal desajuste climático, as estruturas empíricas de cidades como Caracas edificadas pela exploração burguesa, oligárquica dos terrenos urbanos, por contínuos 40 anos de gestão conservadora de partidos como COPEI e AD, antes da revolução bolivariana;  naquelas décadas, a migração do campo à cidade não encontrou outro lugar para construir barracos, e casas, que sobre terras deslizantes, desprovidas de pedras de apoio ou árvores, saqueadas por construtoras que reservaram o leste da cidade para as mansões e os edifícios da burguesia. Quem esteve em Caracas já viu. Nas encostas dos morros que a circundam, há centenas de áreas de risco, reproduções dos Bumbas de Niterói e das favelas do Rio. Contando com o aval de governos locais corruptos anteriores, do período de Perez Jimenez a Andrés Peres e outros, os pobres tiveram a permissão de arriscar suas vidas, em terrenos fofos sem infraestrutura, canalizações, nem esgoto. Que importava aos burgueses que um dia todo esse povo pudesse morrer, sob temporais ou bombas de napalm? Mas, o presidente H. Chávez decidiu dizer um basta a isto! “Viver vivendo e, não, Viver morrendo!”, essa tem sido uma frase de um filósofo que ele tem reiterado todos os dias, não como retórica, mas como um sincero projeto político transformador. E é onde queremos chegar com este relato. Porque catástrofe por catástrofe, existem outras piores como a que está assolando o pobre povo haitiano. Mas, o governo venezuelano aqui tem atuado energicamente em medidas de prevenção contra maiores perdas humanas e à reconstrução garantida de uma vida digna para os afetados pelas chuva.

Da catástrofe à resistência organizada do Estado e da população

A grande diferença diante de catástrofes climáticas que têm ocorrido no mundo, e o que se tem presenciado nestes dias na Venezuela, é uma política de estado de prevenção e gigantesca mobilização social de salvamento e reconstrução.

Em 1999, no estado Vargas, houve um aluvião que vitimou 50 mil pessoas. O governo revolucionário de Hugo Chávez, recém empossado naquele momento, herdando a inoperância do regime anterior, decidiu construir um sistema de defesa e de contenção. As recentes chuvas, criaram muitos danos, a ponto de ser decretado estado de emergência, mas a prevenção acarretou agora menos mortes. Houve somente 2: infelizmente, um vereador do PSUV e um policial, que agiam em socorro à população.

A proporção das vítimas fatais em relação aos danos – até hoje 60 mil (*) afetados no pais, com o estado Falcón quase submerso, e Miranda e Vargas sob emergência, dezenas de milhares de casas pobres desabadas – tem sido relativamente reduzida: conta-se até o momento com apenas 32 mortos em todo o país. A rapidez das medidas preventivas para salvar vidas, conduzindo em refúgios de urgência, tem sido determinante para evitar maior tragédia humana. Sob o comando direto do presidente Chávez, o vice-presidente e todos os ministros arregaçaram as mangas e vestiram as botas junto a governadores, prefeitos, conselhos comunais, forças armadas, soldados da reserva, milícias, estudantes, operários, funcionários públicos, militantes do PSUV e milhares de voluntários, que estão atuando direta e incansavelmente em ações de salvamento. As 60 mil pessoas estão abrigadas em mais de 310 refúgios civis e 9 militares, sem contar que várias outras instituições ministeriais, Telesur, hotéis privados, ofereceram refúgio às famílias.

Há três fatos de destaque histórico que os grandes meios da oposição ocultam e que é preciso divulgar ao mundo. O presidente Chávez decidiu entre outras, hospedar 26 famílias que perderam suas casas nas dependências do Palácio Presidencial de Miraflores e lhes prometeu que de lá só sairão para seus novos apartamentos e nunca mais voltarão a viver como antes: terão casa, emprego, escola e saúde. Da mesma forma, abriu as acomodações do Forte Militar Tiuna aos desabrigados. Foi há 2 dias, à favela de La Pedrera, zona de alto risco e desabamento, e acolhido por multidões de famílias convenceu-as a evacuar para refúgios, assegurando guarda militar dos pertences. Isso não é populismo, como divulga a grande mídia. É a qualidade natural humana que somente o ideal socialista pode emanar nos dirigentes, presidentes e governantes: o amor verdadeiro para com o povo oprimido e à nação. Mais que águas e chuvas, a Venezuela está inundada de solidariedade e desejo de mudar para sempre essa dependência ao capitalismo e à burocracia.

