sábado, 30 de abril de 2011

Mantida por Dilma, política de publicidade cria disputas 'intestinas'



 

Ampliação da lista de veículos pagos em troca de propaganda oficial incomoda adversários políticos do governo e cria dificuldade para entidades representantes de empresas administrar interesses conflitantes dos sócios.


BRASÍLIA – A política que desde a última década democratiza a verba publicitária federal, destinando-a a um número crescente de veículos espalhados hoje por metade do Brasil, tem sido até agora preservada pela presidenta Dilma Rousseff, mesmo sob críticas e alguma desconfiança. Os adversários do PT acham que se trata da “compra” de órgãos de imprensa pequenos sem fôlego para resistir à sedução. Já entidades representantes das empresas estão, no geral, de acordo, mas precisam lidar com uma questão que às vezes opõe associados.

Para a recém criada Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação com Participação Popular, a política publicitária federal merece ser preservada. “Tem que descentralizar tudo na comunicação. Comunicação é um direito humano”, afirma a coordenadora-geral da Frente, deputada Luíza Erundina (PSB-SP).

A Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores de Comunicação (Altercom), que congrega órgãos de comunicação menores, sobretudo da internet, apoia a descentralização. Condena, no entanto, o uso da “mídia técnica” como critério definidor do rumo do dinheiro. Acredita que dar verba só para quem já está no mercado, e de acordo com o alcance de cada um, impede o desenvolvimento de novos veículos e daqueles de menor porte.

“O critério anterior à mídia técnica era elitista e tecnicamente injustificável, muito mais subjetivo e muito mais político”, diz o vice-presidente da Altercom, Renato Rovai. “Mas o investimento federal ainda é muito pequeno. E o governo trata de forma igual os desiguais. Devia investir mais nos veículos pequenos, é muito importante para democratizar a comunicação.”

De 2000 a 2010, o gasto do governo federal com propaganda, descontada a inflação, cresceu a um ritmo equivalente à metade do avanço da economia. E, quando as estatais entram na conta, ficaram 20% aquém da inflação.

Internet versus jornal
Celeiro de uma infinidade de pequenos veículos e da maioria dos sócios da Altercom, a internet fica atualmente com 3% da verba destinada à publicidade pelo governo. Cerca de R$ 15 milhões anuais, sem estatais. Mas, ao lado de cinemas, outdoors e mídia estrangeira, a internet representa mais de 30% dos oito mil órgãos de comunicação a receber dinheiro de propaganda do governo. Antes de 2002, quando não tinha o peso de hoje como fonte de informação, levava uma parcela irrisória da publicidade, inferior a meio por cento.

O avanço da internet no bolo publicitário federal, de três pontos percentuais, se deu em cima dos jornais de papel, cuja fatia diminuiu quase na mesma magnitude. Aos impressos, destinam-se hoje R$ 30 milhões por ano, 6% do total. No início da década passada, antes do governo Lula, eles recebiam R$ 19 anuais, 10% do total. Além de perder espaço, ocorreu desconcentração no segmento. Se antes havia menos de 200 jornais a receber verba oficial, hoje são mais de 2 mil. Resultado da expansão dos jornais populares e dos jornais regionais, por meio dos quais o governo federal atinge mais pessoas, quando quer divulgar informações sobre políticas públicas.

Esse é um problema para os veículos maiores que a Associação Nacional dos Jornais equilibra-se para tentar administrar. Por meio da assessoria de imprensa, a entidade diz que defende o uso da mídia técnica e de critérios transparentes pelo governo, na distribuição do dinheiro de propaganda. Afirma ainda reconhecer que havia problemas para se medir o alcance dos jornais menores, mas que fez um acordo com o Instituto de Verificação de Circulação (IVC) para criar método simplificado de aferição das tiragens deles. Espera, em troca, que aqueles jornais filiem-se ao instituto e aceitem auditagens. O IVC é a referência para o governo aplicar mídia técnica no segmento impresso.

Emissoras versus emissoras
Na radiodifusão, também acontece disputa intestina pela verba publicitária oficial. E onde houve o mais significativo rearranjo interno nos últimos tempos, uma vez que é o tipo de mídia que mais movimenta dinheiro. Em número de veículos que contam com publicidade oficial, as emissoras de rádio e TV representam 40%. Mas, dado o alcance junto à população, ficam com mais de 70% do dinheiro, há mais de uma década. As TVs receberam R$ 288 milhões no ano passado e as rádios, R$ 141 milhões. Nos dois casos, de 2000 a 2010, a verba destinada a cada tipo de mídia mais ou menos dobrou. O número de emissoras atendidas, no entanto, subiu bem mais - vinte vezes entre as TVs e dez entre as rádios. Consequência: a briga pelo quinhão acirrou-se.

A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) prefere não comentar a política oficial. No governo Lula, o então presidente da entidade, Daniel Slaviero, era publicamente a favor. Carta Maior apurou que, por ora, o novo presidente da Abert, Emanuel Carneiro, compartilha da posição do antecessor, que considerava importante regionalizar e democratizar a distribuição da verba. A maior parte dos associados da Abert é formada de emissoras pequenas, que se beneficiam de tal política, ao contrário das grandes.

Até 2007, por exemplo, a principal TV brasileira tinha audiência no patamar de 50% e recebia mais de 70% dos recursos publicitários federais. Hoje, os dois números aproximaram-se e estabilizaram-se em torno de 45%.

Já o segmento “revistas” recebe cerca de R$ 30 milhões anuais de propaganda oficial, sem contar as estatais. A cifra é quase o dobro daquela de 2000 (R$ 14 milhões) e o triplo da de 2002 (R$ 10 milhões). Na última década, a participação deste tipo de mídia no bolo da publicidade oficial oscilou sempre na casa dos 7%. Já a quantidade de revistas atendidas, ao menos no governo Lula, caiu de 3% para 2%. Procurada, a Associação Nacional dos Editores de Revistas (ANER) não se manifestou.

CONTRA OS CHEFES, CONTRA AS OLIGARQUIAS


O nome dado ao livro com algumas entrevistas de Richard Rorty é bastante perspicaz para estabelecer algo que não está na plataforma dos governos petistas, mas que deveria ser um dos primeiros tópicos de qualquer “reforma política” que não fosse apenas uma mudança formal sem capacidade de mover o que especificamente merece ser movido.
Grande parte dos “escândalos” noticiados pela mídia envolvem o nome de Roseana Sarney. E no entanto sabemos que se trata de uma aliada do Governo Federal. Trata-se da aliança mais espúria e repugnante que o PT realizou ao longo dos últimos anos. Para mim e para tantos outros, com essa aliança o PT (enquanto projeto) simplesmente acabou. Se o Governo Dilma não fosse eminentemente uma tecnocracia de esquerda, saberia que o primeiro tema da política nacional deveria ser atacar chefes e oligarquias, dentre as quais a mais forte de todas – a Sarney.
Retomar a política não significa simplesmente se reduzir ao discurso moralista do combate à corrupção, como se tudo estivesse correto e o problema fosse do caráter individual. A corrupção no Brasil é endêmica não por ser abastecida por alguns indivíduos de correção duvidosa, mas porque ela consiste na privatização da esfera pública, ou seja, da democracia como fachada para o governo pactuado das oligarquias. Lula não tocou um dedo nisso nem parece que Dilma irá tocar. Ao contrário: ambos, aderindo a uma visão maquiavélica (no sentido técnico) de política, pactuaram com os fatores reais de poder que, como Lassalle sabia e os juristas fazem questão de esconder, são a verdadeira Constituição do nosso país.
Enfrentar as oligarquias em seu poder que produz miséria, desigualdade, violência e dominação nos lugares onde elas estão situadas significa aderir a uma política de alto nível, isto é, atacar verdadeiramente o poder que atinge nossas formas-de-vida. A luta contra a oligarquia Sarney, portanto, não é uma cruzada anticorrupção (como o jornalismo conservador gostaria de fazer crer, sacrificando um bode expiatório a fim de manter o resto como está), mas um conflito em nome da justiça para a vida nua que está sujeita ao poder descomunal de tais oligarquias, geralmente imposto com violência e não raro crueldade em seus domínios. Com isso, transformar-se-ia a “política” de baixo nível que frequenta o noticiário – a política dos acordos, das negociatas, das barganhas por cargos, das fofocas e dos diz-que-me-diz-que (o que faz o jornalismo político ser indissociável da Revista Caras) – numa verdadeira política, em que cujo centro não pode estar outra coisa se não o estado de exceção em que todos vivemos.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Desigualdade de tratamento para a promoção de equidade social

