sexta-feira, 8 de abril de 2011

As origens da expressão “politicamente correto”

Se pudéssemos resumir de forma simplificada a grande descoberta dos estudos da linguagem no século XX, o resumo seria: a língua não é um instrumento neutro. Dito assim, parece à toa. Mas quando desempacotamos as premissas e conclusões que se desprendem desse enunciado, algumas consequências se impõem para a prática política de esquerda. Não se trata só de que os sujeitos que se utilizam da linguagem não são neutros, mas que os próprios vocábulos, estruturas e entonações da língua trazem consigo uma história carregada de sentidos culturais e políticos. Não é do interesse dos que lutam ao lado dos mais fracos ignorar ou minimizar essa história.
A expressão “politicamente correto” se firmou na língua inglesa como parte de uma ofensiva da direita estadunidense nas chamadas guerras culturais dos anos 1980 e 1990. Embora haja ocorrências da expressão em textos da New Left (a Nova Esquerda), foi naquelas batalhas que o termo passou a funcionar como designação de um suposto autoritarismo policialesco da esquerda no uso da linguagem. A esfera do politicamente correto abrangeria classe, raça, gênero, orientação sexual, nacionalidade, descapacitação e outros marcadores de subalternidade. Mas, sem dúvida, o exemplo paradigmático sempre foi racial.
Enquanto parte significativa dos negros dos EUA passava a utilizar, como autodescrição, o termo “afro-americano” — sob a lógica de que preferiam identificar-se pela cultura de origem, e não pela cor da pele —, o conservadorismo realizava simpósios como “Correção Política e Estudos Culturais”, promovido pela Conferência das Humanidades Ocidentais, em Berkeley, em 1990. O colóquio se propunha a examinar “qual o efeito que tem sobre a pesquisa acadêmica a pressão para se conformar a ideias atualmente na moda”. Tomava corpo a bem sucedida estratégia da direita nas guerras culturais. Partia-se de uma premissa jamais demonstrada, a “pressão” para que se adotassem expressões “politicamente corretas”. No mundo realmente existente, não se tinha notícia de grandes pressões do movimento negro sobre quem fosse para que se abandonasse o termo “black” por “African-American”. Não se tinha notícia de que ninguém tivesse sofrido dano considerável por não usar “ele ou ela” (ao invés de somente “ele”) em frases com sujeito de gênero indeterminado. Mas o mero ato de se explorar a possibilidade de uma nomenclatura alternativa, mais conforme à identidade reclamada pela comunidade, no caso racial, mais inclusiva e menos discriminatória, no caso dos pressupostos sexistas da língua, já oferecia o arremedo de bicho-papão a partir do qual a direita dos EUA desenvolveria sua tática favorita: silenciar o outro enquanto se faz de vítima oprimida. O coroamento dessa tática ocorreu no famoso caso da Universidade Stanford, que marcou a vitória da direita naquele debate e a consolidação da expressão “politicamente correto”.
Os currículos universitários norte-americanos incluem um curso de obras-primas ocidentais que percorre, em geral, um trajeto que vai de Homero (ou Platão) a Nietzsche. Esses autores também são lidos numa série de outros cursos que, em Stanford, compõem as grades dentro das quais o aluno pode cumprir os requisitos de humanas. Em março de 1988, o Senado de Stanford decidiu aprovar uma proposta de substituição de um desses cursos de cultura ocidental, em uma das grades, por um curso intitulado “Culturas e valores”, de cunho comparativo, no qual se incluíam textos “não-ocidentais” como os do ensaísta antilhano Frantz Fanon e da ativista indígena guatemalteca Rigoberta Menchú.
Dentro de Stanford, a implantação do novo currículo foi absolutamente tranquila, num debate já informado por anos de reflexão sobre a necessidade de oferecer outras versões sobre a modernidade. A votação no Senado foi normal. A defesa do projeto foi ligeiramente politizada por grupos de estudantes, mas tudo correu dentro da normalidade que se espera de uma revisão curricular como qualquer outra, exceto por um detalhe. As principais fundações da direita, grupos religiosos e o Partido Republicano acompanhavam o debate de perto. A grande imprensa passou a dedicar blocos de seus programas à “eliminação da cultura ocidental no currículo das universidades americanas”, ao “assassinato de Shakespeare e Platão” e à “intimidação de ativistas estudantis”. Estavam lançadas as sementes das guerras culturais.
Desde Watergate, a queda de Nixon e a consequente desmoralização da direita estadunidense, as forças conservadoras do país passaram a dedicar intenso esforço à vitória na luta cultural. Investiram-se milhões de dólares na construção de think tanks como a Heritage Foundation. Os neo-conservadores sabiam que era no terreno da cultura que se jogaria a cartada decisiva. Em 1988, a direita republicana concluía oito anos de controle sobre a Casa Branca, acabava de estrangular a revolução centro-americana, estava pronta para presenciar a queda do comunismo e identificava na cultura a nova guerra que deveria vencer. William Bennett (ex-secretário de Educação no governo Reagan), Herbert London (fundador do Instituto Hudson, um think tank de direita), Allan Bloom, autor de O fechamento da mente americana, e Dinesh D’Souza, autor de Illiberal Education, passariam a acusar Stanford de jogar no lixo a cultura ocidental. O livro de D’Souza atacava especialmente a incorporação do testemunho de Rigoberta Menchú, ativista guatemalteca de etnia maia-quiché que aprendeu espanhol já adulta e narrou sua história de vida à antropóloga franco-venezuelana Elizabeth Burgos. O relato é indissociável das atrocidades cometidas na guerra civil da Guatemala nos anos 1970 e 1980, de responsabilidade de uma ditadura financiada pelos EUA. O que enfurecia no testemunho de Menchú era que, ao ser incluído num currículo universitário de culturas ocidentais, ele dava uma resposta aos que idealizam o Ocidente ou “os valores ocidentais” como cavalos de batalha. O livro implicitamente dizia: O Ocidente é isto aqui também, é atrocidade também. No entanto, a versão do episódio Stanford apresentada nas redes televisivas e em  revistas como Time e Newsweek se limitava a replicar as fundações de direita: a universidade estava “eliminando a cultura ocidental” do currículo e “matando” Platão e Shakespeare.
De lá para cá, a expressão “politicamente correto” virou moeda corrente no Brasil. Com frequência, a mera menção de algum episódio que envolva racismo, homofobia, sexismo ou xenofobia é desqualificada com referência ao termo, que estaria nos impedindo de sermos nós mesmos. É como se “politicamente correto” fosse um ser com vontade própria, um movimento, um sujeito dotado de consciência. No mundo realmente existente, ele é apenas isto: um sintagma sem referente, um balão de ensaio, uma cortina de fumaça, uma tutameia. Não interessa às forças de esquerda perpetuar a confusão.
Este artigo é parte integrante da edição 96 da revista Fórum.via Sul21

