Mostrando postagens com marcador sustentabilidade. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador sustentabilidade. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 28 de maio de 2012

A primavera brasileira


Luis Nassif na CARTA CAPITAL

O conceito da “primavera” foi adotado para descrever países ou comunidades em que a Internet entrou quebrando barreiras de silêncio.
Nos países de regime ditatorial, a “primavera” significou romper o controle estatal sobre a informação. Mas em muitos países democráticos, significou romper cortinas de silêncio impostas pela chamada velha mídia – os grandes meios de comunicação nacionais.
Nos Estados Unidos, a blogosfera ajudou a romper o sigilo em torno das guerras do Iraque e Afeganistão. Na Espanha, antes mesmo da explosão da Internet, os sistemas de SMS (torpedos) telefônicos ajudaram a desarmar a tentativa de grandes grupos midiáticos de atribuir um atentado à oposição.
Na Argentina, há um conflito latente entre o governo Cristina Kirchner e os grandes grupos midiáticos. No momento, passeatas tomam as ruas da cidade do México, contra a imprensa local.
No Brasil, em pelo menos três episódios exemplares a blogosfera foi fundamental para romper barreiras de silêncio.
O primeiro foi na Operação Satiagraha, da Polícia Federal. Capitaneados pela revista Veja, a chamada grande mídia se esmerou em demonizar os agentes públicos, vitimizar o banqueiro Daniel Dantas e transformar Gilmar Mendes no maior presidente da história do STF (Supremo Tribunal Federal).
Apenas a blogosfera preocupou-se em mostrar o outro lado, o das investigações.
O episódio terminou com o Opportunity se safando junto à Justiça. Mas, no campo da opinião pública, poder judiciário, ministros que se aliaram ao banqueiro, o próprio banqueiro e Gilmar Mendes saíram amplamente derrotados. O episódio mostrou os limites da grande mídia para construir ou destruir reputações.
Várias armações foram denunciadas pela blogosfera, como o caso do falso grampo no STF, o grampo sem áudio da suposta conversa entre Demóstenes Torres e Gilmar Mendes, a lista falsa de equipamentos da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) brandida pelo então Ministro da Justiça Nelson Jobim.
O segundo episódio relevante foi a promoção do livro “A Privataria Tucana”, com indícios de enriquecimento pessoal do ex-governador José Serra. Apesar de totalmente ignorado pela velha mídia, o livro bateu todos os recordes de vendas do ano.
Agora, tem-se o caso do envolvimento da revista Veja com o bicheiro Carlinhos Cachoeira. Foram quase dez anos de parceria, que transformaram o bicheiro no mais poderoso contraventor da república.
Graças às reportagens de Veja, o senador Demóstenes Torres tornou-se símbolo da retidão na política. Com o poder conquistado, participou de inúmeros lobbies em favor de Cachoeira e de avalista das denúncias mais extravagantes da revista.
Veja sempre soube das ligações de Demóstenes com Cachoeira. Mas por quase dez anos enganou seus leitores, não só escondendo essa relação, como difundindo a ideia de que Demóstenes era político inatacável.
Na velha mídia, não há uma linha sobre essas manobras, nada sobre as 47 conversas gravadas entre o diretor da revista em Brasília e Cachoeira, as quase 200 dele com todos os membros da quadrilha.
Assim como no Egito, Estados Unidos, Espanha, México, França, é a Internet que está explodindo cortinas de silêncio.

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Dia Internacional da Biodiversidade: a atração da humanidade pela destruição


Há uma década, o mundo tinha um total de 11 mil espécies ameaçadas de extinção. A ONU estabeleceu então a meta de reduzir significativamente esse número. Não deu certo. Desde a Rio 92, o mundo teve uma perda de biodiversidade de 12%, emitiu 40% mais gases poluentes e as florestas diminuíram 3 milhões de metros quadrados.


Os filmes-catástrofe trazem uma situação recorrente: em algum momento, um cientista considerado meio maluco ou alguma outra pessoa (um policial, jornalista, bombeiro, etc) alerta para um perigo iminente. O alerta inicial é ignorado e, muitas vezes, rechaçado por argumentos que, na maioria dos casos, tem uma base econômica. Os fatos se sucedem, as ameaças tornam-se realidade e aqueles que desprezaram o alerta inicial muitas vezes acabam vitimados na tela. Na vida real, não são só os vilões irresponsáveis que morrem. As tragédias abatem-se democraticamente sobre todos. O cinema não inventou essa lógica do nada, mas a retirou da vida real, onde ela segue hegemônica. Os crescentes e repetidos alertas sobre a destruição ambiental no planeta seguem sendo subjugados por argumentos de natureza econômica.

Todo mundo hoje, em tese, se preocupa com o meio ambiente, desde é claro, que ele não se torne um “entrave” para o desenvolvimento, como se viu, mais uma vez, no recente debate sobre as mudanças no Código Florestal brasileiro. O policial está na beira da praia alertando o prefeito para que mantenha a interdição da mesma porque tem tubarão na área. O prefeito não quer nem saber da ideia, pois a interdição atingiria em cheio o turismo, principal fonte de renda da comunidade. O geólogo pede a evacuação imediata de uma cidade em função da ameaça de um vulcão. Mais uma vez, o turismo ergue-se reivindicando seu espaço. Uma jornalista denuncia o risco de acidente em uma usina nuclear. A bancada ruralista é universal e está sempre pronta a bloquear “alertas catastrofistas” e outras formas de entraves ao desenvolvimento. E assim vamos.

Este 22 de maio, Dia Internacional da Biodiversidade, foi marcado por novos alertas sobre a destruição da diversidade biológica no planeta Terra, em especial nos oceanos, que ganharam atenção especial da ONU este ano. Algumas das informações mais recentes de órgãos ligados às Nações Unidas e a centros de pesquisa apontam o seguinte quadro no planeta:

Apenas no século XX, graças à ação humana, sumiram do planeta metade das áreas pantanosas, 40% das florestas e 30% dos manguezais.

Desde a Rio 92, o mundo teve uma perda de biodiversidade de 12%, emitiu 40% mais gases poluentes e as florestas diminuíram 3 milhões de metros quadrados.

Cerca da metade das reservas de pescas mundiais estão esgotadas;

Um terço dos ecossistemas marítimos mais importantes foi destruído;

O lixo plástico segue matando a vida marinha e criando áreas de águas litorâneas quase sem oxigênio.

Há uma década, o mundo tinha um total de 11 mil espécies ameaçadas de extinção. A ONU estabeleceu então a meta de reduzir significativamente esse número. Não deu certo. Ele aumentou.


Em 2002, os países signatários do Convênio sobre a Diversidade Biológica acordaram que deveriam obter essa redução no ritmo da perda de biodiversidade em 2010, Ano Internacional da Diversidade Biológica. A avaliação dessa meta foi coordenada pelo Centro de Monitoramento para a Conservação Mundial do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Ela baseou-se em uma série de indicadores, tais como a apropriação de recursos naturais, o número de espécies ameaçadas, a cobertura de áreas protegidas, a extensão de bosques tropicais e manguezais e o estado dos arrecifes de coral.

Os resultados foram conclusivos: a biodiversidade vem caindo nas últimas quatro décadas. Caindo significa: extinção de espécies, redução da extensão de bosques e manguezais e, deterioração de zonas com arrecifes de coral. Além disso, a avaliação mostrou que ambientes naturais estão se fragmentando, com destruição de flora e fauna. A Mata Atlântica brasileira seria um exemplo disso. No passado, o segundo bosque mais extenso da América do Sul, hoje se conservam aproximadamente 10%, numa área fragmentada em parcelas diminutas.

A situação dos oceanos também é motivo de crescente preocupação. A Convenção sobre a Diversidade Biológica da Organização das Nações Unidas lançou hoje (22) o livro “Um oceano: muitos mundos de vida”. A obra destaca a importância dos oceanos, que cobrem cerca de 70% do planeta, e alguns dos principais problemas que os afetam hoje, como o aumento da acidez causado pela poluição, a destruição de reservas marinhas e a crescente pressão econômica pela exploração de seus recursos naturais. Ao todo, estão ameaçadas pelo menos 250 mil espécies, conforme o censo marinho realizado entre 2000 e 2010 por 2.700 cientistas de mais de 80 países.

Há um aparente paradoxo cercando essa profusão de alertas e advertências sobre o estado ambiental do mundo. Nunca houve tanta informação disponível e tanta manifestação de preocupação com a degradação física do planeta, inclusive por parte das autoridades governamentais. No entanto, os números da destruição vêm aumentando e a crise econômica em escala internacional pressiona os países a empurrar esse debate com a barriga para um futuro incerto. Há vários níveis de ignorância e incompreensão neste debate. A extinção de uma espécie de bromélia no interior do Rio Grande do Sul ou de uma espécie de besouro no leste da Tanzânia são tratadas quase que como excentricidades. Isoladamente até poderiam ser. O “detalhe” é que, em se tratando de vida e ecossistemas, nunca são acontecimentos isolados, resultando de uma mesma lógica destrutiva hegemônica em escala planetária.

