quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Há 200 anos: José Artigas e a luta pela terra e liberdade

  Mário Maestri   no CORREIO DA CIDADANIA


O nascimento de José Gervasio Artigas Arnal, terceiro de seis filhos, foi registrado em Montevidéu, em 19 de junho de 1764, por seus pais, descendentes dos fundadores da vila e proprietários de algumas terras no interior. José Artigas viveu sua infância em Montevidéu e na chácara paterna, junto ao arroio Carrasco, estudando as primeiras letras com os franciscanos. Aos doze anos, partiu para a campanha onde, em terras familiares, viveu entre os gaúchos, como gaúcho. Aos dezesseis anos participava de partidas de changadoras e de contrabandistas, que vendiam ilegalmente gados e couros nos territórios lusitanos. Por esses anos, teria vivido com os charruas, com toldo, mulher e filho.

Em 1797, com 33 anos, acolheu anistia real e passou a integrar, como soldado raso, no corpo de Blandengues de Montevidéu, formado para combater as correrias de nativos, de portugueses e de changadores na fronteira norte. Muito logo, foi promovido naquele corpo, devido às suas capacidades pessoais e ao enorme conhecimento da fronteira. Antes do fim do século, na fronteira com o Rio Grande do Sul, comprou e libertou um afro-oriental capturado ilegalmente pelos lusitanos. Joaquín Lenzina, o negro Ansina (1760-1860), o acompanharia como amigo, como cronista e como combatente por toda sua vida. Seria seu fiel companheiro no longo exílio paraguaio, onde o caudilho morreria, aos 72 anos. Em 1800, José Artigas secundou o geógrafo, naturalista e oficial espanhol Félix de Azara na operação de “Arreglo de los campos” e na fundação da vila de Batovy. A operação pretendia distribuir terras na fronteira entre as camadas populares, para interromper a expansão latifundiária luso-rio-grandenses em terras espanholas.

Em 1809, quando do ataque inglês a Buenos Aires, Artigas partiu para associar-se à resistência, sem chegar a tempo para os combates. Após a Revolução de Maio de 1810, já capitão do corpo de Blandengues, tentou reprimir inutilmente a população entrerriana sublevada contra a coroa espanhola. Então, desertou do corpo de Blandengues de Sacramento para oferecer-se aos insurretos. Em Buenos Aires, considerado pelos dirigentes revolucionários como decisivo para a vitória da luta pela independência na Banda Oriental, recebeu o posto de tenente-coronel, cento e cinqüenta homens e duzentos pesos. Em inícios de abril de 1811, já na margem oriental do Uruguai, com 180 homens, lançou a Proclamação de Mercedes, obteve diversas vitórias e assumiu a direção da luta contra o partido espanhol na província oriental.

Ao sentir o controle da Banda Oriental escapar-lhe das mãos, o vice-rei espanhol Francisco de Elío aceitou o oferecimento envenenado da coroa lusitana, então com sede no Rio de Janeiro. Uma expedição militar portuguesa atravessou a raia que separava os territórios de Espanha e de Portugal e ocupou, rapidamente, Melo, a fortaleza de Santa Teresa, Rocha e Maldonado, enquanto a frota espanhola bloqueava o porto de Buenos Aires, interrompendo seu rico comércio. Interessada em regiões tidas econômica e militarmente como mais importantes, a junta revolucionária bonaerense, sob o controle dos comerciantes crioulos, não pensou duas vezes. Sem contemplações para com o povo da outra margem do grande rio, negociou armistício, sancionado em 20 de outubro de 1811, que entregava a Banda Oriental aos espanhóis, em troca do fim do bloqueio do porto de Buenos Aires. Indignado com a traição, Artigas levantou imediatamente o cerco de Montevidéu e iniciou retirada com suas tropas para o norte.

Desde o início, a retirada foi acompanhada por civis e seus familiares. Participaram da marcha alguns proprietários, com seus cativos, mas sobretudo orientais pobres, com suas mulheres e filhos. A retirada foi se massificando, até formar uma coluna de talvez quinze mil migrantes, de carretas, cavaleiros e muitos homens, mulheres e crianças viajando a pé. A longa expedição, em direção de Salto Chico, na atual cidade argentina de Concordia, em Entre Ríos, deixou literalmente o interior da Banda Oriental semi-despovoado. Conhecido na época como “la redota”, corruptela de “la derrota”, o movimento foi denominado pela historiografia oriental em forma mais erudita e patriótica como o Éxodo del Pueblo Oriental. Ele é apresentado como momento da fundação da consciência nacional uruguaia.

Em 26 de fevereiro de 1813, com o reinício dos combates entre espanhóis e patriotas, José Artigas retomou o sítio de Montevidéu. Muito logo, sua autonomia em relação a Buenos Aires transformou-se em clara ruptura. Quando da eleição dos deputados orientais que integrariam a Assembléia Geral Constitucional de 1813, chamada por Buenos Aires, realizada em seu acampamento militar, orientou que os representantes orientais defendessem a independência e os limites da Banda Oriental e o mesmo direito de todas as províncias na confederação. 

Independência, Federalismo e Democracia Rural

Uma organização federativa das províncias constituía proposta inaceitável para os comerciantes portenhos, no controle da Revolução de Maio de 1810. Sob a justificativa da ilegalidade da eleição de deputados em acampamento militar, a Junta Revolucionária portenha vetou a participação dos delegados orientais e decretou José Artigas traidor.

Devido à nova situação, o caudilho oriental levantou o cerco de Montevidéu, em meados de 1814, e iniciou a luta pela independência da província e pela organização federalista do antigo vice-reinado do rio da Prata. Após diversas vitórias em combates livrados em Corrientes, em Entre Ríos e na Banda Oriental, Montevidéu foi entregue, em 23 de maio de 1814, a um comandante artiguista.

No governo da Banda Oriental, José Artigas desdobrou-se para antepor a federação das províncias livres do Prata ao centralismo portenho. Em 29 de junho de 1815, reuniu-se o Congresso do Oriente, no qual participaram delegados da Banda Oriental, de Córdoba, de Corrientes, de Entre Ríos, de Santa Fé e das Misiones, para fundar a Liga Federal ou União dos Povos Livres, que conclamou a adesão igualitária de todas as antigas províncias do vice-reinado. Na ocasião, José Artigas foi designado protetor da Liga Federal, estabelecendo sua capital em Purificación, a uns cem quilômetros ao norte de Paisandu.

