domingo, 19 de outubro de 2014

Desigualdade nos EUA



Tradução do vídeo "Wealth Inequality in America", um panorama sobre a distribuição de riqueza nos Estados Unidos. Apesar de ser focado em outro país, acho que transmite uma boa ideia do cenário que podemos imaginar (daí pra pior) aqui também.

Neoliberalismo é o oposto da democracia, diz estudioso francês — Rede Brasil Atual

Neoliberalismo é o oposto da democracia, diz estudioso francês
Dominique Plihon, professor da Universidade Paris 13, diz que se um neoliberal ganha no Brasil, ele ficará triste pelos brasileiros, mas também pela ordem internacional: 'Precisamos de líderes que saibam resistir às grandes potências e não que sejam seus aliados'



 
Plihon: "Há conflito de interesses entre representantes do setor financeiro e suas prioridades para políticas públicas"
O francês Dominique Plihon é um dos principais estudiosos, no mundo, do que se denomina “capitalismo com dominância financeira” e de seus efeitos sobre a sociedade. Professor emérito da Universidade Paris 13 (Université Sorbonne Paris Cité), ele tem longa experiência profissional no Banque de France e é atualmente porta-voz do Attac, associação que defende a taxação das transações financeiras internacionais.

Na semana passada, esteve no Brasil para uma curta temporada de palestras e aulas no Instituto de Economia da Unicamp, e conversou com o Brasil Debate. As reflexões de Plihon sobre as ideias econômicas, seus porta-vozes e interesses, e mesmo o seu poder de pressão por meio do controle dos veículos de comunicação são um necessário contraponto à visão quase única que domina a discussão econômica no Brasil.

Indo além, põe o dedo na ferida de uma questão muito explícita em alguns personagens do debate eleitoral brasileiro: o conflito de interesses entre representantes do setor financeiro privado e suas prioridades para as políticas públicas. Por fim, considera um enorme retrocesso, não só para o Brasil, a eleição de um candidato de perfil neoliberal neste segundo turno das eleições.

Confira os principais trechos da entrevista

Como você enxerga a relação do neoliberalismo com a democracia?

Aqui há um paradoxo. Os neoliberais nos fazem acreditar que a liberdade concedida a todos os atores econômicos faz prosperar a democracia e que o mercado é favorável à democracia. Como se democracia e livre mercado caminhassem juntos.

Essa visão é completamente equivocada. Se deixamos o neoliberalismo funcionar, isso se traduz no surgimento de atores sociais – grupos industriais, bancários – que dominam não somente a economia, mas também a sociedade. Esses atores investem na mídia para difundir análises que condicionam a opinião dos cidadãos e isso funciona como uma forma de dominação ideológica. Aqueles que divergem do pensamento dominante são considerados heréticos, arcaicos, gente que não é séria.

Portanto, o paradoxo é que, ao reduzir o Estado sob o pretexto de dar mais liberdade às pessoas, dá-se poder a alguns atores sociais, concentra-se a renda e cria-se um pensamento único. Eu vou ao limite de dizer que aqueles que defendem o neoliberalismo são por uma sociedade totalitária. Neoliberalismo é o oposto da democracia.

O discurso neoliberal é compatível com a construção de um Estado de Bem-Estar Social, que garanta serviços sociais públicos e universais?

Para o neoliberalismo, o Estado Social é visto como um inimigo, como um concorrente, o que é de certa forma verdade porque, a partir do momento em que o Estado Social se desenvolve, é uma parte do setor econômico que escapa do setor privado, dos investidores internacionais etc.  Eles querem controlar as escolas, controlar os hospitais, controlar as estradas, para obter lucros. É por isso que eles defendem a privatização, sob o pretexto de que o setor privado seria mais eficiente, mas a finalidade é o lucro.

O que devemos defender, enquanto economistas progressistas, é que o setor público é claramente mais eficaz do que o setor privado no que se refere à oferta de bens sociais, ao contrário do que dizem os neoliberais. Essa é uma briga ideológica importante. Eles dizem que se o Estado Social diminuir, todos vão ganhar, vão pagar menos imposto, a economia ficará melhor, os hospitais, as escolas e universidades serão melhores, o que é completamente falso.

Se pegarmos a Saúde, por exemplo, o sistema mais eficaz, menos custoso e que traz mais bem-estar para população é o público e não o privado. O sistema de saúde americano, que é praticamente todo privado, é muito mais custoso do que o francês, que é principalmente público. Mas esse discurso não é ouvido pela mídia controlada pelos grandes grupos privados.

Nessas eleições brasileiras, formou-se uma convenção na bolsa de valores segundo a qual o bom desempenho da presidenta Dilma nas pesquisas conduz a uma queda nos preços das ações. Como você vê o significado político dessa convenção?