O cientista maluco, a jornalista sensacionalista e o policial paranoico seguem fazendo seus alertas e divulgando seus números. O imaginário da humanidade, porém, como vem antecipando o cinema há algumas décadas, parece ter uma atração irresistível pela destruição e pela morte.

Marco Aurélio Weissheimer é editor-chefe da Carta Maior (correio eletrônico: gamarra@hotmail.com)

MC DONALD'S│Bolívia, amônia e baratas

MC DONALD'S│Bolívia, amônia e baratas 

Créditos: CIDADE DE MINAS

CONHEÇA AQUI O 'INOFENSIVO' HIDRÓXIDO DE AMÔNIO, PRESENTE NA CARNE VENDIDA NOS MC DONALD'S. VOCÊ AMA ISTO?!
 VEJA AQUI COMO A MÍDIA NATIVA TRATA COM CARINHO A EMPRESA NORTE AMERICANA.
JAMIE OLIVIER DENUNCIOU EM SEU PROGRAMA DE TV O USO DE HIDRÓXIDO DE AMÔNIA PELO MC DONALD'S PARA TRANSFORMAR EM 'CARNE' OS RESTOS...
UM POVO DIGNO E ALTIVO, QUE NUNCA SE DOBROU AO CONQUISTADOR APESAR DOS SÉCULOS DE DOMINAÇÃO...
FECHADO POR CAUSA DAS BARATAS NO RIO GRANDE DO SUL.
NÃO!


segunda-feira, 30 de abril de 2012

Altamiro Borges: 1º de Maio e a histeria da mídia

no PORTAL VERMELHO


Já virou rotina. Sempre que se aproxima a comemoração do Dia Internacional do Trabalhador, a mídia patronal publica editoriais e “reporcagens” contra o sindicalismo. É a mesma ladainha: as leis trabalhistas são “anacrônicas” e “engessam” o crescimento econômico, há libertinagem nas greves e o Brasil caminha para uma “república sindicalista” – o refrão preferido dos golpistas de 1964.


Hoje, a Folha criticou o fato das centrais sindicais receberem patrocínios oficiais para a realização dos atos do 1º de Maio. Para a mídia patronal, só os patrões deveriam receber recursos públicos – que proveem dos impostos dos trabalhadores – para realizar as suas festivas atividades. Dinheiro público para as elites empresariais, sim; para eventos dos trabalhadores, nunca!

O falso discurso da transparência

Segundo a matéria, que parece ter sido encomendada, “o governo federal dobrou, em três anos, o valor repassado às principais centrais [através de um percentual da contribuição sindical], que preparam festas milionárias para celebrar o feriado do Dia do Trabalho. O bolo destinado às centrais saltou de R$ 62 milhões em 2008 para R$ 124 milhões no ano passado”.

A Folha garante que, “apesar da origem pública, não há nenhuma fiscalização sobre o uso da verba”. Já que é tão transparente, o jornal bem que poderia publicar quanto recebe de publicidade oficial ou de isenções no papel para a impressão; também poderia informar aos leitores quanta grana as empresas e os governos destinam para financiar os seus inúmeros eventos.

Asfixiar financeiramente os sindicatos

Além de criticar os patrocínios às comemorações do Dia Internacional dos Trabalhadores, o diário da famiglia Frias aproveita para satanizar a contribuição sindical descontada na folha de pagamento. Para os empresários, o sindicalismo deveria receber menos recursos. De preferência, deveria morrer à míngua. Desta forma, não promoveria tantas lutas e greves. Não daria tanta dor de cabeça!

Segundo a Folha, o ex-presidente Lula, que teve a sua origem no sindicalismo, beneficiou as centrais ao garantir recursos para a sua atuação. “Nos primeiros quatro anos da regra, as seis centrais receberam um total de R$ 370 milhões. A exemplo do Ministério do Trabalho, todas defendem a cobrança obrigatória, à exceção da CUT”, informa jornal, que sempre pregou o fim deste “privilégio”.

Restrições ao direito de greve

No mesmo rumo da satanização do sindicalismo, editorial do Estadão de segunda-feira passada (23) criticou o aumento do poder de mobilização dos trabalhadores do setor público. Para o jornalão da famiglia Mesquita, que iniciou a sua trajetória publicando anúncios da venda de escravos, o governo deveria restringir drasticamente o direito de greve do funcionalismo.

“Números divulgados pelo Dieese chamam a atenção, mais uma vez, para a urgência de regulamentação do direito de greve de servidores públicos civis. Em 2009 houve 518 greves, o maior número no país desde 1978, com 266 no setor privado, ou 51,5% do total, número ligeiramente superior às 251 greves do setor público... Em 2010, porém, o setor público passou a liderar em número de greves, tendo deflagrado 269 paralisações, 60% do total de 448”.

Que tal o retorno à escravidão?

Para o Estadão, estes números são absurdos. Os servidores deveriam ser reprimidos – ou melhor, sumariamente demitidos. “Com tantas greves e horas não trabalhadas, a máquina do governo, que não prima pela eficiência, é ainda mais emperrada e aumentam os gastos de custeio”. O jornal da famiglia Mesquita culpa os governos Lula/Dilma por não restringirem as greves no setor público.

Sem esconder as suas predileções partidárias, o Estadão apoia descaradamente um projeto do senador Aloysio Nunes, do PSDB, que tramita no Congresso. “O projeto ataca o cerne da questão, definindo com clareza serviços que não podem ser paralisados, em hipótese alguma - abastecimento de água, fornecimento de energia, segurança pública, defesa civil, assistência médico-hospitalar, transporte coletivo, telecomunicações, serviços judiciários, etc”. Ou seja: quase todos os servidores públicos!

Como se observa, a mídia patronal não tolera as lutas dos trabalhadores. O seu desejo insaciável é para retirar direitos trabalhistas, criminalizar as greves e asfixiar financeiramente o sindicalismo. Se pudesse, até proibiria a comemoração do Dia Internacional dos Trabalhadores – como ocorre nos EUA. Ou melhor: ela imporia um decreto pelo retorno da escravidão! Seria bem mais simples.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Por uma infância livre de consumISMO

do blog TREZENTOS


A internet é realmente uma revolução. E quando usada para o bem, é maravilhosa. Existe um projeto de lei, que tramita há 10 anos, com o intuito de proibir a veiculação de publicidade direcionada ao público infantil. Parece radical, parece censura? Mas não é. Lembram-se da publicidade para cigarros? A propaganda de cigarro gerou a mesma polêmica e só ganhamos com a ausência das “caras de pau” das empresas e publicitários que insistiam em associar cigarro a esporte e vida saudável e bem sucedida. Uma reportagem com fumantes famosos confirma que a maioria fumou para ser moderno e se inserir no grupo social que desejavam. Hoje se arrependem pois não conseguem se livrar do vicio. Assim é a publicidade infantil. No futuro teremos criancas com a vida pautada na satisfação exclusiva pelo consumo. Comprar é viciante e a insatisfação compulsiva já se trata nos consultorios e com medicação tarja preta como antidepressivos e ansiolíticos, porque hoje, quem não consome, não faz parte da turma moderna, descolada e bem sucedida. Qualquer semelhança com o cigarro é mera coincidência?
Para completar ,  a Associação de Agências de Publicidade, criou uma ação que pretende parecer dizer que todos somos responsáveis pela infância.  À primeira vista, a gente entende que a intenção da campanha é chamar todos à reflexão mas não é isso. A campanha empenhou-se em culpabilizar exclusivamente os pais pelo controle do que os filhos assistem na TV, como se as empresas não tivessem responsabilidade nenhuma sobre o que fabricam, vendem e anunciam, e as agências de publicidade sobre suas ações de marketing para promover qualquer tipo de produto e serviço direcionado ao público infantil. Uma ação com título dúbio, com atitudes dúbias, com intenções dúbias, assim como é a publicidade voltada para crianças que não têm condições de distinguir o que é bom para elas, o que é realidade, o que é mentira e o que manipulação. Nós adultos somos ludibriados, imaginem as crianças!
Os pais ativistas da internet se uniram e reagiram na hora. E a ABAP tratou-os com um desrespeito e desprezo absurdo, apagando suas mensagens na página da campanha, manipulando os comentários, banindo comentaristas que se opunham ao que eles queriam propagar. E ainda dizendo que nós, pais, queremos censurar a propaganda e impedir a liberdade de expressão da pobre publicidade. Liberdade de expressão só deles, basta ver as regras de participacão do seu site que a gente vê a cara ditatorial e demagógica de suas intenções. Mas uma coisa importante de se tentar entender, é o que a publicidade espera dos pais quando os culpabiliza. Afinal, o que querem que façamos: ficamos em casa cuidando do lixo propagandeado excessivamente às crianças ou saimos para trabalhar como loucos para poder consumir o que eles anunciam? Fiquei confusa.
O que eles não esperavam , era encontrar pais instruídos, informados e prontos para defender o bem estar de seus filhos respondendo na mesma moeda: criaram um site para divulgar a importância de se botar um freio na farra da publicidade infantil. E o site dos pais, entitulado INFÂNCIA LIVRE DE CONSUMISMO, recheado de depoimentos, artigos técnicos, reportagens, charges e imagens  relacionadas ao tema, atingiu, em apenas 3 dias, o mesmo número de simpatizantes e apoiadores que o site da ABAP levou 1 mês para conseguir.
E em 5 dias, o site Infância Livre, conseguiu ultrapassar o site da ABAP, que vale lembrar, é mantido por uma agência de publicidade contratada, o que não acontece com a ação dos pais da internet. Isso nos leva a pensar em outras coisas. Por que a ABAP faria uma ação tão desastrosa? Por que usaria profissionais tão amadores? Por que não teria o menor constrangimento em agir com tão pouca ética com os usuários do site? Será que isso se resume em apenas uma questão: eles subestimam as famílias? Os pais? E acham que somos realmente uma massa tola e manipulável sem força nenhuma para reagir?
Hoje, a publicidade é autorregulamentada pelo CONAR – Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária e isso é péssimo para a nossa sociedade a começar pelo fato que o conselho de ética da entidade tem apenas 19 pessoas representam a sociedade civil, dentre eles, seis jornalistas, três advogados e apenas um médico, enquanto as outras 136 pessoas representam anunciantes ou veículos de comunicação. Isso prova, na base, o tamanho do problema que é o 

