Luis Fernando Veríssimo no Vermelho
Li que a família de Jacobo Arbenz lançou uma campanha para
recuperar o seu nome, na Guatemala. E nós com isso? Nada. Só que tive um
assomo de nostalgia ao ler a notícia, por uma época em que a história
era mais simples e seus vilões e vítimas mais facilmente identificáveis.
Por Luis Fernando Veríssimo, em O GloboTalvez só na Guerra
Civil Espanhola se soubesse, com a mesma nitidez, qual era o lado “bom”
de uma questão — antes, claro, de os nazistas surgirem como os bandidos
indiscutíveis do século.
A Guatemala era o protótipo da “banana republic”. Sua dona era a
americana United Fruit Company, que lá mantinha não só vastas plantações
de bananas mas grandes extensões de terra ociosa, como investimento e
como garantia para futuras expansões.
O domínio da United Fruit sobre a política e a economia da Guatemala
trazia escasso proveito social para o país. Jacobo Arbenz foi eleito
livremente prometendo uma reforma agrária que fatalmente atingiria as
propriedades americanas.
A United Fruit tinha notórias ligações políticas e um ativo lobby em
Washington e não foi difícil, com a Guerra Fria esquentando, convencer o
presidente Eisenhower de que Arbenz significava um regime comunista no
quintal dos Estados Unidos.A CIA foi autorizada a intervir e derrubou
Arbenz com menos pudor do que mostraria em intervenções futuras, na
mesma zona — como em El Salvador — e no resto da América Latina e do
mundo.
O golpe ficou como um exemplo clássico, sem disfarces e sofismas, do
intervencionismo cru em ação. Os disfarces, os sofismas e a retórica
geopolítica viriam depois. No caso da Guatemala era um povo contra a
prepotência dos bananeiros. Simples.
Uma das consequências do golpe pró-United Fruit e da instalação de um
regime apoiado pelos americanos foi uma sangrenta guerra civil que
durou mais de 30 anos, com diversos grupos lançando-se na
clandestinidade, milhares de mortos e atrocidades de lado a lado.
O fato de a família de Arbenz estar buscando sua reabilitação indica
que, na história oficial do país, ele ficou como vilão, não como vítima.
Já a United Fruit não teve nada a ver com a história. Aliás, nem existe
mais. Seu simpático nome agora é “Chiquita Brands” e seu produto
principal, a “Chiquita Banana”.
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