Keynes é quem primeiro explorou essa noção de convenção no mercado financeiro. A convenção é uma representação da realidade que corresponde muitas vezes aos desejos do mercado. Quando vemos nas eleições que a bolsa sobe quando o candidato Aécio Neves aparece com mais chances, isso significa a expectativa do mercado de que esse candidato tomará medidas mais favoráveis a ele.

O que é perigoso, pois significa que um candidato que queira fazer uma política de enfrentamento aos interesses e privilégios do mercado terá a bolsa contra ele. E isso toma uma proporção maior porque a mídia e as elites passam a mensagem de que a opinião “correta” é aquela do mercado e não aquela das pessoas que trabalham, que produzem, que consomem. Isso é, evidentemente, contrário à democracia.

E o que é interessante é que Keynes (John Maynard, economista britânico) mostrou a existência de componentes irracionais na formação dessas convenções. As pessoas se comportam de maneira mimética; de uma hora para a outra passam a agir todas da mesma forma, com base em uma determinada ideia. Essas convenções são frágeis, às vezes irracionais e desprovidas de uma reflexão séria e, mais do que isso, podem ser manipuladas, o que quer dizer que alguns agentes podem forjar opiniões e condicionar a psicologia dos mercados para fazer valer seus interesses.

Nos debates públicos, você tem chamado atenção para o conflito de interesses que envolve a profissão dos economistas. Qual é a importância desse tema?

Na sociedade, há dois tipos de economistas. A primeira categoria é composta por economistas independentes ou com vínculos explícitos com alguma instituição, como um sindicato, ou um banco. Quando ouvimos um economista de um sindicato, sabemos que ele está defendendo os interesses do sindicato, isso é normal e transparente.

A segunda categoria são os economistas que são pagos pelo sistema – recebem recursos de empresas, bancos, partidos – mas não se identificam. Eles geralmente defendem os interesses das classes dominantes e por isso são figuras muito presentes na mídia, dominada por essas classes. Eles são os cães de guarda do sistema.

O que estamos propondo na Europa é algo parecido com que está sendo discutido nos EUA por Gerard Epstein: que haja regras precisas obrigando os economistas a publicarem o nome da entidade de quem recebem financiamentos, assim, quando eles falam na mídia, saberemos se estão defendendo o interesse de alguma empresa, banco, sindicato. Cada um fala o que quer, desde que seja transparente e não seja hipócrita.

E no caso de economistas de mercado que ocupam funções públicas?

Se há um candidato, como Aécio Neves, que anuncia um ministro que é um banqueiro, há um risco de conflito de interesse. Nesse caso, talvez seja o caso de declarar publicamente e, eventualmente, desnudar esta pessoa e os interesses que representa, já que tem muitos laços com o setor financeiro.

Na França, temos esse problema com os altos funcionários, por exemplo, da supervisão bancária, que após seu período no governo vão trabalhar nos bancos. O problema é que essas pessoas não ousam tomar medidas duras, sanções, contra os seus futuros (ou ex) colegas. Nesse caso, deve-se proibir a pessoa de trabalhar no setor que ela supervisionou durante três ou quatro anos, porque há conflitos de interesse.

Esse é o chamado fenômeno das “portas giratórias”, quando um economista vai para a administração publica, depois volta para o setor privado como um homem de negócio, e de novo para administração pública. Isso é muito perverso e antidemocrático.

Como intelectual de esquerda e observador externo como você enxerga a disputa eleitoral em curso no Brasil?

Primeiramente, vejo com bastante interesse porque o Brasil é um país muito importante, e a política que é definida aqui tem impacto sobre a América Latina e também sobre a construção da ordem mundial. Penso que os dirigentes europeus atuais são uma catástrofe para a ordem econômica mundial. Eles são fascinados pela ideologia neoliberal, pela competição, e não pela cooperação, pela solidariedade entre os países etc. Eles têm valores que certamente não são os meus, e que são extremamente perigosos.

Se um candidato neoliberal ganha no Brasil, certamente ficarei triste pelos brasileiros, mas também triste pela ordem internacional. Eu sei que a candidata progressista tem limites e problemas, mas penso que será melhor para o Brasil, pois ela já deu prova de independência frente aos Estados Unidos e frente a atores financeiros.

Precisamos de líderes que saibam resistir às grandes potências, ao setor financeiro, e não que sejam seus aliados. Portanto, vejo as eleições no Brasil com muito interesse e não escondo minha preferência por Dilma Rousseff.

sábado, 18 de outubro de 2014

A história de mais de 78 mil trabalhadores de Minas Gerais - Portal Vermelho

A história de mais de 78 mil trabalhadores de Minas Gerais

Esses trabalhadores estão num limbo. Acreditaram na palavra do Estado, que deveria ser de honestidade e boa fé e, hoje, estão na rua, sem direito sequer a aposentadoria! Este é um relato da eficiência do choque de gestão!

