sexta-feira, 22 de abril de 2011

1833 - França inicia reforma da educação pública

Do blog Opera  Mundi

 Em 28 de julho de 1833, o ministro da Educação da França, François Guizot, faz votar uma lei que iria transformar o ensino primário no país e no mundo. Ela obrigava as comunas com mais de 500 habitantes a ter pelo menos uma escola primária de meninos e a manter pelo menos um professor primário. Além disso, cada departamento francês deveria ter uma escola de formação de professores do ensino básico. Os estabelecimentos privados foram legalizados e a instrução religiosa, mantida. A instrução pública na França seria modificada mais tarde pelas leis Falloux e Ferry.

Promulgada por iniciativa de Alfred de Falloux, então ministro da Educação (Instrução Pública), uma nova lei, sancionada em 15 de março de 1850, instaurou a liberdade do ensino secundário. Fez a distinção entre educação pública (a cargo de uma comuna, de um departamento ou do Estado) e o ensino privado, ao qual foi conferida ampla liberdade. De outra parte, favoreceu o ensino católico nos estabelecimentos primários e obrigou as comunas de mais de 800 habitantes a abrir uma escola para as meninas. Contrária ao princípio da laicidade no ensino, esta lei acabou revogada. Em 1881 e 1882, as leis Ferry seriam promulgadas.


Em 28 de abril de 1848 surgiu a escola maternal. O termo “maternal” foi empregado pela primeira vez em substituição àquilo que então se chamavam “casas de asilo” ou simplesmente “asilo”. Desde 1830, os asilos tinham por função acolher as crianças que ficavam brincando e perambulando pelas ruas enquanto seus pais trabalhavam. Além do ensino, também era oferecida assistência às crianças, cuja idade variava de 2 a 6 anos. A pedagoga Marie Pape-Carpentier desempenhou um papel importante na modificação do funcionamento desses estabelecimentos, especialmente quanto aos métodos empregados, relativamente duros. Foi necessário, porém, esperar pelas leis de Jules Ferry, em 1881, para que as escolas maternais fossem efetivamente instituídas.
 
Em 15 de novembro de 1866, nasceu a Liga Francesa de Ensino, graças à vontade e empenho de Jean Macé, que tinha lançado um apelo para reunir o máximo de voluntários para melhorar a educação na França. Muitos se entusiasmaram pelo projeto e dele fizeram parte. Com um número de adesões sempre crescente em todo o país, a Liga passou a lutar por uma educação popular, pública. Lançou uma petição pela educação obrigatória, gratuita e laica. Quando as leis Ferry foram aprovadas, a Liga adotou um estatuto jurídico, se organizou em federações e nunca parou de lutar contra as desigualdades e em favor do desenvolvimento cultural.

Finalmente, em 16 de junho de 1881, o novo ministro da Educação, Jules Ferry, aprovou uma lei que estabelecia a gratuidade da escola. A partir de 1879, ordenou a publicação de uma série de textos a fim de promover a escola pública e reduzir o peso da Igreja na educação das crianças e jovens franceses. Nesse contexto, uma nova lei seria sancionada em 28 de março de 1882, tornando obrigatória a educação para as crianças de 3 a 6 anos e definitivamente laica. A educação civil substituiria a religiosa e até os professores deveriam ser laicizados no seio de escolas especializadas. Essa foi a estrutura que serviu de base para o ensino público da França daquela época em diante.

'Trem-bala não é o projeto mais conveniente à retomada de autêntica política ferroviária'

  Gabriel Brito, da Redação do CORREIO DA CIDADANIA   
 
No último dia 14, o Senado brasileiro aprovou a Medida Provisória 511/10, que autoriza o empréstimo de 20 bilhões de reais ao consórcio vencedor da licitação pelo Trem de Alta Velocidade (TAV), o trem-bala, que fará a ligação Rio-São Paulo. Para debater mais um mega-projeto dos governos petistas, o Correio da Cidadania conversou com o deputado federal do PSOL-RJ Chico Alencar.
 