Editorial do Sul21

Ainda que alguns possam considerar demagógica a recepção oferecida pelo governador Tarso Genro no Galpão Crioulo do Palácio Piratini às lideranças sindicais gaúchas em comemoração ao 1º de Maio, o fato é que o ato foi oportuno e revestiu-se de significado importante para o futuro do estado e da sociedade gaúcha. Além da comemoração, o governador aproveitou para apresentar e pedir apoio ao Programa de Sustentabilidade Financeira do Rio Grande do Sul, abordando de modo mais detalhado as mudanças na Previdência Social estadual.
Ainda que não tenham sido finalizadas, mudanças profundas deverão ser propostas pelo governo visando reformular o modelo previdenciário adotado no RS. O apoio dos sindicalistas será muito importante para que essas alterações venham a ser realizadas. Segundo diversos estudos, a mudança do perfil demográfico no Brasil e principalmente no Rio Grande do Sul, de um lado, e os desequilíbrios entre a arrecadação das contribuições e a forma de concessão dos benefícios, de outro, em pouco tempo tornarão insustentável a situação atuarial do estado.
Diversas entidades sindicais e diferentes segmentos políticos, inclusive da base governista, contestam os estudos que apontam os déficits e são contrários a que se promovam quaisquer mudanças na previdência social, seja dos servidores públicos ou dos trabalhadores da iniciativa privada. Por este motivo, o Cpers-sindicato, em nome dos professores estaduais, recusou-se a participar do encontro no Piratini e liderou manifestação, no mesmo horário, na praça em frente ao palácio governamental.
Mesmo que as propostas ainda não tenham sido concluídas e, por este motivo, não tenham sido apresentadas em sua integralidade, mesmo que os estudos sobre o sistema previdenciário necessitem aprofundamento e mesmo que se tenha como preocupação a defesa dos direitos e vantagens conquistados pelos trabalhadores, o fato é que o princípio enunciado pelo governador Tarso Genro como orientador do Programa de Sustentabilidade Financeira e da reforma da Previdência no RS merece elogios.
Segundo as palavras do governador, “para viabilizar a previdência social pública no estado do RS, teremos que ter um fundo. Para isto, quem recebe mais terá que pagar mais”. O princípio que rege este raciocínio se assenta sobre o ideário socialdemocrata. É coerente com a plataforma de campanha do governador, com as propostas de seu partido e de todos os partidos que integram a base governista.
Para se promover a igualdade, rezam os fundamentos democráticos e da justiça contemporânea, os diferentes têm que ser tratados de forma diferente. Nesta lógica, os que recebem mais devem pagar mais e os que recebem menos devem pagar menos. Se todos receberem tratamento igual, pagando igualmente, a desigualdade social se aprofundará continuamente.
Este mesmo raciocínio, aliás, deveria ser empregado para a construção da matriz tributária estadual e nacional. O grande imposto deveria ser o imposto de renda, com alíquotas crescentes para atingir os grandes ganhos de capital não reinvestido, mantendo-se isentos de tributação os salários mais baixos e promovendo-se, além disso, uma profunda desoneração fiscal sobre a produção e o consumo.

O que falta para o pleno emprego? Educação, ora…


Brizola Neto no TIJOLACO

Foi mais que providencial o lançamento, ontem, do Programa Nacional de Ensino Técnico, o Pronatec, pela Presidenta Dilma Rousseff. E, coincidentemente, a publicação de um estudo do IPEA que analisa a relação entre emprego, experiência e qualificação profissionais.
Dilma afirmou que o Brasil está, hoje, próximo ” do pleno emprego” e enfrenta “grande demanda de mão de obra qualificada”. Em alguns casos, disse ele, ” falta mão de obra qualificada, em outros, sobra mão de obra sem a qualificação necessária”.
O estudo do IPEA dá números concretos a esta afirmação da Presidente: para o estoque de desempregados estimado em 7,3 milhões de trabalhadores,  “somente 2 milhões (27%) tendem a apresentar qualificação e experiência profissional , enquanto dos 1,5 milhão de novos ingressantes no  mercado de trabalho, estima-se que apenas 762 mil (51%) devam  possuir qualificação e experiência profissional para o pronto exercício do trabalho”.
E, de outro lado, São Paulo e a Região Sul deverão apresentar déficits de mão de obra com qualificação, sobretudo na indústria.
“O sistema de capacitação profissional brasileiro já não corresponde às necessidades do país e às dimensões de nossa economia.”.
É absoluta verdade. Embora seja vital administrar a emergência das pessoas que já integram a população economicamente ativa com cursos rápidos, que possam ser quase simultâneos à sua alocação ou realocação ao mercado de trabalho, não podemos mais ter um sistema de ensino profissional fundado na “emergência”.
Não se pode pensar em educação técnica dissociada de formação geral, porque precisamos de algo muito além de “adestramento” profissional. É a economia moderna que pede essa base, para que sobre ela possam vir a inovação, a criatividade e a modernização da produção e do trabalho.
É animador que o programa tenha foco nos investimentos em ampliação da rede de escolas técnicas – e sua ampliação para o mundo virtual – e contemple a formação de profissionais de alto nível, com as 75 mil bolsas de extensão no estrangeiro, naturalmente com compromissos de multiplicação aqui do conhecimento absorvido.
E o Tijolaço, claro, não pode tratar deste tema sem bater na sua tecla: o Rio de Janeiro tem de ganhar, ontem, uma Escola Técnica de Petróleo e Gás.  A cadeia produtiva do petróleo – além da extração e do refino, propriamente, a indústria naval, a de máquinas e equipamentos, os serviços correlatos à operação das plataformas – vai, literalmente, devorar mão de obra qualificada.
Temos conhecimento acumulado na Petrobras e nas universidades para fazer deslanchar isso rapidamente. E  recurso, nos roylaties e no Fundo Social do Pré-sal, para bancar este esforço.
Vale o que Dilma falou, ao lançar o Pronatec: “nosso país aprendeu a se respeitar e a se fazer respeitar internacionalmente”  e será “do tamanho daquilo que cada um de nós fizermos por ele”.
Façamos, e já.

