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quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Entrevista interessante...

A bela é fera

Sérvia radicada no Brasil, Duda Yankovich superou guerras, adversários de mãos pesadas e empresários de mãos leves. Enfrentou preconceitos e nocauteou todos

Por: Andrea Dip

A bela é fera
Duda: Tive fratura no nariz e não disseram. Achei que eu tinha sinusite e era uma fratura aberta. Estava sem dinheiro, sem patrocínio, sem poder lutar... Entrei em depressão (Fotos: Jailton Garcia)
Faixa preta de caratê aos 14 anos, quatro vezes campeã absoluta de kick boxing em seu país, com um título mundial de boxe no currículo, a sérvia Duda Yankovich tem muita história para contar: sobre comunismo, as quatro guerras que conheceu de perto, a necessidade de competir – e ganhar – em todos os esportes que já praticou ao longo dos 33 anos de idade e, principalmente, sobre começar do zero.
Quando chegou ao Brasil, dez anos atrás, a bela já tinha se formado na escola de segurança internacional 007, trabalhado como segurança de boate e como dublê em filmes e comerciais de televisão. Apesar de ainda não ter conseguido a cidadania brasileira, foi a bandeira verde e amarela que ela levantou ao conquistar o título mundial de boxe em 2006.
Nesta entrevista, Duda falou sobre todas as formas de preconceito que já sofreu na vida: por ser muito nova, por ser do interior, por ser mulher, por ser bonita – e como nocauteou um por um, de saia, maquiagem e cabelo impecável nos ringues da vida. No auge da forma e da fama, a sérvia levou uma rasteira de um empresário sacana que a fez perder patrocínios, dinheiro, visibilidade e a pior parte: se machucar gravemente em uma luta mal arranjada.
Após um ano, Duda volta com tudo para o próximo desafio: o MMA, apresentação que une lutas como boxe, kick boxing e jiu jitsu. Para variar, vai ser uma das poucas mulheres a lutar nessa categoria. Mas para ela vai ser fácil. Afinal, para quem aprendeu a falar português sozinha, em apenas quatro meses, aprender a lutar jiu jitsu é sopa.

Onde você nasceu?

Em uma cidadezinha da Sérvia de 40 mil habitantes, Jagodina, a pouco mais de 100 quilômetros de Belgrado.

Você fazia esportes desde pequena?

Quando era bem pequena fiz natação, depois basquete, mas nunca gostei de fazer esportes por fazer: sempre competi. No começo da adolescência entrei para um grupo de dança folclórica, danças tradicionais da Sérvia.

Você nunca fez um esporte apenas por diversão?

Não consigo fazer por fazer. Mesmo com outras coisas na vida, do que eu gosto, levo a sério. Sempre fui boa aluna. Quando eu tinha de 11 para 12 anos, uma vizinha me pediu para ir com ela assistir a uma aula de caratê. Ela ficou algumas semanas, e eu fiquei seis anos. Com 14 anos, já era a mais nova faixa preta de caratê da história do país. Com 15 anos, deixei a minha cidade e me mudei para Belgrado, para fazer parte da seleção. A minha família não queria, mas persisti. Economizei dinheiro e paguei um internato. Nesse tempo, conquistei patrocínios e apoio do governo. Na época, meu país era comunista e eles incentivavam muito o esporte. Eu recebia um salário do governo porque era medalhista internacional. Todo mundo reclama do comunismo, mas eu acho que a pior época foi quando acabou o comunismo, em 1980, e começou uma briga pelo poder. Eu era muito pequena, mas me lembro que nunca faltava nada. Como esportista, fui muito apoiada.

Como foi a passagem para o kick boxing?

Eu estava desanimada. Não me deixavam competir fora porque eu era muito jovem. Então fui procurar alguma outra coisa para fazer. Eu treinava em um clube chamado Estrela Vermelha, que tinha vários outros esportes. Assisti a uma aula de kick boxing e gostei. No começo, sofria preconceito por parte dos treinadores, “você é menina, bonitinha, tem tanta coisa para você fazer...” Antes disso, já tinha sofrido preconceito por ser muito nova e por ser do interior, porque tinha sotaque. E adolescentes são muito cruéis. Nos primeiros meses eu chorava todos os dias, mas depois virei uma personalidade, e as pessoas não me olharam mais como a menina do interior, e sim como a atleta de seleção. O esporte sempre abre portas, né? No meu país é muito complicado você conseguir ver o mundo. Primeiro porque é cultural: as mulheres nascem para casar, ter filhos, às vezes ter um emprego, ou serem sustentadas pelo marido. Quando eu já morava no Brasil, ligava para a minha avó e ela dizia: “Tudo bem filha, você é campeã mundial, mas quando vai casar?”. Eu só me encaixava no esporte.

E no kick boxing você logo começou a competir...

Sim. No começo eu apanhei bastante. Vinha de um esporte sem contato para um de total contato. Como os treinadores não me ajudavam muito, foi difícil. Mas depois de um ano eles perceberam que não tinham como me tirar de lá, começaram a investir mais tempo em me treinar e rapidamente comecei a dar resultados. Fui campeã absoluta do meu país por quatro anos, participei de dois campeonatos mundiais entre 17 anos e 23 anos.

Nessa época você estudava?

Comecei a faculdade de educação física lá e terminei aqui no Brasil.
Meu pai e meu tio foram convocados várias vezes. Nunca sabíamos se voltariam. E a cultura do país é a de um lugar sempre em guerra. Olho por olho, dente por dente. Se você me faz algo, vai ter troco, mesmo que demore

Vivendo sozinha?

Sozinha desde os 16 anos. Eu não sou típica... Lá as mulheres casam cedo, para fugir de casa ou para constituir família. Eu tinha 13 ou 14 anos e já sabia que essa não seria a minha vida. Oportunamente, quando acabar a minha carreira, posso casar, ter filhos. Mas sempre achei que a gente tem mais a dar do que o que a natureza ou a cultura propõem. Porque isso todo mundo pode. Mas fazer escolhas é mais difícil. É mais fácil você seguir fazendo o que esperam de você.

Duda 1

Você já viveu quatro guerras. Tem alguma imagem que ficou registrada na sua mente?

Nas três primeiras eu era bem nova. Então lembro apenas das filas enormes para comprar coisas, porque a gente tinha que estocar comida e água. Ficava a família inteira na fila, porque cada um tinha direito a uma quantidade limitada de comida. Meu pai e meu tio foram convocados várias vezes e nós não sabíamos se eles voltariam para casa. A cultura do meu país é a de um lugar que sempre viveu em guerra. O olho por olho, dente por dente. Se você me faz uma coisa agora, ela vai ter troco, mesmo que demore alguns anos.

Anotam no caderninho?

As pessoas são mais duras, mais defensivas. Me lembro que treinava kick boxing no porão de uma academia e um dia um cara chegou e gritou “Estamos em guerra!” e nós nem demos bola, até parece que um lugar entra em guerra assim. Quando saímos na rua, à noite, não tinha uma luz acesa, um carro, uma pessoa, nada. Às vezes, passava um carro com umas pessoas gritando “guerra!”, e só. E tinha aquela coisa de se enfiar em abrigos quando uma bomba era anunciada. No final, as pessoas nem iam mais para os abrigos, se acostumaram com aquilo. Em guerra nada funciona. Você não vive. Academia não funciona, empresas, escolas, nada. Imagina? Por isso eu decidi vir para o Brasil. Eu já tinha vindo em 1998 competir e fiz amigos. A guerra aconteceu em 1999. Não tinha perspectiva no meu país. Queria começar algo novo. Fui primeiro para Londrina (no Paraná) dar aulas de kick boxing. Percebi que ainda levava jeito para a coisa e voltei a competir. E estou aqui ainda.

É verdade que as meninas desistiam de lutar quando viam quem era a adversária?

Primeiro não me conheciam, porque eu era apenas treinadora. Mas quando eu voltei a competir, ganhava todas as lutas. E por nocaute. Aí ninguém mais se inscrevia. Não é que eu ganhava todas, não tinha contra quem lutar. Passei a me inscrever com outro nome, o sobrenome do meu marido brasileiro. Aí elas se inscreviam, mas quando subiam no ringue falavam “A Duda, não!” e desciam.

Você casou assim que chegou ao Brasil?
Eu cheguei e fui trabalhar na academia dessa pessoa, que eu já conhecia desde 1998 quando vim pela primeira vez. A gente começou a namorar. Casamos porque meu visto era de turista. Depois de três anos nos separamos. Só agora eu posso entrar com um pedido de naturalização.
Boxe era um esporte muito masculino. Eu lembro que ia visitar a academia de um treinador chamado Miguel de Oliveira, em Londrina, e ele falava: 'Não! Mulher não entra na minha academia!' Vai lá hoje ver quantas mulheres treinam

Mas você sempre lutou pelo Brasil.

Sempre. Mas só posso entrar com o pedido de naturalização agora, após dez anos de permanência sem interrupção. Eu gostaria muito, porque, sem ofensas, sou muito mais brasileira do que alguns brasileiros, porque eu optei por isso. Foi uma escolha minha.

Voltando para o ringue, como você foi do kick boxing­ para o boxe?

O boxe era um esporte extremamente masculino. Eu me lembro que ia visitar a academia de um treinador chamado Miguel de Oliveira, lá em Londrina, e ele falava: “Não! Mulher não entra na minha academia!” Vai lá hoje ver quantas mulheres treinam. Eu era treinadora da equipe de kick boxing, a gente foi para o campeonato brasileiro e levou 12 medalhas. Ninguém acreditava! Mas eu era muito rígida. Me chamavam de Frida, nazista, porque qualquer coisa eu apontava para o chão e  dizia: “Dez! (flexões)” e “Quem não quiser obedecer, a porta da academia está aberta”. Eu não podia dar muita folga para eles, ainda mais por ser mulher. Entre os alunos, tinha alguns que me agradeciam, dizendo que a vida mudou, que o casamento melhorou, que tinha parado de usar drogas... Isso me arrepia só de lembrar! E isso fazia com que eu me dedicasse mais, me esforçasse mais. Até hoje existe a academia, os atletas que eu formei dão aula, o sistema de treino ainda é o mesmo que eu deixei. Fico muito emocionada com isso.
Duda 2

E o boxe?