Porém, forças poderosas seriam galvanizadas contra a proposta de Federação igualitária das províncias do Prata. Por um lado, sua exigência de federação democrática não era aceita pelo programa centralista e monopólico da oligarquia comercial de Buenos Aires. Por outro, instalada no Brasil, desde 1808, a Coroa portuguesa sonhava em retornar ao rio da Prata, conquistando os ricos campos de criação da Banda Oriental e o valioso comércio de Montevidéu. Ela temia igualmente que o programa federalista e social artiguista contaminasse a província do Rio Grande do Sul.

Em 10 de setembro 1815, sob a presidência de José Artigas, o Congresso do Oriente votou e aprovou Regulamento Provisório para o desenvolvimento da campanha que resgatava a antiga proposta, no início do século, de “Arreglo de los campos”, impulsionada por Félix de Azara, secundado pelo agora caudilho oriental. Nos fatos, propunha-se assentar a independência da Banda Oriental e das províncias da Liga Federal em uma ampla divisão das terras entre as populações necessitadas, com destaque para as mais pobres. Com o Regulamento Provisório de 1815, aos negros livres, aos crioulos pobres, aos índios etc. patriotas, seriam entregues suertes de estância, ou seja, pouco menos de dois mil hectares, o necessário para uma família viver da exploração pastoril.

Nesse então, o movimento galvanizado por José Artigas alcançava seu mais elevado momento, ao associar a independência política à metrópole européia à proposta de distribuição de terras entre a população regional pobre. Ele avançava proposta de revolução nacional, federalista, democrática, republicana e social que incendiaria a região.

Do Rio Grande do Sul, chegariam gaúchos e sobretudo cativos fugidos atraídos pelas promessas de liberdade e terra. No mesmo sentido político e social, mas em forma diversa, procederia o doutor José Gaspar de Francia que, entretanto, restringiria a sua luta pela independência apenas à província do Paraguai.

Revolução Agrária

No início, Artigas tentou inutilmente mediar as necessidades de terra dos subalternizados e a exigência de trabalhadores dos criadores. Obedecendo às reclamações dos estancieiros, estabeleceu o regime de obrigatoriedade de “papeletas de conchavado”, espécie de carteira do trabalho, enviando para o exército os homens pobres que não tivessem emprego, os ditos vagos. Reprimiu igualmente o abigeato e proibiu os comerciantes ambulantes em carretas – pulperos volantes –, tradicionais compradores de couros de gados chimarrões ou das imensas propriedades privadas. Porém, essas determinações eram mais formais do que efetivas, não podendo ser utilizadas pelos estancieiros contra os homens pobres, aos quais a nova ordem facilitava o acesso da terra. Artigas impediu igualmente que, após a derrota de Buenos Aires, as terras dos latifundiários portenhos expropriados terminassem nas mãos dos grandes comerciantes, fazendeiros e saladeiristas de Montevidéu, reservando-as para serem distribuídas entre os posseiros e os sem terra patriotas.

O movimento de democratização da propriedade da terra tendeu a aprofundar-se sob a ação e a pressão da população despossuída da campanha, agora sob armas, na guerra contra Buenos Aires e, a seguir, contra o Rio de Janeiro. Muito logo, as grandes propriedades de espanhóis, de portenhos, de emigrados e de todos os ausentes passaram a ser ocupadas pelas classes subalternizadas. Apenas a ação do cabildo de Montevidéu, representante da oligarquia comercial e fundiária oriental, levou a que o novo governo transformasse a determinação de expropriação dos proprietários que abandonavam os campos em ordem de rápido retorno a elas. No interior, arrendatários, poseedores, intrusos etc. negavam-se igualmente a pagar os aluguéis das terras que exploravam, mesmo aos grandes proprietários orientais patriotas.

Por longos anos, a historiografia oriental descreveu quadro histórico no qual a pronta intervenção lusitana e a longa situação de guerra teriam impedido o projeto artiguista de democratização da propriedade de terras. A partir dos anos 1960, investigações detidas de grupo de historiadores uruguaios marxistas, formados por, entre outros, Rosa Alonso Eloy, Lucia Sala de Touron, Nelson de la Torre, Júlio Carlos Rodrigues, pôs fim a esse mito. Esses estudiosos demonstraram que a larga distribuição de terras, sobretudo de propriedade de latifundiários de Buenos Aires, originou o segmento social dos donatários artiguistas, que determinou fortemente a história política e social da Banda Oriental nas décadas seguintes.

As decisões do governo artiguista sobre a divisão de terras abarcavam mais da metade do território, com destaque para as grandes denúncias de terra da oligarquia de Montevidéu e de Buenos Aires. A onda de democratização da propriedade podia se estender às províncias da Liga Federal e à província do Rio Grande do Sul. Em 1816, poderosas tropas luso-brasileiras, formadas por quase cinco mil veteranos das guerras napoleônicas, reforçadas por estancieiros, peões e gaúchos sul-rio-grandenses, invadiam a Banda Oriental, sob o comando do general português Carlos Frederico Lecor (1764-1836), barão da Laguna, enquanto a frota real lusitana atacava por mar Montevidéu. Iniciava-se a dura, longa e sangrenta guerra contra-revolucionária anti-artiguista.

José Artigas comandou a resistência nacional, apoiado pelos pequenos e médios proprietários e, sobretudo, pelos deserdados dos campos e das cidades, ou seja, gaúchos, índios, negros livres, forros e fugidos, secundado por seus comandantes, com destaque para Juan Antonio Lavalleja, Fernando Otorgués, Andrés Latorre, Manuel Oribe, Fructuoso Rivera e o missioneiro Andrés Guazarary. Esses últimos raramente se mostraram à altura das necessidades históricas.

A Contra-Revolução Lusitana

Com o decorrer dos confrontos, muitos dos oficiais de Artigas, à frente das tropas que controlavam, entraram em acordo ou acomodaram-se aos luso-brasileiros. Por sua vez, com o começo da divisão de terras na Banda Oriental, em novembro de 1815, o cabildo de Montevidéu abandonou os pruridos nacionais, aderindo logo que lhe foi possível à proteção real portuguesa. Com fortes apoios na capital e o poder de sua marinha de guerra, os lusitanos ocupavam Montevidéu, em 20 de janeiro de 1817, onde o comandante lusitano foi recebido como libertador. Sob a ordem lusitana, os membros das classes dominantes orientais passaram a combater, por todos os meios, a revolução artiguista. Essa seria apenas a primeira demonstração da enorme ausência de consciência nacional da oligarquia de Montevidéu, quando estavam em jogo suas imensas propriedades e privilégios.