controle da publicidade brasileira que está longe de defender os interesses da sociedade.
Por isso, esse grupo de mães e pais, que defende a infância, convida a todos a conhecer e CURTIR  esta iniciativa no Facebook . Ela tem o intuito de informar e mostrar os argumentos que levam a ver essa necessidade tão grande de se proteger nossos filhos dos malefícios de uma propaganda que é estratégicamente pensada e elaborada para encantar, que não os respeita, que os engana, que os faz acreditar numa falsa sensação de alegria e determina o que se tem como fator primordial de status social desde a mais tenra idade.  E que ao repensar a publicidade, estamos pensando na forma como estamos consumindo o planeta, já que o consumismo está na contramão da educação para o futuro e da sociedade mais sustentável que buscamos.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

''No enfrentamento cotidiano ao capital que o campesinato se constrói como classe''

040412_horacioMST - Horacio Martins de Carvalho, engenheiro agrônomo e cientista social, fala em entrevista ao MPA sobre as tarefas estratégicas do campesinato na construção de sua própria autonomia frente ao agronegócio, além do papel e do caráter da luta dos movimentos camponeses perante o Estado brasileiro que é o grande financiador desse modelo de produção hegemônico.

Horário é membro do Conselho da Associação Brasileira de Reforma Agrária – ABRA, onde também foi presidente.


Quais as tarefas dos camponeses na construção de sua "autonomia" frente ao modelo do agronegócio?

A construção da autonomia relativa dos camponeses perante o capital tem como uma exigência política que o próprio campesinato seja capaz, via as suas mediações de representação de interesses (organizações e movimentos sociais e sindicais), de se constituir como classe social. Para tanto, é importante, senão indispensável, que compreenda a sua relação contraditória de classe com as diversas frações de classe do capital, seja a burguesia bancária, industrial, comercial e/ou agrária.
É na prática cotidiana de enfrentamento do capital que o campesinato se constrói como classe social. A autonomia relativa do campesinato perante o capital expressa a possibilidade efetiva dos camponeses de se reproduzirem socialmente sem dependerem da empresa capitalista, ao menos na maior parte das suas realizações até que se possa construir um Estado popular que supra suas necessidades de instrumentos de trabalho como as máquinas e implementos e amplie o seu contingente de camponeses pelo acesso à terra via uma reforma agrária popular.
Nessa perspectiva são diversas as tarefas para se alicerçar a construção da autonomia relativa camponesa perante o capital, este materializado na burguesia. É recomendável, contudo, se agrupar tais tarefas em dois níveis: as tarefas estratégicas e as tarefas táticas.
As tarefas estratégicas, em geral de médio e longo prazo, deveriam ser elaboradas a partir das questões estruturais concernentes com a reprodução social do campesinato numa formação econômica e social onde o modo de produção capitalista é dominante e hegemônico. Tais tarefas estratégicas seriam, então, definidas historicamente pela dinâmica das relações de classe sociais contraditórias entre o campesinato e as diversas frações de classe da burguesia (burguesia industrial, bancária, comercial e agrária).
Nessa perspectiva, os camponeses deveriam se identificar como sendo uma classe social diferente do proletariado e da burguesia. E a partir daí serem capazes de definir seus interesses de classe que teriam como centralidade a reprodução social da família camponesa. Esse interesse estratégico da classe camponesa é inteiramente distinto do interesse central da reprodução social capitalista que tem como centralidade o lucro.
Ao se considerar que há distinção entre a centralidade de reprodução social da família camponesa e aquela da empresa capitalista no campo (o lucro), estar-se-ia assumindo que a lógica da reprodução social do campesinato é inteiramente distinta daquela da empresa capitalista. Portanto, pode-se afirmar que há uma especificidade camponesa, uma lógica própria que orienta e conduz a sua reprodução social e é, nessa perspectiva, distinta e mesmo contrária, à racionalidade de reprodução social capitalista, esta baseada na exploração do trabalhador assalariado e, via as trocas comerciais nos mais distintos mercados, do campesinato.
Dois eixos centrais poderiam orientar as estratégias camponeses, capazes de construir autonomia relativa o camponês perante o capital: o primeiro, seria construir uma base recursos autogerida, capaz de tornar o camponês menos dependente dos insumos de origem industrial (prática de outro padrão tecnológico); o segundo residiria na relação camponês com a natureza onde a coevolução estivesse presente (evolui a produção camponesa mas evolui a natureza no sentido da sua preservação e melhoramento).
As tarefas táticas seriam aquelas que se estabelecem nas relações entre o campesinato e o Estado. São as tarefas pautadas pela reivindicação de políticas públicas favoráveis ao campesinato e o protesto contra a discriminação dos camponeses no acesso às políticas públicas e à afirmação de seus direitos como cidadãos. É no exercício das tarefas táticas que os camponeses acumularão forças para se constituírem politicamente como classe social.

Qual papel dos movimentos camponeses em uma conjuntura de avanço do Modelo agrícola hegemoneizado pelo Agronegócio?

O papel mais relevante esperado dos movimentos e organizações sociais e sindicais camponesas é a afirmação da sua especificidade camponesa. Significa negar que os camponeses não possuem identidade social, mesmo se contemplando a ampla diversidade de formas de se relacionar tanto com a natureza como socialmente: proprietários de terras, posseiros, arrendatários, parceiros, foreiros, etc. Ao afirmarem a sua especificidade como camponeses, portanto, como famílias que tem como centralidade no processo de produção a sua reprodução social, sendo ao mesmo tempo os que decidem sobre a alocação da força de trabalho familiar e os que usufruem dos resultados obtidos, deixam de se confundirem com os pequenos burgueses (fração da burguesia) ou como proletários. São camponeses.
Essa afirmação da especificidade camponesa e da sua construção política como classe social demanda que o campesinato tenha um projeto de construção de um outro tipo ou modelo de agricultura para o país. Ao negarem o modelo agrícola hoje hegemoneizado pelo agronegócio necessitam afirmar uma outra proposta que nega a atual e construa um novo modelo de relação homem-natureza e homem-homem.
Nessa perspectiva, as dimensões econômica, política e ideológica devem estar integradas. Significa dizer que os camponeses, com o apoio do proletariado rural e urbano, devem ser portadores de uma concepção de mundo distinta da capitalista. A construção dessa nova proposta é a tarefa estratégica principal dos movimentos e organizações sociais e sindicais camponeses. Isso porque sem essa perspectiva de médio e longo prazo para a luta social camponesa as tarefas táticas tornar-se-ão dispersas e o acúmulo de forças no sentido da realização dos interesses de classe dos camponeses (e mais amplamente camponês-proletariado) serão mínimos e insuficientes para mudarem a correlação de força política de classe em presença num determinado contexto.
A prática de um outro padrão tecnológico como a da agroecologia é importante porque proporciona ações imediatas de mudanças no interior da unidade de produção camponesa, assim como no seu produto, de maneira que a negação do padrão tecnológico dominante se efetue não apenas na concepção teórica, mas na prática concreta da produção. Nesse sentido a produção e renovação dos recursos autogerados (produção interna na unidade de produção ou na cooperação entre camponeses num território dado) é de fundamental importância.

Qual deve ser o caráter da luta dos movimentos camponeses frente ao Estado brasileiro que é o grande financiador do agronegócio?