Naquela época, mais ou menos em 2003, tinha um programa na televisão sobre boxe, do Luciano do Valle­, que tinha patrocínio de uma companhia aérea, o que é muito importante – aliás, eu faço um apelo para que haja mais patrocínio para o boxe. No programa sempre passavam lutas femininas e masculinas. Aí surgiu o convite e eu pensei: “Ah, não deve ser muito diferente”. Mas é completamente diferente. Não sabia como chegar na menina sem chutar. Mas quando eu cheguei, nocauteei. E toda semana eu ia lutar. Ninguém tinha dinheiro, a confederação não tinha dinheiro. No boxe tinha mulher pra caramba. Voltei nessa academia e o treinador falava “Se você quiser, fica aí no cantinho”. Aí fui crescendo, melhorando, fazendo luva com os caras. Até que em 2003 fizeram o primeiro campeonato feminino nacional de boxe e eu participei. Em 2004 e 2005 ganhei. Vim para São Paulo treinar com a seleção masculina porque não existia a feminina. Tinha dias em que eu chegava em casa tão cansada que desmaiava no sofá e acordava só no dia seguinte. Apanhava, chorava... Fui lutar o campeonato panamericano e peguei medalha de bronze. Fui pesquisar sobre a mulher que ganhou de mim, porque ela era um caminhão. Vi que ela viajava para lutar, tinha mais de 50 lutas fora. Então resolvi me profissionalizar. Quando você é profissional, o treino é diferente, você se prepara para lutar contra aquela pessoa. Você estuda, cria técnicas para aquela luta.

Aí que começa a história na verdade, né? Mas você começou várias coisas do zero...

Pois é, olha quantas vezes eu comecei do zero. Sempre quero desafios. Tive muita sorte também. Mas hoje acho que em qualquer lugar que eu me jogar, eu me adapto.

Você aprendeu a falar português sozinha?

Sozinha. Eu falava inglês muito bem, então colocava filmes em inglês com a legenda em português, em português com legenda em inglês, depois colocava português com a legenda em português. Demorei quatro meses para falar fluentemente. E terminei a faculdade de educação física aqui.

Como veio o título mundial de boxe?

Para você disputar o título mundial, precisa ter um certo cartel de lutas. Eu vim para São Paulo atrás do Miguel. A equipe não veio logo de cara. Você precisa mostrar resultados para que as pessoas te ajudem e precisa de ajuda das pessoas para mostrar resultados. Isso sempre foi muito ruim. Por exemplo, eu vou estrear no MMA, começar outra coisa, e os patrocinadores dizem: “estreia primeiro, e se você se sair bem nós te apoiamos”. Isso já me desanimou muito, já pensei em desistir.

Você passou aperto com um empresário sacana...
As pessoas, em qualquer área, querem ganhar dinheiro rapidamente, em vez de ganhar aos poucos de forma pensada. Faltou paciência e bom senso. No último ano do nosso contrato, ele marcava lutas para mim, eu me preparava pra caramba – isso exige investimento de tempo e dinheiro – e pouco antes ele dizia que a luta havia sido cancelada. Mas eu não sabia o que estava acontecendo realmente. Foi muito triste, cansativo. E perdi a atenção da mídia. Sem mídia e sem lutar, perdi patrocínios. Mas tive culpa também, porque a pessoa tinha um histórico e eu não fui pesquisar antes.
No meu país as mulheres nascem para casar, ter filhos, serem sustentadas pelo marido. Quando eu já morava no Brasil, ligava para a minha avó e ela dizia: 'Tudo bem, você é campeã mundial, mas quando vai casar?'
Duda 3 

Como você se machucou?

Eu estava há um ano sem lutar. O contrato tinha acabado, eu não tinha mais compromissos e precisava de dinheiro. Aí fechei uma luta que não era para fechar. Era uma menina muito boa, de duas categorias acima do peso, fora de casa. Mas eu não tinha escolha. Não valeu o cinturão mundial que eu tinha de defender, porque era outra categoria. Mas eu não pensei que poderia me machucar. E eu tinha de pensar nisso. Foi algo muito mais sério do que uma simples lesão. Tive uma fratura no nariz­, mas não me disseram que estava fraturado. Eu voltei para o Brasil com muita dor e achava que era sinusite. Tomava remédio e a dor não passava. Aí tive uma crise muito forte, queria cortar minha cabeça fora de dor. Tinha uma fratura aberta. Eu estava sem dinheiro, sem patrocínio, sem poder lutar... Entrei em depressão profunda.

Foi uma parada forçada.

Não sabia mais onde eu estava, quem eu era. Operei em outubro, pelo SUS, graças a pessoas a quem eu posso, devo e vou agradecer. Mas tive de pagar um monte de coisas, gastei o pouco dinheiro que tinha guardado, tive de entregar meu apartamento, meu carro. Não tinha ninguém ao meu lado. Tentava correr e não conseguia, qualquer toque no nariz sangrava e eu não queria mais sair de casa. Aí resolvi dar um tempo. Fui para a minha casa na Sérvia. Tinha até pensado em ficar por lá. Fui passar um tempo na Tailândia e pensei: ainda não é hora de parar.
Peguei minhas malas e voltei para cá. Mas quis mudar de paisagem e fui para o Rio. Tinha uma academia boa de treinamento, eu conhecia a equipe. Tive de começar praticamente­ do zero porque estava totalmente fora de forma. Aí fui convivendo com os atletas, fui melhorando e hoje acho que estou na minha melhor forma. Lutei há poucos meses com uma africana valendo o cinturão e perdi por pontos. Mas fiquei muito satisfeita com a minha performance. Treinei poucos meses para esta luta. Foram dez rounds.

E agora chega de boxe?
Não abandonei o boxe, mas recebi uma proposta para ir para o MMA e topei. Agradeço essa minha fase aos patrocinadores – Cerpa, Amazon Power –, à academia X-GYM, que me acolhe, e à dedicação do Josuel Distak, meu treinador, e do preparador físico Rogério Camões.

Eu nem sabia que tinha mulheres no MMA...

Tem poucas. E é um jogo de xadrez, como toda luta. Você tem de prever os movimentos, tem muitas regras, tem de pensar. Não são só dois caras se batendo. Hoje eu tenho preparador físico, técnico, parceiros de treino e psicólogo. As pessoas acham que atleta é saudável. É saudável nada! Vive no limite, machucado, cheio de dores... Mas o MMA talvez venha agora para coroar todos estes anos em diversas lutas. E lá vou eu começar tudo de novo.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Como é bom ser Colorado!



Centenário, Campeão do Mundo – FIFA, da Libertadores, da Sul-americana, da Recopa, da Suruga, da Copa do Brasil, Tricampeão Brasileiro, Multicampeão Gaúcho, e por aí vai... O que mais te falta Colorado, depois de ganhar TUDO?

Pois é, mas hoje tem mais, começará TUDO DE NOVO! Tu não perdoas, Colorado! Tu com tantos... Mas é assim, tu gostas mesmo é de sempre ser o primeiro.

O Mundo te respeita, a imprensa te reconhece, teus adversários te temem, teus guerreiros lutam por ti, tua torcida te ama!

Aliás, que mística é esta que apaixona e faz chorar um Gaúcho dos quatro costados? Que magia é esta? Sabemos todos, é a tua história. Da Rua Arlindo para o Mundo, os Irmãos Poppe não tinham a noção de que este Clube se tornasse tão grande e tão conquistador, a tal ponto de ter todos os troféus do Mundo aos seus pés.

De onde vem esta força, este poder? Indagam todos!

A resposta é simples: os que fizeram o Colorado um Clube desta grandeza foram aqueles que assistiam no alambrado da Rua Arlindo; aqueles que construíram cada pedaço dos Eucaliptos, do pavilhão de madeira à arquibancada de concreto; aqueles que construíram pedaço a pedaço do maior templo do futebol no Sul do País, o Gigante da Beira-Rio, aqueles que vibram e se emocionam quando a camisa vermelha está na disputa.

És tu mesmo, torcedor colorado, mesmo que não estejas mais aqui, mas a tua força está; tu que irás ao Beira-Rio ou ficarás na torcida. Tu és o protagonista da história vencedora do S. C. Internacional. É a paixão por este Clube de Futebol que o faz gigante.

Torcedor: quarta-feira é o teu dia!

Colorado, teu povo estará junto contigo, para continuar a festa!
Samanta Cardoso Bertei,
Presidente da Confraria Tambores de Yokohama.

Email: presidente@tamboresdeyokohama.com.br

"TAMBORES": DE YOKOHAMA A ABU DHABI 2010!

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Os bastidores humanos e sociais da Copa da Africa-2010


África do Sul - Enquanto a copa cega e ensurdece o mundo
  • O salário de um operário sul-africano equivale a aproximadamente R$ 350,00.
  • Segundo relatórios da ONU, a África do Sul é um dos dez países com maior desigualdade de renda no mundo.
  • 79,8% da população sul-africana é composta de negros, 9,1% de brancos,  8,9% de mestiços e 2,1% de hindus e asiáticos.
  • 44% da população desse país vive na zona rural.
  • Mas 5,7 milhões de pessoas (mais de 10% da população) estão infectadas pelo vírus HIV (Aids). A cada ano são 500 mil novos casos, 20% deles entre crianças. Estudos contabilizam uma média de mil mortes por dia em decorrência da doença.
  • 27% da população está desempregada. 65% dos desempregados tem menos de 35 anos de idade.
  • Na África do Sul ocorrem em média 28 mil assassinatos ao ano, número quase absoluto entre as populações mais empobrecidas.
  • Dados do Banco Mundial apontam que 34% dos sul-africanos vivem com menos de dois dólares por dia (menos de R$ 4,00).
  • Apenas 5% dos negros sul-africanos conseguem chegar à universidade.
  • Para a organização da copa do mundo de futebol, no país, foram desembolsado aproximadamente R$ 4,5 bilhões.
http://www.anovademocracia.com.br/67/19-a.jpg
Sul-africanos protestam contra o desrespeito e a exploração
Em sua luta contra o Apartheid1 o povo sul africano agitava a palavra de ordem "Amandla Ngawethu", que quer dizer "Todo poder ao povo!" no idioma zulu.Após décadas de luta, o povo sul-africano não conquistou o poder nem liberdade. Num país massacrado pela rapina imperialista, a bilionária copa do mundo de futebol movimenta outros bilhões em patrocínio, especulação de grandes empresas e ainda mais exploração do povo daquele país.