Após três anos e meio de resistência na campanha, apesar da quase imediata defecção dos grandes estancieiros, José Artigas e suas tropas de deserdados foram derrotados na batalha de Tacuarembó, em janeiro de 1820. Enquanto os orientais eram vencidos pelos luso-brasileiros, os governadores de Entre Ríos e de Santa Fé venciam os unitários do Diretório de Buenos Aires, com os quais entraram, entretanto, em acordo, sem consultar Artigas devido ao seu insucesso militar.

A derrota final de José Artigas e de revolução nacional, democrática e social que capitaneou foi construída pelos invasores que, através da oligarquia montevideana, desorganizaram a frente social artiguista, atraindo, primeiro, os grandes e médios proprietários, a seguir, os lugares-tenentes do libertador, sob a promessa de reconhecimento das propriedades dos donatários artiguistas e de elevar e premiar os oficiais que aderissem aos luso-brasileiros. Na dura resistência artiguista, teria morrido em torno da metade da população pobre do interior.

Refugiado em Entre Ríos, José Artigas sofreu a oposição do caudilho daquela província, agora apoiado pelos portenhos. Combatido por seus antigos lugares-tenentes, acompanhado pelo negro Ansina e por uns quinhentos combatentes, sobretudo nativos guaranis e cativos fugidos, sem qualquer esperança na nova ordem, cruzou o rio Paraná em direção ao Paraguai, onde foi aceito por José Gaspar Rodríguez de Francia, que lhe impediu, porém, de estabelecer qualquer ligação com o exterior. Anteriormente, Artigas conspirara com a oposição paraguaia, devido à negativa do ditador perpétuo, defensor intransigente da independência paraguaia, de unir-se ao movimento federalista. Os soldados artiguistas que receberam licença para ingressar no Paraguai, em grande parte negros, receberam terras e dissolveram-se na população camponesa local. Os poucos que, desmoralizados pela guerra, entregaram-se ao banditismo, o doutor Francia mandou perseguir e enforcar.

Vinte anos mais tarde, quando o Dr. Francia morreu, em 1840, Artigas foi preso brevemente, pois se temia que a população paraguaia o levasse ao governo do país, devido ao prestígio que também ali gozava. Após a ascensão de Carlos Antonio López à presidência do Paraguai, o caudilho oriental passou a viver, já ancião, em Assunção, rodeado de deferências, na quinta do novo chefe político, onde faleceu, em 23 de setembro de 1850, sem jamais aceitar retornar à Banda Oriental.

Bibliografia utilizada:

MAESTRI, Mário & LIMA, Solimar O. (Org.) Peões, vaqueiros & cativos campeiros. Estudos sobre a economia pastoril no Brasil. Passo Fundo: EdiUPF, 2010.

MAESTRI, Mário. Breve História do Rio Grande do Sul. Da Pré-História aos dias atuais. Passo Fundo: UPF Editora, 2010.

MILLOT, J & BERTINO, M. Historia económica del Uruguay. Montevideo: Fundación de Cultura Universitaria, 1991. (1700-1860) T.1.

PONS, Roberto. Las vísperas de la primera independencia. 3 ed. Montevideo: Casa del Estudiante, 1974.

TOURON, Lucia Sala de & ELOY, Rosa Alonso. El Uruguay comercial, pastoril y caudillesco. Tomo II: sociedad, política e ideologia. Montevidéu: Ediciones de la Banda Oriental, 1991.

TOURON, Lucia Sala; ELOY, Rosa; TORRE, Nelson de la; RODRIGUES, Julio Carlos. La oligarquía oriental en la Cisplatina. Montevideo: Pueblos Unidos, 1970.

TOURON, Lucía Sala; TORRE, Nelson de la; RODRÍGUEZ, Julio C. Artigas: tierra y revolución. Montevideo: Arca, 1967.

WHITE, Richard Alan. La primera revolución popular en America: Paraguay (1810-1840). 2 ed. Asunción: Carlos Schauman, 1989.


Mário Maestri, sul-rio-grandense, é professor do curso e do programa de pós-graduação em História da UFF.
E-mail: maestri(0)via-rs.net

África agora? Por que não?

311011_africamapaLa Haine - [Juan Gelman, Página 12, Tradução de Diário Liberdade] As tropas do regime estadunidense não são só para se apoderar das riquezas da região: trata-se do sonho imperial de colonizar o mundo inteiro.