Verissimo e a revolta da classe média

Altamiro Borges em seu blog

Reproduzo crônica de Luis Fernando Verissimo, publicada no jornal O Estado de S.Paulo:

Diálogo urbano, no meio de um engarrafamento. Carro a carro.

- É nisso que deu, oito anos de governo Lula. Este caos. Todo o mundo com carro, e todos os carros na rua ao mesmo tempo. Não tem mais hora de pique, agora é pique o dia inteiro. Foram criar a tal nova classe média e o resultado está aí: ninguém consegue mais se mexer. E não é só o trânsito. As lojas estão cheias. Há filas para comprar em toda parte. E vá tentar viajar de avião. Até para o exterior - tudo lotado. Um inferno. Será que não previram isto? Será que ninguém se deu conta dos efeitos que uma distribuição de renda irresponsável teria sobre a população e a economia? Que botar dinheiro na mão das pessoas só criaria esta confusão? Razão tinha quem dizia que um governo do PT seria um desastre, que era melhor emigrar. Quem pode viver em meio a uma euforia assim? E o pior: a nova classe média não sabe consumir. Não está acostumada a comprar certas coisas. Já vi gente apertando secador de cabelo e lepitopi como e fosse manga na feira. É constrangedor. E as ruas estão cheias de motoristas novatos com seu primeiro carro, com acesso ao seu primeiro acelerador e ao seu primeiro delírio de velocidade. O perigo só não é maior porque o trânsito não anda. É por isso que eu sou contra o Lula, contra o que ele e o PT fizeram com este país. Viver no Brasil ficou insuportável.

- A nova classe média nos descaracterizou?

- Exatamente. Nós não éramos assim. Nós nunca fomos assim. Lula acabou com o que tínhamos de mais nosso, que era a pirâmide social. Uma coisa antiga, sólida, estruturada...

- Buuu para o Lula, então?

- Buuu para o Lula!

- E buuu para o Fernando Henrique?

- Buuu para o... Como, "buuu para o Fernando Henrique"?!

- Não é o que estão dizendo? Que tudo que está aí começou com o Fernando Henrique? Que só o que o Lula fez foi continuar o que já tinha sido começado? Que o governo Lula foi irrelevante?

- Sim. Não. Quer dizer...

- Se você concorda que o governo Lula foi apenas o governo Fernando Henrique de barba, está dizendo que o verdadeiro culpado do caos é o Fernando Henrique.

- Claro que não. Se o responsável fosse o Fernando Henrique eu não chamaria de caos, nem seria contra.

- Por quê?

- Porque um é um e o outro é outro, e eu prefiro o outro.

- Então você não acha que Lula foi irrelevante e só continuou o que o Fernando Henrique começou, como dizem os que defendem o Fernando Henrique?

- Acho, mas...

Nesse momento o trânsito começou a andar e o diálogo acabou.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Altamiro Borges: “Casamento real” e os súditos da mídia


A busca por audiência não deve ser a única justificativa para a overdose midiática na cobertura do “Casamento Real”. Revistonas dão capas melosas para a união do príncipe William com a “plebéia” Kate. Jornalões gastam papel com fofocas e futricas. O pior, porém, ocorre nas emissoras de televisão – em todas elas, sem exceção. Blocos e blocos nos telejornais para divulgar banalidades.

por Altamiro Borges, em seu blog


A mídia corporativa parece adorar a vassalagem. É servil diante das monstruosidades imperiais dos EUA, assim como é vassala diante da monarquia decadente da Grã-Bretanha. A mídia dominante reproduz a ideologia das classes dominantes. Criminaliza os pobres e reverencia os ricaços – inclusive as ostentações e sandices da decrépita “família real”.

Monarquia decadente e parasitária

Na difusão dos valores “morais” da aristocracia, a imprensa sensacionalista deixa de lado até as agruras do capitalismo no país. No primeiro trimestre deste ano, o PIB britânico cresceu apenas 0,5% – após uma contração, também de meio por cento, nos últimos três meses de 2010. Milhões de trabalhadores estão sem emprego e salário, mas a mídia só fala no tal “casamento real”.

A decadente monarquia agradece tanta vassalagem. Com as festanças, ela tenta sair do atoleiro. No ano passado, a “família real” foi obrigada a cortar 12,2% das despesas oficiais com sua vida parasitária. Mesmo assim, a realeza custou mais de 46,1 milhões de euros para os contribuintes britânicos – seis vezes mais do que outra monarquia decadente, a da Espanha.