Criança, entre livros e TV


Frei Betto, recebido por email

Foi o psicanalista José Ângelo Gaiarsa, um dos mestres de meu irmão Léo, também terapeuta, que me despertou para as obras de Glenn e Janet Doman, do Instituto de Desenvolvimento Humano de Filadélfia. O casal é especialista no aprimoramento do cérebro humano.
Os bichos homem e mulher nascem com cérebros incompletos. Graças ao aleitamento, em três meses as proteínas dão acabamento a este órgão que controla os nossos mínimos movimentos e faz o nosso organismo secretar substâncias químicas que asseguram o nosso bem-estar. Ele é a base de nossa mente e dele emana a nossa consciência. Todo o nosso conhecimento, consciente e inconsciente, fica arquivado no cérebro.
Ao nascer, nossa malha cerebral é tecida por cerca de 100 bilhões de neurônios. Aos seis anos, metade desses neurônios desaparecem como folhas que, no outono, se desprendem dos galhos. Por isso, a fase entre zero e 6 anos é chamada de "idade do gênio”. Não há exagero na expressão, basta constatar que 90% de tudo que sabemos de importante à nossa condição humana foram aprendidos até os 6 anos: andar, falar, discernir relações de parentesco, distância e proporção; intuir situações de conforto ou risco, distinguir sabores etc.
Ninguém precisa insistir para que seu bebê se torne um novo Mozart que, aos 5 anos, já compunha. Mas é bom saber que a inteligência de uma pessoa pode ser ampliada desde a vida intrauterina. Alimentos que a mãe ingere ou rejeita na fase da gestação tendem a influir, mais tarde, na preferência nutricional do filho. O mais importante, contudo, é suscitar as sinapses cerebrais. E um excelente recurso chama-se leitura.
Ler para o bebê acelera seu desenvolvimento cognitivo, ainda que se tenha a sensação de perda de tempo. Mas é importante fazê-lo interagindo com a criança: deixar que manipule o livro, desenhe e colora as figuras, complete a história e responda a indagações. Uma criança familiarizada desde cedo com livros terá, sem dúvida, linguagem mais enriquecida, mais facilidade de alfabetização e melhor desempenho escolar.
A vantagem da leitura sobre a TV é que, frente ao monitor, a criança permanece inteiramente receptiva, sem condições de interagir com o filme ou o desenho animado. De certa forma, a TV "rouba” a capacidade onírica dela, como se sonhasse por ela.
A leitura suscita a participação da criança, obedece ao ritmo dela e, sobretudo, fortalece os vínculos afetivos entre o leitor adulto e a criança ouvinte. Quem de nós não guarda afetuosa recordação de avós, pais e babás que nos contavam fantásticas histórias?
Enquanto a família e a escola querem fazer da criança uma cidadã, a TV tende a domesticá-la como consumista. O Instituto Alana, de São Paulo, do qual sou conselheiro, constatou que num período de 10 horas, das 8h às 18h de 1º de outubro de 2010, foram exibidos 1.077 comerciais voltados ao público infantil; média de 60 por hora ou 1 por minuto!
Foram anunciados 390 produtos, dos quais 295 brinquedos, 30 de vestuário, 25 de alimentos e 40 de mercadorias diversas. Média de preço: R$ 160! Ora, a criança é visada pelo mercado como consumista prioritária, seja por não possuir discernimento de valor e qualidade do produto, como também por ser capaz de envolver afetivamente o adulto na aquisição do objeto cobiçado.
Há no Congresso mais de 200 projetos de lei propondo restrições e até proibições de propaganda ao público infantil. Nada avança, pois o lobby do Lobo Mau insiste em não poupar Chapeuzinho Vermelho. E quando se fala em restrição ao uso da criança em anúncios (observe como se multiplica!) logo os atingidos em seus lucros fazem coro: "Censura!”
Concordo com Gabriel Priolli: só há um caminho razoável e democrático a seguir, o da regulação legal, aprovada pelo Legislativo, fiscalizada pelo Executivo e arbitrada pelo Judiciário. E isso nada tem a ver com censura, trata-se de proteger a saúde psíquica de nossas crianças.
O mais importante, contudo, é que pais e responsáveis iniciem a regulação dentro da própria casa. De que adianta reduzir publicidade se as crianças ficam expostas a programas de adultos nocivos à sua formação?
Erotização precoce, ambição consumista, obesidade excessiva e mais tempo frente à TV e ao computador que na escola, nos estudos e em brincadeiras com amigos, são sintomas de que seu ou sua querido(a) filho(a) pode se tornar, amanhã, um amargo problema.

“Ruralistas querem ludibriar agricultores familiares”


Fetraf e Greenpeace criticam ato com megaestrutura para defender alterações de Aldo Rebelo ao Código Florestal



Vinicius Mansur
de Brasília (DF) para o Brasil de Fato

Milhares de produtores rurais e uma megaestrutura estavam em Brasília, nesta terça-feira (5), para um ato que pediu a aprovação do novo Código Florestal. O custo do evento, de acordo com seus organizadores, a Confederação Nacional da Agricultura Pecuária (CNA) e instituições ligadas ao lobby ruralista, foi de R$ 2 milhões.
O cenário montado serviu de palco para o discurso parlamentares ruralistas: o novo código é uma urgência para todos os produtores rurais do país. Uma farsa, de acordo com o coordenador da Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (Fetraf), Francisco Lucena:
“Os ruralistas querem ludibriar a cabeça de milhares de agricultores familiares com a ilusão de que essa proposta vai elevar a renda e a produção. É uma forma de esconder o interesse da bancada ruralista e dos grandes produtores”.
Lucena explica que uma das ofertas dos ruralistas é dispensar da Reserva Legal as propriedades com até 4 módulos fiscais. Isso é, desobrigar estas propriedades de reservar 20% da área para preservação do ambiente natural da região. A questão é que, enquanto o módulo fiscal mede 5 hectares no Distrito Federal, por exemplo, na Amazônia Legal ele mede 100. “Ou seja, representará uma brutal ampliação da degradação. O que eles querem é ampliar a fronteira agrícola do agronegócio, justificando-se pelos pequenos. Dizem ampliar espaço para produção, mas essa propostas, e muitas outras que vem no pacote, na verdade, podem acabar rápido com nossos recursos naturais.”, diz Lucena.
Para Rafael Cruz, da ONG Greenpeace, os pequenos agricultores serão os maiores prejudicados caso o novo Código Florestal seja aprovado:
“Um estudo da Embrapa concluiu que o Nordeste está ficando impraticável para o plantio de milho, produto básico da dieta do nordestino, por causa da desertificação. Acentuada pelo aquecimento global. E no Brasil a derrubada e queima de florestas é responsável por 61% de todas as emissões dos gases de efeito estufa. No médio e longo prazo o aquecimento vai impactar ainda mais a produção e quem está mais preparado para receber esse tipo de perda é o agronegócio, que tem mais financiamento, maquinaria agrícola, etc. O pequeno não aguenta perda de safras sucessivas.”
Para Cruz, a proposta de novo Código Florestal beneficia, sobretudo, aos parlamentares ruralistas, “que montaram um grande palanque próprio, como o desta terça-feira, com muito dinheiro”.
De acordo com informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), dos 18 deputados federais que integraram a comissão especial do Código Florestal, em julho de 2010, 13 receberam juntos aproximadamente R$ 6,5 milhões doados por empresas do setor do agronegócio, pecuária e até do ramo de papel e celulose durante campanha à reeleição. À época da análise do projeto por esta comissão, o novo Código foi aprovado por 13 votos a 5.

Mídia esconde revoltas em Honduras


Na quarta-feira, 30 de março, milhares de trabalhadores de Honduras aderiram ao “paro cívico”, convocado pela Frente Nacional de Resistência Popular (FNRP). A greve geral se estendeu por todo o território hondurenho e foi duramente reprimida pelo governo golpista de Porfírio Lobo.


Por Altamiro Borges

A mídia nativa, porém, não deu destaque ao protesto ou a brutal repressão. Desde o golpe que derrubou o presidente eleito Manoel Zelaya, em junho de 2009, ela continua torcendo pelos golpistas, serviçais dos EUA.