Não terminava de se findar o estrondo da última bomba que a OTAN despejou na Líbia quando o presidente Obama anunciou a decisão de intervir militarmente outro país africano: Uganda. "Isto é necessário – disse – porque o Exército de Resistência do Senhor (ERS) representa uma ameaça para a segurança regional" (www.whitehouse.gov, 14 de outubro de 2011). Em certo sentido, o argumento é novo: até o presente, a Casa Branca invadia países "em defesa da segurança nacional", a dos Estados Unidos. Esta explicação da operação em Uganda – ao que já se destinou 40 milhões de dólares – põe de manifesto a capacidade de troca que caracteriza o mandatário estadunidense e a amplitude de sua preocupação pelo mundo inteiro.
Washington enviará uma centena de "assessores militares" para contribuir com o aniquilamento do ERS, uma miniguerrilha de vaga orientação cristã sem base social alguma que cometeu atentados terroristas na zona. Opera desde mais de 20 anos, mas o Departamento de Estado presta agora uma repentina atenção. Esse corpo de elite "permanecerá no país todo o tempo que for necessário", precisou Obama, e a história é conhecida: a intervenção dos Estados Unidos no Afeganistão começou com pessoal militar escasso e hoje ascende a 100 mil o número de seus efetivos no país asiático. A generosidade do chefe da Casa Branca se somou em outra oferta: está disposto a intervir no Congo e na República Centro-Africana "se esses Estados solicitarem".
No dia 16 de outubro, dois dias depois do anúncio de Obama, tropas da Quênia invadiram o sul da vizinha Somália por terra, mar e ar com o propósito declarado de impedir que supostos membros da organização islâmica al-Shabaab seguissem violando a fronteira. A Casa Branca manifestou sua surpresa pelo fato e negou que estivesse envolvida, mas os mísseis que causaram a morte de centenas de civis somalis "parecem ter sido disparados desde aviões não-tripulados ou submarinos estadunidenses", segundo The Economist (www.economist.com, 29 de outubro de 2011).
A França negou sua participação na operação e foi desmentida por um porta-voz militar do Quênia, o major Emmanuel Chirchir, que manifestou que a marinha de guerra francesa havia bombardeado populações somalis (The New York Times, 23 de dezembro de 2011). A Líbia ficou para trás, mas a OTAN é incessante.
Tudo parece indicar que, na realidade, avança a aplicação da estratégia do comando dos Estados Unidos para África (Africom, por sua sigla inglesa). Os EUA perseguem o controle militar das zonas estratégicas do continente negro: Líbia, atravessada pelo Mediterrâneo que banha o Oriente Médio e África; o Chifre da África e a região central africana, que facilitam o controle do Oceano Índico e do Atlântico. Pode-se pensar que a razão deste desígnio é se apoderar das riquezas da região, o petróleo líbio, por exemplo, e as reservas de ouro negro da Somália, ao que parece volumosas. Não deixa de ser assim, mas o jogo é mais amplo: trata-se do sonho imperial de colonizar o mundo inteiro.
O Pentágono treina febrilmente os militares de Mali, Chade, Níger, Benin, Botsuana, Camarões, República Centro-Africana, Etiópia, Gabão, Zâmbia, Uganda, Senegal, Moçambique, Gana, Malauí e Mauritânia, e realiza com frequência manobras conjuntas com as forças armadas desses países (www.blackagendareport.com, 18 de outubro de 2011). Exerce, assim, uma notória influência nos comandos militares da região e, consequentemente, em seus governos. Os Estados Unidos se converteram em "sócios" da Etiópia e dos cinco Estados da Comunidade da África Oriental. Qualquer nação africana que, como a Eritreia, não mantém uma relação com o Pentágono, é alvo de uma mudança de regime.
A Casa Branca justifica atualmente a invasão queniana da Somália como parte necessária da chamada guerra antiterrorista em função da insurgência da organização islâmica al-Shabaab, que se levantou contra o governo federal de transição de Mogadíscio imposto em 2009 com o apoio dos Estados Unidos e outros países da Europa para combatê-la. Washington acusa os insurgentes de manter laços com a Al-Qaeda, mas "a maioria dos analistas considera que esses laços são débeis", segundo o Council on Foreign Relations, o think-tank não-partidário sediado em Nova Iorque (www.cfr.org, 10 de agosto de 2011). O CFR estima que o número de combatentes islâmicos ideologicamente convencidos de sua luta oscila entre 300 e 800 indivíduos. Não obstante, al-Shabaab controla boa parte do sul da Somália e obstaculiza assim o domínio geopolítico estadunidense do estratégico território marítimo da África Oriental.
Há cerca de 12 milhões de pessoas com fome na região, castigada pela seca mais dura das últimas seis décadas. Dezenas de milhares morreram e nos próximos meses centenas de milhares conheceriam o mesmo destino na Somália, advertiu a ONU. A invasão militar do Quênia aprofunda, e muito, a gravidade desta situação humanitária.

Traduzido para Diário Liberdade por Lucas Morais

"Companhia francesa descobre 12,3 mil toneladas de urânio na Jordânia"

Do sitio INTELIGENCIABRASILEIRA


A companhia francesa Areva, especialista mundial no setor energético, anunciou nesta terça-feira que descobriu no centro da Jordânia 12.300 toneladas de urânio, quantidade suficiente para desenvolver o programa nuclear jordaniano, segundo comunicado.Divulgada pela agência de notícias estatal jordaniana "Petra", a nota informou que a Areva espera que a jazida alcance 20 mil toneladas até o final de ano, abrangendo uma área de 18 quilômetros quadrados."É uma estratégica reserva de urânio que deve garantir combustível para o programa nuclear jordaniano", afirmou a empresa, que efetua atividades de prospecção em parceria com a estatal jordaniana.A Areva planeja desenvolver "estudos econômicos e técnicos", segundo a nota, para decidir a viabilidade de executar explorações em outras regiões da Jordânia a partir de 2012."A atividade neste âmbito dependerá das necessidades atuais e futuras do mercado global de urânio", acrescentou a empresa.A Jordânia possui aproximadamente 65 mil toneladas de urânio e espera começar a produção deste mineral já no ano 2013, declarou o ministro da Energia jordaniano, Khaled Tuqan, em setembro.Tuqan insistiu recentemente na necessidade da Jordânia desenvolver seu programa nuclear com fins pacíficos, o que preocupa Estados Unidos e Israel, para executar projetos de dessalinização de água e produzir energia segura e estável com baixo custo.Até o momento, a Jordânia fechou acordos de cooperação nuclear com Espanha, Argentina, França, Reino Unido, Rússia, China, Japão, Coreia do Sul, Turquia e Romênia.

Ativistas digitais da Primavera Árabe

http://www.clickfozdoiguacu.com.br/foz-iguacu-noticias/
blogmundo-reune-blogueiros-ativistas-da-primavera-arabe
Do sítio do 1º Encontro Mundial de Blogueiros:

O 1º Encontro Mundial de Blogueiros fez um debate inédito no Brasil sobre as Revoltas do mundo Árabe. Mediada pelo editor da revista Fórum e presidente da Altercon Renato Rovai, e pelo blogueiro Sérgio Telles, a mesa levantou o debate sobre a democracia e a importância das redes sociais para mobilizar a sociedade em grandes protestos como os que aconteceram no Oriente Médio nos últimos meses.



Pra abrir o debate o ativista egípsio Ahmed Bahgat contou sua experiência no Egito e como foi organizar a população em grandes manifestações. De acordo com ele a censura no país chegou a derrubar a inernet por alguns dias para impedir as articulações. Neste período “offline” os ativistas aprenderam a se mobilizar sem internet e ganharam ainda mais força quando o sistema voltou a funcionar.

Bahgat admitiu não ser blogueiro, ele é um ativista no Facebook, onde criou um grupo de protesto. “Eu fui postar algo de protesto no Facebook e percebi que não tinha nem um grupo relacionado ao assunto, por isso criei um, ganhou uma proporção enorme entre os meus amigos e depois atingiu outros círculos de pessoas”.