O governo bolivariano decidiu criar através de votação inicial na Assembléia Nacional uma “Lei de Emergência para terrenos urbanos e habitações”, que priorize a atribuição de casas às pessoas de risco vital como velhos e desabrigados; depois, aos novos casais. A nova lei também definirá o valor dos terrenos urbanos, até hoje sob critério capitalista. Designaram-se vários fundos estatais e projetos de construção urgente de casas populares: em 2011 deverão ser construídas 12.775 casas para os refugiados. Vários terrenos baldios em desuso, ou fins sociais não prioritários como campo de golf, serão expropriados para dar passo a edifícios residenciais. O presidente Chávez convocou os ministros e comitês de desabrigados a controlar o ritmo de construção e o critério social de atribuição das casas, para evitar o desvio burocrático. As inundações na Venezuela estão “radicalizando o processo democrático” e empurrando a correnteza revolucionaria.

Dois aspectos notáveis neste processo venezuelano. O poder popular, o controle social diretamente estimulado pelo Presidente da República que abriu literalmente a casa de governo ao povo; e a participação do exército e do soldado defensor do povo, salvando gente, obstruindo estradas, carregando comida, remédios, reconstruindo estradas. Todos os estudantes da UNEFA (Universidade Experimental das Forças Armadas) estão atuando no reconhecimento dos terrenos, das casas desmoronadas, das medicinas necessárias, das atenções às crianças nos refúgios.  A América Latina já presenciou exemplos como este, em 1973 na Argentina, na época de Héctor J. Cámpora que criou a Operação Dorrego, onde se estabeleceram ações conjuntas entre soldados e a juventude peronista em ajuda a populações inundadas. Na Venezuela, esse processo de solidariedade e exercício de atuação unificada entre governo, exército, o partido (PSUV), milícias, estudantes, comunas se solidificou com as chuvas, e será irreversível. Soma-se a isso a enorme ajuda internacional, dos médicos cubanos espalhados em todos os bairro afetados, e a ajuda governamental de paises como Bolívia, Cuba, China e tantos outros.

Seria muito oportuno e necessário que o governo brasileiro, e os movimentos sociais, o PT, MST, a CUT, a UNE, as TVs e rádios comunitárias, estudantes e trabalhadores do Brasil afora, enviassem além da ajuda material, e a sua solidariedade ao povo e ao governo venezuelano, o seu apoio moral e a sua saudação pelo seu exemplo de conduta de resistência e de luta frente às catástrofes. Transformar as dificuldades em um programa de luta e saltos revolucionários é o que a Venezuela nos ensina.

Helena Iono
Correspondente da TV Cidade Livre, o Canal Comunitário de Brasília

Desde Caracas – Venezuela
3/12/2010

(*) Dados baseados em informações do quotidiano “Correio do Orinoco” da Venezuela

“Dont mix races”: Como o direita racista anda educando suas crianças

Conceição Oliveira em seu blog

Enquanto isso nos EUA:
 
Trata-se de um programa de tevê estadunidense, triste no formato, na inadequação (as crianças mal conseguem ler os roteiros) mas, principalmente triste porque defende o indefensável: o discurso da supremacia branca e cristã.
Walt Disney Company demorou 86 anos para levar para as telas do cinema uma protagonista negra. O comentário depreciativo sobre o filme “The Princess and The Frog” além de servir como reforço ao discurso contra união interracial, serve também para estigmatizar religiões afro.
Fico me perguntando qual é a fronteira legal nos Estados Unidos que permite discursos como estes serem veiculados na tevê. Recorrer à Primeira Emenda para defender estas sandices me parece um absurdo.
De todo modo, da próxima vez que você sentir inveja dos EUA com este eterno complexo de colonizado, lembre-se  de Andrew Pendergraft e imagine um vídeo de crianças negras fazendo algo semelhante.
O vídeo foi legendado pelo @quantotempodura que fez uma breve pesquisa sobre os mentores da intolerância racista, reproduzo-a:
“O nome do garoto é Andrew Pendergraft. A família dele inteira faz parte da KKK. Por sinal, ele é neto de um dos fundadores, Thomas Robb. Assim sendo, o garoto foi criado desde o nascimento pra ser racista.
Andrew já faz o “The Andrew Show” há vários meses. Em todo episódio é a mesma coisa: ele começa falando de algum assunto qualquer pra na sequencia encaixar esse assunto com… “Dont mix races”
“Dont mix races” – Não misture as raças. Para Andrew, quer dizer, pra quem escreve os discursos de Andrew, brancos devem ficar afastados de negros, asiáticos, etc. Tudo para manter a “Supremacia branca”
Andrew está com 10 anos e já divulga o racismo pelo mundo afora, graças à sua família maluca.
Assista, sinta nojo e entenda que pro racismo acabar, você tem que criar seus filhos direito.”

