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segunda-feira, 13 de maio de 2013

A armadilha fenícia




Heródoto, ao relembrar suas conversas com os anciões de Tiro, uma das capitais da antiga fenícia, assegurou a seu público que os comerciantes que ocupavam a atual costa libanesa haviam chegado naquela parte do mundo 28 séculos antes de Cristo. Teriam migrado das praias do mar vermelho, na península arábica, em direção ao Mediterrâneo, assim como fizeram diversas tribos árabes. Conhecido pelos livros escolares como o Pai da Historia, o autor grego é visto no Líbano de forma um pouco mais peculiar. Aqui ele é tido por muitos como um desonesto disseminador de boatos, inimigo do estado e da sociedade. Não são poucos os libaneses que odeiam serem associados aos árabes que os cercam.
Apesar do desgosto, mais uma vez o destino do Líbano parece estar sendo decidido na cidade orgulhosamente árabe de Damasco. Os recentes bombardeios de Israel à capital síria reforçam tal fato. Tentando desassociar seu país da guerra civil ao norte, Tel Aviv foi categórico no comentário: Nosso ataque não tem nada a ver com as tentativas de derrubar o ditador Bashar Al-Assad, estávamos apenas atacando armas iranianas de última geração que se dirigiam ao Líbano.
A ofensiva aérea israelense, que pode muito bem jogar Líbano, Síria e Israel em mais uma guerra, parece possuir uma complexidade maior do que apenas um bombardeio a mercadorias importadas do Hezbollah, grupo amado Libanês que a décadas disputa a hegemonia do sul de seu país com o estado sionista. Israel anuncia a tempos que pretende impedir qualquer forma os envios de armas da Síria ao grupo fundamentalista xiita, porem a dinâmica dos ataques não se encaixam muito bem nesta narrativa. Se os alvos eram misseis do Hezbollah, porque foram atacadas também bases da Guarda Republicana Síria? Alem do mais, é crível que o governo do Baath, em meio a uma guerra de vida ou morte contra seus oponentes armados, enviaria o supra sumo de seu arsenal para o vizinho?
Enquanto tais perguntas seguem sem respostas, os milicianos do Hezbollah parecem estar se engajando cada vez mais na defesa incondicional do governo de Bashar. Adepto de um dos expoentes da religião xiita (o Alawismo) e aliado prioritário do Irã, que por acaso também é patrono do grupo libanês, a possível queda do regime da família Assad tem sido tratado pelo Hezbollah como uma derrota inaceitável. Já são centenas os mártires do grupo nas batalhas das cidades Sírias próximas ao Líbano, onde o governo de Damasco parece ter terceirizado a seus aliados libaneses a luta contra os insurgentes. A guerra prioritária do Hezbollah parece ser a guerra pela sobrevivência de Assad, o que, pela lógica, faria a guerra central de Israel ser a guerra pela derrubada do regime sírio.
Tal raciocínio teria todo sentido se Israel não estivesse mobilizando seus diplomatas pelo mundo em uma campanha contra o armamento dos rebeldes na Síria. Segundo a perspectiva israelense, apesar dos amigos inconvenientes no Líbano, o regime Assad é um companheiro de respeito quando o tema é garantir paz e tranquilidade nas colinas de Golan, território sírio ocupado por Israel a mais de quatro décadas. Dizem as mas línguas que os revolucionários da Síria, baderneiros pela própria natureza, não dariam tranquilidade ao estado sionista uma vez que houvessem derrubado o governo de Damasco.
Zona livre
Segundo o Major-General Yair Golan, chefe do Comando Norte de Israel, a resposta para tal ameaça é simples, cabe a Tel Aviv “criar uma zona militar no lado de lá da fronteira”; invadir o sul da Síria para impedir qualquer rebelde intruso de chegar perto aos territórios que o General chefia. Para o mesmo, o modelo seria a zona tampão criada por Israel entre 1985 e 2000 no sul do Líbano. Curiosamente, foi a partir da luta contra aquela mesma zona que o Hezbollah tornou-se uma potencia regional.
Os bombardeios de Israel a Damasco podem ter tido como objetivo abrir o terreno para uma futura ocupação militar voltada a conter a insurreição. Mais o oposto também pode ser verdadeiro, sendo o ataque uma ajuda a luta dos rebeldes contra o regime de Bashar, ou ainda, apenas um bombardeio ao Hezbollah, sem relação alguma com o levante sírio. Talvez o mais correto seja uma equação que envolva as três hipóteses ao mesmo tempo. A única certeza é que um envolvimento maior de Israel na guerra, segundo o próprio Hezbollah, levaria a milícia libanesa a assumir uma política ainda mais intervencionista no país vizinho.
Pelo menos foi assim que anunciou Hassan Nassarallah, dirigente máximo do grupo libanês, no seu canal de televisão. Segundo Nasserallah, talvez o único dirigente da região conhecido por cumprir suas ameaças publicas, o Hezbollah é um “amigo de verdade” do povo sírio, e por os ter como tanta estima, não os deixarão sair de seu rumo atual.
Persona non grata
As declarações de carinho do Hezbollah aos sírios, porem, parecem ter pouco eco nas cidades e bairros dirigidos pelo grupo no Líbano. São cada vez mais frequentes os ataques a refugiados do país vizinho nos territórios controlados pela milícia. Entre os ativistas exilados que continuam tentando apoiar a revolução que ocorre em seu país natal, as áreas do Hezbollah tornaram-se praticamente zonas proibidas.
A maioria destes jovens, por motivos de segurança, tem buscado refúgio nos bairros cristãos controlados pelas milícias da Falange, um dos principais grupos fascistas que controlam pedaços de Beirute. Inspirada na juventude nazista após a viagem de seu fundador às Olimpíadas de 1936 em Munich, a Falange é mundialmente conhecida por ter executado, em conjunto com Israel, os massacres aos refugiados palestinos dos campos de Shabra e Chatila. Arautos do caráter fenício de seu povo e adversários históricos do governo “árabe” da Síria, os falangistas têm sediado (mesmo que com pouco entusiasmo) os ativistas sírios em suas zonas. Apesar dos esforços, até os mais isolacionistas dos libaneses não conseguem se desmembrar dos acontecimentos no país vizinho.
Já nos bairros controlados pelo Partido Nacionalista Socialista Sírio, cuja bandeira carrega uma versão estilizada da suástica em seu centro, os sírios que não gostam de Bashar são classificados como persona non grata. Defensores de teses heterodoxas, entre as quais a ilha de Chipre integraria uma suposta “Grande Síria” histórica que eles próprios sonham em dirigir, os Nacionalistas Socialistas conseguem ser mais barulhentos que o Hezbollah na defesa do governo de Damasco. No mosaico político de Beirute, onde diferentes milícias disputam milímetro por milímetro as ruas da capital, a sensação de uma guerra iminente a tempos não latejava com tanta força.
Mais uma vez, os refugiados
Talvez o que mais reforça esta ideia é a onda de refugiados sírios que tem-se abrigado no país durante os últimos dois anos. Segundo dados oficiais do Alto Comissariado da ONU, são mais de 450 mil refugiados cadastrados. Os números extra-oficiais falam em mais de um milhão.
Não são poucos os libaneses que tem alertado aos paralelos entre a onda de refugiados palestinos ao país, que supostamente empurrou-o a guerra civil entre 1975 a 1990, e a atual maré Síria. Em um país fraturado de apenas 4 milhões de habitantes, o influxo massivo dos sírios está desequilibrando a correlação de forças interna entre as facções do país. A solução apresentada a tal problema pelo governo libanês foi bastante simples. Está proibido no Líbano a construção de campos para os que fogem às barbáries da guerra. A ideia é deixar claro aos refugiados que eles não são bem-vindos.
A forma encontrada pelo governo para expressar tal sentimento, porém, tem somente empurrado os sírios para debaixo do tapete. A falta de tendas da ONU apenas os espreme nas cidades, onde grupos de famílias inteiras alugam poucos metros quadrados dos cômodos disponíveis. Há casos de famílias de refugiados que foram morar em prisões abandonadas, estábulos ou qualquer coisa que os possa proteger do frio e da chuva.
Para além do descaso governamental, estes refugiados lidam não só com o ambiente hostil da sociedade libanesa, pouco simpática a seus vizinhos, como também aos ataques físicos dos agrupamentos políticos que precisam assassinar sírios para se reafirmarem socialmente.
Um país inviável
Ataques a civis da Síria no Líbano, verdade seja dita, esta longe de ser uma nova realidade. No período anterior à revolução, o espancamento ou assassinato de grupos de trabalhadores migrantes, até então restritos as zonas cristãs, eram notícia comum. A novidade agora é sua democratização entre as diferentes seitas do país.
Devido a falta de mão de obra barata, o Líbano é historicamente um polo de atração de trabalhadores sírios. Não que os libaneses estejam vivendo o sonho do pleno emprego, a ausência de mão de obra se da menos pela grandeza da demanda que o fato de boa parte da juventude libanesa, em busca de trabalho descentes, foge assim que puder de seu próprio país.
Durante o século 19, quando o capitalismo foi introduzido na região que viria ser o Líbano, a economia passou a se basear essencialmente na exportação de seda à Europa e a importação de todo e qualquer outro bem. Os entornos do porto de Beirute tornaram-se o centro de onde esta capital se acumulou, deixando o resto da região na miséria.
A cidade portuária ganhou estados de porta de entrada e saída para o interior da Síria, e a partir dali, o resto do Oriente. Após a quebra da indústria da seda no início do século 20 e a danosa separação econômica entre Líbano e Síria, a economia do país reduziu-se ao setor de serviços, principalmente financeiros, importando praticamente tudo que podia. Em um país pequeno em que nada se produz, o desemprego tornou-se uma doença crônica, sendo o único verdadeiro patrimônio nacional as redes familiares pre-estabelecidas pelo mundo, que facilitam a imigração.
Numa tentativa de justificar a desastrosa estrutura socioeconómico do país, que na prática, expulsa seus jovens, desenvolveu-se a ideia de um gene especificamente atribuído ao povo fenício, que os transforma em grandes exploradores do mundo, e não imigrantes empobrecidos. Esqueceram-se também que o Monte Líbano, região onde o gene fenício é supostamente mais latente, nunca foi colonizado por tal povo, que se restringia a costa do mediterrâneo. Em meio a uma sociedade voltada quase inteiramente a negação de seu entorno, é compreensível a má fama de Heródoto.
(Uma versão resumida deste artigo foi publicada em O Estado de S. Paulo, 13 mai. 2013.)

