Desafios e Propostas
Luiz Bassegio, Luciane Udovic
Entre
os dias 08 a 12 de outubro, mais de 600 pessoas provenientes de 45
países e outras tantas, do Equador, estiverem em Quito, participando do
IV FSMM, que tinha como lema: “Derrubando o Modelo e Construindo Atores –
Povos em Movimento pela Cidadania Universal”. Os debates, mesas,
seminário e oficinas foram em torno dos eixos: crise global e migrações,
direitos humanos, diversidade, convivência e transformações
sócio-culturais e novas formas de escravidão. Além dos seminários, um
diálogo com o Fórum de Autoridades Locais – Cidades Abertas, a
Assembléia dos Movimentos Sociais e a Marcha dos Movimentos Sociais,
realizada em parceria com o Congresso da CLOC– Coordenadoria Latino
americana de Organizações Campesinas com o lema: “Soberania Alimentar,
Dignidade e Cidadania Universal”.
Constatações
Vivemos uma crise do capitalismo. Uma
crise econômica, financeira, energética, ambiental e alimentar. Uma
crise que indica o fracasso da globalização neoliberal, com graves
conseqüências sociais e ambientais para toda a humanidade. A crise põe
em perigo a vida e sua produção bem como a existência da humanidade e do
planeta.
As
mudanças climáticas, resultado da degradação ambiental provocada pelo
desenvolvimento capitalista, hoje é uma dura realidade. Carrega
consigo transformações dramáticas nos ecossistemas e na vida de milhões
de pessoas. O panorama pode ser ainda mais catastrófico. Mares que se
elevam, secas ou enchentes que serão devastadoras. Estudos já indicam
que na metade do século atual milhões de pessoas poderão estar fugindo
de desastres naturais em busca de locais mais seguros onde possam
sobreviver. Poderá ser o maior processo migratório na história.
Nas
várias etapas do ciclo econômico mundial, há uma constante e sistemática
violação de direitos humanos das pessoas migrantes, refugiados e
desplazados nos países de origem, trânsito e destino.
As
migrações internacionais apresentam grandes desafios com relação a
interculturalidade, a multiculturalidade e a construção de identidades. Não
há e nem podem existir hierarquias entre as distintas culturas, mas
pelo contrário relações de complementaridade e de solidariedade.
Com o
avanço da globalização, a abertura acelerada das economias nacionais,
desmantelamento e privatização das estruturas estatais, a indústria do
crime controla o aliciamento de pessoas e do tráfico de migrantes,
valorizando as suas atividades, produzindo novas formas de escravidão,
exploração humana e servidão nos diferentes fluxos migratórios mundiais
Encontro Cidades Abertas
Dando
continuidade a uma iniciativa do FSMM, que realizou o primeiro encontro
Cidades Abertas em Rivas-Vaciamadri, Espanha/2008, foi realizado em
quito o II Fórum de Autoridades Locais. Na
ocasião pudemos repassar e debater com os prefeitos e outras
autoridades locais de diversos países as recomendações do Fórum Social
Mundial das Migrações.
Os
participantes do Fórum demandam às autoridades políticas públicas que
garantam aos imigrantes acesso à saúde, educação, habitação, trabalho e
seguridade humana; demandam também a construção de cenários de coesão
social, favorecendo as dimensões da tolerância, integração e
interculturalidade; exigem a participação política plena, garantindo os
direitos civil e políticos que são a porta de entrada para a construção
coletiva de nossas cidades, em particular, o direito de votar e de ser
votado; processos de educação local que impeçam o medo ao diferente, que
muitas vezes consolida os preconceitos e se convertem em práticas
discriminatórias e finalmente a desburocratização dos serviços prestados
aos imigrantes e que os mesmos seja de qualidade.
