Os pré-candidatos à Casa Branca do partido Democrata, e até alguns republicanos, não têm poupado críticas à política internacional de George Bush. Mas a verdade é que, particularmente no Oriente Médio, hoje o principal “front” externo dos Estados Unidos, o novo presidente, seja quem for, continuará atrás dos objetivos atuais: o controle e a exploração do petróleo da região – a defesa incondicional de Israel –, a guerra sem tréguas contra os movimentos islâmicos, terroristas ou não, e a destruição de qualquer potência emergente fora de sua área de influência. Analisando o que cada um diz, vemos que as críticas são de forma, não de conteúdo. O que pode mudar é a troca das pressões militares, do uso da força e das violações do direito internacional pela diplomacia, a pressão econômica e a promoção da imagem dos Estados Unidos. Em vez da violência, marca dos tempos de Bush, teríamos o respeito às normas da boa convivência entre as nações. Em termos, porém. Sempre que os objetivos americanos forem seriamente ameaçados, Gengis Khan entrará em ação. E aí, bolas para o direito internacional. Começamos hoje a publicar uma série de artigos, analisando as posições dos principais candidatos à sucessão de Bush em matéria de política externa. O primeiro foca a Palestina. Nas semanas seguintes, os temas serão o Iraque, o Irã e, por fim, a América Latina, onde o presidente Chávez e seus aliados Morales, Kirchner e Correa deverão seguir dando trabalho à diplomacia yankee. Palestina: quem é mais pró-Israel? O Haaretz, um dos principais jornais israelenses, criou um ranking dos candidatos à Casa Branca, classificados com notas de 0 a 10 de acordo com a intensidade do seu apoio aos interesses de Israel. Todos os principais presidenciáveis foram aprovados com nota acima de 5, mas o Haaretz considerou Rudy Giuliani “o melhor para Israel”, atribuindo-lhe um 8,37. Pesaram nesta escolha frases como “Israel é o único amigo absolutamente confiável dos Estados Unidos” e fatos como a expulsão de Arafat de um concerto no Lincoln Center. Giuliani desistiu de sua candidatura, mas Hilary, com 7,62 pontos e o segundo lugar no ranking, o substitui à altura nas preferências de Telavive. Ela própria diz por quê: “Minha posição por mais de 20 anos tem sido fazer de tudo para apoiar Israel”. Recorda-se que, já em 1995, procurou convencer o então presidente Clinton a vetar uma resolução da ONU condenando violências de Israel contra os árabes. Falando ao Senado, em outubro de 2000, exigiu que o governo americano cortasse toda a ajuda aos palestinos caso eles declarassem unilateralmente sua independência – com o que, aliás, não estariam fazendo mais do que obedecer à ONU. Mais recentemente, ela protestou quando a Corte Internacional de Justiça condenou o muro de Sharon por usurpar territórios palestinos. E a invasão do Líbano, que causou a morte de 1.200 civis, contou com seu entusiástico apoio, que se estendeu à oposição do governo Bush ao cessar fogo da ONU, para dar tempo a que os invasores matassem mais soldados do Hisbolá. Como Giuliani, Hillary também tem frases encomiásticas muito do agrado dos políticos judaicos: “Israel é um farol, indicando o que a democracia pode e deve significar”. Não é de se admirar que, ao se candidatar ao Senado, tenha recebido financiamentos dos lobbies israelenses que excederam largamente as doações aos demais candidatos (dado da Comissão Eleitoral Federal dos EUA). Também considerado confiável, John McCain é o terceiro no ranking do Haaretz, com nota 7,12. Para ele, “não pode haver paz admissível entre Israel e o palestinos até que estes reconheçam Israel, repudiem o uso de violência, reconheçam acordos anteriores e reformem suas instituições”. Curiosamente, MCain não exige reciprocidade de Israel, que pode continuar com sua política de “matança seletiva” de adversários do Hamas e sua rejeição a uma Palestina independente, com as fronteiras de antes de o exército israelense ocupar o país. Para deixar claro até onde vai seu comprometimento com a causa israelense, McCain disse: “A América precisa fornecer a Israel todos os equipamentos militares e a tecnologia que o país requer para se defender, acima e além do que estamos fornecendo agora”. É dose, considerando a péssima situação financeira dos Estados Unidos, hoje. Mit Romney, o quarto colocado, com 6,5, também tem se derramado em protestos de amizade ao governo de Telavive. Em 2006, ele deixou a AIPAC, principal lobby pró-Israel dos Estados Unidos, encantada quando, como governador de Massachussets, negou proteção policial ao ex-presidente do Irã, Khatami. Foi excesso de sabujice ou de ignorância. Khatami, um moderado, visitava os Estados Unidos buscando um diálogo pela paz entre os dois países. O ex-pastor batista, Huckabee, vem logo depois. Lotado de preconceitos anti-islâmicos, ele se mostra mais sionista e radical do que os próprios fundamentalistas judaicos ao propor que o futuro estado palestino não se localize na Cisjordânia (que ele considera parte de Israel), mas em um país árabe. É demais para o pessoal do Haaretz! Eles sabem que idéias assim podem lhes ser simpáticas, mas trariam problemas explosivos. Daí, o quarto lugar e o 6 de Huckabee. Barack Obama passa raspando neste exame, em último lugar, com meros 5. Mereceria classificação melhor, levando-se em conta seus últimos pronunciamentos. Em visita a Israel, ele rotulou o então primeiro-ministro Sharon de “absolutamente importante e construtivo” para o processo de paz. Invasão do Líbano, bombardeios de Gaza e total assistência militar a Israel têm seu apoio. Além disso, co-patrocinou o Ato Anti-Terrorismo Palestino de 2006, que conclama a comunidade internacional a evitar contatos e financiamentos para o governo do Hamas, “até que ele reconheça Israel, renuncie à violência e desarme-se”. Enquanto isso, faz vistas grossas aos “assassinatos seletivos” de palestinos, à sistemática recusa dos governos de Israel de reconhecer o Estado palestino nos limites definidos pela ONU e ao bloqueio da faixa de Gaza, um ato de violência sem precedentes contra a população árabe. Apesar de um apoio tão amplo, os israelenses não esquecem que, até eleger-se senador, Obama foi ativo nos movimentos em favor do povo palestino. De lá para cá, vem pendendo sempre para o lado de Israel. É verdade que, ainda no ano passado, ele deu uma “escorregada”. Ao proclamar que o direito de retorno dos palestinos não poderia ameaçar a integridade do Estado judeu, afirmou que “Israel tem de reconhecer que o Estado palestino precisa ser coeso e capaz de funcionar”. Ora, um Estado palestino emasculado por colônias judaicas espalhadas pelo país, como quer o governo israelense, jamais será “coeso e capaz de funcionar”. Por essa e por outras, os demais candidatos são mais bem pontuados. Eleito, McCain deve continuar a linha de Bush de apoio total ao governo de Telavive. Por ser “o mais liberal dos conservadores”, talvez ele faça algumas pressões pontuais para suavizar abusos. Tendo uma longa e estreita associação aos lobbies judaicos americanos e uma atuação pró-Israel sem senões, Hilary não será diferente. Ganhando Romney, o mais “georgista” dos candidatos”, ou Huckabee, o cruzado anti-islâmico, nada deverá mudar. Mas e Obama? Será que sua declaração a favor de um “Estado palestino coeso e capaz” ainda vale? O voto judaico é importantíssimo, talvez essencial nas prévias do Estado de Nova Iorque. Parece que Obama tem isso bem presente, pois, no decorrer da campanha, seu comprometimento com as teses israelense é cada vez maior. Luiz Eça é jornalista. |