Desde as vésperas da copa milhares de trabalhadores se levantaram em combativas greves e protestos, revelando à força a África do Sul que as câmeras do monopólio das comunicações imperialista tenta a todo custo ocultar.
Em meados de maio último, poucas semanas antes da copa, os servidores públicos entraram em greve na África do Sul. O mesmo ocorreu com  os trabalhadores dos transportes e  os da estiva (carregadores dos portos) que interromperam durante dias as exportações de metais, carros, frutas e vinho para a Europa e a Ásia, assim como as importações de peças de veículos e combustível, provocando grande prejuízo às grandes empresas imperialistas sediadas no país. Com isso eles ainda impediram a chegada de diversos equipamentos esperados para a realização da copa no país. Os operários afirmavam através de suas combativas ações que sem o cumprimento com seus direitos não haveria copa.

A greve nos transportes durou mais de três semanas
e só foi encerrada com a promessa de atendimento das reivindicações dos trabalhadores.

Faltavam duas semanas para o início da copa quando, em 26 de maio,
os 16 mil funcionários da Eskom, companhia de energia elétrica da África do Sul, entraram em greve reivindicando aumento salarial de 18%.

No dia 17 de maio,
o sistema ferroviário nacional da África do Sul foi paralisado pela greve dos trabalhadores desse setor. Quando a greve completou seu nono dia quatro composições da Metrorail Gauteng foram incendiadas em Parktown, uma das principais estações do sistema urbano de Johannesburgo. Os trens ficaram completamente destruídos, provocando um prejuízo de 15 milhões de rands à empresa (cerca de R$ 3,55 milhões). Os empresários das ferrovias correram à imprensa para acusar os trabalhadores ferroviários e seu sindicato. Os poucos depoimentos de trabalhadores ferroviários sul-africanos divulgados denunciam os baixos salários e o desrespeito aos direitos trabalhistas.

Em 30 de maio, quando faltavam menos de duas semanas para o início da copa,
os operários organizados pelo Congresso dos Sindicatos Sul-Africanos - Cosatu entraram em greve contra o alto preço do fornecimento de eletricidade e o alto custo de vida.

Em 31 de maio
os motoristas de ônibus de Johannesburgo entraram em greve contra as péssimas condições de trabalho e baixos salários. Esta foi a segunda paralização de rodoviários em maio. Além das reivindicações econômicas os trabalhadores exigiam o reconhecimento de seu sindicato Samwu. Como não tiveram suas reivindicações atendidas, os motoristas de ônibus paralisaram novamente o trabalho no primeiro dia dos jogos da copa como forma de pressionar os patrões pelo cumprimento de suas promessas de melhora das condições de trabalho.

Após o jogo entre Alemanha e Austrália, na madrugada do dia 13 de junho,
cerca de trezentos funcionários que trabalhavam em diversas funções nos estádios realizaram um combativo protesto. Eles haviam sido enganados pela organização da copa que pagou 190 rands (aproximadamente R$ 45) dos 1,5 mil rands (cerca de R$ 350) prometidos. A polícia atacou os manifestantes com disparos de balas de borracha, bombas de gás lacrimogêneo e cassetetes e prendeu dez pessoas. Os trabalhadores por sua vez responderam com pedras e garrafas contra a tropa de choque.

Já na Cidade do Cabo, momentos antes do jogo entre Itália e Paraguai,
aproximadamente 100 funcionários contratados para organizar as torcidas abandonaram seus postos de trabalho em protesto contra a falta de pagamento.

No dia 16 de junho centenas de
trabalhadores da copa, pescadores locais, mulheres, estudantes, e representantes de sindicatos reuniram em Durban para protestar contra as condições de trabalho e a carestia de vida.

No mesmo dia
os funcionários responsáveis pela segurança de quatro estádios iniciaram uma greve reivindicando melhores salários. A paralisação atingiu os estádios Ellis Park, em Johanesburgo, Green Point, na Cidade do Cabo, Moses Mabhida, em Durban, e Nelson Mandela Bay, em Porto Elizabeth.  Os seguranças alegam que foi acordado um valor de 1.500 rands por dia de jogo (R$ 375), mas que recebem apenas 190 rands (R$ 47,50). O contrato é de 12 horas de trabalho por dia, mas eles denunciam que a carga horária tem chegado a 16 horas. Além disso, eles tem de pagar 1.200 rands (R$ 300) pelo próprio uniforme.
Esta é a verdadeira face da copa para os trabalhadores e as massas populares sul-africanas: a mesma violência, exploração, miséria e desrespeito de sempre, tudo acobertado pela maquiagem do monopólio da imprensa que tenta apagar a realidade com vuvuzelas e o conto de uma África do Sul exótica e "reconciliada".
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1 Apartheid quer dizer habitação separada no idioma africâner (um misto de Holandês e Inglês. Considerado a língua imposta pelo colonizador imposta como língua oficial na África do Sul). Política de brutal discriminação e segregação racial praticada pelos meios reacionários governantes da República Sul-Africana contra a população africana autóctone e também, em grande parte, contra os imigrados da Índia. Obriga os africanos a viver em reservas; os nativos estão privados de direitos cívicos, o seu salário é muito inferior ao dos brancos, etc. Qualquer transgressão da lei sobre a habitação separada é considerada como um crime de direito comum. À época os Estados socialistas e os países em desenvolvimento condenaram a política de apartheid: um certo número de documentos adotados pela ONU qualificaram o apartheid de crime contra a humanidade, de violação dos princípios do direito internacional, nomeadamente dos fins e dos princípios da Carta da ONU, e proclamam que ele constituia uma grave ameaça para a paz e a segurança dos povos. 
 
Fonte: sitio a Nova Democracia

quarta-feira, 7 de julho de 2010

O time multi-culti da Alemanha


Herr Cacau, brasileiro naturalizado alemão, é apenas um dos 11 atletas com ascendência estrangeira (Foto: Ina FassBender/Reuters)

Por Flavio Aguiar

Num país em crise, com a economia sendo “passada a ferro” pelas regras do FMI num clima recessivo, em que os direitos sociais estão passando por uma poda sem precedentes, em que o presidente renunciou recentemente e a eleição indireta do novo foi um pesadelo para o governo, em que a popularidade do governo e dos seus partidos está lá embaixo, de repente o futebol, a seleção nacional e a Copa do Mundo passaram a ser uma milagrosa tábua de salvação.
Estamos falando, como estávamos acostumados, do Brasil? Não, da Alemanha.
Mas há mais nisso do que pensa a nossa vã filosofia. É que a seleção germânica passou por uma mudança de caráter das mais significativas.
O futebol alemão – o da sua seleção em particular – sempre foi associado a um blindado de artilharia – um Panzer, para ser mais exato. Troncudo, carrancoso, eficiente como um capitalista protestante e conservador como um bispo católico do partido de Bento XVI e, sobretudo, germânico, profundamente germânico: assim era o retrato do time alemão tradicional.
De repente, o que se vê? O time alemão jogando aberto, bonito, rápido, um time jovem de gente bonita. E sem o ex-capitão Ballack, o que, no meu entender deu-lhe mais mobilidade e jinga. Jinga? É, jinga. Não estou com aqueles que querem crucificar Dunga e o nosso time. Mas que faltou jinga, faltou, sobretudo naquele segundo tempo contra os holandeses em que fomos derrotados por uma laranja... mecânica. É um time que jogou certinho, só certinho. Só que o nosso, no segundo tempo, fez tudo errado. Desmanchou-se em campo.
Enquanto isso os lépidos e faceiros germânicos deram uma lição ímpar “a los hermanos de más Allá Del Plata”.
Pois vejam só: lépidos, faceiros e... coloridos! Não só o futebol deles é colorido: o time é colorido. Foi isso que mudou no time alemão: antes ele era um filme em louro e branco; no máximo havia uma cabeleira (sempre curta) morena que vinha lá dos fundos da Baviera. Agora, te tudo quanto é cor. Tem até uma cor que se chama Cacau – Herr Cacau – e que veio do Brasil. Tudo começou em 2004 quando, depois de um desempenho fraco no campeonato europeu, a Federação Alemã de Futebol decidiu "abrir" o time para os seus "oriundi".
11 dos 23 jogadores que a Alemanha despachou para a África do Sul têm ascendência próxima ou nasceram em terra estrangeira. Além do Claudemir Jerônimo Barreto – o Cacau, veja só:
Miroslav Klose, Lukas Podolski e Piotr Trochowski vieram da Polônia.
Mesut Özil, do Werder Bremen, é de ascendência turca, é muçulmano e recita o Corão antes de cada jogo.
Serdar Tasci também é de ascendência turca.
Mario Gómez tem o pai espanhol.
Sami Khedira tem o pai da Tunísia.
Dennis Aogo tem o pai nigeriano.
Jerome Boateng nasceu em Gana, filho de pai ganes e mãe alemã. Jogou contra o irmão, que era da seleção de Gana.
Marko Manin é sérvio de origem.
O time alemão está sendo descrito como o “retrato de uma nova Alemanha”.
Mas nem tudo são flores para o sucesso desse time que, vença ou perca a Copa, já marcou um gol pela integração.
É verdade que os bairros turcos de Berlim estão cobertos por bandeiras alemãs e da Turquia. O comerciante Youssef Bassal (relato do Berliner Zeitung), no bairro de Neukölln, resolveu pendurar um bandeirão alemão de 20 metros na fachada do prédio onde tem sua loja de telefonia celular. A bandeira já foi rasgada (duas vezes) por anônimos – mas que se dizem de esquerda, deixando mensagens alegando que aquilo é “nacionalismo” alemão. De esquerda? Sinceramente, para mim isso é racismo disfarçado.
Em compensação, há grupos neonazis que, pela internet, têm repudiado a seleção alemã. Outros dizem pejorativamente que ela é uma seleção da ONU, não da Alemanha. Mas o caso mais curioso é o daqueles que dizem que só torcem pela Alemanha quando os jogadores alemães puro-sangue tocam na bola...
Mas enquanto isso a maioria dos alemães, venham de onde vierem, se divertem a mil com os jogos – pelo menos até aqui, numa trajetória que foi empanada mas não cortada pela derrota para a Sérvia.
Dentre os mais velhos, há quem não goste desse embandeiramento geral das cidades, pois isso lhes traz recordações desagradáveis do passado.
Mas para os mais jovens, em geral, é uma festa.
A gente vê que de fato há uma nova Alemanha nascendo. Não das cinzas, mas entre as cinzas, sejam as eventuais do vulcão islandês, sejam as ameaçadoras da crise econômica e do pacote depre/regre/ssivo que sobre ela se abate.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Em defesa de Dunga e de Jorginho....