Ato público unifica trabalhadores na defesa de direitos

O dia nacional de luta contra a retirada de direitos – 28 de abril, no Rio Grande do Sul, foi marcado pela realização de um ato público unitário em frente ao Palácio Piratini, sede do governo gaúcho.
“Não somos nós que vamos pagar a conta, resolver com nossos salários, os problemas financeiros do estado”, declarou a presidente do CPERS/Sindicato Rejane de Oliveira, em crítica dirtea à proposta do governo de alterar a previdência estadual.
O movimento começou logo no início da tarde, quando educadores se reuniram no CPERS/Sindicato e, em caminhada, se deslocaram até o Largo Glênio Peres, onde encontraram servidores de outras categorias e trabalhadores da iniciativa privada.
Do Glênio Peres, também em caminhada, os manifestantes se dirigiram ao Palácio Piratini.
Antes do deslocamento, João Ezequiel, da direção do Sindicato dos Municipários de Porto Alegre, criticou a demissão de trabalhadores contratados pela Fugast, fundação que teve o contrato de prestação de serviços com o governo do estado rompido. “Os trabalhadores estão pagando por um erro do governo. Estes trabalhadores sequer estão recebendo suas rescisões contratuais”, denunciou o sindicalista.
Os manifestantes também deixaram claro que não aceitarão nenhum calote no pagamento das Requisições de Pequeno Valor (RPVs). Ao optar pela RPV, o servidor já ja abre mão de um direito, que é o de receber os seus precatórios.
O governo deve cortar privilégios de grandes empresas, que se beneficiam de recursos públicos quando são isentas de pagar o ICMS. Esse montante faz falta para a saúde, educação e segurança.
Durante a manifestação, os educadores cobraram a imediata implantação do piso nacional. No ano passado, ano eleitoral, muito foi falado e prometido. Agora a categoria está cobrando as promessas.
Se o pacote preparado pelo governo atingir direitos dos trabalhadores, a praça da Matriz será novamente ocupada. A advertência é das entidades que integram o Fórum dos Servidores Públicos Estaduais, organização que foi fundamental no enfrentamento aos ataques praticados pelo governo passado.
João dos Santos e Silva, assessor de imprensa do CPERS/Sindicato

fonte: CPERS

Tarso abre Palácio aos trabalhadores e pede apoio ao Programa de Sustentabilidade Financeira


Tarso recebe alimentos e bandeiras dos sindicalistas - Ramiro Furquim/Sul21

Rachel Duarte no Sul21

Para comemorar o Dia do Trabalhador (1º de Maio), o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), convidou as centrais sindicais gaúchas para um churrasco no Galpão Crioulo, do Palácio Piratini, nesta quinta-feira (28). Mais de 20 entidades compareceram ao almoço e sentaram à mesa com o chefe do executivo estadual. O gesto do governador — reconhecido pelos representantes sindicais — tinha uma segunda intenção, além de comemorar o 1º de Maio: Tarso pediu o apoio dos sindicalistas e da imprensa ao Programa de Sustentabilidade Financeira. Ele explicou os princípios que norteiam a proposta de reforma previdenciária que o governo enviará à Assembleia Legislativa.
O cerimonial permitiu que Tarso cumprimentasse todos os representantes das centrais sindicais. Emocionada, a coordenadora do Movimento dos Trabalhadores Desempregados, Eliane de Moura, lembrou o esforço dos trabalhadores para erguer palácios como o que a acolhia naquele momento. “Sãos os trabalhadores que constroem estes palácios. E, muitas vezes, não são convidados a entrar”, lembrou.
Recebidos com a música Cio da Terra, de Milton Nascimento, os primeiros sindicalistas a entrarem do Galpão Crioulo entregaram ao governador alimentos produzidos por pequenos agricultores. Os demais ofereceram as bandeiras de suas entidades, colocadas por Tarso sobre uma mesa à frente da qual estavam cinco banners com as palavras de ordem: soberania, solidariedade, desenvolvimento, sustentabilidade e democracia.
Ramiro Furquim/Sul21

Proposta para a previdência

Ao falar sobre o Programa de Sustentabilidade Financeira e, mais especificamente, sobre a proposta de mudança na Previdência estadual, Tarso reafirmou o que disse em outras ocasiões: “Ainda está em fase de estudo a possibilidade de propor o aumento da contribuição previdenciária dos servidores estaduais”. Reforçou os princípios nos quais os técnicos do governo estão se baseando para apresentar a proposta. “Vamos viabilizar a previdência pública no estado do RS. Teremos que ter um Fundo. Para isso, quem recebe mais terá que pagar mais”, falou sobre o aumento da alíquota previdenciária sobre os salários mais elevados. O governador afirmou que as alíquotas ainda não estão definidas.
Desde o começo da gestão, Tarso defende a criação de um Fundo para a previdência. “Precisamos de um fundo público para não permitir que os servidores da base (85%) financiem as aposentadorias de cima”, afirma o governador. “Alguma modificação terá que ocorrer. A paridade contributiva eu já defendi inúmeras vezes. Mas ela não pode ser aplicada de maneira indiscriminada, se não vai continuar gerando desigualdades. Vamos fazer isso conversando com os trabalhadores”, prometeu.
A criação do fundo se torna necessária, devido ao compromisso de Tarso em não aumentar impostos e não repetir gestos que oneram ainda mais os servidores. Ele lembrou que a sua gestão já diminui impostos para micro e pequenas empresas. Indiretamente, respondeu as críticas da oposição, que classificou os projetos, que compõe o Programa de Sustentabilidade Financeira, de meramente “arrecadatórios”. “Certo governador, quando assumiu, disse que o estado estava em crise. O que ele fez? Propôs arrocho salarial e plano de demissão voluntária. Nós não vamos fazer isso. Vamos valorizar o serviço público”, disse.
Ramiro Furquim/Sul21