Segundo Giorgio Trucchi, em artigo publicado no sítio independente da Agência Latinoamericana de Informação (Alai), a violência policial não conseguiu inibir a mobilização, “mas deixou como saldo o ataque as sedes de sindicatos e disparos que mataram um grevista no povoado de Bajo Aguán e feriram dezenas de manifestantes em todo o território”. O Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Bebidas e a Universidade Autônoma de Honduras foram invadidos com brutalidade e vários grevistas foram presos.

Golpistas apoiados pelos EUA

Em Tegucigalpa, capital de Honduras, a greve paralisou o setor de transportes. “A população ocupou vários pontos da capital e promoveu manifestações nas principais artérias... Centenas de professores, que lutam para que não se privatize a educação, se concentraram em frente a Corte Suprema da Justiça, exigindo a libertação de 20 colegas acusados por ‘protestos ilícitos’”.

Diante da expressiva adesão, o golpista Porfírio Lobo esbanjou truculência. “O regime sucedâneo do golpe de Estado demonstrou novamente a sua verdadeira cara, ao reprimir pela segunda semana consecutiva o povo em resistência”, aponta Giorgio Trucchi.

Segundo Bertha Cáceres, coordenadora do Conselho Cívico de Organizações Populares e Indígenas de Honduras (Copinh), a greve da semana passada confirma o avanço da consciência e da mobilização no país. “Hoje é maior a nossa capacidade de resposta”.

“Estamos defendendo nossos direitos, nossa territorialidade e nossas conquistas. Estamos convencidos de que esta mobilização permanente não vai parar”, garante Cáceres. Para ela, o regime autoritário de Porfírio Lobo se mantém graças ao apoio dos EUA, que segue financiando e treinando as forças repressivas do Estado e conta com tropas próprias nas bases militares em Honduras.

Brasil – Israel – As Forças Armadas

080411_mossadDiário Liberdade - [Laerte Braga]
Se numa laranjeira você enxergar apenas a laranja e não perceber a árvore, corre o risco de um dia vir a não ter mais a laranja. Não há todo sem parte, mas há parte sem todo.

O governo Lula viveu seus oito anos como um barco navegando na superfície do mar, mas consciente que havia um outro oceano, esse subterrâneo. Sombrio, sem luz e desejo de despejar seus tsunamis devastadores sobre países como o Brasil.
É claro e evidente que isso implicou em mudanças de curso, em concessões, em guinadas arriscadas no leme, mas não impediu que, ao final, um resultado positivo pudesse ser alcançado.
O ex-presidente terminou seus oito anos legando um Brasil vivo e presente no cenário internacional, abriu as perspectivas para transformações estruturais significativas e necessárias, que devem ser feitas agora, numa conjuntura que, objetivamente é favorável.
Tentar entender todo o processo de globalização, o neoliberalismo, a nova ordem econômica apenas pelo lado do econômico é aceitar que o oceano aparentemente tranquilo – mas convulsionado – pelo conglomerado terrorista EUA/ISRAEL TERRORISMO S/A, é a única realidade.
É preciso perceber que há uma terceira guerra mundial. Que a África é um continente devastado por lutas fratricidas incensadas pelos donos dessa ordem todos sabemos. Que a Ásia está sendo engolida pela China e o conglomerado tenta sobreviver desesperadamente em um e outro país é outra realidade visível a olho nu. Que a Europa Ocidental é uma colônia transformada em bases militares da OTAN é inegável. Que a Rússia e as repúblicas do Leste Europeu são uma grande incógnita disputada a ferro e fogo é outra parte do todo.
O Oriente Médio convulsionado e os povos muçulmanos sendo deliberadamente perseguidos e implacavelmente assassinados (caso dos palestinos principalmente).
Onde entra a laranja América Latina nessa história toda? O Brasil é a maior delas. A mais importante.
As condições objetivas criadas por Lula, malgradas as concessões, sinalizam na necessidade de um grande salto que implica num resgate de nossa história em sua totalidade (o baú da ditadura por exemplo) e em transformações capazes de ampliar e fazer virar realidade a participação popular.
Ao deixarmos que às margens de um oceano subterrâneo, em cumplicidade com setores das elites, com as elites militares, com o latifúndio, sejam plantadas laranjeiras israelenses, estamos nos permitindo ser a Israel de amanhã, o terror transformado em Estado no que alguns chamam de subimperialismo brasileiro, submetido ao imperialismo norte-americano/israelense (entender porque “imperialismo norte-americano/israelense” é simples. As grandes forças políticas dos EUA não têm forças e não sabem como enfrentar o poder sionista).
As empresas citadas nos artigos anteriores e no relatório dirigido pelo STOP THE WALL COMPAIGN ao governo brasileiro mostram que o papel de todo esse oceano subterrâneo, transformam o Brasil em cúmplice de sistemáticas violações do direito internacional. Os artigos 48, 51 e 52 do Protocolo Adicional das Convenções de Genebra exigem que combatentes façam distinção entre alvos civis e militares e não ataque a população civil. Esses ataques são sistemáticos, deliberados.
Dos 1.417 palestinos mortos na recente guerra de Gaza 926 eram civis e entre crianças. A análise por especialistas em conduta militar em todo o mundo mostra que Israel teve a intenção de promover essas mortes. Houve intenção de causar danos aos civis palestinos e uso excessivo de força, por conta políticas expansionistas, que roubam terras e riquezas palestinas (sionistas milenarmente nunca fizeram outra coisa que não isso, são anteriores ao sionismo, inventaram os bancos).
Na guerra do Líbano, em 2006, foram utilizados foguetes teleguiados para atacar ambulâncias e vários comboios civis.
As armas, nesse momento e há algum tempo, são fabricadas aqui com a cumplicidade dos militares brasileiros, de boa parte da elite empresarial.
O serviço secreto de Israel, a MOSSAD, assassina e sequestra inimigos em qualquer parte do mundo, como fizeram agora em Abu Dab contra um integrante do Hamas. Que governa Gaza eleito – é um partido político – pelo voto popular.
Há uma conclusão de Al Hag sobre o assunto que, literalmente, afirma o seguinte.
“Como uma potência ocupante, Israel é ainda legalmente obrigada a respeitar o Direito
Internacional Humanitário (DIH), que proíbe a matança deliberada de pessoas
protegidas. Homicídios intencionais são considerados uma violação grave da Quarta
Convenção de Genebra nos termos do artigo 147. Além disso, a política israelense de
assassinatos extrajudiciais falha, por alvejar civis, em respeitar o princípio fundamental
da distinção entre combatentes e civis. Além disso, Israel não respeita regularmente o
princípio da proporcionalidade, empregando meios letais excessivos levando à morte ou
lesão corporal dos transeuntes. Finalmente, assassinatos seletivos que são realizados em situações em que não há combate, não podem ser justificados por necessidades militares"
Todas as empresas israelenses que compraram ou se associaram a empresas brasileiras no setor bélico são partes da construção do Muro do ódio que sionistas buscam ampliar para separá-los (como povo ungido, Edir Macedo também acha isso do povo dele, tanto que já instalou templos em Israel, associação perfeita), como partes das ocupações ilegais de terras palestinas.
E aí formam o todo do terror de Estado, o conglomerado EUA/ISRAEL TERRORISMO S/A.
O que o relatório pede ao governo brasileiro e o rompimento do acordo militar com Israel e o resgate da dignidade de nosso País em relação ao direito internacional, aos direitos humanos, o fim desse mar subterrâneo por transitam os zumbis da ditadura militar.
O muro desse novo Apartheid viola de forma brutal os direitos internacionais e humanos na Cisjordânia. As leis internacionais proíbem a anexação de território pela força, a destruição e o confisco de propriedade privada (adoram isso) e transferência forçada de população.
As leis internacionais asseguram o direito de circular livremente, o direito ao trabalho, a educação e a saúde.
Em 2004 o parecer consultivo do Tribunal Internacional de Justiça confirmou a ilegalidade do muro e conclamou os países ditos democráticos a tomarem atitudes diante dessa realidade boçal. Estão errando o alvo, o povo líbio está sendo punido.
O que se pede ao Brasil é que seja rompido esse negócio lucrativo de terror, de ódio, de saque, de roubo, de barbárie, no qual estamos atolados por ignorar o mar subterrâneo e permitir que por ali naveguem a estupidez de militares que não têm nada a ver com o Brasil, de elites podres e políticos que silenciam diante de crimes contra a humanidade, permitindo assim, que essas empresas “continuem a lucrar com os crimes de guerra israelenses enquanto que põe em duvida o compromisso do Brasil com os direitos humanos. É inaceitável que o governo brasileiro entregue dinheiro de seu contribuinte para essas empresas e ao final, uma decisão deverá ser tomada entre negociar com Israel ou se colocar ao lado do povo palestino”.