Marcha dos Movimentos Sociais e dos Migrantes
Merece
destaque neste processo o fato da Marcha ter sido realizada em conjunto
com a CLOC – Coordenadoria Latinoamericana de Organizações Campesinas,
que realizou seu V Congresso, também em Quito, sob o lema: “Soberania
Alimentar, Dignidade e Cidadania Universal”. A marcha foi uma
articulação entre movimentos de campesinos e de imigrantes. A sintonia e
unidade de luta foi visível durante a Marcha. A diversidade de
movimentos sociais não impediram que as bandeiras de luta fossem
unificadas e reforçadas. Cerca de 5 mil vozes fizeram-se ouvir pelas
ruas de Quito com gritos de guerra unificados como: “Si queremos e si
nos da la gana, uma tierra unida, livre y soberana”; “ninguna persona
es ilegal”; “migrantes unidos jamás serán vencidos”; ou ainda, “no
queremos y no nos dá la gana, de ser uma colônia norte americana y si
queremos y si nos da la gana América Latina, socialista y soberana”. Enfim,
a luta era uma só: contra toda a forma de opressão. A Marcha unificada
sinaliza que a articulação dos movimentos sociais é fato e fortalece a
caminha para a construção de outro mundo possível.
Momento do Grito
Sendo o
dia 12 de outubro a data que marca as mobilizações continentais do
Grito dos Excluídos/as, pela simbologia da luta e resistência dos povos
contra o colonialismo, ao final da marcha houve uma mística preparada
pela delegação do Grito para marcar a data e se somar as inúmeras
mobilizações que estavam ocorrendo em outros países. O Grito Equatoriano
construiu um gigantesco protótipo de um avião e um barco, simbolizando
os meios de transporte utilizados hoje pelos migrantes. Uma encenação
mostrou ainda a dor de quem parte e a dor de quem fica a espera de que
um dia se reencontrem e vivam com dignidade. Foi um momento de muita
emoção e também de alegria quando os marchantes migrantes desfilaram
pela Praça São Francisco com o barco e o avião, dançando e cantando, e
gritando: “Derrumbando el modelo, nadie es ilegal, pueblos em
movimiento, por la ciudadania universal”.
Conclusões
Ao
processo do FSMM apresenta-se o desafio de construir um novo paradigma
civilizatório que garanta uma relação harmônica entre os direitos dos
seres humanos e a mãe terra.
É
necessária a construção de poderes locais, regionais, nacionais e
mundiais, que permitam gradualmente ir conquistando espaço na definição
de agendas públicas, programas e projetos.
Outro
desafio, na construção de novos atores, aponta para a incorporação de
crianças, adolescentes e jovens assegurando a incorporação de suas
propostas e a participação efetiva no processo.
É
preciso o respeito irrestrito aos direitos humanos das pessoas migrantes
e o fechamento de todos os centros de internamento e de detenção no
mundo e que sejam suprimidas as “redadas” e as deportações de
milhares de migrantes nos países de trânsito e de destino; devem ser
denunciados todos os meios de comunicação que criminalizam os migrantes e
que incitam à xenofobia e o racismo.
O FSMM deve reiterar sua solidariedade aos povos do mundo especialmente ao povo palestino, colombiano e iraquianos.
Exigir
que os países assinem, ratifiquem e ponham em prática a Convenção
Internacional sobre os Direitos de todos os Trabalhadores Migrantes e de
suas Famílias.
Cabe ao
Fórum também o compromisso da contribuir na construção de um novo
modelo civilizatório que privilegie a vida, a integração dos povos, a
harmonia entre as mulheres, os homens e a natureza garantindo a
sustentabilidade da humanidade e da Madre Terra para os próximos
milênios.
Próximo Fórum
Durante
a Assembléia dos Movimentos Sociais foi oficializado que a sede da
quinta edição do FSMM será na Coréia do Sul. Ao receber a noticia, o
trabalhador migrante, representando a rede de movimentos sociais da
Coréia, sensibilizado, fez um pronunciamento. Ainda que em coreano, a
plenária se emocionou com sua reação. Uma colega também coreana,
traduzia para o inglês e um imigrante dos EUA, traduzia para o espanhol.
Porém o espírito de luta, garra e compromisso evidenciado neste
migrante coreano dispensou palavras e traduções. Nos fez ver e sentir
que a luta e o desejo de cidadania plena não tem fronteiras. A assim
segue o Forum Social Mundial das Migrações: povos em movimento,
ultrapassando fronteiras, por cidadania universal.
- Luiz Bassegio e Luciane Udovic, da Secretaria Continental do Grito dos Excluídos/as
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