É sempre bom recordar que o Estado é o financiador, assim como a base política e ideológica de reprodução do agronegócio. Mas, não é o agronegócio. Ainda que enfrentá-lo, seja no nível das políticas públicas seja no âmbito do poder legislativo, é por demais importante, não se deve descuidar da luta direta contra o capital no campo. É uma luta que se realiza nas diversas dimensões: a econômica (outro padrão tecnológico e de produção), a política (proposição de outras políticas públicas e de legislação a favor do camponês) e a ideológica (concepção de mundo e novo modelo para a relação homem-natureza).
Com relação ao Estado, e em particular com os poderes Executivo e o Legislativo, é indispensável sempre combinar propostas camponesas com as reivindicações e os protestos. O eixo da luta é afirmar propostas econômicas e políticas objetivas de afirmação do campesinato, e se exigir que os governos as cumpram. Um campesinato, ou suas instituições de mediação de interesses, que não tenham propostas de políticas públicas e de legislação para a realização dos seus interesses de classe, fica sempre a reboque da racionalidade dominante que prevê, num processo de dominação-hegemonia, políticas sociais para os outros, sejam eles os camponeses e ou os proletários, no sentido da cooptação pelo alto e para exercer a dominação.
A reivindicação e o protesto vêm depois de esgotadas as ações de afirmação das propostas camponesas. Reivindica-se a concretização do que se sugeriu ou se propôs. E se os governos ou o legislativo não cumprem o que se havia acordado, é o protesto a forma mais usual. Mas, tudo deve partir de proposições, sejam elas estruturais sejam conjunturais. As proposições têm caráter afirmativo, positivo, que educa o próprio campesinato e faz com que ele se sinta sujeito das ações sugeridas. Elas constituem um começo que sempre se renova. Reivindicação e protestos são complementos da ação de proposição. São elos de uma mesma cadeia de acontecimentos nas relações campesinato com o Estado.
A negação do modo de produção capitalista presente no campo se faz não apenas pelo discurso sobre o que ele tem de pior, pela exploração que estabelece nas relações sociais de produção, pela depredação do meio ambiente e pela oferta de produtos e subprodutos contaminados. A negação se faz pela afirmação de um novo projeto ou modelo para o campo. È a proposição que permite a ação positiva de construção de um novo que nega o dominante.
Diria que, em síntese, o caráter da luta dos movimentos camponeses perante o Estado deve ser de proposições afirmativas da especificidade camponesa e das exigências que essa especificidade requer. Afirmar que o campesinato é uma classe social e que, portanto, têm interesses de classe que se confronta com os interesses de classe da burguesia. É uma afirmação portadora de um não à conciliação de classes imposta pelas classes dominantes e pelo Estado.

sábado, 24 de março de 2012

‘Movimentos sociais, partidos de esquerda, todos, estamos a reboque do grande capital e do Estado brasileiro’

 Valéria Nader e Gabriel Brito, da redação  do CORREIO DA CIDADANIA
Como em poucos momentos da história, o Brasil vive um agitado período de lutas políticas em torno do acesso e domínio de suas terras, com intensas pressões sobre as legislações ambientais e fundiárias. Enquanto o Senado aprova a proposta ruralista de um novo código florestal, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprova a PEC 15, que transfere do Poder Executivo ao Congresso o poder de decisão sobre a homologação de terras indígenas e quilombolas.



Em uma análise do atual contexto político, Gilmar Mauro, dirigente do MST, afirma ao Correio que o momento é parte das tradicionais ofensivas capitalistas, que visam avançar sobre novas fronteiras econômicas e suas férteis terras - ao mesmo tempo em que a esquerda se encontra em grande refluxo, de modo “que apenas age reativamente, corre atrás do prejuízo após a direita tomar iniciativas políticas, em geral, perdendo”.

A condução da política econômica focada nos interesses do ‘agrobusiness’ exportador, altamente desestimulante para os investimentos produtivos e industriais (estão aí os dados de nossa ‘desindustrialização para comprovar), corre ao lado de uma reforma agrária a cada dia mais excluída da pauta política. Gilmar Mauro refuta, no entanto, as críticas que sugerem passividade do movimento em relação ao governo petista, lembrando que o MST está “no mesmo patamar de mobilização da época de FHC, com 80, 90 mil famílias acampadas pelo país”.

Realista, ele ressalta a importância da atual jornada de luta camponesa, incluindo as de outros movimentos, mas prefere não alimentar ilusões de grandes mudanças e conquistas populares para o ano. De todo modo, afirma que há muito tempo o movimento camponês não convergia em torno de pautas e cobranças políticas similares.

Como exemplo do atual momento crítico que vivemos, cita a determinação de Dilma Rousseff de não permitir desapropriações que custem mais de 100 mil reais por família. “Ou derrotamos e destruímos essa proposta da Dilma, ou não tem mais assentamento no centro-sul do país”. Com esse novo e desconhecido golpe que se pretende aplicar à reforma agrária – em um país que gasta 48% de seu orçamento com juros da dívida e 0,22% com reforma agrária -, fica notório que a troca de ministro do Desenvolvimento Agrário tende a ter valor prático nulo, como lembra Gilmar Mauro.

Correio da Cidadania: As grandes questões ambientais, agrárias e sociais parecem tratadas de modo cada dia mais raso pelos governantes e pela mídia. Ao mesmo tempo, é notória a efervescência com que o país aparece aos olhos do público, com os números de um agronegócio galopante e com o interesse das multinacionais e grandes corporações em entrar no país, comprando terras e investindo pesado, basicamente, na especulação financeira. Como este cenário vai se associar, daqui em diante, com uma das demandas sociais mais básicas em nosso país, a reforma agrária?

Gilmar Mauro: Toda a lógica apresentada não é nova, mas antiga, e evidentemente aprofunda uma característica histórica de nosso país, a de ser exportador de produtos primários. Faz parte de uma lógica econômica de tentar saldos positivos na balança comercial para se equilibrar no balanço de pagamentos, coisa que por sinal tampouco tem se conseguido. Embora eventualmente o Brasil tenha saldos positivos no balanço comercial, o déficit em conta corrente é altíssimo, fruto de um processo de endividamento externo especulativo, sugando anualmente bilhões e bilhões dos cofres públicos e, conseqüentemente, da população.

Com isso, a reforma agrária está fora de pauta, fora da agenda. A lógica do modelo econômico é o desenvolvimento do agronegócio. Mesmo em relação à pequena produção, vimos a proposta do governo, no sentido de propor o empreendedorismo rural, uma espécie de “agronegocinho”, integrado aos grandes grupos econômicos, às grandes agroindústrias, ou produzindo para o mercado interno.

Dessa forma, dentro de tal política do governo, podem ser integrados mais uns 2 milhões de pequenos agricultores, da chamada agricultura familiar, para dentro deste modelo. E o restante, a grande maioria, mais uns 2, 3 milhões de famílias, mais os assentamentos, fica com o Bolsa família, compensações sociais etc., mas nenhuma perspectiva dentro de tal modelo.

Concluindo, a reforma agrária agora depende de um debate político da sociedade. Se a sociedade quiser dar esse uso que o Brasil vem dando à terra, à água, aos recursos naturais, não cabe mais a reforma agrária. Se a sociedade brasileira quiser consumir esse tipo de alimento, não precisa mais de reforma agrária.

Se quisermos dar outro uso à água, ao solo, aos recursos naturais e comer outro tipo de comida, a reforma agrária é um dos projetos modernos a serem implantados no país, o que evidentemente exige um novo modelo agrícola. É o debate que a sociedade precisa abrir.

Correio da Cidadania: Os números apresentados em relação à reforma agrária em 2011 denotam, portanto, realmente, que o governo Dilma pouco se empenhará no sentido de promovê-la?

Gilmar Mauro: São números pífios! Como sempre foram os resultados da reforma agrária no Brasil, que praticamente inexiste. Aliás, nunca existiu reforma agrária. Nós temos é política de assentamento. E cada vez menor. Os números de 2011 refletem esse cenário, de uma política de assentamento de menor intensidade, com menos recursos, nenhuma prioridade do governo aos resultados. É o reflexo da política que vem sendo aplicada no último período político.

Não acredito que a presidente Dilma se empenhe na questão. Ao menos é o que tem mostrado, ficando muito mais preocupada com a macroeconomia e sua atual lógica de condução, calcada na exportação de commodities agrícolas.

Aliás, todo o desenvolvimento econômico brasileiro está alavancado em três eixos: a demanda externa dos últimos 10 anos por commodities agrícolas e minerais, que as valorizou e valorizou também as próprias terras; em segundo lugar, grandes injeções de recursos públicos, principalmente via BNDES, patrocinando fusões de grandes empresas que se transformam em transnacionais - injeções realmente grandes financiadas pelo povo brasileiro; e em terceiro lugar, os investimentos que o Estado tem feito em grandes obras de infra-estrutura, dos megaeventos, do PAC.

Outro ingrediente que sustentou o crescimento dos últimos anos foi o endividamento das famílias brasileiras, com a abertura do crédito para consumo, a antecipação do consumo, tanto de automóveis como da linha branca. Mas esse modelo econômico tem limites, todo mundo sabe disso. Não dá pra prever a data e a hora da crise, mas ela virá, certamente.

Portanto, dentro do atual cenário macroeconômico (a real preocupação do governo Dilma), a reforma agrária, claro, está fora das prioridades.

Correio da Cidadania: A propósito, em face do atual troca-troca de ministros em um governo de ‘composição’, cada dia mais refém do fisiologismo parlamentar e das imposições midiáticas, qual o significado da troca do ministro do Desenvolvimento Agrário realizada nesses dias, em que Pepe Vargas ocupou o lugar de Afonso Florence?