Em seguida o blogueiro saudita Ahmed Al Omran contou a experiência da Arábia Saudita com as manifestações populares. “As manifestações que vem acontecendo no mundo árabe tem ajudado as pessoas a ultrapassar a barreira do medo, mas ela é diferente de um país para o outro. É improvavé que algo aconteca logo na Arábia”, avaliou.

Omran explicou que no país dele as pessoas ainda são pouco politizadas e não tem muito acesso à informação alternativa, por isso organizar manifestações pela internet ainda é uma tarefa difícil de realizar. “As revoluções tem dado certo na Tunísia e no Egito, mas não em outros lugares, nós na Arábia estamos vendo tudo isso acontecer on-line”.

O blogueiro paquistanês Farhan Janjua participa de uma grande organização responsável por disseminar informação alternativa nas redes sociais. Ele mostrou vídeos com dados sobre os usuários de inernet e o crescimento nas redes durante os últimos meses no país dele. Mostrou ainda um vídeo que foi censurado do Youtube, onde o presidente do Paquistão mandava as pessoas “carem a boca” durante um pronunciamento.

Para fechar a mesa, o jornalista brasileiro, Pepe Escobar, que é também colunista no site Ásia Times do Japão, fez uma explanação sobre a conjuntura política, ecnômica e social no Oriente Médio.
 
Do sitio do MIRO

Elizângela Araújo: O câncer de Lula e o preconceito

por Elizângela Araújo no VIOMUNDO

Muitos conhecidos e até amigos meus têm compartilhado o que parece ser uma campanha cômica – porém sem graça – pelo tratamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Sistema Único de Sáude (SUS). Obviamente, têm sido contra-atacados por aqueles que têm grande apreço e identificação ideológica ou partidária com o ex-presidente. Como a maioria dos brasileiros já deve saber, Lula teve câncer na laringe diagnosticado no último sábado (29/10) e começou nesta segunda-feira (31/10) seu tratamento quimioterápico no hospital Sírio-Libanês, em São Paulo-SP. A brincadeira tem um quê de estupidez e oportunismo e acirra novamente os ânimos do que parece ser dois grupos distintos de pessoas: os pró-Lula e os anti-Lula.
Eu, que até o momento me coloco fora desse terreno de paixões exacerbadas, de repente me vi tendo que pensar algo a respeito da cizânia. A primeira conjectura que me surgiu foi sobre o José Alencar, ex-vice-presidente morto em razão de um câncer no dia 29 de março deste ano, depois de lutar por mais de dez anos contra a doença, não ter sido alvo de uma “campanha” semelhante. Ou foi?
De acordo com a agência de notícias IDGNow, especializada em tecnologia, houve 120 mil compartilhamentos da foto do ex-presidente com a mensagem “Lula, faça o tramento pelo SUS”, no Facebook, desde sábado à tarde até esta segunda. Ainda não há números sobre a repercussão no Twitter. Se o número é pequeno diante do total de usuários – 31 milhões de brasileiros utilizam o Facebook, segundo pesquisa do Ibope realizada em agosto – não deixa de assustar pelo nível dos comentários.
Outros políticos brasileiros enfrentaram a mesma doença – alguns morreram e outros a superaram – sem que houvesse semelhante “campanha”. A presidenta Dilma Rousseff, por exemplo, também tratou-se no Sírio-Libanês. Mário Covas, morto em 2001 depois de perder a luta contra um câncer na bexiga, também não foi alvo de semelhante galhofa. Roseana Sarney, cujo sobrenome dispensa maiores apresentações, também foi vítima de câncer em 1998 (pulmão) e em 2002 (mamas), assim como seu pai, que enfrentou a doença, localizada na próstata, entre 1985 e 1990.
Paulo Maluf, que também dispensa mais detalhes de sua biografia, também foi acometido pela doença em 1997, quando era governador de São Paulo e candidato à Presidência da República. Enfim, há outros inúmeros casos de políticos menos ilustres que tiveram câncer e comoveram mais ou menos brasileiros. No entanto, em nenhum desses casos houve tamanha falta de sensibilidade e oportunismo como no caso do ex-presidente-metalúrgico.
E fico me perguntando por quais razões as pessoas acham jocoso ou mesmo inteligente montar uma “campanha” fajuta a essa altura do campeonato, depois de terem se comovido tanto com a morte do empresário Steve Jobs, morto no dia 5 de outubro também vítima de câncer. Não tenho nenhuma intenção de comparar biografias, malfeitos ou benfeitos de todos que citei aqui, mas convocá-los para expôr minha curiosidade sobre a brincadeira de mau gosto que pede ao ex-presidente que se trate no SUS, porque como dizem seus admiradores, não se trata de uma campanha pelo fortalecimento do sistema, mas de uma campanha anti-Lula. E se tantas pessoas passam a reproduzir uma brincadeira inconsequente como essa sem se importar de tripudiar de uma pessoa que acaba de receber um diagnóstico inquietante como esse, seja quem for, é sinal de que estamos consolidando uma sociedade com valores bem equivocados.
Andaram relembrando, por exemplo, que o Lula declarou, ainda em 2006, que o SUS estaria à beira da perfeição. Assim como ele, porém, todos os governantes deixam o poder público gabando-se de terem deixado evoluções nos serviços públicos. Cá com meus botões, acho que a declaração foi, certamente, infeliz, mas nem por isso vou fazer coro com os que agora tentam achincalhar o ex-presidente num momento em que ser humano nenhum merece tal tratamento.
No fim das contas, acho que todos devem ter o direito de dizer o que querem, desde que também aceitem a contrapartida de ouvir o que não querem. E acho que, no fim, toda essa bobagem evidencia dois grandes grupos que se negam ao amadurecimento político. Os que utilizam a paixão por Lula para desqualificar a indignação do demais pelo sucateamento do SUS, e os que se valem da mesma moeda para tripudiar de uma pessoa acometida com câncer.
Se queremos mesmo a melhoria do nosso sistema público de saúde, por favor, iniciemos uma campanha séria e apartidária pelo fim da corrupção em todos os níveis do poder público, contra a terceirização de serviços essenciais – por meio dos quais muitas secretarias municipais de saúde desviam dinheiro junto com médicos e empresários inescrupulosos do ramo, e pela fiscalização rigorosa da aplicação dos recursos públicos destinados ao setor. Sem esquecer, obviamente, que como população que mais consome agrotóxicos no planeta estamos cada vez mais sujeitos a contrair câncer e outras doenças somente por ingerir alimentos contaminados (embora tenha lido jornalista experiente dizer que Lula contraiu câncer por causa “do fumo e da cachaça”).
Não deixemos que o pior câncer de todos, o do preconceito e da falta de informação, corroa nosso humanismo.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Eu Não Vou me Mover - Curta Metragem - Uma obra prima sobre a Hipocrisia

Repúdio ao tribunal midiático no Brasil


Moção apresentada no Encontro Mundial de Blogueiros:

Do sitio do Miro
 
Nas últimas semanas, a mídia hegemônica mostrou mais uma vez suas garras. De forma inescrupulosa, se aproveitou de denúncias vazias para governar o país no grito.