Inspeção veicular

Sobre a proposta de inspeção veicular, Tarso lembrou que ela não é uma criação do governo estadual, mas uma lei federal, que o Estado passará a cumprir. Alertou que a administração fará “um movimento para arrecadar mais”. Vai atuar “contra quem sonega, contra quem não está pagando”. Ressaltou que o seu governo tem uma visão diferenciada sobre a sonegação. “A maior parte das sonegações — disse Tarso — é involuntária, por desconhecimento da burocracia ou erros de natureza técnica. Vamos credenciar o estado para educar, para informar e, assim, aumentar nossa receita”.

RPVs

O programa, que busca equilibar as contas do Estado e amenizar a previsão de déficit de R$ 550 milhões em 2011, proporá uma mudança no pagamento das Requisições de Pequeno Valor (RPVs), que acumularam, ao longo dos anos, um volume elevado, que deverá ser pago pelo atual governo. “Estas dívidas do Estado, inclusive a dos precatórios, são dívidas cumulativas. Por descumprimento de obrigações legais, por governantes que não eram da mesma orientação política nossa. Agora nós vamos enfrentá-las”, disse.
Aos jornalistas, Tarso Genro não precisou com quais hipóteses o governo trabalha para pagar as RPVs. “Os estudos estão sendo feitos, mas não há nenhuma definição nossa sobre isso”, disse.
Professores e outras categorias fizeram caminhada em protesto contra projetos do governo - Ramiro Furquim/Sul21

Protesto

Mesmo que o governo ainda não tenha divulgado a íntegra dos projetos que serão votados pelos deputados, algumas entidades se opuseram ao almoço oferecido pelo governo e foram para as ruas manifestar o descontentamento.
A caminhada foi organizada pelo sindicato dos professores, o Cpers, que reuniu o maior número de integrantes no ato. A marcha saiu às 13 horas da sede da entidade e formou um grande bloco no Largo Glênio Peres, no centro de Porto Alegre. Com carro de som e cartazes contra as mudanças nas RPVs e na Previdência, as entidades se dirigiram, a partir das 14 horas, à Praça da Matriz. Em frente ao Palácio Piratini, chamavam a atenção do governador sobre as suas reivindicações. A principal delas era contra a reforma da previdência, estudada pelo governo. “O governo não pode é querer aumentar a receita e resolver os problemas financeiros do estado colocando a conta nos nossos ombros”, disse a presidente do Cpers, Rejane de Oliveira.
O protesto reuniu tanto trabalhadores da iniciativa privada quanto servidores públicos, de 10 entidades, entre elas o Cpers, movimentos estudantis, centrais sindicais e metalúrgicos. O ato encerrou por volta das 16 horas.
Durante o almoço, Tarso Genro disse que compreendia o gesto dos trabalhadores que foram às ruas, uma vez que eles “sempre foram maltratados em outros governos”. Ele avaliou a mobilização como um processo natural e importante para que o governo informe melhor suas intenções. Segundo ele, com a proposta que o governo irá apresentar “nenhum professor será atingido”.

Celebrar 1º de Maio hoje significa lutar pela retomada da organização autônoma dos trabalhadores

Escrito por a Força, a UGT, CGTB, CTB   
 
Com o início da industrialização, lá por volta de 1775, com a criação da máquina a vapor, surgem duas classes sociais distintas: o Empresariado Industrial e a Classe Operária.
 
Aproveitando-se da forte migração campo-cidade da época em busca de trabalho assalariado, os empresários passaram a exigir dos seus empregados jornadas longas, que chegavam a 16 e até 18 horas diárias. Os descansos dos fins de semanas eram raros. Os salários baixos, o que levava a que muitas donas de casa fossem para as fábricas, assim como crianças, visando a melhora do rendimento para o lar.
 
A jornada prolongada fazia com que muitos adoecessem, sofressem acidentes graves e provocou muitas mortes. Foi daí que começaram as reações dos operários (os que operam as máquinas). As reações iniciais foram individuais, isoladas, o que permitiu a repressão patronal. Essas derrotas individuais forçaram o aprendizado de que era necessário organizar a luta coletiva. Encontros internacionais de trabalhadores decidiram organizar movimentos pela redução da jornada em todos os países industrializados: oito horas de trabalho, oito horas de descanso e oito horas para convívio familiar, atividades sociais e culturais.
 