Dunga e Jorginho: só o tempo mostrará..

Por Dil no blog egora
 
O próximo técnico da seleção brasileira terá pela frente uma tarefa dificílima: Manter o excelente padrão que Dunga e Jorginho deram ao time durante os 4 anos que estiveram a serviço da seleção brasileira. Nesse período a seleção, que lhes fora entregue esfacelada pelo fracasso de 2006 e sem os principais craques, conseguiu reunir os atributos daquilo que se espera de um verdadeiro e vitorioso time de futebol: Tornou-se super competitiva, com regularidade, equilibrada – tomando poucos gols e fazendo muitos . Conseguiu ainda bater adversários históricos como Portugal, Inglaterra e Itália, fazer do nosso maior rival, a Argentina, um freguês de carteira com duas goleadas, ganhar as competições e, de quebra, conseguir a melhor preparação em uma eliminatória com a classificação garantida com duas rodadas de antecedência.

Isso, meus amigos, podem ter certeza que não é fácil. A coisa mais difícil no futebol é dar padrão e consistência a um time por um bom período, e talvez a coisa quase impossível no futebol é conseguir esse feito sem ter a disposição a fartura de craques que outros treinadores já tiveram. Nesse ponto Dunga merece todo o reconhecimento. Que trabalho!

Para fazer uma comparação nada melhor que lembrar das últimas copas, de pelos menos 30 anos pra cá:

Copa de 82: Um período de vacas gordas, tínhamos craques caindo da árvore no futebol brasileiro, a equipe jogava no talento deles, mas o treinador, desde a preparação, desde o último treino na Toca da Raposa, quando os reservas chegaram a golear por 8 a 2 (!) jamais conseguiu corrigir os erros de cobertura da defesa, o que deixava o Brasil sempre exposto lá atrás...Já na primeira partida contra a URSS, a vulnerabilidade era evidente, mas o talento de Éder, Sócrates e cia, e a boa ajuda do juiz nos fez virar aquele marcador. Resistimos na copa até onde deu no talento de nossos craques, mas sucumbimos em erros pré- anunciados que “gritavam e não eram ouvidos.”

Copa de 86: Ainda uma época de ouro, tivemos troca de técnico, corte por indisciplina do atacante titular que estava no auge e a consequente saída de Leandro. A questão da não escalação de Falcão, onde foi alegada contusão e que depois foi revelada pelo próprio jogador como uma farsa - já que estava de saída para o Nápoli a convite de Maradona e perdera a inscrição em função do fim do prazo para inscrição de estrangeiros. Perdemos nos pênaltis (2 vezes na mesma partida!) sendo a última de forma displicente. Tudo fruto de uma preparação confusa.

Copa de 90: Essa eu prefiro resumir. Era craque pra tudo quanto é lado e um treinador inseguro que chegou ao cúmulo de reunir o grupo antes da última partida e pedir conselhos para alterar ou não o sistema de jogo. Esse fato, revelado por Taffarel quase 20 anos depois e confirmado por outros jogadores, é o cúmulo do anti profissionalismo.

Copa de 94: O trauma de 90 fez com que a CBF buscasse alguém que tivesse identificação com a seleção. A escolha recaiu sobre Falcão, resultado: Convocações polêmicas e 18 meses de um trabalho inconstante e inexpressivo. Foi tirado para entrada da dupla Parreira-Zagallo, que conseguiu montar um time com muita dificuldade, perdendo Copa América e tendo seríssimos problemas para classificá-lo. Perdemos para Bolívia de 2 a 1 estávamos quase ameaçados de, pela primeira vez, ficar fora da Copa do Mundo, quando finalmente Romário imposto na marra pelas circunstâncias, faz seus dois gols no Maracanã e salva a pele de Parreira, que já estava por um triz..A partir daí a equipe entrava nas partidas de mãos dadas, se uniu em torno de lideranças como Ricardo Rocha, Dunga, Taffarel e Jorginho, e se fechou num projeto até a busca suada daquele título.

Copa de 98: Uma péssima preparação. Dessa vez Zagallo era o treinador e convocou mais de 800 jogadores, não tinha time. Na ultima partida no Maracanã os jogadores foram vaiados pelo péssimo futebol apresentado. Quem não se lembra de “Raí pede pra sair e Cafu vai tomar...”. A desorganização era tamanha que no primeiro jogo da Copa o treinador troca metade do meio campo. Sai Raí e Leonardo e entra Rivaldo e Geovanni. E no segundo jogo? Muda tudo, sai Giovanni e entra Leonardo que fez uma copa muito discreta..No talento absurdo de Rivaldo e no auge do fenômeno fomos chegando até desmoronarmos pra França, num episódio até hoje mal explicado mas que não justifica a desorientação evidente do técnico demonstrada durante quatro anos

Copa de 2002: Talvez a pior preparação da história da seleção brasileira. Entra Leão e só faz bobagem, depois vem Luxemburgo e consegue piorar. Com Felipão fizemos uma péssima eliminatória, perdemos pro Paraguai, pro Equador, fomos goleados pelo Chile.. Na copa das Confederações não ganhamos uma e ainda perdemos para a Austrália (!) A Copa América, então, foi um desastre, goleados pela Bolívia e sofrendo a mais vexatória derrota do Brasil quando perdemos de 2x0 para seleção de Honduras. Eu nunca vi uma seleção brasileira tão bagunçada e sem padrão de jogo. Na Copa do Mundo, mais uma vez no talento absurdo de craques como Rivaldo e Ronaldo, numa conjuntura favorável, com grandes times caindo, com arbitragens generosas, e uma boa dose de sorte, chegamos lá e fomos campeões. Apesar da péssima preparação o treinador teve méritos, sem dúvida, mas os fatos mostram (não sou eu que estou dizendo) que seu trabalho foi inconsistente e teve que contar com outros fatores para conseguir o êxito.

Copa de 2006: Talvez a segunda pior preparação da história da seleção brasileira. O Brasil também não vinha bem nas eliminatórias. Ganha a Copa América num erro de arbitragem e na bomba de Adriano, depois estréia perdendo do México na Copa das Confederações, e empata com Japão (que ainda tem um gol mal anulado) quando, de repente, surge novamente um salvador para Parreira: Perdendo para Alemanha, Adriano (o Romário de 2006), solta duas bombaças e muda o placar. Na final, o Brasil ganha da Argentina na melhor partida da seleção desde a Escócia na Copa de 82. Criou-se ali a ilusão do “quadrado mágico”, que depois iria ainda empatar com a Bolívia e novamente empatar com o time do Sevilla. Resultado: A bagunça generalizada, jogadores obesos, fanfarrões, um time com erros que não eram corrigidos, treinador dormindo LITERALMENTE no banco na hora do jogo, e saímos de forma melancólica.

Esse histórico é apenas para mostrar que o trabalho realizado por Dunga e Jorginho foi da maior competência e que fez a seleção chegar muito bem preparada, como nunca antes, numa copa do mundo. Perdemos o jogo em falhas individuais e não coletivas. Não houve o “queijo suíço” de 82, não houve a displicência de 86 e muito menos a falta de comando de 90 e nem o descaso de 2006. Foram erros individuais de jogadores (Julio César e Juan) que não erraram nunca nesses 4 anos. São humanos, acontece. Fora isso, o time era bom mas não era imbatível e perdeu numa partida de futebol normal e para a Holanda que também era um grande time; bem diferente por exemplo da Argentina que foi esfacelada de 4 pela Alemanha e poderia ter sido de mais...

O título não veio? Ok, mas é bom não esquecermos que em duas ocasiões com a seleção dirigida por aquele que a imprensa considera “mestre”, e que tinha em suas mãos um manancial de craques, ele também não veio.

Outros técnicos ganharam e ele não? Novamente ok, mas não podemos nos esquecer jamais que Copa do Mundo é talvez o local mais propício para as vicissitudes e muitas vezes até o imponderável, que futebol é o esporte onde a justiça e a lógica não andam de mãos dadas. O histórico acima está aí pra provar isso.

A mídia leiga, movida pelo rancor, quer nos fazer crer que Dunga não tinha qualquer valor; agora, como era de se esperar, está execrando ele de todas as formas, se vingando do jeito que pode - até estampar a cabeça dele numa lata de lixo, fizeram, como nunca fizeram com nenhum outro treinador.