De acordo com ele, o governo se equivoca em lançar mão de um projeto que antes de tudo não tem teto orçamentário, uma vez que há quase um consenso de que a previsão de custo de R$ 30 bilhões é de baixa confiabilidade. Além disso, o deputado lembra que "com os recursos destinados ao trem-bala (públicos, do BNDES) poderiam ser construídos 10 quilômetros de metrô ou VLT em cada uma das nas 9 regiões metropolitanas do Brasil, onde vivem 65% da população".
 
Dessa forma, considera que o projeto do Trem de Alta Velocidade ocupa lugar remoto na tabela de prioridades nacionais, e vem em momento muito inconveniente, logo após o governo anunciar o corte de 50 bilhões de reais do Orçamento Público. O deputado não menospreza a necessidade de se retomar uma política ferroviária, mas sublinha que isso deveria começar pela ampliação da malha urbana, saturada e insuficiente.
 
Correio da Cidadania: Como você recebeu a Medida Provisória 511/10, que autoriza a União a oferecer garantia para financiamento de até R$ 20 bilhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao consórcio que construirá o Trem de Alta Velocidade (TAV), conhecido como trem-bala, que ligará São Paulo ao Rio de Janeiro?
 
Chico Alencar: Mais uma reversão total daquilo que o PT sempre pregou. A recuperação do transporte sobre trilhos no Brasil, que começou a se deteriorar nos anos 50 com a ênfase dada à indústria automobilística é importantíssima, é verdade.
 
Porém, o trem-bala surge sem que a gravíssima crise que afeta a população mais pobre no transporte urbano sobre trilhos seja resolvida – metrô, trens, VLT... Nada disso está sendo implementado. Com os recursos destinados ao trem-bala, públicos, do BNDES, poderia se construir 10 quilômetros de metrô ou VLT nas 9 regiões metropolitanas do Brasil, onde vivem 65% da população.
 
Governar é escolher prioridades a partir das necessidades mais sentidas de nossa gente.
 
Não vou nem falar de educação, vamos ficar na parte do transporte sobre trilhos mesmo: dá pra dizer tranquilamente que o trem-bala não é prioridade. Poderia se fazer algumas adaptações e melhorar a ligação ferroviária Rio-SP, mas o trem-bala vai exigir vultosos investimentos, com recursos do BNDES. Além disso, não admite passagens difíceis, vai exigir muitos túneis, pode dividir cidades ao meio, terá impactos ambientais violentíssimos... E ainda dizem que a passagem vai custar 300 reais...
 
Correio da Cidadania: Pela projeção divulgada pelo governo, os custos da passagem ficarão entre 150 e 200 reais, por uma viagem de uma hora e meia. Ou seja, mesmo que sejam custos um pouco menores do que os mencionados por você, ainda seria mais caro e demorado que a viagem de avião. Como você enxerga esse aspecto?
 
Chico Alencar: Pois é, e já começaram as reivindicações de várias cidades. Querem que pare em Volta Redonda, tem que parar em Resende, em São José dos Campos, em Jundiaí... Todo mundo quer uma parada em sua cidade. Quanto à duração da viagem, seria de cerca de duas horas e meia.
 
Mas os detalhes técnicos são menos importantes do que outro fator, aquele que elenca prioridades. Não que eu seja contra o trem-bala por princípio. Todo transporte de massa é bem vindo, toda tecnologia que comprima tempo e espaço com segurança é ótima, mas no Brasil temos etapas e ferrovias, outros trilhos, urbanos e suburbanos, a serem implementados antes. Os metrôs do Brasil são de dimensões muito pequenas. O Rio, por exemplo, tem o metrô mais caro do Brasil e a menor extensão; o de Brasília é ridículo... Existem outras prioridades.
 
Correio da Cidadania: Isso no momento em que o governo Dilma corta 50 bilhões do orçamento, atingindo, como manda a tradição, os serviços essenciais dirigidos à maioria da população que carece, e padece, deles?
 