Inconformados com o fato de terem perdido nas urnas a eleição presidencial, tentam impor uma agenda negativa para a nova presidente, tendo como foco a desmoralização dos quadros políticos que ocupam seu primeiro escalão. Com muito orgulho, os barões da mídia se vangloriam de ter derrubado o 6º ministro de estado em 10 meses de governo.

O alvo da vez foi o ex-ministro do Esporte Orlando Silva. Baseados em afirmações feitas por um homem com extensa ficha corrida na justiça, acionado por ter desviado milhões dos cofres públicos e que não apresentou nenhuma prova contra o ex-ministro, a mídia criou um tribunal de exceção para julgar e condenar publicamente Orlando Silva. Num primeiro momento, a presidente Dilma Rousseff resistiu à investida da mídia, mas não suportou a pressão e cedeu à chantagem midiática.

Ao se curvar, mais uma vez, aos interesses dos grandes conglomerados de comunicação e se pautar pela efemeridade das pesquisas de opinião, a presidente Dilma cria um perigoso precedente para a democracia brasileira e uma arapuca para o seu governo.

No primeiro caso, porque qualquer pessoa pública passa a ter o ônus da prova de sua inocência, violando um princípio Constitucional, e pode ser fuzilada no paredão da sanha reacionária. No segundo, porque a mídia e a elite conservadora que ela representa se sentem fortes para continuar a investida contra o seu governo. Já há, inclusive, os que apontam os próximos alvos. Engana-se a presidente se ela acredita que adotando uma postura subserviente à mídia ela estará fora do alcance dos seus fuzis.

Nessa guerra midiática, a estratégia da mídia e das elites é desmoralizar os partidos que compõe a base do governo e seu primeiro escalão com o objetivo de enfraquecer a presidente, que pode ser o próximo alvo.

Este episódio só fortalece a necessidade de o Brasil discutir urgentemente um marco regulatório para as comunicações. A mídia ataca os que defendem a regulação porque tem o monopólio da capacidade de gerar escândalos – mesmo que a partir de fatos que não os justifiquem – ou de abafá-los, quando lhes interessa. O país não pode mais ser refém das vontades políticas das poucas famílias que controlam 80% do conteúdo dos meios de comunicação. Só por meio da regulação é possível garantir a liberdade de expressão para todos, ampliar o pluralismo e a diversidade da comunicação brasileira.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Lula e os porões da política



Ontem, assistimos, mais uma vez, ao espetáculo deprimente que é a política sendo feita sem pudor, sem tergiversações. A repercussão da doença de Lula na mídia revela que essa atividade se baseia, hoje, em absoluta falta de decência e de lealdade nos embates entre os que deveriam terçar idéias para melhorar a vida das pessoas.
Na busca por causar o maior abatimento moral possível ao adversário, vale tudo. Principalmente chocá-lo com ausência de um traço de humanidade em seus adversários e, assim, deixá-lo assustado ao imaginar a que ponto chegariam para destruí-lo.
Nos últimos dias, dois casos se encadearam em demonstrações análogas, ainda que em níveis extremamente desiguais, de como, não raro, a política passa até pelo ato supremo de tirar a vida de um adversário da forma mais selvagem que se possa conceber.
Um desses casos reside nos detalhes sobre como Muamar Kadafi, ex-ditador da Líbia, foi assassinado por seus adversários… políticos. O outro caso, de nível de virulência infinitamente menor, mas igualmente assustador, foi ver a forma como a mídia tratou a doença de Lula.
Melhor não entrar nos detalhes sobre o assassinato de Kadafi, pois ainda visualizo a imagem mental que se me formou ao saber das sevícias que sofreu antes de colocarem fim ao seu suplício. Sobre Lula, a mídia o acusou de supostamente ter se causado o mal que o acomete, e comemorou a possibilidade de a doença ter êxito onde seus adversários “humanos” falharam.
A política, como a conhecemos, não requer capacidade, honestidade, talento ou boas intenções; requer capacidade de ser canalha ao impensável, de trair sem culpa, de não ter piedade ou comedimento algum na busca por atingir o oponente. Para vencer o adversário, vale tudo. Principalmente cinismo, muito cinismo.
É uma atividade para profissionais com “couro duro”. Nesse aspecto, somente alguém que saiu de uma região miserável, que passou fome e privações de toda sorte, que sofreu humilhações que arrasariam moralmente qualquer pessoa pode suportar a deslealdade da política em suas manifestações menos contidas.
Enganam-se, porém, os que julgam que um tumorzinho conterá alguém que, apesar de tudo pelo que passou, fez do Brasil a terra de promessas mil que jamais sonhamos que se tornaria. A selvageria dos adversários é antiga, conhecida e previsível. Lula, portanto, só precisa se precaver contra a traição, que se confunde com a política.
Por fim, resta, apenas, uma dúvida: será que esses 80% dos brasileiros que pesquisas recentes mostraram que devotam carinho extremado a Lula estão gostando de ver a mídia comemorar a sua doença?
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Conheçam melhor, abaixo, quem é a comentarista da CBN que atribuiu a doença de Lula ao “alcoolismo”


domingo, 30 de outubro de 2011

Em cúpula no Paraguai, países ibero-americanos defendem desenvolvimento com justiça social



 

