terça-feira, 22 de novembro de 2011

Greve de coerência



JUREMIR MACHADO DA SILVA
 
A greve do magistério do Rio Grande do Sul é um caso de escola para se analisar as contradições da política. Ou dos políticos? Tenho certeza de que se estivesse sobrando muito dinheiro o governador Tarso Genro pagaria o Piso na hora. O problema é que só quatro estados brasileiros (Minas Gerais, Pará, Bahia e Rio Grande do Sul) não o pagam. E a Bahia garante que paga, sim. Como é que conseguem? Outro ponto é o tempo para preparação de aulas garantido pela nova lei: 17 estados não o respeitam. Mas, quanto ao salário, só três ou quatro. No "Esfera Pública", na Rádio Guaíba, o senador petista Paulo Paim botou o governo numa saia justa. Lembrou que durante a sua campanha, em 2010, fartou-se, assim como seus companheiros de partido, de atacar a governadora Yeda Crusius por não querer pagar o Piso. Como mudar de discurso agora? Como passar do duro "Yeda não paga porque quer" para o mole "Tarso não paga porque não pode?"

Sou testemunha de que Tarso Genro não prometeu pagar o Piso imediatamente. No mesmo "Esfera Pública", durante a campanha eleitoral, comprometeu-se a fazê-lo ao longo do seu mandato. Mas isso não poderia ser no apagar das luzes ou a conta ficaria para o governo seguinte, que poderá ser o dele mesmo ou de outro. A contradição volta: por que os petistas cobravam pagamento imediato de Yeda e querem pagar a médio ou longo prazo? A única explicação é a tradicional: uma coisa é ser oposição, outra é ser situação. Como diz o sábio, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. O problema do governador Tarso Genro com os professores, sobre o Piso, é o que o seu partido disse antes, como opositor, sobre o mesmo assunto. Situação agravada pelo fato de que a maioria esmagadora dos estados brasileiros paga o Piso. Por fim, esperava-se que o Cpers fosse correia de transmissão do governo e desse mole nessa questão. Alguns criticavam o Cpers por antecipação. A surpresa está aí. Sem dó nem fidelidade.

Em linguagem dura, o Rio Grande do Sul está fora da lei. Paulo Paim foi mais longe: como aceitar que o seu office boy no Senado ganhe o dobro do Piso de um professor? A política está atolada em contradições. Cada partido tem o seu mensalão. Atacados, todos criticam o financiamento privado de campanha. Assim: dado que existe a necessidade de pedir dinheiro às empresas privadas, que fazem negócios com o Estado, é inevitável um troca-troca. Nalguns casos, empresas dão propinas para ter licitações aprovadas. Em outros, devolvem parte do orçamento superfaturado. Coro: só o financiamento público resolve.

Não será uma maneira de aproveitar o pepino para fazer uma boa limonada? Não ter mais de correr atrás de dinheiro para campanha? A impressão é de que toda afirmação de um político é estratégica: fortalecer seu interesse ou o do seu partido. O governo do Rio Grande do Sul parece só ter uma medida a tomar para acabar com a greve do magistério e sair da contradição: apresentar um cronograma de pagamento do Piso. E aprender uma lição: é preciso tomar cuidado com o que se diz. O último problema é que essa lei do Piso foi concebida por Tarso Genro. Se não pagar agora, vai ter custo nas eleições de 2012.

JUREMIR MACHADO DA SILVA é jornalista, escritor e professor

* Artigo publicado no jornal Correio do Povo, de Porto Alegre (RS), em 22.11.11

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