Por Beatriz Cerqueira*, no Muda Mais

Beatriz Cerqueira A prática de um político é um importante critério para as pessoas avaliarem o seu discurso. A situação trágica em que se encontram mais de 78 mil trabalhadores em educação da rede estadual de Minas Gerais é um exemplo de prática que merece uma reflexão profunda de todos os brasileiros. 

A prática dos últimos 12 anos aqui no Estado foi de ter um grande número de contratos temporários. Só em 2014, foram 73 mil contratos temporários para trabalhar no serviço público. É importante lembrar que a contratação temporária é prevista como uma exceção à regra do concurso público. Quem é contratado temporariamente não tem carreira, não tem direito a lotação na unidade escolar nem participa do regime próprio de previdência. Além disso, existe a possibilidade do fim do contrato (nunca superior a um ano) ser antecipado e o trabalhador simplesmente ser demitido sem nenhum direito trabalhista. Em síntese, a política de contratos coloca o trabalhador numa situação de absoluta precariedade e insegurança quanto ao futuro. 

Para piorar, o governo mineiro causou graves e irreparáveis prejuízos aos seus contratados. Não contribuiu com a previdência durante anos.

É que, com a Reforma da Previdência, feita pelo governo Fernando Henrique Cardoso, passou a ser obrigatória a contribuição para aposentadoria - todos os trabalhadores teriam que ser vinculados a um regime de previdência. E, por regra, contratos temporários se vinculam ao Regime Geral de Previdência, gerido pelo INSS. Mas o governo de Minas não estava disposto a repassar recursos para o INSS e estabeleceu uma guerra jurídica de conceitos sobre contribuição previdenciária justificando, assim, o não recolhimento da contribuição de mais de 98 mil contratos temporários.

Com a guerra em curso, professores com tempo e idade para aposentadoria não conseguiam se aposentar.

Para que o Estado não pagasse sua dívida bilionária com o INSS, o governo mineiro construiu outra teoria: deu cargo efetivo, sem a realização do concurso público, aos contratados temporários por meio de uma Lei Complementar e os vinculou ao seu regime próprio de previdência. Com isso, não precisou repassar um único centavo ao INSS e assumiu os compromissos previdenciários futuros de seus contratados. Mais que isso: iludiu todos esses trabalhadores com a promessa de direitos equivalentes aos servidores concursados, estimulou rivalidades e tentou dividir a categoria.

Chegou ao absurdo de enviar cartas, com o timbre do governo, assegurando a estabilidade no cargo e, com isso, desestimulando a inscrição no concurso público realizado em 2011 (após duas greves da categoria). Mas esta vinculação foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em março deste ano. Com isso, mais de 78 mil trabalhadores em educação da rede estadual de Minas Gerais se viram num "limbo", não são mais detentores de cargos efetivos e seus cargos serão ocupados por concurso público.

Estamos falando de pessoas com 23 anos de magistério, auxiliares de serviço com mais de 50 anos de idade. A maioria adoeceu no trabalho e, hoje, não estaria apta para um novo concurso ou mesmo para uma nova contratação temporária. Em nossa profissão podemos acumular dois cargos públicos, até por uma questão de sobrevivência. As professoras contribuíram para se aposentarem em dois cargos e agora somente se aposentarão uma única vez pelo INSS, mesmo tendo dedicado a vida a duas atribuições de educadoras. E as que adoeceram, o Estado não as aposentou.

A situação da Universidade Estadual de Minas é ainda mais assustadora. Não houve concurso público. Os professores eram submetidos a rigorosos processos seletivos para serem contratados. Mas não se tornaram efetivos. Os professores construíram uma carreira na Universidade Estadual. Mais de 50% era efetivado sem concurso e agora viram a sua vida acadêmica desmoronar. E, com isso, a Universidade Estadual também.

O que isso tudo tem a ver com as eleições para presidente? Isso foi feito por Aécio Neves quando ele era governador do Estado. Devemos avaliar as características dos políticos que prometem muitas coisas, mas, suas práticas denunciam a conivência com as precárias condições de trabalho, a falta de política de concurso público como determina a Constituição Federal, o desrespeito a um direito fundamental que é o de se aposentar.

Esses trabalhadores estão num limbo. Acreditaram na palavra do Estado, que deveria ser de honestidade e boa fé e, hoje, estão na rua, sem direito sequer a aposentadoria! Este é um relato da eficiência do choque de gestão!

*Beatriz Cerqueira é coordenadora-geral do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTEMG).