segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Valores Ocidentais

Laerte Braga
Laerte Braga no Diario Liberdade

A História nem é "carroça abandonada à beira da estrada" (Chico Buarque de Holanda) e tampouco se faz em um dia. O fim da União Soviética começa a mostrar outro processo de extinção, o da Europa Ocidental. A maior parte dos países dessa parte do mundo, a rigor, por conta do alinhamento quase absoluto com os EUA, perdeu sua autonomia, sua independência e muitos governos (britânico, sueco, alemão, italiano, por exemplo) são inteiramente subordinados a Washington.
A globalização em se falando de Europa foi literalmente "globalitarização" (Milton Santos), ainda que numa forma diferente da concebida pelo geógrafo brasileiro. Nações como a Suécia e a Alemanha, o Reino Unido, são meros pedaços de terra cercados de uma história de milênios, mas bases militares da OTAN – Organização do Tratado Atlântico Norte – a força de ocupação norte-americana.
A guinada à direita do presidente francês Nicolas Sarkozy tem um claro apelo eleitoral (os votos da extrema-direita em ascensão e suas políticas contra imigrantes). Com as forças de esquerda desmanteladas e incapazes de conter o avanço dos EUA sobre o continente, só resta em termos de sobrevivência abrir as portas dos palácios reais e castelos para o pão nosso de cada dia. Um euro por visitante, a única concessão a estrangeiros.
O grande problema vivido pela Europa Ocidental hoje se materializa na gota d'água do processo de restrição a direito de imigrantes e nas grandes manifestações contra o crescimento da população muçulmana. "Muitos europeus rotulam o crescimento dos contingentes estrangeiros – especialmente muçulmanos – como incompatíveis com os valores ocidentais". A afirmação é de Matthew Goodwin, do Instituto de Relações Internacionais Chatham House, com sede em Londres.
Esse fenômeno da rejeição a muçulmanos acende outra fogueira e num outro extremo. A direita traz consigo o antisemitismo. A exigência de brasão, árvore genealógica, ou fortes depósitos em bancos europeus passa a ser condição básica para ser absorvido e integrado a Europa. O impasse se supera com o sionismo, versão fascista do judaísmo e detentora do controle de grande parte dos "negócios".
O surgimento de conflitos com setores que aceitam essas políticas pode e deve incendiar boa parte da Europa, exatamente no momento em que outra boa parte dos países europeus, começa a vislumbrar a falência econômica.
Para Washington basta que os europeus continuem acreditando que são donos de seus museus, castelos, seus reis e rainhas, seus primeiros ministros exóticos, ou presidentes erráticos como Sarkozy, que o resto eles, norte-americanos, providenciam.
Em breve, pelo andar da carruagem, os tradicionais ônibus de dois andares que circulam por Londres e outras cidades inglesas vão virar bastião da pátria amada, do império onde o sol não se punha.
Vai ser o que restar diante do avanço dos EUA.
A extrema direita já participa de governos na Itália, Dinamarca e Holanda e tem cadeiras nos parlamentos da Áustria, Bulgária, Letônia, Eslováquia e Suécia.
Na França, surge a primeira musa dessa horda. Marine Le Pen, 42 anos de idade, deputada ao Parlamento Europeu pela Frente Nacional de seu país, partido que entre outras coisas, é racista, fascista e antisemita. Foi eleita para suceder seu pai Jean-Marie à frente da organização desde 1972. Marine teria hoje, segundo avaliações de institutos de opinião pública, 17% dos votos dos franceses numa eventual disputa eleitoral.
Segundo ela o hábito dos muçulmanos de orar pelas ruas se compara "a ocupação da França pelos nazistas". Defende o retorno da pena de morte, a volta do serviço militar obrigatório e acha que os crimes praticados por policiais contra "suspeitos" (como o do brasileiro Jean Charles assassinado pela polícia londrina) devem ser considerados "legítima defesa".
Quer o fim dos benefícios sociais para estrangeiros.
São os tais "valores ocidentais".
A verdade é que neste momento começam a naufragar e a apodrecer os pilares da Nova Ordem traçada pelo Consenso de Washington – o neoliberalismo –.
A própria corte desse império está mergulhada numa crise que sinaliza seu declínio. Quando elegeu o primeiro presidente de pele negra, não só os negros, mas todos, perceberam que se trata de um branco disfarçado e disposto ao papel de garçom da Casa Branca. Michael Moore, o cineasta, compara-o nas funções de "comandante em chefe das forças armadas" ao "funcionário do mês do BurgerKing do meu bairro".
A ocupação da Europa por bases militares, os conflitos na Ásia, África e Oriente Médio, as tentativas de golpes contra governos progressistas da América Latina, são sinais da transformação dos EUA num conglomerado terrorista formado pelo que Eisenhower (general e ex-presidente) chamou de "complexo industrial e militar", isso na década de 50 do século passado.
Não existem mais os Estados Unidos como nação. Mas o conglomerado EUA-Israel Terrorismo S/A, montado num arsenal capaz de destruir o mundo cem vezes se necessário for e pelos tais "valores ocidentais".
Nesse contexto todo a América Latina passa a ter capital importância diante do potencial econômico que traz consigo. Matérias primas básicas, petróleo em grande quantidade, água, toda a perspectiva de um grande campo para sustentar o conglomerado. Evitar o declínio em curso.
E é por aí que cresce a importância de governos como o de Chávez, Evo Morales, Lugo, Pepe Mujica, Ortega, Castro, Corrêa e outros e se faz necessária a plena definição do Brasil – maior país da região – pelo processo de integração sem os Estados Unidos, para que não sejamos uma nova Europa, ou um novo México.
É a barbárie com tecnologia de ponta.

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