No dia 1º de Maio de 1886, nos Estados Unidos, grande greve paralisou mais de um milhão de operários. Mais de 100 mil pararam a cidade de Chicago. Ali houve forte repressão policial, com gente ferida e mortes. Quatro dias depois uma greve ainda maior, nova repressão, outras mortes e a prisão de oito dirigentes daquela manifestação. Num julgamento a "toque de caixa" e com "cartas marcadas", os jurados decidiram pela condenação dos oito como os responsáveis pelos acontecimentos. Dois foram condenados à prisão perpétua e um a 15 anos de prisão (Miguel Schwab, Oscar Neeb e Samuel Fielden). Os outros cinco foram condenados à morte pela forca em praça pública: August Spies, Albert Parsons, Adolph Fischer, George Engel e Luiz Lingg - este último preferiu o suicídio na cela.
 
As lutas se intensificaram em todos os países e, aos poucos, as oito horas foram sendo conquistadas, assim como condições específicas para o trabalho das mulheres e menores e tantos outros benefícios.
 
Passados 125 anos, o Capital desfecha novos golpes contra a classe trabalhadora em todo o mundo capitalista, roubando direitos conquistados com muita luta e muito sangue derramado. No Brasil não é diferente. Os empresários querem o fim da jornada de 44 horas.
 
Na prática, obrigam seus trabalhadores a jornadas mais longas, superiores até a 10 horas, inclusive aos sábados, domingos e feriados. Exigem reformas da Previdência para que os trabalhadores se aposentem após 65 anos (mulheres aos 60) de idade, e um mínimo de 35 anos de contribuição. Com a rotatividade no emprego, o desemprego e os trabalhos precários, poucos chegarão à aposentadoria: morrerão trabalhando. Querem o fim do 13º salário, diminuição das férias, eliminação da licença gestação/maternidade e a livre negociação por empresas para facilitar o achatamento dos salários e quebrar de vez o papel representativo dos sindicatos.
 
Quantos outros direitos já não vêm sendo surrupiados aos trabalhadores, disfarçadamente? Um exemplo: a contratação para trabalhar sem registro por experiência ou temporariamente.
 
Nossas esperanças foram depositadas na formação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), em 1983. O momento político da época e o avanço da consciência da classe trabalhadora foram determinantes para esse novo passo do conjunto do movimento sindical.
 
Entretanto, o empresariado não estava dormindo. Buscou novos aliados e provocou o racha no movimento dos trabalhadores. Da união do peleguismo comandado por Joaquinzão com a direção do então PCB, do PC do B e do MR-8, nasce a divisionista CGT para combater as greves por categorias profissionais ou mesmo gerais, como vinha acontecendo. Era o esforço para dividir a classe operária, colocando-a a serviço dos interesses patronais.
 
Contrariados com os fracos resultados dessa divisão, os homens do capital patrocinaram a formação de mais uma central: A Força Sindical (ou Farsa sindical?). O "sindicalismo de resultados", troca dos dedos por alguns anéis, levou à capitulação progressiva da direção cutista. Já nos anos 90 percebia-se que a direção da CUT não estava mais interessada em defender os interesses dos trabalhadores. Sua meta era outra: levar Lula à presidência da República, a qualquer preço. E esse preço incluía a passividade do movimento sindical.
 
Hoje, estamos assistindo à mais vergonhosa capitulação das centrais sindicais tradicionais aos interesses do capital nacional e internacional. Sobretudo a CUT e a Força Sindical - verdadeiras inimigas entre si nos anos 90 -, tornaram-se cúmplices da entrega dos nossos direitos ao capital e se unem para abafar a consciência e a memória histórica dos trabalhadores. Em São Paulo, estão unidas na promoção do show no dia 1º de maio, a Força, a UGT, CGTB, CTB (esta correia de transmissão do PC do B) e Nova Central. Show financiado por empresas estatais (Petrobras, Caixa, Eletrobrás) e muitas empresas particulares (Brahma, Carrefour, Casas Bahia, Pão de Açúcar, BMG, Banco Itaú, Bradesco*), que financiarão também 20 carros a serem sorteados durante o show.
 
O que é, então, celebrar o 1º de Maio, hoje, 125 anos depois dos acontecimentos de Chicago? É retomar a organização autônoma dos trabalhadores, a começar pelos locais de trabalho (fábricas, comércio, hospitais, escolas, unidades públicas e também nas comunidades), para reforçar os sindicatos que continuam comprometidos com os trabalhadores; é fazer novas experiências de organização e de lutas visando a construção de um outro instrumento de lutas, que não repita os desvios ideológicos como vem acontecendo nos últimos 20 anos; é entrar nas lutas em defesa dos nossos direitos, pelas 40 horas semanais, contra as reformas que visam eliminar direitos conquistados e que estão circulando no Congresso Nacional, entre tantas outras importantes.
 
Participe dos atos em memória dos nossos mártires! É urgente somar forças com os setores do movimento sindical e popular que ainda resistem aos ataques do capital e renovar o compromisso de lutar em defesa dos nossos direitos.
 
Em São Paulo, ato na Praça da Sé, a partir das 10,00 horas
 
Atividades culturais, memória dos 125 anos de lutas e apresentação da pauta de lutas da Classe Trabalhadora. Patrocínio das Pastorais Sociais, de parcela do movimento social, dos sindicatos ligados à Conlutas e Intersindical, Consulta Popular e partidos da esquerda (PSOL, PCB, PSTU).
 