Brasília – A Declaração de Assunção, adotada pela Cúpula Ibero-Americana, que terminou ontem (29) na capital paraguaia, fez um forte apelo para a mudança do papel do Estado como um instrumento de “promoção do desenvolvimento sustentável com justiça social inclusiva e com vista a alcançar a boa vida”.
A declaração, aprovada pelos representantes dos 22 países que integram o grupo – os da América Latina, além da Espanha, de Portugal e Andorra – enfatizou a necessidade de encontrar uma reformulação do Estado para garantir o bem comum.
O texto ressalta que “a transformação do Estado é um processo contínuo e constante que afeta as estruturas públicas nas relações entre governo e cidadãos, adequando o seu conteúdo para a condução de melhoria contínua e gestão dos assuntos públicos, para promover o desenvolvimento sustentável com justiça social, inclusiva e com vista a alcançar a boa vida”.
O comunicado acrescenta que, para desenvolver as capacidades nacionais a fim de erradicar a pobreza, é importante “promover o desenvolvimento sustentável e o equitativo crescimento econômico e o desenvolvimento sustentável como um objetivo central da cooperação para o desenvolvimento”.
Os países ibero-americanos reiteraram “os princípios e valores do acervo político, econômico e social da Conferência Ibero-Americana, convencidos da necessidade de reforçar os Estados para desempenhar o seu papel de direito na condução da estratégia de desenvolvimento global, em defesa da democracia e da governabilidade, de promover a igualdade, a justiça social e garantir e ampliar os direitos dos cidadãos”.
Os signatários da declaração reconheceram o contexto “de crise econômica e financeira que afeta vários países do mundo, com profundos ajustes e reajustes que colocam pressão sobre as instituições de todos os níveis”.
No documento, os países também ressaltam que “a participação do cidadão é um componente essencial da gestão democrática e de tomada de decisão no desenvolvimento sustentável”. Reconhecem ainda que “as políticas fiscais podem contribuir significativamente para a melhorar a distribuição, aumentar a cobertura e melhorar a qualidade e acesso aos serviços públicos”.
Entre os acordos fechados durante a cúpula estão a decisão de promover a cooperação entre as administrações públicas dos países ibero-americanos, em busca da integração regional e da criação de oportunidades e canais “para a transferência e o intercâmbio de conhecimentos e experiência em processos, projetos e programas bem-sucedidos”.
O texto também lista acordos sobre questões como o apoio a “redes regionais de governo eletrônico” e promoção de “mudanças progressivas na estruturas fiscais para consolidar um sistema de coleta mais eficiente”. A declaração destaca ainda a necessidade de se “criar condições para uma maior igualdade nos níveis de bem-estar, enfatizando o papel do governo na erradicação da pobreza e redução da desigualdade por meio do investimento social sustentado”.