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Por que os médicos cubanos assustam

Fonte: Blog do Porfírio
Só em 2011, médicos cubanos recuperaram a visão  gratuitamente de2 milhões de pessoas em  35 países
Elite corporativista teme que mudança do foco no atendimento abale o nosso sistema mercantil de saúde

A virulenta reação do Conselho Federal de Medicina contra a vinda de 6 mil médicos cubanos para trabalhar em áreas absolutamente carentes do país é muito mais do que uma atitude corporativista: expõe o pavor que uma certa elite da classe médica tem diante dos êxitos inevitáveis do modelo adotado na ilha, que prioriza a prevenção e a educação para a saúde, reduzindo não apenas os índices de enfermidades, mas sobretudo a necessidade de atendimento e os custos com a saúde.
Essa não é a primeira investida radical do CFM e da Associação Médica Brasileira contra a prática vitoriosa dos médicos cubanos entre nós. Em 2005, quando o governador de Tocantins não conseguia médicos para a maioria dos seus pequenos e afastados municípios, recorreu a um convênio com Cuba e viu o quadro de saúde mudar rapidamente com a presença de apenas uma centena de profissionais daquele país.
A reação das entidades médicas de Tocantins, comprometidas com a baixa qualidade da medicina pública que favorece o atendimento privado, foi quase de desespero. Elas só descansaram quando obtiveram uma liminar de um juiz de primeira instância determinando em 2007 a imediata “expulsão” dos médicos cubanos.
No Brasil, o apego às grandes cidades
Dos  371.788 médicos brasileiros, 260.251 estão nas regiões Sul e Sudeste
Neste momento, o governo da presidenta Dilma Rousseff só está cogitando de trazer os médicos cubanos, responsáveis pelos melhores índices de saúde do Continente, diante da impossibilidade de assegurar a presença de profissionais brasileiros em mais de um milhar de municípios, mesmo com a oferta de vencimentos bem superiores aos pagos nos grandes centros urbanos.
E isso não acontece por acaso. O próprio modelo de formação de profissionais de saúde, com quase 58% de escolas privadas, é voltado para um tipo de atendimento vinculado à indústria de equipamentos de alta tecnologia, aos laboratórios e às vantagens do regime híbrido, em que é possível conciliar plantões de 24 horas no sistema público com seus consultórios e clínicas particulares, alimentados pelos planos de saúde.
Mesmo com consultas e procedimentos pagos segundo a tabela da AMB, o volume de clientes é programado para que possam atender no mínimo dez por turnos de cinco horas. O sistema é tão direcionado que na maioria das especialidades o segurado pode ter de esperar mais de dois meses por uma consulta.
Além disso, dependendo da especialidade e do caráter de cada médico, é possível auferir faturamentos paralelos em comissões pelo direcionamento dos exames pedidos como rotinas em cada consulta.
Sem compromisso em retribuir os cursos públicos
Há no Brasil uma grande “injustiça orçamentária”: a formação de médicos nas faculdades públicas, que custa muito dinheiro a todos os brasileiros, não presume nenhuma retribuição social, pelo menos enquanto não se aprova o projeto do senador Cristóvam Buarque, que obriga os médicos recém-formados que tiveram seus cursos custeados com recursos públicos a exercerem a profissão, por dois anos, em municípios com menos de 30 mil habitantes ou em comunidades carentes de regiões metropolitanas.
Cruzando informações, podemos chegar a um custo de R$ 792.000,00 reais para o curso de um aluno de faculdades públicas de Medicina, sem incluir a residência. E se considerarmos o perfil de quem consegue passar em vestibulares que chegam a ter 185 candidatos por vaga (UNESP), vamos nos deparar com estudantes de classe média alta, isso onde não há cotas sociais.
Um levantamento do Ministério da Educação detectou que na medicina os estudantes que vieram de escolas particulares respondem por 88% das matrículas nas universidades bancadas pelo Estado. Na odontologia, eles são 80%.
Em faculdades públicas ou privadas, os quase 13 mil médicos formados anualmente no Brasil não estão nem preparados, nem motivados para atender às populações dos grotões. E não estão por que não se habituaram à rotina da medicina preventiva e não aprenderam como atender sem as parafernálias tecnológicas de que se tornaram dependentes.
Concentrados no Sudeste, Sul e grandes cidades
Números oficiais do próprio CFM indicam que 70% dos médicos brasileiros concentram-se nas regiões Sudeste e Sul do país. E em geral trabalham nas grandes cidades. Boa parte da clientela dos hospitais municipais do Rio de Janeiro, por exemplo, é formada por pacientes de municípios do interior.
Segundo pesquisa encomendada pelo Conselho, se a média nacional é de 1,95 médicos para cada mil habitantes, no Distrito Federal esse número chega a 4,02 médicos por mil habitantes, seguido pelos estados do Rio de Janeiro (3,57), São Paulo (2,58) e Rio Grande do Sul (2,31). No extremo oposto, porém, estados como Amapá, Pará e Maranhão registram menos de um médico para mil habitantes.
A pesquisa “Demografia Médica no Brasil” revela que há uma forte tendência de o médico fixar moradia na cidade onde fez graduação ou residência. As que abrigam escolas médicas também concentram maior número de serviços de saúde, públicos ou privados, o que significa mais oportunidade de trabalho. Isso explica, em parte, a concentração de médicos em capitais com mais faculdades de medicina. A cidade de São Paulo, por exemplo, contava, em 2011, com oito escolas médicas, 876 vagas – uma vaga para cada 12.836 habitantes – e uma taxa de 4,33 médicos por mil habitantes na capital.
Mesmo nas áreas de concentração de profissionais, no setor público, o paciente dispõe de quatro vezes menos médicos que no privado. Segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar, o número de usuários de planos de saúde hoje no Brasil é de 46.634.678 e o de postos de trabalho em estabelecimentos privados e consultórios particulares, 354.536. Já o número de habitantes que dependem exclusivamente do Sistema Único de Saúde (SUS) é de 144.098.016 pessoas, e o de postos ocupados por médicos nos estabelecimentos públicos, 281.481.
A falta de atendimento de saúde nos grotões é uma dos fatores de migração. Muitos camponeses preferem ir morar em condições mais precárias nas cidades, pois sabem que, bem ou mal, poderão recorrer a um atendimento em casos de emergência.
A solução dos médicos cubanos é mais transcendental pelas características do seu atendimento, que mudam o seu foco no sentido de evitar o aparecimento da doença. Na Venezuela, os Centros de Diagnósticos Integrais espalhados nas periferias e grotões, que contam com 20 mil médicos cubanos, são responsáveis por uma melhoria radical nos seus índices de saúde.
Cuba é reconhecida por seus êxitos na medicina e na biotecnologia
Em sua nota ameaçadora, o CFM afirma claramente que confiar populações periféricas aos cuidados de médicos cubanos é submetê-las a profissionais não qualificados. E esbanja hipocrisia na defesa dos direitos daquelas pessoas.
Não é isso que consta dos números da Organização Mundial de Saúde. Cuba, país submetido a um asfixiante bloqueio econômico, mostra que nesse quesito é um exemplo para o mundo e tem resultados melhores do que os do Brasil.
Graças à sua medicina preventiva, a ilha do Caribe tem a taxa de mortalidade infantil mais baixa da América e do Terceiro Mundo – 4,9 por mil (contra 60 por mil em 1959, quando do triunfo da revolução) – inferior à do Canadá e dos Estados Unidos. Da mesma forma, a expectativa de vida dos cubanos – 78,8 anos (contra 60 anos em 1959) – é comparável a das nações mais desenvolvidas.
Com um médico para cada 148 habitantes (78.622 no total) distribuído por todos os seus rincões que registram 100% de cobertura, Cuba é, segundo a Organização Mundial de Saúde, a nação melhor dotada do mundo neste setor.
Segundo a New England Journal of Medicine, “o sistema de saúde cubano parece irreal. Há muitos médicos. Todo mundo tem um médico de família. Tudo é gratuito, totalmente gratuito. Apesar do fato de que Cuba dispõe de recursos limitados, seu sistema de saúde resolveu problemas que o nosso [dos EUA] não conseguiu resolver ainda. Cuba dispõe agora do dobro de médicos por habitante do que os EUA”.
O Brasil forma 13 mil médicos por ano em 200 faculdades: 116 privadas, 48 federais, 29 estaduais e 7 municipais. De 2000 a 2013, foram criadas 94 escolas médicas: 26 públicas e 68 particulares.
Formando médicos de 69 países
Estudantes estrangeiros na Escola Latino-Americana de Medicina
Estudantes estrangeiros na ELAM
Em 2012, Cuba, com cerca de 13 milhões de habitantes, formou em suas 25 faculdades, inclusive uma voltada para estrangeiros, mais de 11 mil novos médicos: 5.315 cubanos e 5.694 de 69 países da América Latina, África, Ásia e inclusive dos Estados Unidos.
Atualmente, 24 mil estudantes de 116 países da América Latina, África, Ásia, Oceania e Estados Unidos (500 por turma) cursam uma faculdade de medicina gratuita em Cuba.
Entre a primeira turma de 2005 e 2010, 8.594 jovens doutores saíram da Escola Latino-Americana de Medicina. As formaturas de 2011 e 2012 foram excepcionais com cerca de oito mil graduados. No total, cerca de 15 mil médicos se formaram na Elam em 25 especialidades distintas.
Isso se reflete nos avanços em vários tipos de tratamento, inclusive em altos desafios, como vacinas para câncer do pulmão, hepatite B, cura do mal de Parkinson e da dengue. Hoje, a indústria biotecnológica cubana tem registradas 1.200 patentes e comercializa produtos farmacêuticos e vacinas em mais de 50 países.
Presença de médicos cubanos no exterior
Desde 1963, com o envio da primeira missão médica humanitária à Argélia, Cuba trabalha no atendimento de populações pobres no planeta. Nenhuma outra nação do mundo, nem mesmo as mais desenvolvidas, teceu semelhante rede de cooperação humanitária internacional. Desde o seu lançamento, cerca de 132 mil médicos e outros profissionais da saúde trabalharam voluntariamente em 102 países.
No total, os médicos cubanos trataram de 85 milhões de pessoas e salvaram 615 mil vidas. Atualmente, 31 mil colaboradores médicos oferecem seus serviços em 69 nações do Terceiro Mundo.
No âmbito da Alba (Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América), Cuba e Venezuela decidiram lançar em julho de 2004 uma ampla campanha humanitária continental com o nome de Operação Milagre, que consiste em operar gratuitamente latino-americanos pobres, vítimas de cataratas e outras doenças oftalmológicas, que não tenham possibilidade de pagar por uma operação que custa entre cinco e dez mil dólares. Esta missão humanitária se disseminou por outras regiões (África e Ásia). A Operação Milagre dispõe de 49 centros oftalmológicos em 15 países da América Central e do Caribe. Em 2011, mais de dois milhões de pessoas de 35 países recuperaram a plena visão.
Quando se insurge contra a vinda de médicos cubanos, com argumentos pueris, o CFM adota também uma atitude política suspeita: não quer que se desmascare a propaganda contra o regime de Havana, segundo a qual o sonho de todo cubano é fugir para o exterior. Os mais de 30 mil médicos espalhados pelo mundo permanecem fiéis aos compromissos sociais de quem teve todo o ensino pago pelo Estado, desde a pré-escola e de que, mais do que enriquecer, cumpre ao médico salvar vidas e prestar serviços humanitários.
Fonte: Blog do Porfírio