Tudo bem, sabíamos que seria assim. Só que agora, meus amigos, não tem jeito, eles criaram uma situação tão absurda de execração humana e super exigência que fará com que o próximo técnico da seleção seja obrigado a manter o bom trabalho de Dunga e Jorginho, o que não será nada fácil.

Pra terminar, é preciso registrar que Dunga e Jorginho, mesmo não tendo ganho essa copa do mundo, são ídolos, tetracampeões, exemplos de caráter, de trabalho sério, bem feito e, acima de tudo, sabem muito de futebol. E assim como hoje cada vez mais e mais pessoas reconhecem o valor da seleção de 94, num futuro breve, inexoravelmente, irão também reconhecer, mesmo com uma ou outra crítica procedente, o bom trabalho feito por essa dupla. O tempo mostrará.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Valeu SELEÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL...

O Brasil caiu de pé. Levamos azar no primeiro gol holandes e dai a casa caiu...mas valeu o exemplo, a garra e a postura desses jogadores que souberam honrar seu país. O resto é satisfação da globo que irá tripudiar o ùnico técnico, depois de João Saldanha, que ousou afrontar o império midiático dessa rede infame...a vida continua e temos eleições chegando....

quinta-feira, 1 de julho de 2010

FIFA, a máfia do futebol.....



A Fifa controla o dinheiro, marca os adversários e dribla a Justiça

Flavia Tavares, de O Estado de S. Paulo

Enquanto o English Team sofria para passar às oitavas contra a Eslovênia, o escocês Andrew Jennings desfiava o sarcasmo adquirido ao longo da vida de repórter investigativo na Inglaterra, na BBC e em grandes jornais. Com a pontaria muito mais calibrada que a dos artilheiros desta Copa do Mundo, o jornalista vai relatando casos de corrupção que apurou para produzir seus três livros sobre o Comitê Olímpico Internacional (COI) e outro sobre a Federação Internacional de Futebol (Fifa) – mesmo sendo o único jornalista do mundo banido das coletivas da entidade desde 2003.

O jornalista inglês Andrew Jennings relata em livro casos de corrupção dentro da FIFA um dos escândalos relatados por ele em 2006, no livro Foul! The Secret World of Fifa (não traduzido no Brasil), teve um desfecho na sexta-feira. Altos dirigentes da organização máxima do futebol receberam propina, admitiu a Justiça suíça. Mas eles não serão punidos porque a lei do país, que é sede da Fifa, permitia o “bicho” na época.

Os figurões pagarão apenas os custos legais e suas identidades não serão reveladas. “É por isso que meu segundo livro sobre o tema será uma comparação da Fifa com o crime organizado”, conta. Ele optou por publicar a obra depois das eleições na entidade, em maio de 2011, embora duvide que alguém vá enfrentar o dono da bola, Joseph Blatter. “Ninguém ousa desafiar a Fifa porque eles controlam o dinheiro. E a imprensa cala”, dispara Jennings.

Em suas investigações sobre a Fifa, o que o senhor descobriu?

A Fifa é comandada por um pequeno grupo de homens – não há mulheres em altos postos da entidade e isso fala por si – que está lá há muitos anos. São homens em quem não devemos confiar e contra quem temos provas contundentes. Eles podem continuar no poder porque controlam o dinheiro. E tornam a vida dos dirigentes das confederações nacionais muito boa e fácil. Fico envergonhado porque ninguém se manifesta contra esse poder.

Como os dirigentes se manifestariam?

Zurique, sede da Fifa, é uma Pyongyang do futebol. O líder fala e os outros agradecem. Numa democracia é esperado que haja discordância, oposição. Na Fifa, não há. Eles têm um congresso a que, ironicamente, chamam de parlamento. São cerca de 600 delegados – acho que são 2 ou 3 por país representado, e são 208 países. Se você chegasse de Marte acharia que o mundo é perfeito, porque todos concordam. É vergonhoso. Nisso, a CBF é tão culpada quanto todas as outras confederações.

Que instrumentos a Fifa usa para manter esse poder?
A Fifa dá cerca de US$ 250 mil por ano para cada país investir em futebol. Na Europa, não precisamos desse dinheiro. A indústria do futebol fatura o suficiente para se alimentar. Mas é uma forma de a Fifa se manter. Esse dinheiro nunca é auditado. Na Suíça, a propina comercial não era ilegal até pouco tempo, apenas o suborno de oficiais do governo. O caso que eu conto no meu livro é justamente sobre um esquema de propinas pagas pela International Sport and Leisure (ISL), empresa que negociava os direitos televisivos e de marketing da Fifa. A história é cheia de detalhes, mas no final a ISL só foi responsabilizada pelo fato de gerenciar mal seus negócios enquanto devia para outras empresas.

Não houve punição?

Como eu disse, o pagamento de propina não era ilegal na Suíça. Portanto, não havia crime a ser punido. As acusações contra a Fifa foram retiradas e a entidade foi multada em 5,5 milhões de francos suíços (cerca de US$ 5 milhões) para custos legais.

Por que os governos não se envolvem ou a Justiça não faz algo?

Porque a sede da Fifa é na Suíça e a lei lá é muito permissiva. Para outros países, é inaceitável que esses homens se safem tão facilmente e que os altos dirigentes riam da nossa cara desse jeito. O que me deixa enojado é que os líderes dos países – o primeiro-ministro britânico, o presidente Lula e todos os outros – façam negócio com essas pessoas. Eles deveriam lhes negar vistos, deveriam dizer que não querem se relacionar com dirigentes tão corruptos. E tenho certeza de que, se os governantes se voltassem contra a corrupção da Fifa, teriam apoio maciço dos torcedores/eleitores.

Por que todos são tão complacentes?

Suponhamos que você seja uma torcedora fanática pelo seu time. Você vai à Copa do Mundo, mas como sempre há escassez de ingressos. Você então compra suas entradas de cambistas, mesmo sabendo que parte desse ágio vai voltar para o bolso da Fifa, já que ela é suspeita de liberar esses ingressos para os ambulantes. Você não pode provar, claro, mas você sabe. As pessoas não são estúpidas. Os governos menos ainda, eles podem investigar o que quiserem. Mas não investigam a Fifa porque os políticos simplesmente ignoram os torcedores. É o que já está acontecendo com a Copa de 2014. Qualquer brasileiro com mais de 10 anos sabe que a corrupção já está instalada. Por que ninguém faz nada?

Por quê?
É difícil saber. Se um país relevante enfrentasse a Fifa ela recuaria. Ou você acha ela excluiria o Brasil de uma Copa? Eles conseguem enganar países pequenos, esquecidos pelo mundo. Mas, se o Brasil dissesse não à corrupção, provavelmente a América Latina se uniria a vocês. E você acha que esses líderes latino-americanos nunca discutiram a possibilidade de um levante, de fazer o que os europeus já deveriam ter feito há tempos? Acho que lhes falta coragem.

O Brasil tentou fazer uma investigação, por meio de uma CPI.

Tentou e foi ao mesmo tempo uma vitória para o país e uma grande decepção, porque pararam de investigar no meio. O povo vai ter de pressionar os políticos a fazer algo. É realmente uma pena que o Brasil tenha chegado tão longe na investigação e tenha desistido no caminho. Havia provas para seguir em frente, para tirar a CBF das mãos do Ricardo Teixeira e, quem sabe, colocar auditores independentes lá dentro. A Justiça também poderia ser mais ativa. Por mais que eles tenham comprado alguns juízes, não compraram todos, certamente.

Sabendo de tudo isso o senhor ainda consegue curtir o futebol, se divertir com ele?

Sim, porque a corrupção não está tão infiltrada nos jogos, embora chegue a essa ponta também. Ela fica mais nos bastidores. Há exceções, como na Copa de 2002, em que a Espanha e a Itália foram roubadas grotescamente. Era importante para a Fifa que a Coreia do Sul passasse adiante. Não foi culpa dos jogadores, mas as razões políticas e econômicas se impuseram. Na Coreia, o beisebol é mais popular do que o futebol. Se eles fossem desclassificados, os estádios se esvaziariam. Neste ano, todos ficaram de olho nos jogos de times africanos. Blatter também precisa de um time do continente nas oitavas. A questão é que, quando assistimos às partidas, assistimos aos atletas, ao esporte, então, é possível confiar. É fácil punir um árbitro corrupto e a maioria não é corrompida.

Então, a corrupção não interfere tanto no esporte?

Cada centavo que os dirigentes tiram ilicitamente da Fifa ou das organizações nacionais é dinheiro que eles tiram do esporte e de investimentos. Portanto, estão desviando de nós, torcedores, e dos atletas que jogam no chão batido em países subdesenvolvidos. Eles tiram dos pobres.

É possível para os jogadores, técnicos e dirigentes se manterem distantes da corrupção no futebol?

Bom, o dinheiro normalmente é tirado do orçamento do marketing, não afeta jogadores e técnicos dos times nacionais. Uma coisa interessante é o comitê de auditoria interna da Fifa. Um dos membros é José Carlos Salim, que foi investigado muitas vezes no Brasil. Por que você acha que ele está lá? Para fingir que não vê.

A corrupção no futebol começa nos clubes e se espalha ou vem de cima para baixo?

Sempre haverá um nível de roubalheira em todas os escalões. Para isso temos leis e, às vezes, conseguimos aplicá-las. Mas a pior corrupção está na liderança mundial. Quase todos os países assinam tratados internacionais anticorrupção, mas não fazem nada quanto aos desmandos da Fifa e do COI. E, quando algum governante tenta ir atrás de dirigentes de futebol corruptos, a Fifa ameaça suspender o país. Só que ela faz isso com os pequenos. Fizeram isso com Antígua! Suspenderam o país minúsculo que ousou processar o dirigente nacional. Ninguém falou nada. Eu escrevi sobre isso porque tenho fãs lá que me avisaram do caso.

O senhor se sente uma voz solitária na imprensa?