O tráfico no Rio e o crime organizado transnacional



Os verdadeiros chefes do narcotráfico no Rio de Janeiro são ligados à rede do crime organizado transnacional que movimenta no sistema bancário internacional cerca de 400 bilhões de dólares por ano. Esses são os grandes responsáveis pela violência e pelo tráfico de drogas e armas em todo o mundo. A situação que vemos no hoje no Rio reflete um quadro internacional, onde as polícias só conseguem apreender entre 3 e 5% das drogas ofertadas no mercado. É preciso ter em mente essa dimensão global do crime organizado na hora de buscar soluções para enfrentar o problema em nossas cidades. A avaliação é do jurista Wálter Maeirovitch (foto), colunista da revista Carta Capital e ex-secretário nacional antidrogas da Presidência da República.
Compreender essa dimensão global é condição necessária para evitar discursos e propostas de soluções simplistas para o problema. Maierovitch dá um exemplo: “Os produtos principais do tráfico de drogas são a maconha e a cocaína. Tomemos o caso da cocaína. Sua matéria prima, a filha de coca, é cultivada nos Andes, especialmente no Peru, Bolívia, Colômbia e Equador. No entanto, a produção da cocaína exige uma série de insumos químicos e nenhum destes países tem uma indústria química desenvolvida. O Brasil, por sua vez, possui a maior indústria química da América Latina”. Ou seja, nenhum dos países citados pode ser apontado, isoladamente, pela produção da cocaína. Essa “indústria” tem um caráter essencialmente transnacional.

Novas tendências das máfias transnacionais

Presidente do Instituto Brasileiro Giovanni Falcone de Ciências Criminais, Wálter Maierovitch é um estudioso do assunto há muito tempo. O livro “Novas Tendências da Criminalidade Transnacional Mafiosa” (Editora Unesp), organizado por ele e por Alessandra Dino, professora da Universidade Estadual de Palermo, trata dessas ramificações internacionais do crime organizado. A primeira Convenção Mundial sobre Crime Organizado Transnacional, organizada pela ONU, em 2000, em Palermo, destacou o alto preço pago ao crime organizado internacional em termos de vidas humanas e também seus efeitos sobre as economias nacionais e sobre o sistema financeiro mundial, onde US$ 400 bilhões são movimentados anualmente.
Em 2009, diante da crise econômico-financeira mundial, o czar antidrogas da ONU, o italiano Antonio Costa, chamou a atenção para o fato de que foi o dinheiro sujo das drogas funcionou como uma salvaguarda do sistema interbancário internacional. “Os bancos não conseguem evitar que esse dinheiro circule, se é que querem isso”, observa Maierovitch. A questão da droga, acrescenta, é muito usada hoje para esconder interesses geopolíticos. Muitos países são fortemente dependentes da economia das drogas, como é o caso, por exemplo, de Myanmar (antiga Birmânia), apontado pela ONU como o segundo maior produtor de ópio do mundo (460 toneladas), e de Marrocos, maior produtor mundial de haxixe. (Clique aqui para ler mais)
Foto 1: Divulgação
Foto 2: Marcelo Cassal Jr (Agência Brasil)

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Memória comunista: 20 anos da morte de Caio Prado Jr

  Milton Pinheiro no Correio da Cidadania   
 
No último dia 23 de novembro fez 20 anos da morte daquele que é considerado o nosso maior historiador, Caio Prado Jr. Esse pensador e homem de ação marcou o debate intelectual e político brasileiro, ao tempo em que agia sobre a realidade social, como militante do Partido Comunista Brasileiro, onde ingressou em 1931, permanecendo em seus quadros até sua morte em 1990. Foram 59 anos de uma militância constante.
 
Caio Prado Jr. nasceu no dia 11 de fevereiro de 1907, na cidade de São Paulo, e sua vida pode ser sintetizada por uma frase que ele citara no seu discurso como deputado estadual do PCB, na primeira sessão da primeira legislatura de 1947, da Assembléia Legislativa de São Paulo: "É por ação que os homens se definem". Portanto, para conhecimento da história do Brasil, da luta pelo socialismo e da memória do PCB, é importante registrar a vida do camarada Caio Prado Jr., sem dúvida, o nosso maior intelectual.
 