terça-feira, 9 de abril de 2013

Eleições na Venezuela...


Citando Roberto Carlos, Maduro afirma ter “um milhão de povos amigos”

O presidente da Venezuela utilizou a música "eu quero apenas" do cantor brasileiro para ressaltar as relações de amizade do país caribenho


Jônatas Campos
de Caracas (Venezuela) no BRASILDEFATO

Com perfil de diplomata elogiado por diversas lideranças no mundo inteiro, depois de passar seis anos como chanceler da Venezuela, o presidente e candidato a reeleição, Nicolás Maduro, vem recebendo diversos apoios internacionais. Neste domingo (7), em comício no Estado de Apure, na região dos Lhanos venezuelanos, área rural do país, Maduro contou com a presença do coordenador geral do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST), João Pedro Stédile e do coordenador da organização internacional Via Campesina, Henry Saragih.

O presidente da Venezuela utilizou a música "eu quero apenas" do cantor brasileiro Roberto Carlos para ressaltar as relações de amizade do país caribenho. "O presidente Chávez nos deixou no mundo como na canção de Roberto Carlos 'eu quero ter um milhão de amigos'. Hoje a Venezuela tem um milhão de povos amigos", disse o presidente sob aplausos.
Vestido com um chapéu sombreiro, símbolo da região rural, Maduro disse que respeitará qualquer que seja o resultado eleitoral. "Respeitarei em nome da Constituição os resultados eleitorais e a decisão que o povo tomar", disse.
Em discurso, o coordenador da Via Campesina ressaltou os programas de redução da fome e de reforma agrária feitas no governo Chávez e a experiência do atual presidente nas questões internacionais. "Com Maduro teremos a certeza de fazer escutar nossa voz em todo o mundo, nas Organizações das Nações Unidas, em Genebra, para dar a voz a todos os que não têm voz", disse Henry Saragih, que é natural da Indonésia.
Já o coordenador do MST, João Pedro Stédile, afirmou que as eleições do próximo domingo 14 de abril serão "uma batalha dos povos da América Latina". "Estamos aqui com Maduro para derrotar o projeto da burguesia. Lula e o povo brasileiro não vão dormir até ver o resultado de 14 de abril. Não durmam vocês também até que chegue a vitória", afirmou.
O economista aproveitou para convidar o presidente para a Copa do Mundo que ocorrerá no Brasil no próximo ano. "Em junho de 2014, convido o presidente Maduro e a seleção (de futebol) da Venezuela para vir ao Brasil disputar a Copa do Mundo", concluiu. (com ComunicaSul - Comunicação Colaborativa)

quarta-feira, 20 de março de 2013

Pablo Neruda: “Eu não me calo”