Rubros reflexos do massacre

 
Os massacres envolvendo franco-atiradores e dezenas de alvos inocentes, geralmente em escolas ou universidades, foram por muito tempo considerado um fenômeno tipicamente norte-americano. Com efeito, até a década de 90 os EUA concentravam quase 90% de ataques do tipo.

As explicações, portanto, orbitavam em torno das idiossincrasias do american way of life, com sua concentração fatídica de culto às armas e à livre-circulação destas, individualismo e consumismo exacerbados, e belicismo como manutenção de um orgulho e poderio nacionais que há tempos encontra-se em decadência.

Por isso mesmo, alguns setores - da esquerda notadamente -, reagiam de forma contraditória: ainda que não deixassem de achar estarrecedor e deplorável a morte de inocentes por tais eventos promovida, nutriam uma indisfarçável satisfação por estes se consubstanciarem como evidência de que algo ia muito mal no seio do Império opressor.

Porém, por motivos que os bem-pensantes ainda não foram capazes de explicar, de uns 15 anos para cá casos semelhantes passaram a se repetir no Japão, na Rússia, na França, na Alemanha. Hoje foi a vez do Brasil, mais exatamente de Realengo, carioquíssimo subúrbio que antes remetia a domingos de calor e músicas de Jorge Benjor - e bairro ao qual Gilberto Gil mandou aquele abraço antes de partir, à força, para o exílio londrino, e, 1968.

Mas os abraços de hoje em Realengo em muito diferem do nobre gesto de superação do exilado, a se despedir em alto astral do país do qual fora apartado: são abraços partidos, de mães que não mais terão seus filhos nos braços; abraços confortadores, desolados, de consolo; abraços que, além de um gesto de afeto irradiam uma mesma pergunta: por quê?

À medida em que a tragédia ia vindo a público, a mídia brasileira – TVs à frente – começava a dar um show de incompetência, manipulação, desrespeito, achismo e despreparo que acabou por fornecer, no Dia do Jornalista, um triste retrato dessa categoria profissional. Num misto de incompetência e má-fé, até o islamismo foi invocado como a razão do massacre, enquanto a emoção dos entrevistados e do espectador era explorada com inédita sem-cerimônia.

Algumas horas antes de saber do massacre eu conversava com uma aluna, prestes a se formar, da qual sou orientador. Com olhos muito vivos, que transmitem uma intensa vida interior, ela pesquisa há tempos sobre um novo modelo de jornalismo, cívico, comunitário, solidário. Por mais que travemos, nessas sessões, uma delicada batalha entre as exigências realistas da academia e seu entusiasmo genuíno, este, nela, acaba sempre por me encantar.

A lembrança dela e de sua pureza de intenções, contrapostas às imagens do massacre e à vergonhosa cobertura midiática, acabou por formar, em mim, uma lúgubre epifania, de uma sociedade onde crianças são mortas sem mais nem porquê, jovens idealistas saem das faculdades para serem moldados em meros instrumentos do comércio jornalístico, e a por si nobre missão de informar a sociedade se transforma numa busca sem barreiras por Ibope, em que a ética e as boas atenções afundam no sangue e na exploração sadomasoquista da dor alheia.

Seduc -RS assina acordo trabalhista para garantir benefícios dos professores do ProJovem


A Secretaria de Estado da Educação (Seduc) assinou, na tarde de quinta-feira (7), um acordo trabalhista com o Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinpro/RS), que vai garantir o pagamento dos direitos trabalhistas dos professores contratados para o Programa ProJovem Urbano/RS. O documento foi assinado na 29ª Vara Trabalhista da Capital pelo procurador trabalhista da Procuradoria Geral do Estado (PGE), Alfredo Crossetti Simon, e pelo diretor do Sinpro, Amarildo Pedro Cenci. A Seduc foi representada na audiência pelo procurador, Dr. Ernesto José Toniolo, responsável pela intermediação que resultou no acordo.

Segundo Toniolo, a intervenção da PGE foi fundamental para o desfecho do impasse trabalhista gerado a partir do momento que a empresa contratada pela gestão anterior se adequou as normas institucionais do programa ProJoven. “Evitamos o ajuizamento de demandas que poderiam posteriormente onerar desnecessariamente o Estado. A PGE cumpriu com a sua missão: defender o interesse público, sem esquecer da repercussão social para os interessados,  no caso os professores”, disse.

Para o diretor do Sinpro o acordo significa a quebra de um paradigma. “Isso é uma novidade porque em momentos como esse é costume o poder público lavar as mãos. Neste caso, os professores, sindicato e a governo confluíram para uma solução. A Secretaria da Educação e a PGE não mediram esforços para chegarmos a uma solução”, concluiu o diretor.

Os professores que aderirem ao acordo irão receber todos os benefícios a que possuem direito e poderão encaminhar o seguro desemprego. O valor total é de R$ 900 mil.


Entenda o caso

Por decisão judicial, o Sinpro/RS era responsável pelo pagamento dos professores que atuavam no programa, já que a empresa contratada não cumpriu com suas obrigações de contrato. O Estado repassava, até o mês de fevereiro desde ano, R$ 180 mil para o sindicato pagar o salário líquido dos professores. Valor que não cobria os encargos trabalhistas dos professores já dispensados do programa.

A nova gestão da Seduc, preocupada com a situação dos 219 professores que não receberam seus direitos convidou, no dia 14 de fevereiro, representantes do Sinpro/RS para uma reunião na tentativa de solucionar o impasse. A partir do protagonismo da Secretaria, começaram as negociações para um acordo com a intermediação da PGE.

O ProJovem

O ProJovem Urbano é um programa do Governo Federal que tem o objetivo de proporcionar a  reinserção de jovens de 18 e 29 anos no mercado de trabalho, através da conclusão do Ensino Fundamental e qualificação profissional. No Estado são oferecidas duas qualificações, construção e pequenos reparos e administração.