Dostoiévski: um gênio ainda atual aos 190 anos de nascimento


 
Milton Ribeiro no SUL21

Há um período de nossa adolescência ou logo após, quando somos ou não universitários com algum tempo tempo livre — como diria Kafka, com mais energia do que necessidade de produzir –, em que usamos nosso tempo lendo clássicos. Neste período, procuramos ler os maiores ícones e, dentre estes, estará inevitavelmente Dostoiévski. E ele costuma ser uma experiência inesquecível. Como literatura e visão de mundo, é algo arrebatador. Se a aventura de lê-lo jovem nos causa profundas marcas, também tolhe-nos, pela inexperiência, a análise das razões de tal assombro.
Fiódor Mikhailovich Dostoiévski (Moscou, 30 de Outubro de 1821 — São Petersburgo, 28 de Janeiro de 1881) foi um escritor russo, considerado um dos maiores romancistas e um dos mais inovadores artistas de todos os tempos.
Fiódor foi o segundo dos sete filhos nascidos do casamento entre o médico Mikhail Dostoiévski e Maria Fedorovna. A mãe do escritor morreu quando ele ainda era muito jovem, de tuberculose, e o pai foi provavelmente assassinado pelos próprios servos, que o consideravam autoritário. Alguns biógrafos afirmam que o assassinato do pai causou a primeira crise epilética em Dostoievski, fato considerado controverso por seus atuais estudiosos.
A obra dostoievskiana explora a autodestruição, a humilhação e aspectos ético-religiosos, além de analisar os estados patológicos que levam ao suicídio, à loucura e ao homicídio. A literatura moderna e várias escolas da teologia e psicologia foram influenciadas por suas ideias. Por exemplo, seu último romance, Os Irmãos Karamazovi, foi considerado por Sigmund Freud como o melhor romance até então escrito e uma grande influência.
Porque Dostoiévski é diferente?
Há um outro clássico russo — Problemas da Poética de Dostoiévski, de Mikhail Bakhtin — ,que investiga os procedimentos ficcionais do escritor russo e aquilo que neles há de original. Em um dos capítulos, A Ideia em Dostoievski, é analisado o motivo do assombro e sedução que um escritor nascido há quase dois séculos ainda exerce sobre seus leitores.
Antes de chegar a Dostoiévski, Bakhtin nos fala de Sócrates e sobre a natureza dialógica da idéia. Segundo o grego, o habitat natural das idéias é o diálogo. A idéia internalizada é algo inútil e morto; porém, se a mera divulgação de uma idéia já a altera pelas limitações da linguagem e de quem a expressa, imaginem as transformações que nela ocorrem quando em choque com outras. O diálogo socrático influenciou tanto Dostoievski que ele direcionou sua arte no sentido de tornar-se principalmente um regente de personagens, retirando de seu texto a voz onisciente (que tudo sabe) do autor. Seu objetivo era o de deixar suas criaturas livres e de colocar-se à altura delas, nunca acima. Para fazer isto, o escritor tinha de converter seu pensamento numa arena na qual as diversas vozes do romance lutavam, sofriam, amavam, decidiam e se debatiam, sempre com sua própria lógica interna e verossimilhança — mas sem a aparente mediação do autor. Com esta disposição, Dostoiévski coloca-se como um criador de biografias pessoais e de situações que falam simbolicamente por si mesmas; mas que, pronto isto, deixa seus personagens livres, agindo e opinando de forma independente, enquanto anota o que dizem. Não é simples.
A tal projeto artístico, a esta quase insanidade de tornar sua obra uma arena, temos que acrescentar o fato de que Dostoiévski dá razão a todos e a ninguém, pois NUNCA EMITE JULGAMENTOS DEFINITIVOS. O escritor-voz-da-razão, o que elabora belas teses e aforismos infalíveis foi misturado a seus personagens. Dostoiévski não é divino nem definitivo.
A partir de Crime e Castigo – isto significa eliminar apenas as obras da juventude – só se conhecem as ideias de cada personagem, não a opinião do autor sobre elas. E muito menos se saberá quem o representa dentre os personagens. Ele não nos deixa pistas, pois permanece distante. Some-se a isto uma imensa capacidade de observação, um talento artístico ímpar e o fato de ser um manancial de preocupações éticas muito a frente de seu tempo, e estaremos no caminho de entender porque Dostoiévski é tão apaixonante.
Dostoiévski ou Tolstói?
Esta é uma pergunta provocativa não somente porque coloca frente a frente dois monstros do romance russo do século XIX, mas também porque compara dois projetos literários muitíssimo bem sucedidos e distintos. Não chega a ser lógica uma comparação entre seres humanos e romancistas tão diferentes entre si — seja nas posturas, seja nas vivências de cada um — , porém, ao mesmo tempo sabemos que nada é mais lógico do que comparar dois contemporâneos importantíssimos, como hoje fazemos com Saramago e Lobo Antunes, por exemplo. Aqui a armadilha que devemos evitar é o elogio de um para desvalorizar o outro. Eram ambos autores de grandes painéis. Seus romances eram tudo: psicológicos, sociais, filosóficos, picarescos, metafísicos (no caso de Dostoiévski) e tão grandes que empurraram as fronteiras dos gêneros para poderem se acomodar dentro delas.
Tolstói talvez seja o maior de todos os narradores clássicos — por que mesmo não recebeu o Nobel se faleceu em 1910? Seus romances são perfeitos, têm ritmo, excelente prosa, envolvem. Se fossemos obrigados a compará-lo com alguém, seria com Turguênev ou com certa parte da obra de Tchékhov. E aqui voltamos às questões de foco narrativo. Tolstói era o típico narrador onisciente que, apesar de detalhista, não era capaz de abandonar sua posição aristocrática, o senso comum da época e o certo e errado da concepção cristã do mundo. Já Dostoiévski, quando comparado a Tolstói, parece um alucinado. O narrador de Dostoiévski localiza-se sob a pele dos personagens, saltando de um para outro, deixando-se reger de tal forma por suas lógicas (ou loucuras) que faz sumir o narrador-julgador.
Tolstói, é claro, chamava os romances de Dostoiévski de mal-acabados. O acabamento era fundamental para clássicos como ele e Thomas Mann, por exemplo. Tolstói não tinha razão ao chamar os romances de Dostoiévski de mal-acabados. Eram muito diferentes. Pois livros como Crime e Castigo e O Idiota — sôfregos, nervosos e tão viscerais — , sob o filtro de Tolstói se transformariam em outra coisa. Quem pensa em acabamento quando quer descobrir quem matou o velho Fiódor? E quem criticaria o acabamento absolutamente impecável da Parábola do Grande Inquisidor — apenas para me referir a dois temas de Os Irmãos Karamázovi? Ora, Dostoiévski não estava preocupado com o acabamento porque as regras vigentes da beleza literária o atrapalhavam; porém, quando precisou, fez uso delas brilhantemente. Na verdade, uma das últimas preocupações que temos ao ler Dostoiévski é com o acabamento. Os personagens de Tolstói sofrem com dignidade, os de Dostô berram e se escabelam. Não obstante, o horror metafísico que cresce de O Idiota não fica nada a dever ao de Ivan Illich.
Enquanto Guerra e Paz é um panorama, Os Irmãos Karamázovi aponta para o fim de uma era, como Dostoiévski já mostrara em Os Demônios. Tolstói é um burguês, Dostoiévski pensa um apocalipse ético e moral. São muito diferentes. E muito bons.
Dostoiévski, o que e que traduções ler?
As gerações passadas leram Dostoiévski nas Obras Completas do autor russo da Editora José Olympio. Hoje sabemos que não era nada completa. Eram livros bonitos, vermelhos, de capa dura, o que havia de melhor. Os tradutores eram Rachel de Queiróz, Ledo Ivo, Brito Broca, etc. Todos os livros vinham com esplêndidos prefácios de gente como Otto Maria Carpeaux e Wilson Martins. Minha geração engoliu aqueles livros como se fossem o melhor Dostoiévski possível. Não eram. O que tinham de bom eram os prefácios…
Nos anos 80, começaram a aparacer novas traduções, totalmente diferentes. A explicação era incrível. As traduções antigas, aquelas da José Olympio, eram feitas a partir de outras traduções, francesas, do início do século XX. Os tradutores franceses daquela época não eram nada respeitosos, açucaravam expressões, situações e até criavam frases facilitadoras. Ou seja, eles adaptavam os autores ao gosto francês, aparavam as arestas, retiravam espinhos, deixavam-no… mais bonitos…
Porém, nos anos 90, a Editora 34 montou um time de tradutores para retraduzir todo Dostoiévski. Antes, aqui e ali, já aparecera o verdadeiro autor: havia as traduções de Boris Schnaiderman dos grandes russos; nos anos 80, Moacir Werneck traduziu O Jogador e O Eterno Marido direto do russo. O resultado foi um autor muito mais direto e sem firulas. Muito melhor, limpo e impactante, certamente. Mas a revelação do verdadeiro e completo Dostoiévski veio nos anos 90 com Paulo Bezerra na Editora 34. Digo com a maior tranquilidade que quem leu O Idiota e Crime e Castigo nas traduções antigas, leu outros livros. Dizem meus olhos e minha mente que estes romanções só foram verdadeiramente traduzidos há pouco. As novas versões estão certamente bem mais próximas de Dostoiévski, por mais que Brito Broca tenha feito milagres com sua versão francesa de Crime e Castigo.
Então, indicamos a coleção da 34 ou outras traduções diretas. Para este humilde leitor, O Idiota só se tornou uma obra-prima após a leitura da tradução de Bezerra. A tradução da José Olympio tem todos os méritos associados ao pioneirismo e às parcas possibilidades dos anos 50, mas vão me desculpar, os dois Idiotas têm pouco a ver um com outro. Toda a transcedência e o valor altamente filosófico da obra perdeu-se na passagem para o francês ou para o português.
Dostoiévski não é nada, mas nada romântico. É um escritor bem mais duro do que fazem crer as antigas traduções. Porém, se não houver dinheiro e o leitor do Sul21 encontrar uma das antigas traduções que têm reaparecido ainda hoje a preços módicos, compre do mesmo jeito. Um mau Dostoiévski é superior a quase tudo que haverá em torno.
O que ler? Ora, tudo o que foi escrito após Crime e Castigo, incluindo este, com destaque para Os Irmãos Karamazóvi, Os Demônios, O Idiota, O Jogador e O Eterno Marido.. São todos volumes de mais de 500 páginas, mas é puro tempo ganho.