averdade.org

Sha
Neruda e MatildeA Poesia é a arte que coordena as ideias e as palavras de modo a expressar o pensar e o sentir de forma bela. Fala ao coração. É o belo em forma de Linguagem. Mas a divisão da sociedade em classes, a violência gerada pela exploração da minoria opressora, violam também a arte em todas as suas formas. Em vez de terna, a poesia se torna dura, embora não deixe de ser bela. É que o poeta tem “apenas duas mãos e o sentimento do mundo” (Carlos Drummond de Andrade).
É isso que explica a evolução poética de Pablo Neruda, o maior poeta chileno e um dos maiores da Literatura universal. Do lirismo de “Vinte Poemas de Amor e uma Canção Desesperada” aos versos combatentes de “Espanha no Coração” e “Canto Geral”.
Ele não nasceu com o nome com o qual se consagrou, e sim como Neftali Ricardo Reyes Basoalto. Não era um nome poético, não gostava. Ainda na adolescência, adotou o pseudônimo de Pablo Neruda (referência ao escritor checo Jan Neruda, que apreciava), oficializando-o depois mediante ação judicial.
Neruda veio ao mundo na localidade de Parral, em 12 de julho de 1904. Seu pai era o operário ferroviário José Del Carmen Reyes Morales. Sua mãe, Rosa Basoalto Opazo, professora primária, morreu quando ele tinha apenas um ano de vida. A mãe que conheceu foi Trinidade Candia Marverde, a segunda esposa de José Reyes, a quem chamava de “Mamadre”,
Recebeu o primeiro prêmio aos quinze anos.  Em 1921, a família se mudou para Santiago, onde estudou Pedagogia na Universidade do Chile e seguiu ganhando prêmios com suas poesias. “Vinte Poemas de Amor e uma Canção Desesperada” é publicado em 1923, um sucesso de público e crítica.
Diplomacia e Militância Política
Ingressou na carreira diplomática em 1927, atuando em vários países. Despertou para a militância política no ano de 1936, lutando contra o franquismo na Espanha ao lado do amigo e magnífico poeta Federico García Lorca, assassinado pelos fascistas em agosto daquele ano. Então a ternura deu lugar ao combate, pois a poesia, como disse Jorge Amado, “pode ferir como bala de fuzil”. Neruda escreveu Espanha no Coração. Perdeu o cargo e abandonou a carreira diplomática.
Em 1945, ingressou no Partido Comunista do Chile; foi eleito senador em 1948; teve o mandato cassado e ingressou na clandestinidade. Exilou-se, andou por diversos países, escrevendo no México Canto Geral, que retrata a luta, a vida, o sentimento dos povos da América Latina.
De volta ao Chile, o PC o indicou como candidato à Presidência da República, mas ele não aceitou, defendendo o apoio a Salvador Allende, eleito em 1970 por uma ampla Frente Popular. (Sobre Salvador Allende, leia A Verdade, nº96).  Apoiou Allende até o fim, que se deu com o golpe de Estado que implantou uma longa noite de terror e agonia sobre o Chile (1973-1990). Em 1971, Neruda recebera o Prêmio Nobel de Literatura.
Suspeita de assassinato
Doze dias após o golpe, morria Pablo Neruda, pois sua voz não se calou. Continua emocionando e incentivando os lutadores do povo.  Os legistas diagnosticaram o câncer como causa mortis. Sua esposa, Matilde Urrutia, disse que o poeta “morreu de tristeza”. A tristeza de presenciar o enterro da democracia, a morte de seus amigos Salvador Allende e Victor Jara, célebre cantor e compositor, que transformava em música a vida e a luta dos trabalhadores, do povo do Chile.
É fato que o poeta sofria de câncer na próstata, mas seu médico havia garantido que ele ainda viveria ainda de cinco a seis anos. Pessoas que assistiram à sua internação na Clínica Santa Maria, em Santiago, testemunharam que ele não parecia um doente terminal; apenas estava muito nervoso. Aplicaram-lhe um calmante e nunca mais o poeta acordou.
O motorista do casal Neruda, Manuel Arraya, assegura que era bom o estado de saúde do poeta. Ele até se preparava para uma viagem ao México, onde falaria sobre a situação política do Chile. Conta Arraya que Neruda vinha recebendo telefonemas ameaçadores e, logo após sua morte, a residência, em Isla Negra, foi totalmente saqueada.
Diante das evidências, o juiz Mário Carroza reabriu a investigação e determinou a exumação dos restos mortais do poeta, que se encontram em sua casa na Isla Negra, onde funciona um museu em homenagem a sua vida e obra. Os resultados deverão ser divulgados por ocasião dos 40 anos do golpe, que se completam a 11 de setembro próximo.
Poesia Perigosa
É muito provável que a mão que torturou e mutilou Victor Jara para calar sua voz e os acordes do seu violão também tenham silenciado o poeta, pois, como ele mesmo dissera, “o poeta que sabe chamar o pão de pão e o vinho de vinho é perigoso para o agonizante capitalismo” (Confesso que Vivi).
Eu não me calo.
Eu preconizo um amor inexorável.
E não me importa pessoa nem cão:
Só o povo me é considerável,
Só a pátria é minha condição.
Povo e pátria manejam meu cuidado,
Pátria e povo destinam meus deveres
E se logram matar o revoltado
Pelo povo, é minha Pátria quem morre.
É esse meu temor e minha agonia.
Por isso no combate ninguém espere
Que se quede sem voz minha poesia.
(Neruda, 1980) 
Pablo Neruda: A meu Partido
Me deste a fraternidade para o que não conheço. Me acrescentaste a força de todos os que vivem. Me tornaste a dar a pátria como em um nascimento. Me deste a liberdade que não tem o solitário. Me ensinaste a acender a bondade, como o fogo. Me deste a retidão que necessita a árvore. Me ensinaste a ver a unidade e a diferença dos homens. Me mostraste como a dor de um ser morreu na vitória de todos. Me ensinaste a dormir nas camas duras de meus irmãos. Me fizeste construir sobre a realidade como sobre uma rocha. Me fizeste adversário do malvado e muro do frenético. Me fizeste ver a claridade do mundo e a possibilidade da alegria. Me fizeste indestrutível porque contigo não termino em mim mesmo.

terça-feira, 19 de março de 2013

Unidade, luta e caminhos da esquerda

Editorial do sítio Vermelho:

Como era previsto, no ano de 2013 estão sendo realizados ou se encontram em preparação importantes encontros de forças da esquerda latino-americana e mundial. São eventos que podem ter impacto sobre as lutas dos povos em cada país em torno de questões candentes da conjuntura e contribuir para abrir perspectivas no plano estratégico.

Nos últimos dias, de 14 a 17 de março, teve lugar na Cidade do México o 17º Seminário Internacional “Os Partidos e a Nova Sociedade”, organizado pelo Partido do Trabalho (PT) do México. De composição variada, com forte presença comunista e de outras forças revolucionárias e anti-imperialistas, o encontro contou com a participação de mais de uma centena de organizações de esquerda dos cinco continentes. O conteúdo dos documentos apresentados, das rodadas de debates e as resoluções tiveram por foco a crise do sistema capitalista, as graves questões geopolíticas da atualidade, as ameaças à paz derivadas das políticas neocolonialistas e agressivas das potências imperialistas e as lutas dos povos e nações por um novo ordenamento econômico e político mundial.

Em busca de situar as forças consequentes da esquerda numa correta perspectiva tática e estratégica, o encontro organizado pelo PT mexicano debruçou-se sobre as distintas expressões do poder popular e passou em revista os caminhos para a conquista e consolidação de governos alternativos, conformados por forças transformadoras e progressistas.

Numa direção semelhante em muitos dos seus aspectos, o Foro de São Paulo anunciou no último domingo os preparativos para a realização do seu 19º Encontro, no mês de julho no Brasil. Também neste caso, esta articulação de forças de esquerda latino-americanas volta as suas atenções para o desenvolvimento e agravamento da crise do capitalismo-imperialismo e suas consequências geopolíticas. Numa região em que ao longo de uma década e meia foram acumulando-se vitórias eleitorais das forças de esquerda e vão tomando forma distintas experiências de governos alternativos sob a direção de forças progressistas, é de se esperar que tais experiências passem pelo crivo de uma avaliação sistemática e sejam enfrentados os novos desafios, tendo sempre por critério definidor os anseios de libertação nacional e social dos povos.

Está prevista também para este ano a realização do 15º Encontro Internacional de Partidos Comunistas e Operários, no mês de novembro em Portugal, com agenda ainda a ser definida. Constituído por partidos e organizações com nítida identidade comunista, esses encontros dão uma contribuição especial à compreensão dos complexos problemas mundiais, à formulação de plataformas de luta dos trabalhadores e dos povos e, sobretudo, apontam a perspectiva do socialismo como alternativa ao sistema capitalista-imperialista, historicamente esgotado. Os encontros dos partidos comunistas têm insistido com toda a clareza em que a única via para a conquista do progresso social e da paz é a luta dos trabalhadores e dos povos pelo socialismo.

Os Encontros Internacionais de Partidos Comunistas e Operários firmam-se como uma dinâmica de busca da unidade, exercício de cooperação e solidariedade internacionalista, por meio da qual os partidos comunistas definem linhas de atuação comum e vão conformando um campo próprio no quadro geral da luta anti-imperialista.