Não confio na cobertura esportiva das agências internacionais. Em outras áreas elas são ótimas. Não no esporte. É uma piada. Apresento documentários com denúncias graves sobre a Fifa na BBC, num programa de jornalismo investigativo chamado Panorama, e dias depois a BBC Sport faz um programa inteiro em que Joseph Blatter apresenta alegremente a nova sede da Fifa em Zurique.

O senhor acompanhou a briga do técnico Dunga com a imprensa brasileira?

Não vou comentar o episódio porque não acompanhei de perto. Posso dizer que a imprensa inglesa e a da maioria dos países é puxa-saco. E sem razão para isso. A desculpa é que os editores têm medo de perder o acesso às seleções e à Fifa. Bobagem. Ora, eu fui banido das coletivas da Fifa sete anos atrás e ainda consegui escrever um livro e fazer várias reportagens. A imprensa deve atribuir as responsabilidades às autoridades. Se não fizer isso, é relações públicas. Tenho milhares de documentos internos da Fifa que fontes me mandam e não param de chegar. Por que só eu faço isso?

A cobertura se concentra mais no evento esportivo em si e nas negociações de jogadores?

Exato, também porque a chefia das redações tende a se concentrar nos assuntos de política nacional, internacional e na economia e deixar o esporte em segundo plano.

O que o senhor espera da Copa no Brasil, em 2014?

Há algumas semanas, o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, deu um piti público cobrando o governo brasileiro para que acelerasse as construções para a Copa. Estranhei muito, porque não imagino que o governo brasileiro se recusaria a financiar uma Copa. Vocês são loucos por futebol, estão desenvolvendo sua economia, têm recursos e podem achar dinheiro para isso. Uma fonte havia me dito que Valcke e Ricardo Teixeira tinham tirado férias juntos, estavam de bem. Então, o que está por trás dessa gritaria? É pressão para o governo brasileiro colocar mais dinheiro público nas mãos da CBF. Mundialmente, as empreiteiras têm envolvimento com corrupção. Dá para sentir o cheiro daqui.

Três de seus livros são sobre as Olimpíadas. As falcatruas acontecem em qualquer esporte ou são predominantes no futebol?

Sou cuidadoso ao falar disso. Sei que a liderança da Fifa é muito corrupta – e venho publicando isso há mais de dez anos sem que eles tenham me processado nem uma vez sequer, o que diz muito. O COI era muito pior sob o comando de Juan Antonio Samaranch (morto em abril deste ano), que presidiu a entidade de 1980 a 2001. Ele era um fascista e o fascismo é, além de tudo, uma pirâmide de corrupção. Samaranch trabalhou ao lado do generalíssimo Franco. Essa cultura franquista e fascista se transformou em uma cultura gângster.

A corrupção no COI diminuiu com a saída de Samaranch?

Vou ilustrar com uma história. No meu site publiquei uma foto de Blatter cumprimentando um mafioso russo, em 2006, em um encontro com dirigentes do país. O russo foi quem fez o esquema em Salt Lake, na Olimpíada de Inverno de 2002, para que os conterrâneos ganhassem o ouro em patinação artística. Pois bem, Blatter, Havelange e muitos outros da Fifa são parte do comitê do COI. Essa é a dica de como a Rússia está agindo para sediar a Copa de 2018.

Foi assim que o Brasil conseguiu a Copa de 2014 e a Olimpíada de 2016?

Na votação em Copenhague, que deu a sede olímpica para o Rio de Janeiro, o nível de investigação jornalística foi ridículo, só víamos a praia de Copacabana com o povo feliz. Há um grupo no COI que já foi denunciado por receber propina no escândalo da ISL – e quem acompanha a entidade sabe quem eles são. Os dirigentes dos países só precisam pagar umas seis ou sete pessoas para conseguir o voto. Existe, com certeza, uma sobreposição entre os métodos da Fifa e do COI. Mas a cultura das duas entidades não é tão estrita quanto à de uma máfia, é mais como se fossem máfias associadas, apoiadas umas nas outras. Coca-Cola, redes de fast-food, Adidas, você acha que essas companhias não sabem o que está acontecendo? Eles não são estúpidos. A cara de pau é tamanha que Jacques Rogue, presidente do COI, disse em Turim, em 2006, que o COI e o McDonald’s compartilham os mesmos ideais. Será que ele não sabe quanto a obesidade infantil é um problema gravíssimo em vários países? Ou faz parte do jogo ceder a esses interesses?

sábado, 9 de janeiro de 2010

O futebol e a barbarie...


Por Rafael Pirrho, em Joanesburgo

Antes que se coloque tudo no mesmo saco, é preciso dizer que o ataque à delegação de Togo, em Angola, não tem chance de se repetir na Copa do Mundo. A África do Sul possui um leque de problemas sérios, incluindo a violência urbana, mas entre eles não estão grupos terroristas ou separatistas. Além disso, aqui há mais estrutura e experiência em grandes eventos, ao contrário de Angola.
O problema é explicar isso àqueles que já se acostumaram a ver os 53 países africanos como um só. Se há crise em um deles, é comum que todos recebam o mesmo rótulo. Por isso, não há como negar que, embora esta seja uma análise equivocada, o que aconteceu em Angola respinga na Copa da África do Sul.

Mas a barbárie mancha, sobretudo, a imagem de crescimento que Angola tenta construir. O país é, ao lado da Nigéria, o maior exportador de petróleo da África, mas engatinha em questões básicas como segurança e infraestrutura. Tem grandes riquezas naturais, mas ainda sofre para controlar seu próprio território.
Cabinda, local do atentado contra a seleção togolesa, é uma reunião de todas essas características. De lá saem cerca de 80% da larga exportação de petróleo angolano, mas, por isso mesmo, esta é uma região instável, repleta de interesses econômicos. Ao colocar a cidade (homônima da província) como sede da Copa Africana, Angola queria mostrar que a situação por lá estava sob controle. Apostou alto e perdeu.
Perderam também os milhões de angolanos que esperavam com ansiedade por esta Copa Africana. Nas últimas semanas, uma enxurrada de propagandas na TV mostravam como o país já respirava o torneio. Angola convidou Pelé e Eusébio, festejou as presenças de Drogba e Eto’o, sonhou com um inédito título continental, mas acabou atingida em cheio pelos tiros em Cabinda. Os terroristas conseguiram acertar o alvo ao exporem ao mundo as fragilidades do país.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Misérias e glórias do xadrez

Misérias e glórias do xadrez

Esta parte do artigo analisa matches e esquivas do predecessor de Garry Kasparov na primeira demonstração da convivência entre “ser um ás no xadrez e um cretino em outros campos da vida”: o campeão mundial Alexander Alekhine

CARLOS LOPES

Algum sujeito de espírito, parece que Miguel de Unamuno, disse que “o xadrez é um excelente exercício para melhorar a capacidade de jogar xadrez”. Nada pode ser acrescentado a esse raciocínio, exceto que também é válido para o salto com vara ou para a porrinha. A diferença é, apenas, a de que ninguém jamais pretendeu que as pessoas ficassem – ou fossem - mais inteligentes por saltar com vara ou apostar uns cobres nos palitinhos. Já o xadrez...

As pessoas que jogam xadrez não o fazem porque são mais inteligentes ou para ficar mais inteligentes. Jogam porque gostam de jogar xadrez. Como conseqüência, é possível ser um ás do xadrez e, ao mesmo tempo, ser um cretino em outros campos da vida. Muito antes de Kasparov, Alexander Alekhine foi a primeira demonstração dessa estranha convivência – estranha apenas em função das fantasias que cercam o jogo.

Nascido numa família muito rica, filho de um latifundiário czarista e da herdeira de um império industrial, Alekhine saiu da Rússia em 1921. Já era, então, famoso como jogador. Apesar de um incidente na Ucrânia, em que foi preso como espião contra-revolucionário (era a época da guerra civil), as autoridades soviéticas o liberaram para disputar o campeonato de Moscou (janeiro de 1920) e a Olimpíada de Xadrez de Todas as Rússias (outubro do mesmo ano) - que seria considerada como o I Campeonato da URSS, quando esta foi organizada, em 1922. Ele venceu os dois torneios. Porém, mais do que a oportunidade de jogar xadrez, os soviéticos ofereceram-lhe emprego como tradutor na Internacional Comunista e o nomearam secretário do Departamento de Educação Comunista.

No entanto, logo em seguida, ele preferiu juntar-se àquela malta de foragidos russos que se reunia em Paris. Naturalizou-se francês e até freqüentou a Sorbonne, supostamente para formar-se em Direito com uma tese sobre o sistema penitenciário chinês - as atuais instâncias de pós-graduação ainda não existiam, mas a embromação acadêmica já tinha, há muito, feito a sua estréia. A tese não foi aprovada, até porque ele jamais chegou a elaborá-la - o que não o impediu de intitular-se “Dr. Alekhine” para o resto da vida.

Mas, foi antes de sair da Rússia que ele começou a série de casamentos com senhoras algo alucinadas, em geral tão decrépitas quanto endinheiradas, a que se refere Hans Kmoch em “Grandes Mestres Que Eu Conheci”.

Amigo de Alekhine por longos anos, seu “segundo” (analista para partidas adiadas) durante o match de 1934 pelo campeonato mundial, e árbitro do match seguinte, Kmoch rompeu com o então campeão mundial durante a II Guerra, quando vivia com a esposa na Holanda invadida pelos nazistas. Foi então que um jornal alemão editado no país ocupado publicou um artigo de Alekhine intitulado “Xadrez ariano e xadrez judaico”. Referindo-se à sua derrota no match de 1935, dizia: “O árbitro Kmoch é casado com uma judia, logo qualquer um pode imaginar como ele era objetivo”.

