Por Brizola Neto no TIJOLACO
Quando a gente fala que a mídia manipula a informação, não está dizendo que ela mente.
Está dizendo que distorce, aumentando um lado, reduzindo o outro.
Vejam o caso da manchete – e mais quase toda uma página interna da edição de hoje da Folha de S. Paulo.
Aí vem a conta marota.
Como foram compradas 22 plataformas e, destas, só três foram
integralmente construídas aqui, tem-se que 3/22 é igual a 13,6%. E
então, 87% dão estrangeiras. Arredondando, 90%, não é?
Aí você, pacientemente, lê toda a matéria. A repórter Leila Coimbra jamais escreve a expressão 90%,
senão uma vez, para dizer que das 48 plataformas da petroleira privada
OSX, 90% serão construídas no Brasil, no estaleiro que o grupo
empresarial de Eike Batista está começando a construir no Porto do Açu,
em sociedade com a sul-coreana Hyundai Heavy Industries, e que será,
segundo os planos, o maior estaleiro das Américas.
Como a empresa já achou e extrai petróleo, é óbvio que ela não iria
esperar ficar pronto o estaleiro e que o estaleiro produzisse as
plataformas, não é? Até porque, é evidente, um estaleiro não é simples
como “fazer um puxadinho” e construir uma plataforma não é fazer um
toldo de varanda. Portanto, nada mais natural que, na fase inicial, ela
comprasse quatro plataformas em estaleiros que fazem uma atrás da outra.
Mas vá lá, é uma empresa privada e, se a Folha não se incomoda em que
a Vale – segundo ela, empresa privada também, embora o estado tenha a
maioria das ações do consórcio controlador – faça navios lá fora, é
estranho que se incomode com o fato de a OSX fazê-lo. E, como se viu,
nem é o caso.
Bom, sobram então, dos 15 equipamentos utilizados no gráfico que
ilustra a matéria, 11 equipamentos pertencentes à Petrobras, e só três
deles feitos no exterior: a TLP-61 e os navios-plataforma (FPSO) Santos
e Angra dos Reis.
E por que? Os dois FPSO foram comprados porque se destinam aos
sistemas definitivos de exploração dos campos de Tupi e Lula, os
primeiros do pré-sal. Eles substituem outros, afretados no exterior, que
fizeram os testes de longa duração, mas que não têm capacidade de
suportar o megavolume – 100 mil barris/dia – que os poços terão na sua
operação comercial. Foi, portanto, uma opção de velocidade na entrada
de operação do pré-sal.
Opção que, de forma alguma, substitui ou reduz o empenho da Petrobras
em desenvolver a indústria naval e petrolífera nacionais. Tanto que os
FPSO apontados como tendo “parte nacional, parte estrangeira” são, na
sua maioria, cascos comprados e reformados estruturalmente no exterior –
eles têm previsão de ficarem ancorados no poço por 20 anos, não podem
vir á terra para pequenos reparos – e convertidos aqui em
navios-plataforma. O P-58 está no Estaleiro Estaleiro Rio
Grande – que vai
fazer oito outros FPSO, chamados “replicantes” – e o P-52 no Estaleiro
Atlântico Sul, em Pernambuco. Lá, também, será sendo feito o “Cidade de
São Paulo”, que tem apenas o casco importado da China.
Aliás, uma das características comuns a muitos navios-plataforma do
tipo FPSO é serem construídos, por opção econômica, a partir de cascos
de antigos navios petroleiros de grande capacidade – os chamados VLCC, Very Large Crude Carriers
– que não são mais competitivos como navios de longo curso mas que se
prestam perfeitamente – por sua enorme capacidade de tanques - à
operação quase estacionária de um navio-plataforma. Daí a necessidade de
reforma do casco, em geral em dique seco, para reforçar suas
características estruturais. O complexo não é o casco, mas a construção
de uma plataforma de petróleo sobre ele.
E
a TLP-61? É simples, é uma plataforma de um tipo diferente, pioneira no
Brasil. E não está sendo feita no exterior, não. Está sendo feita no Estaleiro Brasfels, em Angra dos Reis.
Mas, como é uma plataforma de outro tipo, diferente de todas já
utilizadas pela Petrobras, a execução do projeto implicará a utilização
de uma balsa especial para a etapa de mating (acoplamento do casco ao
convés). A balsa existente no Brasfels, utilizada na construção de
P-52, P-51 e P-56, não se encaixa à P-61, por que a distância entre
suas colunas é menor do que em plataformas semissubmersíveis, como as
que usa a Petrobras. Assim, a nova balsa será construída no estaleiro
da Keppel Fels em Singapura, junto com uma parte do convés e dos topsides da plataforma, que chegam ao estaleiro brasileiro no fim deste ano.
Agora, se a Folha se preocupa tanto com a questão da nossa
capacidade de construir aqui plataformas para a exploração de petróleo,
ao ponto de dedicar uma capa do caderno de economia à nossa
“incapacidade” de fazê-las, porque dedicou, no dia da inauguração da
P-52, no início deste mês, a plataforma com maior índice de
nacionalização já alcançado (73%), apenas dois parágrafos de uma pequena
matéria, como voc~e pode ver na reprodução publicada aí ao lado?
Seria isso o que o neoacadêmico Merval Pereira disse outro dia,
desqualificando os blogs, a “capacidade de hierarquizar a notícia” da
grande mídia?
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