Além da crise sistêmica do capitalismo – para a qual são vãs as expectativas de superação sem luta revolucionária – o mundo está vivendo enorme instabilidade, caracterizada por profundas crises políticas e por uma brutal ofensiva imperialista contra os povos. Malgrado a retórica de paz e cooperação dos Estados Unidos e demais potências imperialistas, o mundo vive uma alarmante situação, em que as conquistas democráticas e sociais são atacadas, o direito internacional é tornado letra morta, a soberania nacional é constantemente violada, configurando-se uma situação de insegurança e de graves ameaças à paz e à própria sobrevivência da humanidade. Um dos traços marcantes de nossa época é a tendência declinante nos planos econômico e político do sistema capitalista-imperialista, o que aumenta a sua agressividade e acarreta uma inarredável crise civilizacional.

Neste quadro, agigantam-se os desafios e as responsabilidades das forças de esquerda. Trilhar os caminhos da resistência à brutal ofensiva do imperialismo, da luta pelos direitos dos trabalhadores e dos povos, da defesa da soberania nacional e da paz, é tarefa irrecusável e inadiável das forças consequentes em sua opção política e ideológica de ser de esquerda.

Destaca-se o esforço pela união dos povos na luta anti-imperialista, para dar impulso à resistência e à luta, descortinar perspectivas, mobilizar as massas e fortalecer as suas organizações. Esta união é a tarefa mais importante para canalizar o descontentamento popular que se espraia e dar consistência organizativa, força e consequência aos levantamentos populares pela democracia, os direitos sociais, a soberania nacional, o desenvolvimento nacional com progresso social.

Os encontros entre as forças de esquerda podem jogar um importante papel no enfrentamento desses desafios, quando neles prevaleçam a unidade, a cooperação, a solidariedade e o espírito de luta.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Cuba, seu povo, seus sonhos

Por Mauro Santayana, em seu blog: via BLOG DO MIRO
Podemos discordar do regime político de Cuba, que se mantém sob o domínio de um partido único. Mas é preciso seguir o conselho de Spinoza: não lisonjear, não detestar, mas entender. Entender, ou procurar entender. A história de Cuba – como, de resto, de quase todo o arquipélago do Caribe e a América Latina – tem sido a de saqueio dos bens naturais e do trabalho dos nativos, em benefício dos colonizadores europeus, substituídos depois pelos anglossaxões.
E, nessa crônica, destaca-se a resistência e a luta pela soberania de seu povo não só contra os dominadores estrangeiros, mas, também, contra seus vassalos internos.
Já se tornou lugar comum lembrar que, sob os governos títeres, Havana se tornara o maior e mais procurado bordel americano. A legislação, feita a propósito, era mais leniente, não só com o lenocínio, e também com o jogo, e os mais audazes gangsters de Chicago e de Nova Iorque tinham ali os seus negócios e seus retiros de lazer. E, mais: as mestiças cubanas, com sua beleza e natural sensualidade, eram a atração irresistível para os entediados homens de negócios dos Estados Unidos.
A Revolução Cubana foi, em sua origem, o que os marxistas identificam como movimento pequeno burguês. Fidel e seus companheiros, no assalto ao Quartel Moncada – em 1953, já há quase 60 anos - pretendiam apenas derrocar o governo ditatorial de Fulgencio Batista, que mantinha o país sob cruel regime policial, torturava os prisioneiros e submetia a imprensa à censura férrea. A corrupção grassava no Estado, dos contínuos aos ministros. O enriquecimento de Batista, de seus familiares e amigos, era do conhecimento da classe média, que deu apoio à tentativa insurrecional de Fidel, derrotada então, para converter-se em vitoria menos de 6 anos depois. Os ricos eram todos associados à exploração, direta ou indireta, da prostituição, disfarçada no turismo, e do trabalho brutal dos trabalhadores na indústria açucareira.
Foi a arrogância americana, na defesa de suas empresas petrolíferas, que se negaram a aceitar as novas regras, que empurrou o advogado Fidel Castro e seus companheiros, nos dois primeiros anos da vitória do movimento, ao ensaio de socialismo. A partir de então, só restava à Ilha encampar as refinarias e aliar-se à União Soviética.
Os americanos, sob o festejado Kennedy – que o reexame da História não deixa tão honrado assim – insistiram nos erros. A tentativa de invasão de Cuba, pela Baía dos Porcos, com o fiasco conhecido, tornou a Ilha ainda mais dependente de Moscou, que se aproveitou do episódio para livrar-se de uma bateria americana de foguetes com cargas atômicas instalada na Turquia, ao colocar seus mísseis a 100 milhas da Flórida, no território cubano.
A solução do conflito, que chegou a assustar o mundo com uma guerra atômica, foi negociada pelo hábil Mikoyan: Kruschev retirou os mísseis de Cuba e os Estados Unidos desmantelaram sua bateria turca, ao mesmo tempo em que assumiram o compromisso de não invadir Cuba – mas mantiveram o bloqueio econômico e político contra Havana. Enfim, ganharam Moscou e Washington, com a proteção recíproca de seus espaços soberanos – e Cuba pagou a fatura com o embargo.
O malogro do socialismo cubano nasceu desse imbróglio de origem. Tal como ocorrera com a Rússia Imperial e com a China, em movimentos contemporâneos, o marxismo serviu como doutrina de empréstimo a uma revolução nacional. O nacionalismo esteve no âmago dos revolucionários cubanos, tal como estivera entre os social-democratas russos, chefiados por Lenine e os companheiros de Mao.
Os cubanos iniciaram reformas econômicas recentes, premidos, entre outras razões, pelo fim do sistema socialista. Ao mesmo tempo tomaram medidas liberalizantes, permitindo as viagens ao exterior de quem cumprir as normas habituais. É assim que visita o país a dissidente Yoani Sánchez (que mantém seu blog na internet de oposição ao governo cubano). Ocorre que ela não é tão perseguida em Havana como proclama e proclamam seus admiradores. Tanto assim é que, em momento delicado para a Ilha, quando só pessoas de confiança do regime viajavam para o Exterior, ela viveu 2 anos na Suíça, e voltou tranquilamente para Havana.
É sabido que ela mantém encontros habituais com o escritório que representa os interesses norte-americanos em Cuba, como revelou o WikeLeaks. Há mais, ela proclama uma audiência que não tem, como assegura o sistema de registro mais confiável, o da Alexa.com. (citado por Altamiro Borges em seu site) em que ela se encontra no 99.944º lugar na audiência mundial, enquanto o modesto jornal O Povo, de Fortaleza, se encontra na 14.043ª posição, ou seja dispõe de sete vezes mais seguidores do que Yoani. Há mais: ela afirma que tem 10 milhões de acessos por mês, o que contraria a lógica de sua posição no ranking citado. O site de maior tráfego nos Estados Unidos é o do New York Times, com 17 milhões de acessos mensais.
Apesar de tudo isso, deixemos essa senhora defender o seu negócio na internet. É seu direito dizer o que quiser, mas não podemos tolerar que exija do Brasil defender os direitos humanos, tal como ela os vê, em Cuba ou alhures. Um dos princípios históricos do Brasil é o da não interferência nos assuntos internos dos outros países. O problema de Cuba é dos cubanos, que irão resolvê-lo, no dia em que não estiverem mais obrigados a se defender da intervenção dos estrangeiros, que vêm sofrendo desde que os espanhóis, ainda no século 16, ali se instalaram. Foram substituídos pelos Estados Unidos, depois da guerra vitoriosa de Washington contra o frágil governo da Regente Maria Cristina da Espanha. Enfim, o generoso povo cubano, tão parecido ao nosso, não teve, ainda, a oportunidade de realizar o seu próprio destino, sem as pressões dos colonizadores e seus sucessores.
Dispensamos os conselhos da Sra. Sánchez. Aqui tratamos, prioritariamente, dos direitos humanos dos brasileiros, que são os de viver em paz, em paz educar-se, e em paz trabalhar, e esses são os direitos de todos os povos do mundo. Ela, não sendo cidadã de nosso país, não deve, nem pode, exigir nada de nosso governo ou de nosso povo. Dispensamos seus avisos mal-educados e prepotentes, e esperamos que seja festejada pela direita de todos os países que visitará, à custa de seus patrocinadores (como o Instituto Millenium), iludidos pelo seu falso prestígio entre os cubanos.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Solidariedade aos presos políticos palestinos em Israel