Gilmar Mauro: Do ponto de vista pessoal, não conheço muito o Pepe Vargas, porém, ele deve entender mais de reforma agrária que o anterior, que não entendia nada.

Mas, de toda forma, sendo objetivo na avaliação, não vai se alterar muito o cenário da reforma agrária. Não é a pessoa, um só ministro, que vai mudar isso. É a política de governo, e quem a determina é a Dilma.

Prova disso é a determinação da Dilma de não fazer assentamento onde a terra custe mais de 100 mil reais por família. Ora, com o preço das terras em São Paulo, no Sul, no Centro-Oeste, não haverá mais desapropriação. Com isso, a presidente altera a Constituição, a qual estabelece que a terra que não cumpre sua função social deve ser desapropriada para fins de reforma agrária, dando lugar a uma medida administrativa, econômica, estabelecendo que o custo por família assentada não pode passar de 100 mil reais. Portanto, não tem mais desapropriação no centro-sul do nosso país.

Correio da Cidadania: Houve informações de que o principal fator a convencer Dilma de trocar o ministro foram informes da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) acerca da grande insatisfação do movimento, e o medo de sua radicalização. Elas são verídicas?

Gilmar Mauro: Que há uma grande insatisfação do MST, e também de outros movimentos, é evidente. Claro, com um ministro da reforma agrária que não entendia do assunto, nada se encaminhava.

Mas a insatisfação não era só com essa pessoa, e sim com o fato de que o Brasil usa 48% de seu orçamento para juros e amortizações da dívida e somente 0,22% para reforma agrária. Esse é o motivo de insatisfação.

Em termos de radicalização, o movimento apenas continua fazendo lutas, estamos no mesmo nível em que estávamos no governo FHC, com 80, 90 mil famílias acampadas em todo o Brasil. Houve um período, logo que o Lula entrou, quando o povo achava que ele avançaria na reforma agrária, que as famílias acamparam em maior número. Mas hoje temos em torno de 80 ou 90 mil famílias.

Continuamos fazendo ocupação, luta, sem ilusão de que vão resolver o problema da reforma agrária. Porém, não deixaremos de fazê-lo, pois é preciso colocar o debate para a sociedade, para outros setores, categorias.

Fora isso, também vivemos um momento de poucas lutas sociais. Aquelas que ocorrem são bastante corporativas, calcadas em reivindicações econômicas, seja do movimento sindical, seja do movimento social. Um cenário difícil para todo o movimento social, a esquerda, os setores progressistas. Mas o nosso movimento vai continuar fazendo o que sempre fez. O ingrediente principal é ampliar o debate no conjunto da sociedade.
Correio da Cidadania: Mas o que pensa desse expediente de infiltração de agentes do Estado nos movimentos sociais?

Gilmar Mauro: Quanto à participação da ABIN, deve ser falta do que fazer, deve faltar serviço lá. Mas, historicamente, sempre fizeram isso conosco. Não só os serviços internos, como também a CIA. Portanto, estamos vacinados com relação a eles, além de ser de fato uma falta do que fazer.

Porém, não acredito que a mudança do ministro seja resultado de tal diagnóstico da ABIN. Essa insatisfação já foi mostrada por vários setores em diversas reuniões. Inclusive, estamos conseguindo reunir uma pauta comum entre vários movimentos sociais, algo inédita no último período, com a participação de Contag, Fetraf e outros movimentos, na perspectiva de realizarmos um encontro nacional de movimentos camponeses, uma espécie de congresso camponês no Brasil. E é a primeira vez, pelo menos nos últimos dez anos, que conseguimos juntar todo esse povo numa pauta em comum.

Sendo assim, acredito muito mais nesses fatores do que nas informações vindas de agências como a ABIN.

Correio da Cidadania: De toda forma, a Abin e outros órgãos do Estado também dedicam seus serviços a investigar as milícias do campo contratadas pelo latifúndio, promotoras de permanente violência, chegando muitas vezes a assassinatos, ou sua atuação reitera o caráter de classe e de discriminação social do Estado?

Gilmar Mauro: Aí tem uma questão importante a ressaltar. Historicamente, sempre houve violência, ora com o viés mais coercitivo, ora desenvolvendo processos de geração de consensos na sociedade. E acredito que o atual momento seja de intensificação de ambos. Um momento de ampliação dos instrumentos de produção de consenso social, e aumento também do uso de instrumentos coercitivos, basta observar os últimos despejos ocorridos em São Paulo.

Mas a tentativa deles, do Estado e da sociedade de classes, é produzir consensos na sociedade que justifiquem processos de coerção; o episódio Cutrale foi isso, a entrada nos morros do Rio de Janeiro também, e assim por diante.

Este é o momento que vivemos, e não é uma particularidade brasileira, e sim uma realidade mundial. À medida que o capitalismo enfrenta dificuldades econômicas e entra em crise, é evidente que o aparelho repressivo dos Estados entra em ação, não sendo diferente o caso brasileiro.

Correio da Cidadania: Como você avalia a recente jornada de lutas das mulheres camponesas e a importância deste tipo de mobilização encabeçada por elas? A marcha das mulheres prenuncia algo para a jornada de lutas do Abril Vermelho?

Gilmar Mauro: Nós iniciamos no começo do ano um processo de luta com várias ocupações. Na jornada em solidariedade aos companheiros do Pinheirinho, levamos 11 ônibus com militantes, quatro caminhões de comida. Agora, colocamos em mobilização por todo o Brasil milhares de mulheres. Em São Paulo, houve paralisações em todas as regiões, envolvendo centenas e centenas de mulheres. E vamos continuar assim na jornada de abril, que estará calcada fundamentalmente na reforma agrária. Ou a gente destrói e derrota essa proposta da Dilma de que terra acima de 100 mil reais por família não deve ser desapropriada, ou a política de assentamentos continuará fora da pauta política.

Assim, estamos iniciando bem o ano, com as forças que temos, com as dificuldades que temos, as quais, como eu disse, são dificuldades do conjunto da esquerda e do movimento social. Mas acho que será um ano de muitas lutas, muitas mobilizações, e principalmente, na minha expectativa, de construções políticas com outros setores da classe trabalhadora, a exemplo do que está acontecendo com o movimento camponês.

Portanto, acho este um ano promissor em termos de lutas sociais, principalmente dos movimentos do campo. E outros setores estão dando os mesmos indicativos, como os professores. Na semana passada, acabou a jornada nacional do MAB, com participação do MST, e agora vem o Abril Vermelho, uma jornada que espero que seja bem grande em nível nacional.

Correio da Cidadania: Qual o significado deste tipo de manifestações na atual conjuntura política e econômica, dominada pelo entrelaçamento do capital fundiário ao financeiro, com a agricultura praticamente refém de grandes grupos econômicos? Que conseqüências efetivas se podem esperar destas manifestações neste contexto?

Gilmar Mauro: Eu não crio ilusões. O capital é o capital, na indústria, no comércio, no sistema financeiro ou na agricultura. A agricultura é só mais um espaço para a sua valorização. E o capital investe muito no Brasil porque está ganhando muito, e vai continuar a fazer isso.

Já a minha falta de ilusão é em relação às manifestações da classe trabalhadora. Creio que a grande maioria das mobilizações da classe trabalhadora se resume a reivindicações de ordem econômica. O movimento sindical em geral e a classe trabalhadora em geral lutam por aumento de salário, Participação nos Lucros e Resultados (PLR) etc. Claro que há outras reivindicações também, significativas, porém, ainda bastante calcadas na luta econômica.

Assim, acredito que o próximo período ainda será marcado por esse tipo de mobilizações, aliás, no mundo inteiro. As mobilizações na Europa são importantes, mas também não tenho dúvida de que estão calcadas nas importantes perdas sofridas pela classe trabalhadora no último período. Não está posta a luta pelo socialismo na Europa, por exemplo. Ao menos com força popular.  O caso do Oriente Médio, nos países árabes, é semelhante, pois são muito mais lutas democráticas do que anti-sistêmicas. O Brasil não foge à regra, as lutas são muito mais econômicas do que por mudanças políticas e anti-sistêmicas. Nesse sentido, ocorrerão mais lutas, até mais greves do que ultimamente, porque o Brasil ainda vive esse período, não tem pleno emprego, mas ainda tem muitas possibilidades.

De toda forma, creio que devemos nos preparar para um longo período. O próprio Plínio Arruda Sampaio (ex-presidente da Associação Brasileira da Reforma Agrária) já disse que temos de nos preparar para uma maratona. Não dá pra pensar em corrida de 100 metros. Eu vejo, tranquilamente, de maneira igual. Os momentos de luta da classe trabalhadora são esparsos, sazonais, às vezes sai só uma greve no ano, e com a luta bastante calcada no aspecto econômico.

Porém, enquanto existir capitalismo, a classe trabalhadora vai bater cartão de dia e de noite. Temos de ir nos fortalecendo em relação às organizações, movimentos. Não se trata de fortalecer indivíduos, fomentar mais divisões, e sim de fazer esforços em favor das organizações e lutas conjuntas, ainda marcadas pelo viés econômico, mas visando politizá-las, discutir os processos vividos. Em alguns cantos, o processo de politização é mais rápido, em outros, mais lento, mas existe o aprendizado coletivo, tanto em relação ao que é esse governo, ao que é o Estado, como à lógica do capital. Nesse sentido, muitas organizações sociais têm evoluído.