Fonte: portal da Seduc-rs

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Governo firma Protocolo de Intenções com o MEC para qualificar o ensino gaúcho

Haddad e Tarso assinam Protocolo de Intenções - Ramiro Furquim/Sul21

Rachel Duarte

Em ato solene no Palácio Piratini, o ministro da Educação, Fernando Haddad, recebeu do governador gaúcho, Tarso Genro, nesta quinta-feira (7), documento propondo parceria formal entre o estado e a União para a capacitação e formação de profissionais da educação, jovens e trabalhadores. A proposta foi recebida por Haddad com sinal positivo, confirmando que dará “todo suporte de infraestrutura necessário”. A cerimônia ocorreu no Salão Negrinho do Pastoreio, no final da manhã.
O governador e o ministro assinaram o termo de compromisso, em meio a discursos e muita troca de elogios. Haddad recordou a gestão de Tarso Genro no Ministério da Educação (2004-2005) e disse que deu continuidade às políticas implementadas por Tarso. “Nossa visão da educação foi batizada com o jargão ‘da creche ao doutorado’”, disse, referindo-se à política de educação permanente. O governador gaúcho, por sua vez, recorreu à modéstia. Disse que o ministro fez mais do que ele à frente da pasta. “O Haddad representa a reconstrução de um projeto de nação a partir da educação. Ele aprofundou as diretrizes de uma educação federativa, que começamos a construir”, afirmou.
Rede de Colaboração Horizontal
Tarso Genro entregou a Fernando Haddad a proposta de formação de uma da Rede de Colaboração Horizontal, debatida na Câmara Temática do Pacto Gaúcho pela Educação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES-RS). A proposta prevê a parceria formal entre instituições de Ensino Superior, federais e comunitárias, os Institutos Federais, a Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Uergs) e o Estado para a capacitação e formação de profissionais da educação, jovens e trabalhadores.
O protocolo de intenções, com 48 meses de vigência, prevê, entre outras coisas, a instalação de dois centros de formação para profissionais da educação; recuperação física do Instituto de Educação General Flores da Cunha; a formação de 34 mil profissionais da educação da rede estadual e ampliação da jornada escolar para alunos de 500 unidades escolares, por meio do Programa Mais Educação.
A intenção é que esta rede seja formada em 45 dias, possibilitando maior qualificação em diversas áreas dos professores da rede pública.
O debate sobre o piso
Fernando Haddad, ministro da Educação - Ramiro Furquim/Sul21
Após a cerimônia, o ministro Haddad concedeu entrevista coletiva à imprensa gaúcha. Além de lamentar a tragédia ocorrida no Rio de Janeiro, onde um estudante assassinou 12 jovens, alunos da escola em que estudou, o ministro falou sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal, que decretou, ontem (6), a constitucionalidade do piso nacional do magistério. “Demos o primeiro passo de um pacto firmado em 1994 com os professores e resgatado no governo Lula, transformando-se em uma emenda constitucional promulgada pelo parlamento”, disse.
A legislação, sancionada em 2008, foi, ainda naquele ano, contestada pelos governadores do Mato Grosso do Sul, do Paraná, de Santa Catarina, do Rio Grande do Sul e do Ceará. O governador Tarso Genro assim que assumiu a gestão retirou a petição em nome do estado gaúcho. “O governador Tarso Genro endereçou uma petição ao STF, abrindo mão da contestação, por ser a favor da lei”, defendeu Haddad.
Os proponentes da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) queriam que o termo piso fosse interpretado como remuneração mínima, incluindo os benefícios, sob a alegação de que os estados e municípios não teriam recursos para arcar com o aumento. Já as entidades sindicais defendem que o valor estabelecido pela lei deve ser entendido como vencimento básico. As gratificações e outros extras não podem ser incorporados na conta do piso. Por 7 votos a 2, o STF seguiu esse entendimento, considerando improcedente a ação.
Ramiro Furquim/Sul21

“Agora iremos para a decisão do mérito da lei; antes havia apenas uma liminar concedida. Há uma verba do ministério da educação de cerca de R$ 1 bilhão disponível para auxiliar os estados e municípios que não têm condições de cumprir esta lei imediatamente. Mas, há que se reconhecer o esforço para implantação desta lei que já acontece em todo o país”, disse Haddad.
No Rio Grande do Sul, o governo manifestou disposição em alcançar o piso nacional, mas de forma gradual. Devido ao déficit orçamentário dos cofres públicos, o governo gaúcho pretende utilizar as políticas de financiamento para alcançar o piso.“O piso continua valendo como lei e continua o nosso compromisso de alcançar o piso de forma processual”, disse o secretário de Educação do RS, José Clóvis de Azevedo.
Com a decisão do STF, o valor atualizado que deve ser pago pelos estados e municípios aos docentes em 2011 é de R$ 1.187,14.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Governo do RS apresenta metas para a Educação nos próximos quatro anos

No blog Tomandonacuia


O Secretário da Educação do Estado do Rio Grande do Sul, José Clóvis de Azevedo, apresentou nesta terça-feira (05) em audiência pública da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa diagnóstico da situação atual da rede pública estadual de ensino, as políticas previstas e o plano de trabalho da secretaria para o período 2011-2014. O requerimento de audiência foi apresentado pelos deputados petistas Alexandre Lindenmeyer, Ana Affonso e Marisa Formolo.

O secretário destacou que o plano de trabalho da SEDUC tem como principio norteador a democratização da escola em três dimensões: o acesso, a gestão democrática e a recuperação do papel político dos conselhos escolares. José Clovis também destacou que um dos objetivos da Secretaria é melhorar a qualidade da aprendizagem e ampliação do conhecimento.

O secretário antecipou que será aberto um processo de debate com a sociedade e a comunidade escolar, valorizando espaços como o da Conferência Estadual de Educação. O secretário também abordou a necessidade da modernização tecnológica e da recuperação física da rede escolar, prioridades para os próximos quatro anos. A SEDUC está elaborando um diagnóstico da situação física da rede escolar com o objetivo de recuperar e qualificar bibliotecas, laboratórios e ampliar a informatização administrativa e pedagógica.

A universalização do ensino fundamental, segundo José Clovis, trouxe uma modificação extraordinária na escola pública, que passou a hospedar uma nova composição social ao incluir milhões de jovens originários das classes populares de baixa renda no sistema, alterando um ambiente quase exclusivo da classe média. Por isso, segundo o secretário, esse novo cenário de escola pública traz também um novo desafio pedagógico e uma nova concepção de avaliação, onde se faz necessário o acolhimento a esses estudantes e o estímulo para que não abandonem o aprendizado.

Ensino médio

Os dados apresentados pelo secretário revelam um quadro preocupante no ensino médio, devido ao alto nível de reprovação e abandono da sala de aula por parte dos estudantes. Segundo ele, há uma redução de quase 40% do número de matrículas e o desafio da Secretaria nestes quatro anos é reverter esse cenário. A meta de trabalho é diminuir a evasão e a reprovação. “A não aprendizagem não é um problema só dos alunos. É um problema do sistema educacional e da forma de atuação pedagógica, pois a escola tem o dever de despertar nos alunos o desejo de estudar”, afirmou.

José Clóvis assegurou, ainda, que a educação profissional terá uma dedicação especial, tendo como meta elevar em 50% o número de matrículas ma ensino técnico nos próximos quatro anos.