(ESQUERDA MARXISTA)Divulgamos este abaixo-assinado de uma campanha que ocorre em todo o Brasil em solidariedade aos presos políticos palestinos em Isael. Antes, durante e após o Fórum Social Mundial Palestina Livre, ocorrido no final do ano passado, publicamos em nossa página diversos artigos sobre a luta do povo Palestino e nossa posição em defesa de um Estado laico e democrático em todo o território histórico da Palestina. Essa campanha de solidariedade é mais uma importante iniciativa em defesa da luta do povo Palestino contra a brutal repressão do Estado Sionista de Israel. Convidamos todos os leitores de nossa página a assinarem esta carta que será encaminhada a orgãos governamentais, comitês de direitos humanos, escritórios da ONU, etc, após o dia 15 de janeiro. Contamos com a solidariedade de todos.
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EM DEFESA DOS PRESOS POLÍTICOS PALESTINOS
LIBERDADE PARA OS 4600 PRESOS PALESTINOS ENCARCERADOS NAS PRISÕES ISRAELENSES

Desde 1948, quando foi criado o Estado de Israel em terras da Palestina, uma onda de violência e agressão marca o cotidiano do povo palestino. Todos os palestinos que lutam contra a ocupação israelense e pela independência nacional tem sido perseguidos, presos, torturados ou assassinados pelos sucessivos governos de Israel. O Estado de Israel é hoje o campeão mundial em violações dos direitos humanos. É um Estado anti-democrático e racista, que pratica uma limpeza étnica em todo o território da Palestina ocupada. A legítima luta de libertação nacional palestina contra o colonialismo israelense tem levado mais de 800 mil palestinos para as prisões israelenses.
Nós, abaixo assinados, condenamos as práticas a agressões diárias, cometidas pelo Estado de Israel, contra os presos politicos palestinos dentro das prisões israelenses. Condenamos as detenções contra o povo palestino, que almeja a liberdade e independencia. Segundo os últimos relatórios de organizações de direitos humanos o numero dos presos palestinos nas prisões israelenses chega a 4600, até o final de mês de outubro de 2012. Entre eles: 84 detidos administrativos, 189 crianças, 10 deputados, 9 mulheres, 530  que cumprem prisão perpétua, 451 sentenciados há mais de 20 anos. diante dessa situação exigimos:

1)  a revogação imediata das prisões administrativas, que carecem de qualquer fundamentação legal e são mais um instrumento ilegal das foraças de ocupação;
2)  a proteção à dignidade e à vida dos presos que realizam greves de fome como protesto contra as suas precárias condições nas prisões;
3)  o cumprimento dos acordos realizados entre os presos, a direção dos presídios e o serviço  de inteligência interna de Israel(Shein Beit);
4) imediata libertação de todos os 1027 presos que foram incluídos no acordo realidado em 2011, pois muitos dos que foram libertados foram perseguidos e presos novamente pelas tropas de ocupação;
5) libertar imediatamente todos os deputados membros do Conselho Legislativo Palestino, que foram eleitos pelo povo para exercer seu mandato e fortalecer a luta democrática na Palestina, e que hoje se encontram nas nas prisões israelenses;
6) o fim da politica de isolamento dentro das prisões, que submete o preso à condições muito mais desumanas, pois o excluí da possibilidade de contato com outros presos e com seus familiares;
7) a libertação imediata de todas as crianças e jovens menores de 18 anos, pois seus direitos fundamentais assegurados por diversas resoluções e pela própria Carta de fundação da ONU estão sendo cotidianamente desrespeitados nas prisões israelenses, como direito à saúde, à educação, etc;
8) a libertação imediata de todos os presos que se encontram com doenças consideradas graves;
9) atendimento médico digno e acesso à medicação e tratamento adequado, com possibilidade de visitas de médicos indicados por familiares e/ou organizações de direitos humanos que acompanham e prestam assistência e ajuda humanitária aos presos;
10) garantia ao direito à educação e acesso ao ensino superior no interior das prisões israelenses, com direito aos presos de ter acesso à livros, revistas e jornais;
11) que o Estado de Israel respeite e cumpra os acordos e as convenções internacionais de direitos humanos em relação aos presos políticos palestinos. 
A luta dos presos políticos palestinos por melhores condições de vida nas prisões e por sua libertação é parte fundamental da luta por justiça e pela paz na Palestina. Não haverá paz sem justiça. E justiça hoje significa tratar com dignidade e libertar todos os presos políticos encarcerados por lutarem pela libertação de sua pátria. A luta do movimento de libertação nacional palestino contra a ocupação israelense é uma luta legítima, inspirada na heróica resistência popular de outros povos que também lutaram e venceram o colonialismo, conquistando assim seu direito inalienável à soberania, à independência e a autodetermninação.
Pedimos à todas as forças democráticas e progressistas do mundo, e suas organizações políticas, sociais, culturais e humanitárias, bem como aos governos que defendem e praticam os princípios fundamentais dos direitos humanos e do direito internacional humanitário, que divulguem este abaixo-assinado e que façam chegar às autoridades israelenses em seus países, pois a causa palestina é hoje uma causa de toda a humanidade.
Ninguém pode ficar impune quando comete uma injustiça. Chegou a hora do Estado de Israel ser julgado pelos inúmeros crimes que vem cometendo contra o povo palestino.
PAZ, JUSTIÇA E LIBERDADE PARA A PALESTINA!!!!!

Para assinar envie e-mail para CONTATO@MARXISMO.ORG.BR preenchendo no assunto "SOLIDARIEDADE PRESOS PALESTINOS" e enviando no corpo do e-mail seu NOME, PROFISSÃO, ENTIDADE (se participar de algum sindicato, partido, associação de moradores, etc).

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

A QUESTÃO NACIONAL NA ESCÓCIA – PARTE II

marxismo.org


Socialist Appeal - CMI Inglaterra
A ideia de que uma Escócia independente sobre uma base capitalista resolveria os problemas do povo escocês é falsa. Pelo contrário, levaria a uma queda no padrão de vida, pois os salários seriam reduzidos para aumentar a competitividade.
Apesar do discurso do Partido Nacional Escocês (PNE) de “escoceses ricos contra britânicos pobres” e sobre um futuro baseado no “petróleo escocês”, o petróleo do Mar do Norte vai diminuir em 0,7% no orçamento britânico de 2011-2012 para 0,2% em 2022-2023. O setor bancário, que joga um papel preponderante na economia, esta em dificuldades e é mantido vivo graças ao estado britânico.
O PNE é um típico partido pequeno burguês, que aponta varias direções diferentes de acordo com sua constituição interna. Em uma tentativa de se afastar do estigma conservador, eles adotaram uma linha de esquerda e “socialista” nas áreas urbanas onde o Labour era a principal força de oposição. Eles compreenderam que essa era a única forma de desafiar o Labour dentro da própria base do partido. Agindo dessa forma, eles conseguiram reunir partes importantes da base operaria nas cidades. Nas áreas rurais, por outro lado, eles mantiveram sua política burguesa nacionalista.
Por trás dessa política de “esquerda”, há uma orientação pró-negócios que favorece o capitalismo na Escócia. Salmond prometeu “uma regulação leve para o setor financeiro” incentivando Fred Goldwin, presidente do Banco Real da Escócia, a comprar o ABN AMARO, um negocio que empurrou o banco para a falência. O manifesto do PNE também contem trechos que defendem o congelamento de salários no setor público e a redução de 20% no imposto empresarial.
A ideia deles de uma Escócia independente significaria uma “corrida para o fundo do poço”, com trabalhadores escoceses competindo com outros da Europa por mercados cada vez menores. No contexto de uma crise mundial, uma Escócia independente seria esmagada de uma forma parecida com a que vemos na Grécia, Portugal e Irlanda. O fato de a Grécia ser hoje governada por uma Troika europeia demonstra bem como a independência nacional diminuiu no contexto da crise. Toda a argumentação por uma “Europa independente” em uma época de crise econômica quando tudo, inclusive o Euro, ameaça afundar, provou não ter significado algum. Todos os países, embora nominalmente independentes, estão debaixo do mando do mercado mundial e das grandes corporações financeiras e industriais.
O verdadeiro caráter de classe do PNE esta demonstrado em sua defesa do congelamento dos salários dos servidores públicos por cinco anos e pela redução de 20% nos impostos dos ricos. A classe trabalhadora não deve esperar um tratamento muito melhor dos nacionalistas do que aquele que era oferecido pelos Tories ingleses e pelos liberais.
Na Escócia, o PNE, em acordo com Londres, conseguiu retardar a implementação dos cortes planejados, de maneira a aplacar a fúria da população. Isso talvez explique sua atual popularidade. Contudo, em Abril, eles serão forçados a impor um plano de cortes que vale por dois anos em apenas um. A medida que os cortes avançarem, o PNE culpará os conservadores de Londres e dará ao Labour a tarefa de aprová-los.
A curto prazo, isso pode causar dificuldades ao Labour. Podemos ver o exemplo da câmara de vereadores de Glasgow, onde o orçamento só foi aprovado por dois votos de diferença e depois de muitas deserções no lado dos trabalhistas. Seis desses vereadores pretendem lançar um partido rival. É pouco provável que tenham sucesso, mas esse gesto mostra as pressões envolvidas.
Enquanto isso, o PNE, que esta em alta nas pesquisas, pretende ganhar a prefeitura de Glasgow nas eleições de Maio. (O partido ocupou sete das quinze cadeiras de Glasgow no parlamento escocês), se isso ocorrerá temos que esperar para ver. No longo prazo, esse sucesso só viria a causar uma enorme queda de popularidade ao PNE, que se veria obrigado a implementar cortes tanto a nível municipal quanto em toda a Escócia.
 