Em 1924, Caio Prado Jr. ingressou na Faculdade de Direito de São Paulo, já em 1926 participou do primeiro congresso dos estudantes de Direito, em Minas Gerais, e, em 1927, publicou o seu primeiro artigo no periódico A Chave, intitulado "A Crise da Democracia Brasileira". Em 1928, tornou-se bacharel em Direito. Nessa mesma ocasião foi preso em São Paulo por fazer uma saudação à candidatura de Getúlio Vargas, ao se dirigir ao então candidato Júlio Prestes. Em 1930, participou da Revolução como membro de um comitê de apuração dos crimes do governo anterior.
 
Em 1932, começou a publicar artigos, já com conteúdo marxista, examinando, naquele período, a economia brasileira. Nesse mesmo ano, fundou o Clube dos Artistas Modernos (CAM) e, em 1933, viajou para a URSS e, no retorno, publicou o livro Evolução Política do Brasil – Ensaio de Interpretação Materialista do Brasil. Logo depois, em 1934, publicou URSS: um Mundo Novo e nesse mesmo ano concluiu a tradução do livro de Bukhárin, Tratado de Materialismo Histórico, fato de grande relevância histórica para a luta ideológica no Brasil, pois passávamos a ter literatura marxista entre nós. Ainda em 1934, enquanto participava de vários cursos na USP, que havia sido recentemente fundada, juntamente com vários intelectuais europeus e brasileiros, fundou a Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB).
 
O ano de 1935 se reveste de grande ebulição. São as lutas contra o governo autoritário de Getúlio Vargas e a construção de um instrumento de frente única chamado de ALN (Aliança Libertadora Nacional). Caio Prado Jr. foi eleito o vice-presidente da ALN em São Paulo e, nesse mesmo ano, passou a ser o diretor do jornal A Platea, onde escreveu e publicou o programa da ALN. O ano prossegue com grandes agitações políticas, em novembro ocorrera o levante comunista e o governo popular e provisório de três dias na cidade vermelha de Natal, logo sufocado pelas tropas de Vargas a serviço da burguesia. A partir daí, desenvolveu-se uma gigantesca repressão aos comunistas e aliancistas por todo o país. Nessa onda repressiva ocorreu a prisão de Caio Prado Jr. no Rio Grande do Sul, depois trazido para São Paulo, onde ficou preso até 1937.
 
Quando foi solto, ainda no ano de 1937, viajou para o exílio na França, onde desenvolveu intensa atividade intelectual e política. Fez cursos na Sorbonne, viajou pelo Norte e Noroeste da Europa e exerceu forte ação de solidariedade aos refugiados da Guerra Civil Espanhola. De 1937 a 1939, enquanto esteve na França, militou no Partido Comunista Francês e nele exerceu muitas atividades políticas. Durante esse período escreveu muitos textos, em especial pesquisa historiográfica, relatos de viagens, debates sobre cultura e uma discussão sobre a gênese e a evolução do socialismo.
 
No seu retorno ao Brasil, empreendeu várias viagens pelo interior do país, ficando mais tempo no estado de Minas Gerais e escrevendo textos sobre essas viagens, bem como um estudo sobre a questão urbana da cidade de São Paulo, publicado em 1941. Em 1942, foi lançada sua grande obra Formação do Brasil Contemporâneo, que tem como eixo central o estudo da formação social brasileira e a sua transformação. Assim como Marx, no Capital, para Caio Prado Jr. o estudo da realidade brasileira e sua formação social e histórica contém os elementos de suas características atuais e os elementos para sua transformação. Apesar de ser uma obra respeitada e elogiada por historiadores de todos os tempos, mais do que uma grande pesquisa historiográfica, o objetivo subjacente é o conhecimento da realidade para sua transformação revolucionária.
 
Durante o ano de 1943, Caio Prado Jr. fundou a editora Brasiliense e escreveu diversos artigos sobre historiografia, em especial o Roteiro para Historiografia do Segundo Reinado (1840-1889). No ano seguinte, o intelectual comunista resolveu fazer articulações políticas para derrubar o governo Vargas, viajando para a Argentina e o Uruguai, onde manteve contato com intelectuais; todavia, mesmo com essa intensa movimentação política, continuou escrevendo textos historiográficos sobre algumas regiões do Brasil, sobre índios, povoamento e limites geográficos.
 
No ano de 1945, com o processo de democratização do Brasil e a legalidade do PCB, Caio Prado Jr. disputou a eleição para deputado federal na lista do Partido em São Paulo, mas ficou na terceira suplência. Ainda naquele ano, foi publicado o livro História Econômica do Brasil, e, logo em seguida, ele foi eleito para a Comissão Política do I Congresso Brasileiro de Escritores. Pouco depois, lançou a coleção Problemas Brasileiros pela editora Brasiliense.
 