Correio da Cidadania: O que implicaria, na atualidade, e a seu ver, uma autêntica e renovada discussão sobre reforma agrária? Quais seriam, ao mesmo tempo, eventuais novas estratégias para levá-la a cabo?

Gilmar Mauro: Eu dividiria a tarefa em duas partes. A primeira é a da resistência. É importante segurar a bandeira em pé, isso é o fundamental. Em tempos de crise é mais fácil sair xingando todo mundo e começar a promover novas rachaduras, sendo que muitos setores da esquerda não conseguem falar com o conjunto da classe trabalhadora, voltando-se a elas mesmas e gerando uma digladiação interna que só gera fragmentação. E assim nem precisa de direita. Manter as bandeiras em pé e resistir a esse tempo histórico é fundamental.

Em segundo lugar, do ponto de vista estratégico, como já comentamos em parte, é preciso fazer um amplo debate na classe trabalhadora sobre o que é o modelo econômico. No nosso caso, o modelo agrícola, colocando em pauta o questionamento a respeito de quem nossas terras estão a serviço, a que custo isso tudo está sendo produzido, com a destruição ambiental, degradação da água, das reservas florestais etc., além do tipo de comida que nossa sociedade quer consumir. Tudo para promover um debate politizado de que é preciso pensar num novo modelo agrícola, que respeite o meio ambiente, produza alimentos, matérias-primas, empregos e condições de vida com novos paradigmas tecnológicos e produtivos.

Para fazer isso, evidentemente, não tenho ilusões, é preciso outro Estado. É preciso outro governo, e isso não depende só de nós. Aliás, para fazer reforma urbana também precisa de outro Estado, outro governo. Porém, tudo acaba recaindo na correlação de forças e avanço do conjunto de setores da classe trabalhadora, o que é o nosso desafio e também de toda a esquerda que acredita e quer mudanças profundas em nosso país.

Enfim, nesse tempo de resistência, é preciso continuar investindo na formação político-ideológica e rever a organização. Enfatizo a organização, pois, como a classe não vive lutando - quem trabalha vive trabalhando, e só luta todo dia quem não trabalha -, caímos no problema da importância da organização, com memória histórica, preparadora de novas lutas, formadora de novos militantes, inclusive com a tarefa da conspiração, no bom sentido, política da classe trabalhadora. É mais que necessário fortalecer as organizações sociais.

Correio da Cidadania: Na época da eleição de 2010, pouco antes da vitória de Dilma, você nos concedeu entrevista na qual reiterava que o Movimento dos Sem Terra não seria refém deste governo, a despeito de não haver tomado partido de nenhum candidato naquele momento. Você acredita que o movimento venha tendo posturas condizentes com essa afirmação?

Gilmar Mauro: Acredito que sim. O MST não é refém de nenhum governo e nem será, muito pelo contrário. Mas é preciso dizer umas coisas. Conversando com sindicalistas, ouço que “o MST não está fazendo muita luta, e não sei que...”, mas devolvo lembrando que estamos no mesmo patamar da época do FHC, replicando com a pergunta: “nas greves do movimento sindical qual é a pauta? Vocês têm pautado a desapropriação das fábricas? As greves não são pra melhorar o salário e PLR? As negociações são com quem? Com o próprio patrão?”.

Com o MST é o contrário. Nós ocupamos o latifúndio e não negociamos com o latifundiário. Negociamos com o governo, com o Estado brasileiro, e reivindicamos que o desaproprie. Assim, é evidente que, embora façamos uma luta radical, a ocupação da terra etc., no fundo fazemos uma luta radical para que a terra seja desapropriada e aí sim legalizada, institucionalizando a ação do nosso movimento. Que seja legalizada para novas famílias assentadas, pois é a única forma de terem acesso aos créditos e outras coisas. Isso porque não temos força para tomar e distribuir o latifúndio por conta própria e fazer a reforma agrária por conta própria. Por isso, na nossa luta, ocupa-se e negocia-se. Nela, vemos o governo brasileiro como o canal da nossa negociação, assim como o sindicato negocia com o patrão que é o dono da fábrica. Portanto, neste contexto, a única diferença é que lutamos pela desapropriação e o sindicato por melhores salários.

Fiz essa reflexão para chegar a outra: quando se parou uma fábrica e o conjunto de seus trabalhadores veio para uma ocupação nossa? Quem vem para as ocupações é a representação política da categoria, do sindicato, o que é importante, mas já paramos nossa produção inteira para prestar solidariedade a outros setores da classe trabalhadora.

Não estou dizendo isso para defender que o MST seja melhor que outros setores, e sim que o estágio da luta ainda se encontra fundamentalmente em torno de lutas econômicas. E aí tenho clareza de uma coisa: uma organização que não responde às necessidades de sua categoria perde o sentido e razão de ser para a sua categoria. Portanto, o MST vai ter que conjugar a necessidade da sua base, a luta pela terra, a lona, a cesta básica, o crédito, mas, concomitantemente, terá de investir na formação político-ideológica, fazendo todas as lutas. Esse é o grande desafio de ser um dirigente do MST no atual momento histórico, a meu ver.

Correio da Cidadania: Ao lado da reforma agrária, mais fora da pauta da grande mídia bem como da agenda governamental, estamos diante das intensas discussões e polêmicas em torno do Código Florestal. O que tem a dizer do imbróglio em que se tornou esta reforma e como ela está associada ao destacado boom de ‘expansão capitalista’ no Brasil e ao tema da reforma agrária?

Gilmar Mauro: Essa é a tentativa deles: avançar nas terras brasileiras e na destruição do que ainda resta de preservação ambiental. É o papel deles no jogo. O que impressiona é ver setores da esquerda – se é que se pode chamar de esquerda -, progressistas, entrarem nessa, inclusive setores da igreja, com um discurso econômico em defesa do modelo atual.

De nossa parte, estamos em campanha contra os agrotóxicos, um debate que a meu ver envolveu e entrou na sociedade. Se for aprovado esse Código Florestal, será goela abaixo, porque há sinais claros na sociedade de que a maioria dos brasileiros é contra a sua aprovação.

Enfim, é o rolo compressor do modelo econômico aplicado no país, mas os impactos da aprovação do código, evidentemente, serão muitos.

Correio da Cidadania: E já há informações de que a presidente poderá vetar o novo texto do Código tal como votado no Senado. Porém, novos decretos viriam a modificar este modelo anterior, de modo a atender às expectativas da bancada ruralista. O que deve ser o desenrolar final desse processo em sua opinião?

Gilmar Mauro: Eu não gosto de fazer projeções, pois seriam mais especulações subjetivas. Em minha opinião, se a Dilma vetar, ótimo. Só não sei se tem tempo pra isso, se o fará de fato, é disso que não tenho nenhuma segurança. Acho difícil ficar apelando agora, “veta, Dilma, veta, Dilma!”. Sei lá, é muito difícil. Tomara que isso ocorra, seria uma medida importante, mas não tenho certeza e nem apostaria minhas fichas nisso. Mas, se vetar, dará mais força para a sociedade continuar se mobilizando. Não acho que facilitaria subterfúgios posteriores.

Na verdade, para ser honesto, tenho que dizer que os movimentos sociais, os partidos de esquerda, todos, estamos a reboque – a reboque – do grande capital e do Estado brasileiro. E estamos agindo reativamente, esse é o nosso problema, e não é só do MST. Estamos sempre correndo atrás das iniciativas que eles tomam. E normalmente perdendo.

Esse é o balanço que precisa ser feito, inclusive para fugir à arrogância de que cada um tem uma verdade, absoluta. É preciso dizer que estamos todos ferrados, pra não usar outra expressão. E se não tomarmos consciência da necessidade de se fazerem lutas com perspectiva de unificação, vamos perder em todas as frentes, nas quais só estamos correndo atrás do prejuízo. Estamos com dificuldade de ter uma estratégia própria e tomar iniciativas. O caso do Código Florestal é evidente, mas é só um. Há a Transposição do São Francisco, os transgênicos... Estamos sempre correndo atrás, e pior, perdendo, como disse.

Correio da Cidadania: Acredita que o descaso com as questões agrárias, sociais e ambientais, ao lado da hegemonia do agronegócio, com seu modelo de exploração dos recursos naturais e o pesado lobby que vem fazendo para desmantelar o Código Florestal, poderão levar a uma radicalização dos movimentos sociais, inclusive do MST, nos próximos tempos?

Gilmar Mauro: Não é uma questão de vontade. Meu desejo é fazer a revolução... Mas não posso cair no subjetivismo. Volto a ressaltar que a classe trabalhadora está numa fase de lutas com reivindicações econômicas. Eu não acredito em processos mais intensos do que esse. Tomara que esteja equivocado, mas não vou semear ilusões num meio de comunicação. Acho que estamos num tempo difícil e, mesmo com tais medidas, na sociedade brasileira as lutas ainda estão sendo marcadas pelo economicismo.