Os Sectários e o Nacionalismo
 
Os mais diversos tipos de sectários tem uma coisa em comum: sempre capitularam diante do nacionalismo burguês. Eles veem os slogans de autodeterminação e independência nacional como “absolutos”, independentes de tempo e espaço. Essa abordagem nada tem a ver com a de Marx e Lênin, que sempre se basearam na situação concreta e principalmente, sempre submeteram as questões nacionais às questões de classe. Seria um grave erro para os marxistas vestir a toga nacionalista ou adotar uma defesa evangélica da independência da Escócia. Essa seria uma capitulação ao discurso da pequena burguesia, por mais que este estivesse disfarçado de revolucionário.
A questão nacional na Escócia resurgiu em um debate no Militant em 1991, quando a ascensão do nacionalismo escocês serviu como justificativa para a liderança local dar o “giro escocês”. Esse “giro” foi baseado no estabelecimento de uma organização aberta – o Labour Militant Escocês – para supostamente enfrentar os perigos do nacionalismo crescente. Na pratica, embora não admitissem, a maior parte da liderança estava abdicando diante das frustrações e sobretudo, do nacionalismo. Isso logo ficou evidente quando o Militant escocês virou o Partido Socialista Escocês, em 1998, por uma Escócia independente e socialista. No restante da Grã-Bretanha, eles adotaram o nome de Partido Socialista da Inglaterra e País de Gales, para demonstrar sua identidade separada da Escócia.
Toda essa linha política foi uma reprodução da que foi posta em pratica pelo equivoco de John MacLean, que defendeu a necessidade de um Partido Trabalhista escocês diferenciado. Esse erro nasceu da frustração e da falta de confiança na militância trabalhista em todo o Reino Unido. Contudo, em poucos anos toda a Grã Bretanha foi abalada com a greve geral de 1926.
Essa postura do LME e depois do PSE significou o abandono de tudo aquilo que havíamos defendido no passado. “Os socialistas devem estar preparados para apoiar a independência escocesa mesmo que seja sob uma base não socialista como a promovida pelo PNE”, escreveram Tommy Sheridan e Alan McCombes, então lideres do PSE, “os fundamentos materiais para uma democracia socialista já existem na Escócia... temos terra, água, pesca, madeira, petróleo, gás, e eletricidade em abundancia. Temos um clima moderado, onde enchentes, secas e tornados são praticamente desconhecidos.”
Isso demonstrou o quanto eles haviam capitulado diante do nacionalismo, e não somente na Escócia. Para sua vergonha, eles também deram apoio aos croatas no processo de separação da Iugoslávia. Nós apontamos que a separação da antiga Iugoslávia era um ato criminoso que não atendia aos interesses de nenhum dos povos envolvidos. A historia posterior da região comprovou a natureza reacionária do processo, que não pode ser justificado do ponto de vista da classe trabalhadora.
Apesar de seus clamores iniciais, essa iniciativa na Escócia foi uma tentativa de imitar o racha do Labour em 1976, quando John Sillars e Robertson lançaram o Labour escocês, já fadado ao fracasso desde o começo. Nós condenamos esse racha na época, mas isso foi convenientemente esquecido.
Os “marxistas” foram tão longe a ponto de propor a fundação de um partido escocês autônomo para falar em nome da classe trabalhadora escocesa. Essa abordagem errônea não era inédita. Originalmente, essas ideias foram defendidas por trotskistas nos EUA, que advogavam por partidos separados em raça, gênero e nacionalidade. Isso vai contra os princípios básicos do bolchevismo, que se opunha á perigosas divisões no movimento operário. Eles se opunham ao ABC do marxismo na questão das nacionalidades.
Mesmo na Rússia czarista (uma prisão de nacionalidades), onde os russos eram 43% da população, Lenin se opunha às divisões com base nas nacionalidades. Ele se mantinha firme na unidade da classe trabalhadora. Ele lutou contra as tentativas de organizar entidades separadas para trabalhadores judeus, apesar do fato de que eles sofriam opressões diferenciadas e falavam outro idioma.
O PSE teve algum impacto inicial. A desilusão com o governo Blair de Londres fez com que parte da esquerda do Labour os apoiasse temporariamente, o que resultou no ganho de seis parlamentares e dois conselheiros em 2003. Em 2007, porém, eles perderam tudo e o partido implodiu. A tentativa de romper a hegemonia do Labour ou de fundar um partido de esquerda forte em seu lugar fracassou. Desde então, o giro a direita do Labour e a sucessão de governos trabalhistas em Londres abriu ainda mais espaço para os nacionalistas.
Portanto, a tentativa de fundar uma alternativa a esquerda do Labour, em bases bastante oportunistas, fracassou. Desde então, o PSE se dividiu e hoje praticamente desapareceu.
 
Os Escoceses querem a Independência?
 
Enquanto que os nacionalistas ganharam a maioria dos assentos de Holyrood, seu apoio não vem de seu discurso de independência, e sim da desilusão dos trabalhadores com o Labour em Westminster e seu homônimo escocês. Devemos ser cuidadosos e não confundir apoio aos nacionalistas com apoio á independência.
O apoio a independência na Escócia variou ao longo dos anos, chegando a um pico de 47% em Março de 1998 a 20% em 2009. Em Dezembro de 2011, voltou a subir e chegou a 38% (uma pesquisa feita pelo site YouGov em Janeiro verificou 33% a favor da independência e 53% contrários). Esses números coincidiram com a ascensão dos nacionalistas, que chegaram a 50% nas pesquisas, contra 26% do Labour, 12% para os Tories, 8% para os Liberal Democratas e 4% para os demais.
Enquanto que não há uma maioria a favor da independência, o apoio por medidas como essa demonstram um desejo de assumir maior controle sobre seus próprios assuntos. Precisamos ser sensíveis a esse desejo, que parte da vontade do povo escocês de ter um maior controle sobre suas próprias vidas. Portanto, devemos apoiar uma maior autonomia para o parlamento escocês.
Até certo ponto o apelo ao nacionalismo sofreu um abalo com a crise, que viu o discurso de “um arco de prosperidade” que envolveria, além da Escócia, a Irlanda, Islandia e Noruega. O “arco da prosperidade” foi reduzido a um “arco de crise”. A crise do euro também levou a pique a ideia dos nacionalistas de adotar o Euro como alternativa à Libra. Mas desde então, o apoio aos nacionalistas se recuperou e até aumentou depois das eleições de 2011. Isso, porém, não vai durar a medida que os cortes forem sendo aplicados.
O apoio do PNE à independência sempre foi bastante qualificado. Eles garantiram aos eleitores que a Rainha continuaria a ser a chefe de Estado mesmo após a separação. Eles também manteriam o uso da Libra ao invés do Euro. Mais recentemente, eles declararam que teriam no Banco da Inglaterra uma fonte de investimentos!
Ao lado disso, apesar de sua retórica anti nuclear, a questão das bases militares britânicas e das armas nucleares permanece nebulosa na proposta de independência do PNE.
Ao contrário da Escócia, a questão do nacionalismo no País de Gales é bem menos preponderante. Assim como na Escócia, a política de direita do Labour levou a desilusão de boa parte da classe trabalhadora ao partido, que sempre teve uma base solida na região, refletindo a composição proletária do país. Isso permitiu que o partido nacionalista local (Play Cymru) crescesse e até formasse coalizão com o Labour em administrações passadas. Mas recentemente esse partido tem perdido força.
Nas eleições legislativas de 2011, pela primeira vez o Play Cymru conseguiu menos assentos que o Torie. Mais uma vez, para conseguir apoio, o partido lançou a questão da independência. Enquanto que o partido tem o apoio de 20% do eleitorado, a questão da independência tem apoio de metade dessa porcentagem. Como resultado, alguns lideres do partido, de forma ultra oportunista, qualificaram a questão como “irrelevante”. Eles dizem, na prática: “se você não gosta dos meus princípios, posso mudá-los”.
O Play Cymru esta hoje em conflito com sua identidade e deu um Lee giro á esquerda, com a eleição de Lianne Wood para a liderança do partido. Com um governo trabalhista em Cardiff se apresentando como defensor dos interesses nacionais contra a ação da coalizão conservadora em Londres, o Plaid Cymru percebe que é difícil se posicionar, que a ideia de independência tem muito pouco apelo. Rhodri Glyn Thomas, um membro do parlamento, disse o seguinte:
“A economia esta em crise, o desemprego cresce mês após mês e alguém que falar de um conceito (independência) que ninguém entende bem o que significa. Infelizmente, porque na Escócia eles farão um plebiscito sobre o assunto, alguns acham que deveríamos fazer o mesmo aqui. Eu sugiro que elas vão à Escócia.”
Por isso é que Lianne Wood quer se concentrar nos assuntos econômicos, tais como a queda dos salários, desemprego e estresse no trabalho. Essa é a única direção que eles podem tomar se quiserem desafiar a hegemonia dos trabalhistas galeses. Contudo, com a polarização de classes cada vez mais clara, o próprio Labour será forçado a assumir posições mais radicais para manter o apoio de sua base e assim, os nacionalistas à margem das massas trabalhadoras.
A posição marxista sobre o assunto nada tem a ver com a dos partidos nacionalistas ou sindicalistas. Nossa visão é baseada nos interesses do povo escocês e principalmente, da classe trabalhadora escocesa e da Grã Bretanha como um todo. A Escócia é uma nação e seu povo tem direito a auto determinação. Contudo, a questão nacional, quando não abordada da forma correta, pode terminar em desastre. Em todos os casos, devemos nos perguntar: isso ajuda ou atrapalha a luta pelo socialismo? Ajuda a classe trabalhadora ou apenas cria divisões em seu interior? A resposta para essas duas perguntas determinará nossa postura, e nada mais.
 