Com efeito, a esposa de Kmoch, Trudy, era judia – e não é preciso dizer muito mais: “Sob o olho vigilante da Gestapo, tais declarações podiam significar a morte (....). Minha mulher e eu já estávamos em constante medo de que ela pudesse ser deportada. A acusação de Alekhine foi aterrorizante”, escreveu, depois, Kmoch. Acrescente-se que este último, austríaco, era “cidadão do Reich”, ou seja, após a anexação da Áustria, estava sujeito às leis raciais da Alemanha, em que o casamento com uma judia era crime punível, inclusive, com a morte.

A necessidade de relembrar o rol de canalhices perpetradas por Alekhine durante a guerra – em que também ele era oficialmente cidadão de um país ocupado, a França – reside em que hoje apareceram vários apologistas a relevar essa conduta indecente. A última versão é a de que “não foi provado” que Alekhine escreveu os artigos que apareceram com a sua assinatura nos jornais nazistas. Isso é exatamente o que não precisa de prova. Se ele apenas os assinou, pior. E, se esses artigos não existissem, sobrariam os seus alegres retratos em torneios nazistas, no momento em que uma série de grandes jogadores recusavam-se a participar dessas promoções nos países ocupados e, sobretudo, sua longa estadia como hóspede do “governador-geral” da Polônia, SS-Obergrup-penführer (general das SS) Hans Frank, executado em Nuremberg por crimes contra a Humanidade.

Porém, sobre os apologistas de Alekhine, bastam alguns trechos do relato de Kmoch - escrito pouco antes de sua morte, em 1973 - que reproduzimos aqui porque “Grandes Mestres Que Eu Conheci” não foi publicado em livro (há uma tradução em inglês, “Grandmasters I Have Known”, nos arquivos da revista eletrônica “ChessCafe.com”):

“Algum tempo atrás, escrevi um artigo sobre Alekhine. Já que ele era um contemporâneo meu que eu havia conhecido bem por muitos anos, senti que poderia evitar a costumeira apresentação dele como um grande gênio do xadrez e modelo de virtude. Ao invés disso, escrevi sobre sua personalidade e sobre minhas próprias experiências com ele, o que significava mostrá-lo, entre outras coisas, como um alcoólatra, um oportunista político e um anti-semita no estilo nazista.

“Quando meu artigo apareceu na Deutsche Schachzei-tung, uma revista sobre xadrez de Berlim, enfrentei considerável menosprezo por parte de alguns ardorosos arianos. Um professor alemão insistiu que nunca tinha visto Alekhine bêbado e que, portanto, Alekhine não podia ter sido um alcoólatra. Outro professor alemão explicou tudo apontando a minha própria inferioridade. Um homem que em Viena costumava pertencer somente a clubes arianos de xadrez, condenou meu artigo como irreconciliável com o fato de que eu uma vez fora segundo de Alekhine.

“Muito mais tarde, alguns nobres especialistas em cobrir de cal a realidade, gente da mesma categoria dos professores alemães acima mencionados, explicaram que Alekhine foi forçado a escrever aqueles infames artigos. Mas isso é simplesmente uma variante da história do bêbado que borrou as calças e depois queria saber quem era o culpado”.

Porém, em 1927, quando se tornou campeão, a consciência geral ainda era a de que os nazistas não passavam de alguns palhaços. Somente quando lhe pareceu que os nazistas iriam ganhar a guerra, é que Alekhine começou publicamente a bajulá-los. Antes, tomou bastante cuidado, inclusive para que os soviéticos não o vissem como um inimigo, apesar de sua condição de emigrado da Rússia.

A explicação é que nenhum outro país contava com tanta simpatia nos meios enxadrísticos quanto a URSS. Esta, aliás, havia sido governada por um enxadrista, Lenin, e era agora dirigida por outro, Stalin, ambos conhecidos como fortes jogadores. Quando o grande Lasker foi obrigado, após a tomada do poder por Hitler, a sair da Alemanha, preferiu Moscou como local de moradia, em vez de Londres, onde havia, a princípio, se asilado. Posteriormente, foi encontrar-se com seu amigo Albert Einstein, nos EUA.

A FUGA

O primeiro problema de Alekhine, depois de ganhar o título mundial, foi o mesmo de antes: José Raul Capablanca. Por acordo mútuo, havia sido acertado que haveria um match-revanche. Alekhine rompeu o compromisso - e é impressionante a energia que investiu para fugir a um novo confronto.

Não era apenas uma fuga do match-revanche. Alekhine fugiu de qualquer enfrentamento, mesmo em torneios, com Capablanca. Numa atitude que só seria vista muitas décadas depois, exigiu, em certas ocasiões, que a inscrição de Capablanca não fosse aceita, como condição para sua participação em torneios - tal como Kasparov faria com o GM Valery Salov, é verdade que, nesse último caso, por razões políticas, e de forma mais covarde, pois Salov não era Capablanca, e, em meio à queda da URSS, tinha a mídia contra ele.

O outro método de Alekhine, ao saber que Capablanca seria um dos participantes de um torneio em que já estava inscrito, era, na última hora, fazer exigências financeiras extorsivas, a serem cumpridas em prazo exíguo (v. p. ex., sua carta de 19/05/1932 a um dos organizadores do Torneio de Pasadena, Califórnia).

Quando do falecimento de Capablanca, em 1942, Alekhine diria que “morreu o maior jogador de todos os tempos, um gênio como nunca se verá novamente”. Próximo da própria morte solitária em Portugal, deixou escapar: “Não entendo, nem agora depois de tantos anos, como consegui ganhar de Capablanca no match de 1927”.

Em suma, Alekhine queria manter o título contra alguém que tinha certeza de que era melhor do que ele. Há quem não concorde com esta avaliação sobre Capablanca. Mas esta era a avaliação de Alekhine. Conta Reuben Fine que, no início dos anos 30, Capablanca mostrou a ele a montanha de correspondência mantida com Alekhine e/ou seus representantes, com o objetivo de realizar um novo match. Tudo perfeitamente inútil. Alekhine estava fugindo de jogar uma simples partida, quanto mais um match.

No entanto, em 1936, Alekhine não conseguiu evitar o confronto com Capablanca. Era um dos torneios mais importantes do mundo, o de Nottingham, Inglaterra, e Alekhine estava com o prestígio abalado, por sua derrota contra Euwe no ano anterior – somente no ano seguinte ele recuperaria o título mundial, precisamente, num match-revanche. Assim, aceitou participar de Nottingham, mesmo sabendo que Capablanca estaria lá.

A partida foi especialmente tensa. Os jogadores evitaram sentar-se um em frente ao outro – faziam sua jogada e depois iam andar pelo salão, esperando a resposta do oponente. Alekhine ficou em posição superior. E foi então que o talento estratégico de Capablanca se impôs sobre o jogo eminentemente tático de Alekhine. Entre os que analisaram a partida, somente o velho Lasker – aos 68 anos – percebeu a sutileza. Eis o relato de Capablanca:

“Durante o transcurso da partida, meu contrário adquiriu uma magnífica posição, e, em um determinado momento, viu que mediante uma pequena manobra podia ganhar a qualidade [“ganhar a qualidade” = trocar um bispo ou cavalo, peças menores, por uma torre, peça maior]. Atirou-se e ganhou a qualidade, mas depois perdeu a partida. Muitos dos mestres mais fortes ali presentes puseram-se a estudá-la. Todos partiam do momento em que começava a manobra para ganhar a qualidade. Todos afirmavam que a manobra era correta, e buscavam o erro em algo posterior. Assim estiveram por muito tempo, e nisso chegou Lasker. Colocaram-no a par do resultado e lhe mostraram a posição; mas logo que começaram a demonstrar-lhe a manobra para ganhar a qualidade, ele interrompeu e disse: ‘Não, isso nunca’. O velho mestre havia percebido o que os outros não haviam visto: que ganhar a qualidade era um erro, e que meu contrário não somente perdia a vantagem que lhe dava sua magnífica posição, mas que, com qualidade e tudo, tinha uma posição perdida. Havia percebido que a combinação não havia sido feita pelo meu contrário, mas por mim, ao permitir-lhe ganhar a qualidade. Assim, disse: ‘Você, sem dúvida, respirou aliviado quando viu que seu adversário mordeu o anzol’. (....) A verdade é que Lasker foi o único alí presente que se deu conta do verdadeiro valor daquela posição, assim como das possibilidades que ela continha” (transcrito de “Ultimas Lecciones”, pela revista Ajedrez en Cuba, Vol. II-16, nº 26, set./1998).

Há algo inteiramente fora do comum neste texto: Capablanca, que sempre se mostrou amistoso com os oponentes, inclusive nas análises dos jogos que ganhou deles, nesse caso não cita o seu nome. Nem mesmo o chama de “oponente”, em geral o termo que os enxadristas preferem para designar seus adversários. Até mesmo esta última palavra é usada, no texto, somente por Lasker. Capablanca prefere chamá-lo de “meu contrário”. O que Alekhine, sob vários aspectos, e essencialmente, era.


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quarta-feira, 5 de agosto de 2009

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Xadrez, a ginástica dos neurônios...

Vacilo não tem vez

Democrática e de fácil acesso, a prática do xadrez ajuda a desenvolver a concentração, o raciocínio lógico, a imaginação e o potencial de aprendizad.

Por: Ricardo Criez - RedeBrasilAtual


Vacilo não tem vez

Despreocupada, Nathalia se diverte (fotos: Gerardo Lazzari)

A molecada corre de um lado para o outro para se distrair e driblar o friozinho da tarde de outono. O ruído e o clima dão ares de gincana aos intervalos de cada rodada. Os competidores e o público sentem-se num parque de diversões. Nem parecem estar num ambiente – um dos ginásios do complexo poliesportivo do Ibirapuera, em São Paulo – em que os protagonistas jogam emocionantes partidas de... xadrez. Trata-se da 6ª Copa Ayrton Senna de Xadrez Escolar, realizada sempre em junho pela Federação Paulista de Xadrez. Lucas Tavares Lira, de 8 anos, integrante de um grupo de 30 alunos de uma escola de Santos, considera o jogo “muito bom para a cabeça”. “Ele era muito inquieto, melhorou 100% depois que passou a jogar”, diz a mãe, Juliana Castro Tavares Lira, que sempre o acompanha nas competições.

Horácio
Horácio: incentivo
Marcio
Marcio: cada erro pode ser fatal

Nos últimos anos tem crescido o ensino de xadrez nas escolas públicas e privadas. Há projetos por todo o país, em iniciativas dos governos ou de clubes, entidades e federações. E há também o trabalho de formiguinha de voluntários e educadores dos mais variados campos do conhecimento (professores de educação física, ciências, matemática, história, português etc.), que perceberam como o xadrez pode ser uma poderosa ferramenta no processo de aprendizagem de um aluno.

“Batemos o recorde de inscritos”, disse Horácio Prol Medeiros, presidente da federação, sobre o evento de proporções gigantescas para os padrões do xadrez. Mais de 60 pessoas trabalharam na infraestrutura para acomodar 1.782 enxadristas de 210 cidades de todo o estado. “A ideia do xadrez escolar é exatamente incentivar aquelas crianças que ainda não participaram de competições oficiais”, explicou o dirigente.

Entre os alunos, ganhar era a última preocupação. “É divertido estar aqui”, disse Nathalia Soares Costa, de 8 anos, de uma escola particular paulistana, que venceu duas das quatro partidas que disputou. Ela garante que não fica chateada quando perde: “Quero continuar jogando e ganhar um troféu”.

Jogo e vida

Um dos motivos que levam professores a apostar no ensino do xadrez na escola é o fato de se poder traçar um paralelo entre o que ocorre no mágico tabuleiro quadricular de 64 casas e as situações do cotidiano. “Cada lance executado no tabuleiro corresponde a um efeito na partida, assim também são os próprios atos da vida”, destaca o Grande Mestre Internacional (GMI) Gilberto Milos Júnior, que chegou a ser número 34 no ranking mundial. O estudante Marcio Luiz da Costa Correia, de 13 anos, já compartilha esse pensamento. “É preciso pensar muito bem, um erro pode ser fatal”, diz o jovem aluno de uma escola de Santos.

Para Milos, atual número 4 do ranking brasileiro, o xadrez ajuda em primeiro lugar a organizar o raciocínio e administrar o tempo. Embora não tenham ido tão bem no torneio para iniciantes organizado pela FPX, os amigos Patrick Lanchotti e Renan Vianna Cardoso, ambos de 17 anos, estudantes da rede pública, procuram praticar esse pensamento. “O xadrez estimula o raciocínio lógico, a disciplina, a responsabilidade”, acredita Renan.

É senso comum entre os estudiosos e especialistas da arte da Caissa, a deusa mitológica dos tabuleiros, que a prática do jogo faz bem para o desenvolvimento de habilidades como atenção, concentração, raciocínio lógico, memória, organização de ideias, imaginação, antecipação, espírito de decisão, autocontrole, disciplina e perseverança. E até para a autoestima, a competição ética e o trabalho em equipe.

Livros
  • Xadrez Básico, de Orfeu D’Agostini
  • Xadrez para Todos, de James Mann de Toledo e Juliana Kyoko Kamada
  • Estratégia Moderna de Xadrez, de Ludek Pachman
Sites
Jogos on-line
  • O ICC é o maior clube de xadrez virtual do mundo. Pode-se acessá-lo sem gastar nada ou se cadastrar e pagar uma pequena anuidade.
  • Gratuito, o espanhol EducaRed também é muito bom.
Ouça
  • Brancas e Pretas, de Paulinho da Viola e Sérgio Natureza (Do álbum A Toda Hora Rola uma História, de 1982).

Para Antonio Villar Marques de Sá, professor da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília, o xadrez, por ser um jogo complexo, é uma das melhores atividades para desenvolver a capacidade intelectual dos jovens. Villar aponta o xadrez como uma atividade socializadora, que pode ser trabalhada com pessoas de todas as classes sociais, de qualquer idade ou sexo, e também por pessoas com deficiências.

A tenacidade e a disciplina de Margareth Giorghe são bons exemplos para os mais jovens. Ela aprendeu a jogar com o pai, na Áustria, mas só passou a praticar efetivamente após os 30 anos, quando veio para o Brasil. E não parou mais.

Aos 90 anos, segue disputando competições em São Bernardo do Campo em ótimo nível. “É uma ginástica para a mente”, garante ela, que joga até consigo mesma, em casa. Margareth já disputou finais de Campeo­nato Brasileiro, além de ter conquistado títulos municipais, regionais e estaduais. “Eu não teria chegado a essa idade, com essa lucidez, sem a prática diária do xadrez.”

“Assim como os demais esportes, o xadrez também funciona como um fator de inclusão social”, aponta o Mestre Internacional (MI) James Mann de Toledo, que trabalha há 25 anos como professor de xadrez e já formou vários campeões brasileiros de categorias menores. “E tem uma grande vantagem em relação às demais modalidades: é mais barato e precisa de pouca gente para ser praticado.”

O educador Mário Cardozo ajudou a disseminar o jogo nas escolas públicas de Belém e em instituições que cuidam de menores infratores na capital paraense, com bons resultados de inclusão. No ano passado, levou a modalidade para a aldeia indígena dos Tembé, na pequena cidade de Capitão Poço, a mais de 300 quilômetros de Belém. Atualmente todos jogam o “jogo dos reis” na tribo, onde já é possível mensurar uma verdadeira revolução: a soma de todas as médias de 5ª a 8ª série do ensino fundamental passou de 5,9 para 7,2 de um ano para o outro.

Famosos

A história é repleta de pessoas famosas em outras áreas da humanidade que se aventuraram no tabuleiro. Napoleão Bonaparte, um dos maiores estrategistas militares da história, foi um grande entusiasta do xadrez. Na corte, seu adversário mais constante era o general Michel Ney, seu mais brilhante estrategista, que sempre levava a melhor contra o “terrível corso”.

Por uma questão cultural e climática, o xadrez está para a Rússia assim como o futebol para o Brasil. Para ter uma ideia dessa distância quilométrica, há 170 GMI russos no mundo, ante 17 argentinos e apenas 8 brasileiros. Lenin, um fascinado pelo jogo, chegou a dizer que teve de optar “entre o xadrez e a revolução”.

Che Guevara e Fidel Castro também praticavam o jogo, inclusive na Sierra Maestra, antes da tomada de Havana. Che era reconhecidamente um jogador mais forte, tendo inclusive empatado em 1962 com o GMI argentino Miguel Najdorf, numa partida na qual o grande mestre teria sido muito “camarada”.

Albert Einstein, um dos maiores gênios do século 20, não cansava de massacrar Julius Robert Oppenheimer, o cabeça do Projeto Manhattan, que resultou na fabricação da primeira bomba atômica. Einstein também era muito amigo do campeão mundial e matemático alemão Emmanuel Lasker, a quem sempre pedia para “deixar esse jogo das pedrinhas para enfrentar, com ele, alguns problemas de matemática e física”.

O compositor ucraniano Sergey Prokofiev, autor de Concerto para Piano nº 3 e do balé Romeu e Julieta, era um enxadrista da maior categoria e obteve até uma fantástica vitória, em 1914, sobre o cubano José Raúl Capablanca, que posteriormente viria a ser campeão mundial.

Índia ou China

Há várias lendas sobre a origem do xadrez. Uma das histórias mais conhecidas – e que encontra suporte em fontes arqueo­lógicas – menciona o sábio Sissa. Ele era um brâmane que viveu no noroeste da Índia entre os anos 600 e 700 e foi incumbido pelo rajá Bahlait de inventar um jogo que embutisse valores éticos e morais, como a prudência, a determinação e a coragem. Sissa, então, criou o chaturanga, o “exército formado por quatro membros”, precursor do atual xadrez.

O rajá gostou e fez questão de presentea­r o sábio com qualquer coisa que ele solicitasse. Sissa pediu como recompensa um grão de trigo pela primeira casa do tabuleiro, dois pela segunda, quatro pela terceira, oito pela quarta e, assim, sucessiva e exponencialmente até a 64ª casa. Mal sabia Bahlait que nem mesmo uma camada de trigo de três metros de espessura que cobrisse todo o planeta seria capaz de pagar pelos serviços do sábio!

Da Índia, o chaturanga teria ido para a Pérsia (atual Irã) e se disseminado pelo mundo por meio da cultura árabe e da influência política e geográfica da nova força do Islã, a partir do século 7. A Europa sofreu grande influência, em particular com a invasão direta da Espanha pelos muçulmanos. Após a expulsão dos mouros, os europeus apropriaram-se da cultura árabe, alteraram as regras e criaram o xadrez moderno.

Estudos recentes, contudo, indicam que o xadrez poderia ser muito anterior ao chaturanga. Em 1985, o americano Sam Sloan­ escreveu um longo artigo intitulado “A origem do xadrez”, no qual cita fontes e documentos segundo os quais o jogo teria surgido na China, no século 3 a.C., e só posteriormente migrado para a Índia.

Lances inocentes
Laurence Fishburne e Max Pomeranc em Lances Inocentes

O tabuleiro no cinema
No cinema, uma das partidas mais famosas foi disputada entre o astronauta Frank Poole e o computador Hal 9000 no filme 2001: Uma Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick (1968), durante uma viagem entre a Terra e Júpiter. Poole utilizou como jogada uma variante inferior da Abertura Ruy López e facilitou o trabalho do computador, que ainda não tinha a velocidade e o cálculo destrutivo dos microprocessadores de hoje. Mas o melhor filme sobre xadrez já realizado chama-se Lances Inocentes – Procurando por Bobby Fischer (1993), de Steven Zaillian. Com estrelas como Ben Kingsley, Laurence Fishburne e Joe Mantegna no elenco, retrata bem o universo do jogo, do aprendizado ou da competição, e é uma ótima lição de vida para pais, professores e alunos.