E se eu tenho convicção de uma coisa hoje, é a seguinte: não existe a menor possibilidade de fazer a revolução pela classe. Ou a própria classe faz a revolução ou não haverá um grupo que a fará por ela. Portanto, é momento de ter essa consciência histórica, trabalhar, trabalhar e trabalhar, e talvez a gente consiga superar para o próximo período o atual momento de fragmentação e dificuldades.

Acho que a crise econômica internacional, que certamente virá para cá, pode nos ajudar. Se agora não tivermos sabedoria sobre como nos posicionar e onde queremos estar quando a crise vier – e sem dúvida, virá – para darmos um salto de qualidade, talvez possamos ir mais para trás ainda. Não acredito que neste ano acontecerão grandes coisas. Tomara, tomara que sim, mas não quero plantar grandes ilusões.

Valéria Nader, economista e jornalista, é editora do Correio da Cidadania; Gabriel Brito é jornalista.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Dia Mundial da Água: estudos decifram o diálogo entre a selva amazônica e sua água


Em 1993, a ONU definiu o dia 22 de março como o Dia Mundial da Água. A data ficou destinada à discussão sobre os diversos temas relacionados a este importante bem natural. Cerca de 0,008 %, do total da água do nosso planeta é potável (própria para o consumo). E, como sabemos, grande parte de suas fontes  (rios, lagos e represas) está sendo contaminada, poluída e degradada pela ação predatória do homem. O Dia Mundial da Água tem como objetivo principal criar um momento de reflexão, análise, conscientização e elaboração de medidas práticas para resolver tal problema. O Sul21 transcreve abaixo um artigo de Alice Marcondes sobre as trocas que a selva amazônica realiza com a água da região e as alterações que têm sido verificadas na região.

Por Alice Marcondes, Tierramérica via SUL21

Foto: Lubasi/Flickr

Havendo alteração na relação entre a selva amazônica e os bilhões de metros cúbicos de água que circulam pelo ar, desde o Oceano Atlântico equatorial até os Andes, estará em risco a resiliência deste bioma crucial para o clima do planeta, alerta um experimento de duas décadas. A Amazônia é um ser vivo de 6,5 milhões de quilômetros quadrados, que ocupa metade do território do Brasil e parte de outros oito países (Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela), e abriga a maior reserva de água doce do planeta.
Para entender plenamente esse complexo sistema, cientistas do Brasil e do mundo criaram o Experimento em Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA, sigla em inglês). Após 20 anos de pesquisas, os dados coletados constituem um alerta. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que participa do experimento, se nos próximos anos não houver políticas efetivas para reduzir a emissão de gases causadores do efeito estufa, a Amazônia chegará ao final do Século 21 com 40% menos chuva, com temperaturas médias de até oito graus acima do normal.
Isso converteria a Amazônia em uma fonte emissora de dióxido de carbono, em lugar de um depósito desse gás-estufa. A Agência Internacional de Energia estima que, em 2010, a população mundial lançou na atmosfera o recorde de 30,6 gigatoneladas de dióxido de carbono, principalmente procedente da queima de combustíveis fósseis. “As pesquisas nos mostram que a floresta tem um grande poder de resiliência, mas também que este poder tem limites”, disse ao Terramérica o físico Paulo Artaxo, presidente do Comitê Científico Internacional do LBA.
Foto: Douglas Fernandes/Flickr

“Se continuarmos queimando tanto carbono, o cenário climático para a região amazônica será bastante desfavorável a qualquer resiliência que a selva possa desenvolver. Dificilmente sobreviverá a um estresse climático tão grande”, acrescentou Paulo. Para a coleta de dados o LBA contou, entre outros instrumentos, com 13 torres de 40 a 55 metros de altura, instaladas em diferentes pontos da selva, para medir o fluxo de gases, o funcionamento das propriedades básicas do ecossistema, a radiação e muitos outros parâmetros ambientais. A informação coletada é analisada por cientistas de várias áreas, com a finalidade de entender a selva como um sistema interrelacionado.
“A percepção da comunidade científica, de que os estudos individuais ou disciplinares não eram competentes para explicar a Amazônia, levou ao LBA. Percebia que era necessário um esforço integrado para explicar a floresta tropical, a partir das ciências físicas, químicas, biológicas e humanas, e também da relação entre elas”, disse ao Terramérica o engenheiro agrônomo Antônio Nobre, destacado cientista que também integra o LBA. “Quando comecei os estudos no LBA, minha parte principal no projeto era o carbono. Mas o carbono sem água fica seco e a floresta pega fogo. Se não há transpiração, não há sequestro de carbono, porque não ocorre a fotossíntese. Percebi que o ciclo da água e o do carbono são inseparáveis”, afirmou Antônio.
Foto: Jorge Andrade/Flickr

Essa análise integrada demonstrou que a Amazônia está absorvendo uma pequena quantidade de dióxido de carbono da atmosfera, estimada em meia tonelada por hectare ao ano. Contudo, esta fixação varia muito por região, segundo o grau das alterações ambientais. Em áreas próximas a lugares onde a ação humana causou uma degradação significativa, a absorção diminui, e a Amazônia, em lugar de incorporar carbono, o emite.
Além disso, a absorção de dióxido de carbono enfrenta “as emissões causadas pelo desmatamento e pelas queimadas” provocadas para expandir a agricultura, destacou Paulo. Como nos últimos anos as queimadas diminuíram drasticamente, de 27 mil quilômetros quadrados em 2005 para cerca de sete mil quilômetros quadrados em 2010, “hoje a selva tem como característica predominante a absorção”, explicou. Porém, com as mudanças causadas pelo efeito estufa e o aquecimento da selva, a estação seca tende a aumentar, criando um cenário propício para mais incêndios e mais emissões de dióxido de carbono.
Segundo Paulo, “o lançamento na atmosfera de partículas sólidas pelas queimadas altera a microfísica das nuvens e o regime de precipitações. Em um dos estudos do experimento se constatou que o aumento das queimadas em Rondônia estende de duas a três semanas a estação seca, retroalimentando a incidência das queimadas e piorando ainda mais seu efeito sobre o funcionamento do ecossistema”. Na “muito severa” seca de 2005, “a Amazônia perdeu muito carbono”, contou Paulo. Em uma situação de “grandes secas” mais frequentes, é possível que a selva se converta em “emissora de dióxido de carbono e deixe de cumprir um importante serviço ambiental”, alertou.
A extensão da temporada seca causa outro fenômeno, a emissão de carbono dos rios, que também foi estudado no LBA. “Os cursos de água de pequeno e médio portes emitem quantidades significativas de gás. Ocorre o que chamo evasão de dióxido de carbono dos corpos aquáticos, e isto acontece porque a maior parte desses rios está saturada de carbono dissolvido na água”, afirmou Paulo. Com o passar do tempo, este carbono “é lançado na atmosfera em quantidades bastante significativas. Todos os fenômenos que alteram o ecossistema amazônico têm um forte impacto na evasão de gases dos rios. Com o aumento da temperatura, aumenta a emissão de gás”, acrescentou.
Foto: Jorge Andrade/Flickr

Para ilustrar as consequências que um desequilíbrio da Amazônia poderia acarretar ao clima mundial, Antônio citou a pesquisa que se popularizou com o nome de “rios voadores”, iniciada na década de 1970 e convertida em um projeto consolidado desde 2007. “Descobrimos que a ação do Sol sobre a região equatorial do Oceano Atlântico evapora grande quantidade de água. Esta umidade é transportada pelos ventos para o norte do Brasil. São cerca de dez bilhões de metros cúbicos de água por ano, que chegam à Amazônia em forma de vapor. Parte cai como chuva, e parte segue até encontrar a muralha da Cordilheira dos Andes”, descreveu Antônio.
Na região andina, o vapor cai como neve e, ao derreter, “alimenta os rios da bacia amazônica. A maior parte da chuva que cai sobre a floresta volta a evaporar”, esclareceu Antônio. Esta umidade flutua sobre Bolívia, Paraguai e os Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, no oeste; Minas Gerais, no leste; São Paulo no sudeste e inclusive até Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, no sul. “E leva a maior parte das chuvas para todas essas regiões”, explicou. A seca da Amazônia prejudicaria esse rio aéreo e “o ciclo de chuvas nessas regiões, que são muito ricas em agricultura”, alertou Antônio.
O LBA é hoje um programa do Ministério de Ciência e Tecnologia, coordenado pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, com apoio de outras entidades. Seus pesquisadores estão ampliando esse trabalho para outras áreas, como os sistemas agropastoris e o comportamento do dióxido de carbono nas plantações de soja. “Temos um trabalho enorme pela frente para compreender os processos naturais e o que os humanos fazem quanto à alteração dos ecossistemas”, concluiu Paulo.

terça-feira, 13 de março de 2012

Os ruralistas e o hidronegócio

  Roberto Malvezzi (Gogó)  no CORREIO DA CIDADANIA 

“Hidronegócio, literalmente o negócio da água”. É assim que o verbete do Dicionário da Educação do Campo (Fiocruz e Movimentos Sociais) define toda atividade econômica que tem a água como sua principal mercadoria. A agricultura industrial consome 70% da água doce utilizada no mundo, portanto, é a principal atividade econômica interessada na água.