Referendo
 
Como marxistas, devemos apoiar o referendo na Escócia sobre a independência nacional como um direito democrático. O PNE conquistou maioria no parlamento escocês, e o plebiscito é sua política. Salmond disse que o referendo será no  outono de 2014, no 700º aniversário da batalha Bannockburn, quando Robert, o Bruce derrotou os ingleses, ou mais importante, quando a Escócia vai sediar os jogos da Comunidade Britânica e a Copa Ryder. Eles estão se esforçando para adiar essa votação para o mais longe possível, mas isso pode ser contraproducente se por acaso o mundo sofrer outro abalo financeiro.
Contudo, nós continuamos firmemente opostos ao nacionalismo pequeno burguês que procura dividir a classe trabalhadora e suas instituições. Continuaremos a defender maior autonomia na Grã Bretanha, mas permaneceremos contrários à separação. Ao invés disso, apoiaremos a luta pelo socialismo no Reino Unido e internacionalmente e a união vital da classe trabalhadora nas ilhas britânicas para atingir esse fim.
O povo escocês tem direito a um referendo democrático sobre a independência sem qualquer interferência do governo de Westminster. Marxistas defendem o direito de auto determinação dos povos, inclusive à separação, caso esses povos assim desejem. Nós apoiamos suas aspirações nacionais por um governo próprio. Se a questão econômica for determinante para deixar ou permanecer no Reino Unido, argumentaremos contra.
É claro que não apoiamos o status quo, uma vez que não oferece qualquer solução real para os problemas da classe trabalhadora escocesa. Ainda assim nós enfatizaremos que uma independência sob uma base capitalista não resolveria os problemas dos trabalhadores. Nós precisamos nos diferenciar dos Tories e liberais que simplesmente defendem a União. Por outro lado, devemos sempre manter firmes as bandeiras por uma Grã Bretanha socialista e pelo socialismo internacionalista.
A questão do referendo escocês tem certo paralelo com o referendo do Mercado Comum de 1975, em relação a posição que tomamos. Então nós nos opusemos á entrada do Reino Unido no bloco e colocamos uma palavra de ordem alternativa: “Estados Unidos Socialistas da Europa”. Isso nos permitiu manter distancia dos conservadores e dos reformistas (inclusive stalinistas) que se opunham ao Mercado Comum por razões puramente nacionalistas.
É importante que façamos uma distinção clara entre nossa análise e a dos liberais, conservadores, trabalhistas e outros que só vão apoiar “devolução máxima” de autonomia na cédula de voto. Precisamos explicar que apoiamos essa iniciativa como parte da luta socialista, ligando-a com um governo trabalhista socialista que use seu poder para implementar medidas socialistas, coordenar nacionalizações, etc. Também devemos esclarecer que vemos isso como parte da luta de classes e uma ferramenta que pode ser utilizada para conscientizar e mobilizar os trabalhadores no resto da Grã Bretanha e do mundo.
Naturalmente alguns sectários sairiam em defesa da independência da Escócia, argumentando que seria “um golpe contra o estado britânico”. Essas pessoas não possuem qualquer perspectiva ou princípios validos e nada têm a ver com o marxismo. Eles representam uma adaptação oportunista do nacionalismo pequeno burguês. A perspectiva de uma revolução socialista vitoriosa na Escócia ou no País de Gales passa obrigatoriamente pela derrubada do capitalismo britânico em seu conjunto. A ideia de “socialismo em um só país” foi uma utopia reacionária da URSS. O que alguém pode dizer sobre uma “Escócia socialista” ou um “País de Gales socialista”?
Nós consideramos o desenvolvimento dos sindicatos e organizações políticas em toda a Grã Bretanha como um enorme avanço histórico. Portanto, rechaçaremos sempre qualquer tentativa de fazer retroceder o relógio da história e dividir o movimento operário em fronteiras nacionais. A ideia de que as ações revolucionárias da classe trabalhadora de Glasgow estarão divorciadas das dos trabalhadores de Newcastle, Manchester, Liverpool e Cardiff é ridícula. Colocar a revolução socialista em termos nacionalistas é completamente reacionário e indica uma mentalidade provinciana infantil. Como internacionalistas, devemos colocar a questão da revolução britânica no contexto da revolução europeia e mundial.
 
Unidade da classe
 
Historicamente, a classe trabalhadora britânica é uma só classe. Trabalhadores ingleses, escoceses e galeses compartilham uma historia de lutas de mais de dois séculos. Manter essa unidade é fundamental para derrotar a classe dominante britânica, que luta para manter seu domínio. Para combater os capitalistas britânicos é necessária a unidade de todos os trabalhadores a nível britânico em uma luta comum contra um inimigo comum.
Para triunfar em sua luta para derrotar o capitalismo e construir uma nova sociedade, os trabalhadores escoceses devem juntar forças com os milhões de operários ingleses e galeses. Qualquer ruptura nessa unidade significaria um grande golpe na luta pelo socialismo. A luta de classes na Grã Bretanha já se expande a um nível nacional. A unidade instintiva já foi demonstrada pelo movimento estudantil, que fez protestos de massas contra medidas que só seriam aplicadas, naquele momento, na Inglaterra e no País de Gales. Mais tarde, mais provas dessa unidade seriam dadas na disputa pelo governo local.
Com base na crise e nas medidas de austeridade que irá aplicar, o PNE verá seu apoio diminuir cada vez mais. A ideia de um “arco de prosperidade” no norte da Europa se provou totalmente falsa. Suas tentativas de impor medidas que agradem os investidores os colocarão em conflito com a classe trabalhadora. Os eventos sombrios que se aproximam servirão para alterar a consciência das massas na Escócia e em outros lugares.
O desenvolvimento das lutas operárias na Inglaterra, Escócia e País de Gales, como vimos na magnífica greve de 30 de Novembro, tenderá a unificar ainda mais os trabalhadores e, consequentemente, diluir a influencia nacionalista e liquidar os partidos que a sustentam. Somente a retomada das tradicionais organizações de massa da classe trabalhadora com genuínas políticas socialistas e o desenvolvimento de uma esquerda dentro de suas fileiras poderá se apresentar como alternativa aos setores que têm referencia nos nacionalistas.
A principal tarefa do proletariado escocês é se juntar com seus companheiros ingleses e galeses no combate às medidas do governo de coalizão. É a luta por políticas socialistas que é a verdadeira resposta à crise capitalista. A luta por uma Grã Bretanha socialista incluirá a auto determinação da Escócia e País de Gales como parte dos Estados Unidos Socialistas da Europa e de uma Federação Mundial de Estados Socialistas. Essa é a única saída
Traduzido por Arthur Penna