Para minha surpresa, durante uma ou duas vezes o senhor, ao chamar os participantes para aparecerem no vídeo o fez da seguinte maneira:
- Vamos agora falar com nossos heróis!
De imediato tive uma surpresa que me fez trepidar na cadeira.
Heróis?
O senhor chama aqueles que passam alguns dias aboletados numa confortável casa, participando de festas, alguns participando até de sessões de sexo sob os edredons, falando palavras chulas e no fim podendo ganhar um milhão de reais, de heróis?
Pois bem Sr. Pedro Bial, eu trabalho numa Plataforma Marítima que se localiza a aproximadamente 180 km da costa brasileira e contribuimos, mesmo modestamente, para que o nosso País alcançasse a auto-suficiência em Petróleo e continuamos lutando, todos nós, para superar esse patamar.
Neste último dia 26 de Fevereiro presenciamos um acidente com um dos Helicópteros que faz nosso transporte entre a cidade de Campos e a Plataforma. As imagens que ficaram em nossa mente Sr. Bial, irão nos marcar para o resto das nossas vidas. Os seus "heróis" Sr Bial, são meros coadjuvantes de filmes de segunda categoria comparados com os atos de heroísmos que presenciamos naquele momento.
Certamente o Senhor como Jornalista que é, deve estar a par de todo o acontecido. Mas sei que os detalhes o Sr. desconhece.
Pois bem, perdemos alguns colegas. Colegas esses, Sr Bial, que estavam indo para casa após haver trabalhado 15 dias em regime de confinamento. Não o confinamento a que estão sujeitos os seus "heróis", pois eles têm toda uma parafernália de conforto, segurança e bem estar, que difere um pouco da nossa realidade. Durante esse período de quinze dias esses colegas falaram com a família apenas por telefone. Não tiveram oportunidade de abraçar seus filhos, de beijar suas esposas, de rever seus amigos e parentes... Logo após decolar desta Plataforma com destino a suas casas o Helicóptero caiu no mar ceifando suas vidas de modo trágico e desesperador. E seus "heróis" Sr Bial, a que tipo de risco eles estão expostos? Talvez aos paredões das terças-feiras, a rejeição do público, a não ganhar o premio milionário ou a não virar a celebridade da próxima novela das oito.
Os heróis daqui Sr Bial foram aqueles que desceram num bote de resgate, mesmo com o mar apresentando um suel desafiador. Nossos heróis Sr. Bial desceram numa baleeira, nossos heróis foram os mergulhadores, que de pronto se colocaram à disposição para ajudar, mesmo que isso colocasse suas vidas em risco. Nossos heróis Sr. Bial, não concorrem ao Premio de um Milhão de reais, não aparecem na mídia, nem mesmo os nomes deles são divulgados. Mas são heróis na verdadeira acepção da palavra. São de carne e osso e não meros personagens manipulados pelos índices de audiência. Nossos heróis convivem aqui no dia-a-dia, sem câmeras, sem aparecerem no Faustão ou no Jô Soares.
Heróis, Sr Bial são todos aqueles que diariamente, saem das suas casas, nas diversas cidades brasileiras, chegam à Macaé ou Campos e embarcam com destino as Plataformas Marítimas, sem saber se regressarão as suas casas, se ainda verão seus familiares, ou voltarão ilesos, pois tudo pode acontecer: numa curva da estrada, num acidente de Helicóptero, no vôo comercial de regresso a sua cidade de origem...
Não tenho autoridade suficiente para convidá-lo a conhecer nosso local de trabalho e conseqüentemente esses nossos heróis, mas posso lhe garantir Senhor Bial, que caso o Sr estivesse presente nesta plataforma durante aquele fatídico acidente seu conceito de herói certamente seria outro.
Em memória dos colegas:
Durval Barros, Adinoelson Gomes e Guaraci Soares
*Carlos Augusto Lordelo Almeida é técnico de segurança da Plataforma P-XVIII