Chico Alencar: Pois é! É completamente contraditório a essa política de arrocho e contenção de gastos que a Dilma promove em seu governo. A gente se choca com isso. É uma iniciativa de ‘alta velocidade’ contra a política de contenção.
 
Correio da Cidadania: Aliás, essa previsão orçamentária encontra base na realidade ou ainda nem se calcularam precisamente os custos totais do projeto? Em outras palavras, você enxerga tendência de inchaço dos valores, tal como visto em diversas obras de infra-estrutura nos últimos anos?
 
Chico Alencar: Não, não tem a menor base real. É só pra tentar edulcorar um pouco o projeto e atrair a iniciativa privada. É claro que podemos temer por inchaço de custos. Nesse país a diferença entre orçamento inicial e custo final vai a uma diferença que pode chegar a 10 vezes.
 
É algo fora de lugar fazer esse trem-bala. Apesar das deficiências, ir de São Paulo ou Campinas para o Rio, ou o contrário, ainda é fácil. Tem o transporte aéreo e ferroviário, e não há um estrangulamento dessa rota, a Dutra não está estrangulada.
 
Inclusive, tivemos a experiência de revitalizar o trem de prata Rio-SP e não foi bem sucedida, por causa do custo. Não foi nem pela demora, já que se podia dormir bem nele. Mas só durou uns dois anos depois de reativado até voltar a cair em desuso.
 
Correio da Cidadania: Dessa forma, nem do ponto de vista de uma malha integrada do transporte nacional a obra adquire viés positivo?
 
Chico Alencar: Acho que não, pois deveríamos começar pelas redes metropolitanas.
 
Correio da Cidadania: E o que pensa da criação da Empresa de Transporte Ferroviário de Alta Velocidade (Etav), estatal que seria dedicada exclusivamente ao gerenciamento do projeto?
 
Chico Alencar: Aí é uma conseqüência. Quando se aprova financiamento para construção do trem-bala, que pelo menos haja uma estatal enxuta que possa controlar o processo e evitar abusos que são praticados ao bel prazer da livre iniciativa.
 
Correio da Cidadania: Não se podia deixá-lo a cargo da Valec, a atual empresa gerenciadora da malha ferroviária?
 
Chico Alencar: Poderia também, mas alegam que a Valec tem outras preocupações etc. Na verdade, a criação de nova estatal serve pra ressaltar a prioridade que se pretende dar ao trem-bala.
 
Correio da Cidadania: Ainda que sejam questionáveis os custos do projeto em meio às necessidades nacionais, o Brasil não precisa retomar políticas estratégicas no setor ferroviário, hoje em dia praticamente reduzido às rotas de transporte dos minérios e outros itens da cadeia produtiva da Vale?
 
Chico Alencar: Precisa, claro, quanto a isso não há duvida. O Brasil precisa de uma rede ferroviária, e tem condições disso, o que é muito importante. O transporte ferroviário é de massa, não apenas coletivo, é a rede do futuro, inclusive.
 
E essa política que era forte nos anos 30, 40, começou a minguar nos anos 50 e nunca mais voltou. Precisamos retomar, mas fazê-lo com o trem-bala é retomar com bases equivocadas, embora já esteja aprovado na Câmara e no Senado.
 
Correio da Cidadania: E qual seria a estratégia ferroviária mais adequada ao país?
 
Chico Alencar: Fazer as ligações ferroviárias nas grandes cidades e suas regiões metropolitanas, melhorar a qualidade dos trens urbanos, reativar ligações inter-estaduais, mesmo que sem o trem de alta velocidade, que é caríssimo e exige condições especiais, e a partir disso acumular condições para transportes mais complexos como o trem-bala.
 
Gabriel Brito é jornalista.

