quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

A mediação brasileira no caso Colômbia/FARCs

Laerte Braga


O presidente da Colômbia Álvaro Uribe quer o Brasil mediando a liberação dos reféns colombianos e estrangeiros em poder das FARCs. A senadora Córdoba, opositora de Uribe, fez um apelo a Lula para que aceite mediar o que já estava resolvido.

Toda a seqüência de fatos que antecedeu ao referendo na Venezuela sobre as reformas constitucionais propostas pelo presidente Hugo Chávez obedeceu ao esquema golpista tramado em Washington, veiculado com precisão pela mídia mundial, a latino-americana de forma milimétrica e que teve no governo colombiano um aliado (a Colômbia sob Uribe é protetorado norte-americano) decisivo.

No sábado que antecedeu o referendo a mãe e uma irmã de Ingrid Betancourt, senadora e candidata a presidência da Colômbia viajaram para Caracas e manifestaram publicamente seus agradecimentos ao presidente Chávez pelo empenho em libertar os reféns.

O presidente da França, Sarkozy foi claro e enfático diante da pressão da mídia de seu país e dos parentes de reféns francês, por conta da opinião pública, ao dizer que não se opunha à mediação de Hugo Chávez.

Um acordo preliminar feito com as FARCs permitiu que documentos fossem levados a um determinado ponto do território colombiano comprovando que os reféns, sobretudo a senadora, estavam vivos.

Começa aí o calvário de Chávez e aí talvez as razões de sua “derrota” no referendo.

O que era um pacote para ser entregue ao governo da Colômbia comprovando o estado dos reféns virou uma armadilha pensada e planejada em Washington, que contava com a vitória de Chávez no domingo, para então montar o golpe e derrubar o presidente venezuelano.

Os portadores da carta da senadora foram presos, os documentos que provaram estarem vivos os demais reféns, tudo levado para Bogotá e denúncias da mãe de Betancourt acabaram por desmascarar e mostrar a farsa escancarada, a armadilha.

Os portadores dos documentos iam apenas cumprir uma parte no acordo feito entre o governo da Colômbia, as FARCs através do presidente da Venezuela e do qual tinha ciência o presidente francês.

Foram presos, trechos da carta da senadora publicados à revelia da família, como denunciaram sua mãe e sua irmã, o retrato exibido à exaustão, um contexto previsto pelos governos dos EUA e da Colômbia, como parte do golpe contra Chávez.

A “derrota” de Chávez e o pronunciamento do presidente aceitando os resultados logo no início da madrugada de segunda-feira acabaram por abortar o golpe, pois faltou o motivo principal. A vitória de Chávez e a justificativa que o golpe “repunha” a Venezuela na órbita dos países democráticos, leia-se, países títeres dos interesses norte-americanos.

Ingrid Betancourt seria liberada, como os reféns franceses e os louros do acordo seriam de Chávez.

A decisão de pedir ao governo brasileiro para mediar um acordo com as FARCs resulta da percepção pela opinião pública colombiana e francesa principalmente, que tudo não passou de uma jogada de Washington com um governo títere e ligado ao narcotráfico (foi eleito e reeleito com o dinheiro do narcotráfico).

É claro que Lula deve aceitar o papel. As FARCs estão dispostas a negociar o mesmo acordo que foi negociado com Chávez com o presidente do Brasil. Mas é claro também que os detalhes da armadilha contra Chávez têm que vir a público e ficar transparente que o presidente da Venezuela foi vítima de uma cilada.

Por mais paradoxal que possa parecer a vitória do não acabou por impedir as forças oposicionistas venezuelanas, a mídia da Venezuela, de desfechar o golpe montado e orquestrado por Washington.

Como evidente está que a luta pelas reformas propostas e pela opção pelo socialismo não está enterrada e nem perdida. Até porque, forças de esquerda na cegueira que costuma caracterizar grupos e partidos sem objetivo outro que não sobreviver em guetos, optaram pela abstenção.

Todo o movimento que, entre outras coisas, resultou na compra do general Baduel, então ministro da Defesa de Chávez quando do golpe de 2002, só faz reproduzir uma prática comum a Washington, ainda mais em tempos delirantes de Bush, como no caso do sacrifício da Quinta Frota para ter o pretexto necessário para uma guerra contra o Irã.

A história está cheia de histórias assim. Os impérios nunca foram diferentes em seus propósitos e terá sido por isso que Esopo e La Fontaine escreveram fábulas, como a do lobo e do cordeiro em que não importa que quem turve a água seja o lobo, quem está condenado a morrer por turvar a água é o cordeiro.

O que o governo brasileiro precisa estar atento é a eventuais manobras do narcotraficante Álvaro Uribe (para os EUA o tráfico é menos nocivo que a perda do petróleo venezuelano), preposto de Bush e não cair em armadilha semelhante.

Celso Amorim é um dos pontos positivos do governo Lula. Em todos os sentidos. Sabe onde põe os pés e o que falar. Mas sabe também que atrás de cada porta existe alguém com um punhal pronto para enterrá-lo pelas costas, logo depois do abraço.

E no caso de Washington, numa América Latina que começa a resgatar o sentido de soberania, de independência, de projetos nacionais e regionais de crescimento, desenvolvimento e unidade, todo cuidado é pouco.

O episódio envolvendo o rei da Espanha (a soldo de banqueiros e grandes mafiosos espanhóis rotulados empresários) foi só a explosão de um pastel de vento, o rei, que se seguiu às críticas do presidente da Nicarágua Daniel Ortega, como antes, em ambiente mais reservado, Lula, Kirchner, Bachelet, Correa e Tabaré Vasquez haviam feito as mesmas críticas à voracidade colonizadora das máfias espanholas.

Foi demais para um rei acostumado a ser tratado de majestade, bajulado e a posar para capas de revistas no mundo inteiro, no papel de perfeito garoto propaganda. E depois ir caçar bisões em extinção na Suíça, pagando cinco mil dólares para cada animal abatido.

É o velho sentimento de colonizado das elites. Qualquer rei que chegue ao Brasil vira logo objeto de disputa de convites para recepções DASLU e visitas a uma escola de samba, onde sua majestade, via de regra, dança com uma bela mulata, no mais ridículo espetáculo de subserviência que as elites costumam dar e dão sempre, pois o negócio deles é dinheiro em caixa, não importa se para isso é papai e mamãe ou ficar de quatro.

Chávez foi vítima de uma cilada e Lula precisa abrir os olhos para não cair noutra.

Betancourt e os reféns já estariam soltos e em casa se Uribe e os norte-americanos se importassem com vidas, com seres humanos e não com drogas e lucros a qualquer preço

Fonte: FazendoMedia

> Laerte Braga é jornalista. Nascido em Juiz de Fora, trabalhou no Estado de Minas e no Diário Mercantil.

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