* Fonte: Folha de 24/04, página A10.
 
Waldemar Rossi é metalúrgico aposentado e coordenador da Pastoral Operária da Arquidiocese de São Paulo.

Rebeliões: destruindo os estereótipos das mulheres árabes


Por Soumaya Ghannoushi*Na Carta Capital

Entre esta nova geração de proeminentes mulheres árabes, a maioria escolhe usar o hijab. Urbanizadas e educadas, elas não são menos confiantes e carismáticas que suas irmãs “desveladas”.
As revoluções árabes não somente estão abalando as estruturas da tirania até suas mais profundas fundações, como estão destruindo muitos dos mitos a respeito da região árabe que têm se acumulado por décadas. No topo desta lista de mitos dominantes estão aqueles das mulheres árabes como enjauladas, silenciadas, e invisíveis. Estes não são os tipos de mulheres que apareceram na Tunísia, Egito, ou mesmo no ultraconservador Iêmen nas últimas semanas e meses.
Não apenas as mulheres participaram ativamente nos movimentos de protestos enfurecidos nestes países, como desempenharam também papeis fundamentais. Elas organizaram protestos e piquetes, mobilizaram muitos cidadãos, e eloquentemente expressaram suas exigências e aspirações por mudanças democráticas.
Como Israa Abdel Fatteh, Nawara Nejm e Tawakul Karman, a maioria das mulheres está na faixa dos 20 ou 30 anos. Há ainda casos inspiradores de ativistas mais velhas: Saida Saadouni, uma mulher com seus 70 anos na Tunísia, enrolou a bandeira nacional em seus ombros e participou dos protestos de Qasaba, que conseguiram derrubar o governo provisório de M. Ghannouchi. Tendo protestado por duas semanas, ela disseminou um espírito revolucionário único entre os milhares que se reuniram a sua volta para escutar seus discursos incendiários. “Eu resisti à ocupação francesa. Eu resisti às ditaduras de Bourguiba e Ben Ali. Não descansarei enquanto nossa revolução não chegar ao fim, por vocês, meus filhos e filhas, não por mim,” disse Saadouni.
Seja nos campos de batalha virtuais da internet ou nos protestos físicos nas ruas, as mulheres têm se provado como reais incubadoras de lideranças. Isto é parte de um fenômeno mais amplo característico destas revoluções. A política aberta das ruas fez nascer e amadurecer futuras líderes. Elas crescem organicamente nos campos, muito mais do que sendo impostas de cima por organizações políticas, grupos religiosos ou imposições de gênero.
Outro estereótipo sendo desconstruído neste movimento é a associação da burca com a passividade, submissão e segregação. Entre esta nova geração de proeminentes mulheres árabes, a maioria escolhe usar o hijab. Urbanizadas e educadas, elas não são menos confiantes e carismáticas que suas irmãs “desveladas”. Elas são uma expressão da complexa formação da cultura muçulmana, com processos de modernização e globalização sendo a marca fundamental da sociedade árabe contemporânea.
Este novo modelo de líderes mulheres criadas em suas terras natais, nascidas de levantes revolucionários, representa um desafio a duas narrativas, as quais, embora diferentes nos detalhes, são similares em referência ao mito da singularidade cultural árabe; ambos destituem a figura da mulher árabe como criatura inerte e sem força de vontade.
A primeira narrativa – que é dominante nos círculos muçulmanos conservadores – sentencia as mulheres a uma vida de reprodução e criação das crianças; mulheres são feitas para viver nos estreitos confins de suas casas com a permissão de seus maridos e parentes homens. Sua presença deve se limitar em torno de noções de pureza sexual e honra familiar; interpretações reducionistas da religião são procuradas para justificar isto.
A outra visão é abraçada por euro-americanos neoliberais, que veem as mulheres árabes e muçulmanas através do estreito prisma do modelo Talibã: objetos miseráveis de pena que precisam de uma intervenção benevolente de intelectuais, políticos ou mesmo militares. Mulheres árabes aguardam a libertação da jaula escura do velamento para um jardim prometido de iluminação.
As mulheres árabes estão se rebelando contra ambos modelos: elas estão tomando para si as rédeas dos próprios destinos libertando a si mesmas, ao passo em que libertam suas sociedades das ditaduras. O modelo de emancipação que estão conformando com suas próprias mãos é definido por suas próprias necessidades, escolhas e prioridades – e de ninguém mais.
Embora possa haver resistência a este processo de emancipação, a Praça Tahrir e Qasaba agora são parte da psiquê e da cultura das mulheres árabes. De fato, elas finalmente têm voz para gritar seus há muito silenciados anseios por libertação do autoritarismo – tanto político quanto patriarcal.

* Tradução de Cainã Vidor.

* Publicado originalmente no site da Al Jazeera, em português no Envolverde.