O estímulo para a formação de novos professores também é uma prioridade para o governo Tarso Genro. Segundo o secretário, a médio e longo prazos faltarão professores, devido ao esvaziamento generalizado dos cursos de licenciatura, principalmente nos campos de conhecimento da matemática, física e química. Com o objetivo de reverter esse quadro, a SEDUC promoverá convênios com universidades para a formação permanente para o educador, investindo na especialização e extensão universitária dos educadores. No que tange à valorização dos trabalhadores em educação, o secretário confirmou como meta a realização de concurso público, pagamento das promoções atrasadas e a recuperação salarial com o avanço gradativo para o piso nacional e integração gradativa do piso no vencimento básico.

A luta vitoriosa de 72 famílias gaúchas de sem terra por um pedaço de chão


Assentados recolhem o arroz cultivado sem agrotóxico - Ramiro Furquim/Sul21

Igor Natusch no Sul21

Para muitos, um pedaço de terra é mais do que uma conquista: é uma luta que nunca se encerra. Depois das longas marchas, das ocupações e da espera pela desapropriação, vem outra etapa para aqueles que, até este momento, chamávamos de sem terra. Com poucos recursos, muitas vezes sem conhecer bem o chão onde construirão os alicerces de seu futuro, resta a centenas de famílias o esforço para tirar do solo o que dele se espera. O assentamento, longe de ser o final de uma saga, é apenas o começo de um novo e longo episódio.
Desde os três anos de idade, Jaqueline Nunes conhece como poucos os caminhos poeirentos da luta por um pedaço de chão. Vinda de uma família de pequenos agricultores, Jaqueline foi criada em meio a barracas, nos acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), espalhados pelo interior do Rio Grande do Sul. Debaixo de uma lona, encarou durante anos o calor do verão eas chuvas geladas do inverno. Aos 18 anos, decidiu sair do assentamento onde morava com a família, em Nova Santa Rita, para construir a própria história. Foram mais 3 anos e 9 meses em meio à escassez, buscando por um lugar onde cultivar uma nova vida.
Desde 2007, Jaqueline faz parte das 72 famílias que vivem no Assentamento Apolônio de Carvalho, em Eldorado do Sul (RS). Dessas, 53 se dedicam atualmente ao cultivo de arroz orgânico, em uma área que se estende por 534 hectares. “O orgânico para mim é mais natural, porque eu sempre estive no meio disso”, conta Jaqueline, que também atua como coordenadora regional do MST. Seu pai, assentado em Nova Santa Rita, foi um dos primeiros agricultores ligados ao movimento a cultivar verduras ecológicas. Atualmente, vende seus produtos em Porto Alegre, em uma feira promovida pelo Incra.
Segundo dados do Incra/RS, a área de cultivo de arroz agroecológico no RS alcançou 3,8 mil hectares em 2011, superando os 2,1 mil do ano passado. O número de famílias envolvidas com o cultivo, feito sem aditivos químicos, também aumentou: de 211 famílias em 2010, agora são 428. Os produtores vivem em 16 assentamentos, espalhados por 11 municípios. A maioria deles ligados à reforma agrária. Realidade na qual o assentamento onde Jaqueline mora se insere, de forma oficial, pela primeira vez.
O Assentamento Apolônio de Carvalho foi escolhido pelo governo gaúcho para a inauguração da oitava colheita de arroz orgânico de 2011. O lançamento aconteceu no dia 17 de março, com a presença do governador Tarso Genro e de secretários estaduais. Depois da festa, da visita dos engravatados e do governador chegando de helicóptero, ficou o trabalho para fazer. E as perspectivas são boas. Em alguns pontos, os assentados estimam mais de 120 sacos de arroz por hectare — uma média maior do que a das fazendas das redondezas, que cultivam o cereal de forma convencional, com uso de aditivos químicos. “Eles ficam falando ‘poxa, nós plantamos arroz convencional e colhemos 80 ou 90 sacos por hectare. Como é que eles conseguem?’”, diz Jaqueline.

Jaqueline Nunes: luta pela terra durou bastante tempo - Ramiro Furquim/Sul21
A maioria das famílias, segundo Jaqueline, tinha a ideia inicial de trabalhar com leite. Mas as condições do terreno inviabilizaram o projeto e forçaram os assentados a uma mudança de rota. “A nossa terra aqui só dá mesmo para arroz”, afirma Josino de Jesus, outro agricultor que encontrou no Apolônio de Carvalho a chance de controlar o próprio destino. “O terreno é muito molhado, não dá para cultivar plantas secas”. Jaqueline explica que algumas famílias, pela falta de experiência, tiveram resistência em plantar o orgânico. “É uma cultura meio arriscada, porque é muito investimento. Se der um erro humano perde a produção e fica endividado para o resto da vida”.
Uma das formas de contornar essa inexperiência é a parceria estabelecida com agricultores de Tapes, já acostumados a lidar com o cultivo de arroz. É uma troca simples: os assentados de Eldorado do Sul entram com a terra, e Tapes empresta os tratores, fundamentais para a colheita. Além disso, a troca de experiências é valiosa para os iniciantes no cultivo de arroz agroecológico. “Nossa ideia é ir aprendendo, adquirindo equipamento e nos tornando cada vez mais autônomos”, explica Jaqueline.

“Por que tu não acampa e pega um pedaço de terra?”

Josino de Jesus nasceu em Caçapava do Sul, filho de agricultores. A decisão de lutar por um pedaço de chão, porém, surgiu em Porto Alegre. “Vim trabalhar com um doutor aqui em Porto Alegre, e tinha um acampamento perto de onde eu trabalhava. E aí esse doutor me disse: por que tu não vai acampar lá com eles e pegar um pedaço de terra?” Jesus, como é conhecido no assentamento, achou que era uma boa ideia, e juntou-se ao acampamento. “Foi ele quem me levou lá, inclusive. Faz uns 7 anos”.
Hoje em dia, Jesus cuida não só da plantação de arroz, mas também de uma das hortas que diversificam a produção do assentamento. “Já entreguei aipim, milho verde, abóbora”, lista ele. As hortas ajudam, também, a aproximar o assentamento de um equilíbrio autossustentável. “Algumas famílias buscam alternativas”, explica Jaqueline Nunes. “Arroz é uma vez por ano. Dá para fazer até 7 mil reais de renda por ano, mas se a gente fizer essa divisão por mês, vai dar uns 400 ou 500 reais, às vezes menos que um salário mínimo. Tem muitas famílias, como a do Jesus, vendo essa questão de horta. A horta já é uma renda mensal que ele vai ter. Tem famílias que estão fazendo queijo. Já são outras rendas, mesmo que a gente saiba que a renda maior é mesmo a do arroz”.
Para ampliar a capacidade produtiva, a solução é contar com fomentos do Incra. O assentamento já conseguiu duas parcelas de recursos junto ao órgão, e atualmente pleiteia uma terceira. Além disso, os trabalhadores rurais contam com fundos de investimento do Pronaf. Os assentados assentados podem investir estes recursos em equipamentos para plantio e colheita, além de melhorias úteis para o seu dia a dia. Existem também planos para empreendimentos coletivos, como a construção de um silo.

Josino de Jesus: "Não dá para cultivar plantas secas" - Ramiro Furquim/Sul21
“Podemos formar grupos de cinco ou seis famílias para adquirir um trator, para grades, esses implementos maiores”, comenta Jaqueline. “A família pode optar. Se ela diz que vai ficar no arroz, tem como investir em trator, comprar os implementos todos. Outros optam por trabalhar com leite, mas para nós aqui é bem mais complicado, por causa das características do terreno. Provavelmente 90% das famílias vão ficar no arroz mesmo”.

Terreno pertencia a traficante internacional de drogas

A terra que hoje fornece alimento para a merenda escolar de milhares de estudantes em todo o Brasil já foi utilizada para propósitos bem menos nobres. Mais precisamente aos negócios escusos do traficante internacional Juan Carlos Ramirez Abadía. O terreno era parte das quase infidáveis posses do colombiano Abadía no Brasil, mas não era usado para o cultivo ou produção de drogas. Era, isso sim, um gigantesco haras, no qual o traficante criava cerca de 15 cavalos de raça. “Os cavalos eram criados à base de chocolate. Chocolate mesmo, alfafa e chocolate!”, admira-se Jaqueline.

Traficante colombiano criava 15 cavalos nas terras que agora produzem arroz orgânico - Ramiro Furquim/Sul21
Muito bem alimentados de cacau, os cavalos descansavam em grandes baias, enquanto o proprietário do terreno pensava em investimentos ainda mais altos. A ideia de Abadia, segundo os atuais moradores do assentamento, era construir no local uma das maiores arenas de rodeio da América Latina. No entanto, a Justiça alcançou Abadía antes que as obras tivessem início, e frustrou os planos empreendedores do traficante internacional.
As origens pouco nobres da terra acabaram sendo positivas para o MST na luta pelo apoio da comunidade. O que não quer dizer que o assentamento tenha acontecido sem sobressaltos. “Foi uma ocupação que durou bastante tempo”, explica Jaqueline. Durante 58 dias, os trabalhadores rurais ficaram no terreno, esperando uma definição, sem aceitar os argumentos usados para convencê-los a sair. “Eles (governo) não tinham argumentos para as famílias”, diz Jaqueline. “Nosso argumento era de que queríamos produzir, e eles não tinham elementos para nos contestar, porque era terra de traficante, de lavagem de dinheiro. Mas acabou sendo bom, porque a sociedade ficou do nosso lado. Conseguimos fazer esse diálogo”.

Mãe de Jaqueline foi presa no confronto da Praça da Matriz

A mãe de Jaqueline Nunes, Elenir, foi uma das pessoas presas após o tristemente notório incidente na Praça da Matriz, em 1990, quando uma violenta tentativa de dispersar agricultores resultou na morte de Valdeci de Abreu Lopes, cabo da Brigada Militar. O fato marcou o MST, que a partir dali passou a ser visto por muitos como uma organização criminosa — imagem que, para vários setores, segue intocada. “Foi uma coisa que marcou muito”, admite Jaqueline, em um dos poucos momentos em que seu olhar desvia do interlocutor e volta-se para o vazio.
Sete pessoas foram presas pela morte de Valdeci. Durante anos, a versão oficial foi de que, agredido por uma foice, o cabo teria atirado a esmo uma ou duas vezes antes de tombar morto. Mais tarde, os autos do processo relevaram outra versão: a de que o golpe fatal teria sido provavelmente uma atitude de defesa, após os disparos, já que uma pessoa golpeada na artéria carótida perde os sentidos quase que imediatamente.
Dos sete presos, a mãe de Jaqueline foi a única mulher. Aparentemente, nenhum dos que assumiram a responsabilidade estava de fato envolvido no crime. Ao levarem a culpa pela morte do policial militar, eles seguiram o princípio do MST de não personalizar ações. Elenir Nunes foi uma das pessoas baleadas por Valdeci — vítima dos tiros, acabou transformada pelo inquérito em culpada de assassinato.
O confronto na Praça da Matriz acabou marcando decisivamente a relação entre Jaqueline Nunes e a mãe. A filha evita detalhes, não se aprofunda na história, mas admite que pouco viu Elenir nos anos de prisão e que passou a ser filha de “duas famílias”. Hoje, ela tem uma terceira família: a própria. Seu marido trabalha longe, voltando apenas nos finais de semana; seu filho passa a maior parte do tempo na escola ou sob os cuidados da madrinha. Enquanto isso, Jaqueline trabalha em nome do MST, ajudando outras famílias a colocar um fim na caminhada em busca de terra.

“Diziam que eu ia chegar aqui para plantar sapo”

“Chega de caminhar”, disse Doroti Carpes, após anos de marchas e acampamentos. Ela e o marido participaram da marcha até São Gabriel, que cruzou o Rio Grande do Sul em 2003, e permaneceram durante três anos e meio em um pré-assentamento em São Borja. “Era marcha e marcha, luta e luta. A gente parava de caminhar já de noite; os pés ficavam inchados”, conta ela. Depois de tanto andar, Doroti resolveu abraçar a chance e vir até Eldorado do Sul. “Diziam para mim: mas tu vai para lá para plantar sapo!  E eu disse que não tinha problema: vou plantar sapo se precisar”, lembra, rindo.

Doroti Carpes: "Vou plantar sapo, se precisar" - Ramiro Furquim/Sul21
Chegando ao assentamento, a água acabou se mostrando, de fato, um problema. Devido ao solo úmido do banhado, demorou muito tempo até que se encontrasse o lugar mais adequado para levantar as casas. “A gente levantava um barraquinho, dava uma chuva e já alagava tudo”, lembra Doroti. Jaqueline explica que, no início, a divisão por lotes não levava em conta as áreas secas, e as casas se espalhavam de forma desigual pelo assentamento. Depois de um tempo, os assentados e o Incra chegaram a uma conclusão: era impossível levantar casas em determinados pontos do terreno. Atualmente, as casas são erguidas em trechos específicos, próximas umas das outras. “São áreas que não alagam” explica ela. “A limpeza dos valos e a criação de canais acabaram drenando bastante, por isso é seco… Antes, qualquer chuva e era água pelo joelho, em qualquer lugar”.
Vinda da região norte do estado, Marli Malinoski chegou ao assentamento mais de um ano depois da primeira divisão dos lotes. Esteve no Rio de Janeiro, fazendo parte de um projeto chamado “solidariedade e formação nas áreas de reforma agrária”. Embora estivesse concorrendo a outras áreas mais próximas de onde moram seus familiares, Marli acabou sendo chamada para o Apolônio de Carvalho, e resolveu não deixar a chance passar. No momento, ela é uma das poucas pessoas a morar sozinha no assentamento.
No momento, existem cinco lotes ainda não ocupados no Apolônio de Carvalho. Geralmente, o MST tem seus próprios critérios para definir quem vai ganhar a terra — participação nas marchas e ocupações, tempo de acampamento, situação familiar. Porém, o Incra resolveu criar regras para disciplinar essa escolha. Regras que não parecem agradar muito os moradores do assentamento. “Hoje, aplicam um questionário”, conta Marli Malinoski. “Querem saber se tem experiência em plantio de arroz, carteira assinada de trabalho em várzea. Quem é sem terra não tem carteira assinada, é gente que trabalhou em granja e não tem como comprovar”, reclama.

Relação com prefeitura de Eldorado do Sul é complicada

Um dos muitos desafios do dia a dia do assentamento está em conquistar, mais do que a atenção, o respeito do poder público. Pelo que se percebe nas conversas com os assentados, o diálogo com a prefeitura de Eldorado do Sul não costuma ser dos mais fáceis. Como exemplo, Jaqueline Nunes cita uma das reuniões que teve com o prefeito do município, Ernani de Freitas Gonçalves (PDT). Durante o encontro, Jaqueline teria tido que ouvir o prefeito dizer que o plantio de arroz orgânico não trazia muitas vantagens para Eldorado do Sul. “Ele disse que progresso mesmo quem trazia eram as grandes empresas, como a Dell”, revolta-se.
Para contestar essa visão, o assentamento tenta usar uma linguagem que os governos, de modo geral, entendem muito bem. “Fomos para uma reunião com o secretário de agricultura do município (Sérgio Munhoz), com a pauta de obter tubos para canalização”, conta Jaqueline. “No início, ele (secretário) ficou meio assim, não estava muito disposto a ajudar. Quando dissemos para ele que eles tinham que investir no Apolônio, que só de ICMS dá R$ 1 milhão por ano para o município, a coisa mudou. Ele arregalou os olhos e disse ‘um milhão? Vamos fazer os cálculos então’. Quando eles viram que dava retorno financeiro, mandaram 200 tubos para nós”, conta ela, sorrindo. “Antes de ver que dá retorno, eles ficam jogando a gente para lá e para cá”, continua Marli Malinoski. “Tem que falar com o prefeito, tem que falar com o secretário de Obras. É um jogo bem estranho”, completa, escolhendo as palavras.

Marli Malinoski: uma das poucas pessoas que vivem sozinhas no assentamento - Ramiro Furquim/Sul21
As dificuldades com a prefeitura vão além dos investimentos materiais, estendendo-se também a aspectos menos óbvios, mas nem por isso menos perceptíveis. “O transporte de Eldorado do Sul, que leva os estudantes, não aceita transportar assentados e não faz integrado”, denuncia Marli. Tratamento bem diferente do que recebem de Charqueadas, o outro município que abriga terras do assentamento. Na cidade, administrada por Davi Gilmar de Abreu Souza (PDT), os assentados são melhor tratados, dentro da lógica econômica que move o município. “A questão de apoio a cooperativas é bem mais marcada em Charqueadas”, diz Jaqueline Nunes, que também integra a coordenação regional do MST. “Eles veem a cooperativa com outros olhos. Nosso esforço é fazer Eldorado do Sul ver a gente com esse mesmo olhar”.
Marli exemplifica. “Às vezes, a gente chega em Eldorado passando mal, precisando mesmo de atendimento (médico). Já fui duas vezes até lá, uma delas porque eu estava com um problema de coluna, e já chegavam perguntando de onde eu era. Eu respondia que era do Apolônio e diziam ‘tá, mas é do lado de Eldorado ou de Charqueadas? Porque se for de Charqueadas a gente não atende, tem que ir até lá, nós não damos cobertura para vocês’”. Do outro lado da ponte, segundo ela, o tratamento é distinto. “Tu chega lá e tem atendimento, remédios, marca exames. Ninguém te pergunta nada”, diz Marli Malinoski, lembrando também do ônibus que aparece de vez em quando, com dentista e clínico geral, para atender as famílias dentro do assentamento.

Arrendamento para “catarinas” quase põe tudo a perder

Apesar dos progressos, uma crise interna acabou dividindo os assentados e por pouco não cria sérios problemas para o Apolônio de Carvalho. Tudo começou com a proposta de agricultores de fora, chamados de “catarinas” pelos moradores do assentamento. “As famílias estavam passando necessidade, sem equipamentos para plantar, sobrevivendo com cesta básica”, explica Marli. “Daí apareceram eles, com uma mala de dinheiro, dizendo que queriam plantar arroz nas nossas terras, que nos dariam tanto por ano. Como que não vai aceitar?”
Os catarinas tornaram-se, a partir daí, arrendatários do terreno. “Para eles, era um modo de ganhar dinheiro”, afirma Jaqueline. “Não nos levavam para a plantação, não nos deram chance de aprender nada. Eles vivem de empréstimo em cima de empréstimo, não pagam imposto nenhum, plantam e colhem aqui para vender tudo lá”.
Assim que soube do arrendamento, o Incra tomou medidas duras — contra os assentados. “Todas as famílias foram notificadas, ameaçaram tirar todo mundo dos lotes”, conta Jaqueline, indignada. Os interrogatórios eram constantes, tentando determinar quais assentados teriam sido os primeiros a aceitar a proposta dos catarinas. “Começaram a jogar as famílias umas contra as outras. Diziam que um tinha falado do outro, que algumas pessoas eram ‘inadequadas para convívio social’”, acrescenta Marli, sem disfarçar a ironia na voz. “Os companheiros começaram a pensar que não era o Incra o inimigo, e sim as outras famílias. Chegou em um ponto que os vizinhos não se encontravam mais nem para tomar chimarrão”.
De acordo com Jaqueline, foi um período de estagnação para o Apolônio de Carvalho. “Não conseguíamos mais reunir as famílias para discutir melhorias. Precisávamos ir atrás de energia elétrica, de água, transporte escolar, e ninguém conseguia se organizar, porque todo mundo desconfiava de todo mundo”. Além disso, a determinação do Incra no sentido de que ninguém podia deixar os lotes enquanto durasse o inquérito aumentou ainda mais a carga de tensão. “Quem saísse, seria notificado”, lembra Marli. “Acabou ficando uma situação do tipo: se o filho tiver como ir para a escola, tudo bem, se não tiver, não vai, porque ninguém tinha disposição de ir atrás”.
O esforço, mais do que de recuperar a convivência entre as famílias, acabou sendo de reorganizar todo o assentamento. “Fomos organizando os grupos de produção, dividindo alguns lotes para produção de sementes, outros para os grãos”, conta Jaqueline. Hoje, a integrante da coordenação regional do MST comemora uma situação bem mais positiva dentro do assentamento. “Se a gente tem uma reunião para discutir alguma demanda, 90% das famílias aparecem. Naquela época, a gente não conseguia reunir cinco famílias que fossem para ir atrás de alguma coisa”, revela.

“A família que não tem um bichinho vai querer comprar uma vaca”

A situação, no momento, é inegavelmente melhor. Com esforço coletivo, o Assentamento Apolônio de Carvalho conseguiu retomar o rumo e agora investe com força crescente em uma cultura que já dá sinais de sucesso. Mas os trabalhadores sabem que ainda há bastante coisa para conquistar. “Como estamos investindo bastante, não vamos ter muito lucro agora”, admite Jaqueline Nunes. “A gente espera que nos anos seguintes, com essa estrutura que estamos montando, os custos caiam e a gente consiga investir mais nas famílias mesmo, nas casas”.

Marli, Jaqueline e Doroti: exemplos para os pequenos agricultores - Ramiro Furquim/Sul21
“Mesmo essas parcelas (de financiamentos do Incra) não garantem que a gente vá poder adquirir as máquinas e equipamentos que a gente precisa”, diz Marli Malinoski. “Porque a família que ainda não tem um bichinho vai querer comprar uma vaca, por exemplo. A vaca é uma garantia de leite, de sustento, é uma contribuição de proteína na alimentação. As famílias têm prioridades que são para a subsistência delas, para consumo imediato. Não tem como abrir mão disso para investir em outras coisas”.
Seja como for, o futuro dessas famílias surge mais como uma esperança do que como um ponto de interrogação. Os últimos quatro anos do Assentamento Apolônio de Carvalho são, para elas, mais um passo em uma longa jornada rumo ao próprio chão. Para muitos, distante de casa; para outros, longe do que a terra os tinha ensinado em semeaduras e colheitas anteriores. Para todos, um desafio e chance para novos começos. A colheita do arroz orgânico deve estar encerrada em duas semanas, fechando um ciclo e iniciando outro — na terra, da terra e para a terra.