Em 1946, Caio Prado Jr. aprofundou seus escritos nos diários políticos que fazia e participou, no PCB, dos debates sobre as candidaturas a deputado estadual que ocorreriam no ano seguinte. Nas eleições de 1947, elegeu-se deputado estadual pelo PCB e participou intensamente dos debates no parlamento, onde apresentou emendas e projetos para a constituição paulista de 1947. Durante sua legislatura, dentre vários projetos, vale ressaltar que apresentou o projeto de criação da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), que se transformou em um dos mais importantes instrumentos de apoio à pesquisa no Brasil. Nesse mesmo ano, Caio Prado Jr. publicou no jornal do PCB, A Classe Operária, o artigo "Fundamentos econômicos da revolução brasileira", onde criticou algumas avaliações e teses do partido.
 
A luta política e ideológica se acirrou no Brasil, o registro do PCB foi cassado em 1948 e Caio Prado Jr. teve seu mandato cassado juntamente com outros deputados comunistas pelo país. Ficou preso durante três meses e, quando foi solto, viajou para a Polônia, Tchecoslováquia e França. Durante esse período, trabalhou em textos filosóficos e prosseguiu em viagens pelos países da Europa, quando participou do Congresso da Paz em 1949, realizado em Paris pelo Partido Comunista Francês.
 
Nos anos de 1950 e 1951, Caio Prado Jr. se dedicou ao estudo da filosofia e publicou, em 1952, o livro, em dois tomos, Dialética do Conhecimento.
 
Um dado importante para a memória da luta ideológica no Brasil é que, em 1954, foi fundada por Caio Prado Jr. a gráfica Urupês, que foi responsável pela publicação de farto debate sobre a realidade brasileira. Ainda nesse mesmo ano, Caio Prado Jr. concorreu à cátedra de Economia Política na USP, todavia, mesmo tendo sido aprovado no concurso de Livre-docência, não recebeu a cátedra na faculdade de Direito.
 
Em 1955, foi lançado o primeiro número da histórica revista Brasiliense e, já no número 2, Caio Prado Jr. escreveu o artigo "Nacionalismo Brasileiro e Capitais Estrangeiros". Nos anos seguintes continuou seu trabalho intelectual e, em 1957, publicou o livro Esboço dos Fundamentos da Teoria Econômica.
 
Entre 1960 e 1962, Caio Prado Jr. viajou pelos países socialistas, URSS, China, e em Cuba participou das comemorações do III aniversário da Revolução, integrando a delegação brasileira. Em 1962, no seu retorno, publicou o livro O Mundo do Socialismo.
 
Com o golpe civil-militar de 1964, saiu o último número da revista Brasiliense (51). Caio Prado Jr. foi preso novamente e passou uma semana encarcerado no DOPS. Essa nova conjuntura brasileira e suas preocupações com a transformação da realidade encontraram em Caio Prado Jr. um esforço intelectual intenso, pois em 1966 ele lançou o clássico A Revolução Brasileira. Esse livro produziu um grande impacto na esquerda em nosso país e a perseguição política da ditadura avançou. Caio Prado jr. fugiu do Brasil em 1970 para o Chile, mas foi preso ao retornar nesse mesmo ano e assim permaneceu por quase dois anos. Foi indiciado em inquérito policial-militar (IPM) e condenado. Ficou preso, primeiro na casa de detenção Tiradentes e depois no quartel de Quitaúna, quando foi solto em agosto de 1971.
 
Embora esse ano de 1971 tenha sido um ano em que ficou preso, mesmo assim publicou o livro O Estruturalismo de Lévi-Strauss – o marxismo de Louis Althusser. A partir daí, começou o processo de recolhimento de Caio Prado Jr., porém continuando em articulação com as ações do partido e produzindo intelectualmente, publicando ainda textos e livros. Em 1979, ficou doente e passou por um período muito difícil até 1982, com o mal de Alzheimer. Continuou trabalhando muito, desenvolvendo suas reflexões intelectuais e, em 23 de novembro de 1990, morreu aos 83 anos, em São Paulo. Seu corpo foi velado na biblioteca municipal Mário de Andrade e foi sepultado no Cemitério da Consolação.
 
Calava-se a voz, paralisava-se a pena do maior intelectual da história do PCB e maior historiador do Brasil. Mas suas ações e suas formulações pautaram a luta e o pensamento sobre a revolução em nosso país. Serve como marca indelével para o futuro socialista pelo qual todos nós lutamos.
 
Milton Pinheiro é professor de Ciência Política da Universidade do Estado da Bahia – Uneb, editor da revista Novos Temas e autor do livro Outubro e as experiências socialistas no século XX.