Estamos próximos da Semana Mundial da Água e, em Marselha, acontece o 6º Fórum Mundial da Água. É o encontro do capital da água, junto com representações governamentais e organismos multilaterais como FMI e Banco Mundial. Como já denunciava Ricardo Petrella em 2002, no Fórum Social Mundial de Porto Alegre, é a reunião da “Oligarquia Internacional da Água, que gera um novo discurso da privatização, mercantilização, como remédio para o que chamam de escassez da água”. A sociedade civil, como sempre, costuma fazer um contraponto paralelo ao evento.

Curioso que uma das representações brasileiras no evento é a senadora Kátia Abreu. Agora a CNA é membro do Fórum Mundial da Água. Por aí já se pode ver quem são seus componentes. E ela disse textualmente que estará lá para “propor um debate em nível mundial sobre a proteção das nascentes, de margens de rios e das áreas de recarga dos aqüíferos que, no Brasil, se chamam Áreas de Preservação Permanente (APPs). São áreas frágeis, de preservação obrigatória, das quais depende o bom funcionamento do ciclo hidrológico. O lançamento ocorrerá durante palestra da presidente da CNA sobre o tema “Agronegócio Brasileiro: Construindo Soluções para Proteção e Uso Sustentável da Água no Campo”, das 12h às 13h45, no Pavilhão Brasil, onde mais de 40 instituições públicas e privadas brasileiras apresentarão seus projetos de responsabilidade ambiental” (Assessoria Comunicação CNA).

Oras, quem é que está propondo a consolidação agrícola das áreas de preservação permanente nas mudanças do Código Florestal? Quem quer mudar a lei para não pagar a multa de mais de oito bilhões em crimes contra as áreas de preservação permanente? Quem quer consolidar a ocupação dos morros? Quem está devastando o Cerrado no oeste baiano e eliminando rios e nascentes? Quem está acabando com o Taquari no Pantanal e assim inundando áreas que antes eram apenas sazonalmente inundadas? Enfim, quem é essa senadora que vai a Marselha defender a preservação de nascentes, beiras de rios e demais áreas que tanto lutamos para que efetivamente sejam preservadas?

Há tempos denunciamos no documento “As Perspectivas do Agro e Hidronegócios no Brasil e no Mundo” os caminhos do agronegócio brasileiro. Por ali já podíamos delinear que o capital no campo avançaria não somente em busca de solos, mas pelos caminhos das águas. A super-exploração de mananciais de superfície e subterrâneos pelos irrigantes segue sem nenhum controle real, como se passa em todo oeste baiano. Aqui em Juazeiro, a quantidade de água utilizada pela AGROVALE para irrigar cana é uma caixa preta a sete chaves.

Portanto, o lugar da senadora é mesmo em Marselha. Estará em casa. Só que a prática de quem ela representa é o avesso de seu discurso.

A cara de pau da senadora é mais dura que estaca de aroeira.


Roberto Malvezzi (Gogó) possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.

segunda-feira, 12 de março de 2012

EMBRAPA A SERVIÇO DA MONSANTO E DAS TRANSNACIONAIS?


Por Gilvander Luís Moreira[1], em seu blog

Em tempos de Campanha da Fraternidade sobre saúde pública – CF/2012 -, a EMBRAPA[2] pediu liberação do herbicida Glifosato também para a cultura da mandioca. Essa é uma lamentável notícia que exige, no mínimo, sete breves comentários.

1 – A EMBRAPA é uma das empresas públicas que mais recebem dinheiro das transnacionais para investimento em pesquisas, melhor dizendo, aperfeiçoamento tecnológico na produção agropecuária. Um ditado popular diz: “quem paga a banda, escolhe a música”, ou seja, grande parte das pesquisas feitas pela EMBRAPA no último período tem sido para beneficiar as grandes empresas do ramo de agrotóxicos, como a própria MONSANTO que no ano de 2010 passou para a EMBRAPA nada menos que R$ 5,9 milhões para investir em pesquisas para os próximos 3 anos (2011, 2012 e 2013). [Como pode ser constatado aqui e

2- O Glifosato é um herbicida sistêmico não seletivo, ou seja, mata qualquer tipo de planta, exceto aquelas geneticamente modificadas para resistir ao glifosato, como é o caso das plantas (soja, por exemplo) com a marca RR (Roundup Ready), produzida pela MONSANTO. Um dos agrotóxicos mais vendidos pela Monsanto no país é o Roundup, que tem como principal ingrediente o glifosato.

3 - O uso massivo do glifosato tem provocado a aparição de resistência por parte de algumas plantas, levando a um aumento progressivo das doses usadas, e assim a uma desvitalização e perda de fertilidade da terra, afinal o herbicida elimina também, bactérias que são indispensáveis à regeneração do solo e manutenção de sua fertilidade. Este processo faz com que a cada dia aumente o uso de fertilizantes químicos, que alimentam as plantas e não fertilizam a terra, aumentando ainda mais o ciclo vicioso. Só no ano passado (2011), as importações brasileiras de fertilizantes (20,7 milhões de toneladas) somaram um gasto de 9,1 bilhões de dólares. Quem está mesmo ficando com os lucros e quem está ficando com os prejuízos?

4 - Rubens Onofre Nodari, agrônomo, mestre em Fitotecnia e doutor pela University Of California At Davis, professor na UFSC, afirma que além dos problemas no meio ambiente, o glifosato traz problemas à saúde pública, como o aumento da incidência de certos tipos de câncer e alterações do feto por via placentária. Reduz a produção de progesterona e afeta a mortalidade de células placentárias atuando como disruptor endócrino, ou seja, ele aciona genes errados, no momento errado, no órgão errado. O glifosato também causa, por exemplo, diminuição da produção de espermas, conforme vimos em experimentos feitos em ratos, ou produz espermas anormais. No caso do sistema endócrino, ele pode, por exemplo, inibir algumas enzimas. Ele vai alterar os hormônios que entram na regulação da expressão gênica.

5 - Desta forma vemos que a EMBRAPA, criada no início da década 70 do século XX, em plena ditadura, pelo então presidente Médici (que já fazia parte das estruturas criadas para dar suporte à imposição da chamada "Revolução verde", agricultura altamente mecanizada, que por sua vez impôs sobre a agricultura o lixo da 2ª Grande Guerra, incluindo, além de máquinas pesadas, armas químicas que foram transformadas em agrotóxicos) segue ainda hoje cumprindo o papel de criar condições para o avanço do Capital na agricultura, na qual umas poucas empresas lucram, melhor dizendo, furtam, e o conjunto da sociedade fica com os problemas gerados, sejam eles sociais, ambientais e até mesmo econômicos. Injustamente é a estrutura do Estado, que se diz Democrático de Direito, atuando em favor do Agronegócio e consequentemente em favor do beneficio das empresas transnacionais que dominam a produção e comercialização de agrotóxicos.

6 - Vamos deixar o Brasil se tornar a maior lixeira tóxica do mundo? O Brasil já é o campeão mundial no uso e consumo de agrotóxico. Confira o Filme-documentário “O Veneno está na mesa”, do diretor Sílvio Tendler. Por esse motivo, o deputado federal Padre João (do PT) está travando uma batalha na Câmara Federal contra o uso de agrotóxicos.[3]

7 – É inadmissível que a EMBRAPA continue com projetos de melhoramento na produção agropecuária que fortalecem os projetos das empresas transnacionais, agridem o meio ambiente e adoecem o povo brasileiro. A coluna mestra da EMBRAPA deve ser pesquisar nas áreas de agricultura familiar, com adubação orgânica. A EMBRAPA precisa assimilar em todas suas pesquisas o paradigma da Agroecologia. Só assim estará contribuindo para que a saúde se difunda por todo Brasil.
Enfim, quase todos os venenos devem ser proibidos. O uso deles só é tolerável como exceção e não como regra geral, o que lamentavelmente vem acontecendo. Roundup e muitos outros agrotóxicos são desenvolvidos para matar, não fazem parte da ética da vida. Há uma aliança macabra não confessada entre o agronegócio e a indústria farmacêutica. Produz-se alimentos envenenados para adoecer as pessoas e, assim, jogá-las nas garras da indústria farmacêutica que é a segunda que mais lucra, melhor dizendo, furta – após a indústria bélica. Em nome da Campanha da Fraternidade sobre Saúde Pública repudiamos a liberação do glifosato para a mandioca e todos os seus derivados.

Belo Horizonte, MG, Brasil, 11 de março de 2012.

[1] Frei e padre carmelita; mestre em Exegese Bíblica; professor Teologia Bíblica; assessor da CPT, CEBI, SAB e Via Campesina; e-mail: gilvander@igrejadocarmo.com.br – www.gilvander.org.br – www.twitter.com/gilvanderluis – facebook: gilvander.moreira
[2] Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.
[3] Acompanhem mais informações no site do mandato: www.padrejoao.com.br