O contra-ataque da direita frente à maior tributação dos ricos nos EUA

Por Sam Pizzigati no Portal Grabois
 
O debate fiscal no Congresso dos EUA segue girando quase exclusivamente em torno da questão dos cortes no orçamento, sem que se dê atenção às enormes fortunas dos super ricos que seguem com uma baixa tributação. Mas então, por que os porta-vozes das grandes fortunas dos EUA começaram a suar? Porque se deram conta do novo clamor – por parte dos sindicatos e da sociedade civil em todo o país –pedindo maiores impostos para os “multimilionários”. E porque deram também uma olhada nas pesquisas: quase 80% dos estadunidenses querem que o imposto de nossos ricos aumente.
O crescente clamor público para que se aumente os impostos para os ricos nos Estados Unidos tem deixado os conservadores cada vez mais preocupados. E com razão. Os dados não estão do seu lado...e tampouco a História.

Ao longo de todo o país, começa-se a ouvir uma consigna simples, mas poderosa contra os cortes selvagens do gasto público. “Como acabar com o déficit? – proclamam os manifestantes. “Aumentar, aumentar, aumentar os impostos dos ricos!”.

Essa ideia, infelizmente, ainda não se materializou nas propostas dos legisladores. Uma exceção: na semana passada, em Washington, o republicano Jan Schakowsky, de Illinois, lançou uma proposta para aumentar os impostos das rendas superiores a 1 milhão de dólares, passando dos atuais 35% para um leque que variaria entre 45 e 49%.

Mas o debate fiscal no Congresso segue girando quase exclusivamente em torno da questão dos cortes, sem que se dê atenção algumas às enormes fortunas dos super ricos que seguem com uma baixa tributação. E nos parlamentos estaduais é quase sempre a mesma história.

Mas então, por que os porta-vozes das grandes fortunas dos EUA começaram a suar? Porque se deram conta do novo clamor – por parte dos sindicatos e da sociedade civil em todo o país – pedindo maiores impostos para os “multimilionários”. E porque deram também uma olhada nas pesquisas: quase 80% dos estadunidenses, assinalam os últimos levantamentos, querem que o imposto de nossos ricos aumente.

Os apologistas da classe ultra acomodada, diante do avanço desta onda que grota “mais impostos para os ricos”, começaram a organizar seu contra-ataque preventivo. Subir os impostos dos ricos, reza seu novo argumento, dificilmente servirá para enxugar o déficit porque, como sustenta o editor da National Review, Kevin Williamson, “não há o número suficiente de ricos” para isso.

A National Review, publicação mais reverenciada da direita, lançou duas bombas de profundidade na semana passada que iam nesta linha. Williamson, editor adjunto da revista, terminou seu artigo voltando de novo aos velhos mitos e tópicos fiscais da direita. Os ricos, diz, ou bem vão se livrar do aumento de impostos mediante artifícios legais ou vão marchar a jurisdições com menor pressão fiscal.

Seu colega na National Review, Robert VerBruggen, tratou de abordar a questão em números a partir das declarações de imposto de renda de 2008, para sustentar sua afirmação de que “se não pudermos subir também os impostos para todas as pessoas que não são ricas, o imposto sobre a renda não será de muita ajuda para aumentar a arrecadação”. Mas os dados, se analisados no detalhe, não apoiam essa conclusão.

Em 2008, o ano mais recente com registros completos do IRS (a agência tributária dos EUA), os contribuintes que ganhavam mais de 200 mil dólares anuais pagaram ao governo federal, depois de explorar todos os vazios legais que puderam encontrar, somente 21,8% do total de suas receitas. Isso é consideravelmente menos do que pagavam os mais opulentos dos EUA – também depois de buscar toda evasão possível – há 50 anos. Em 1961, os contribuintes que ganhavam mais de 27 mil dólares – o equivalente a uns 200 mil dólares atuais – pagavam em média impostos de 31,3% sobre seus rendimentos totais.

Mas mesmo os contribuintes que ganhavam ainda mais há 50 anos pagavam também mais do que agora ao Tio Sam. Em 1961, as rendas anuais acima de 400 mil dólares – cerca de 3 milhões de dólares hoje – enfrentavam uma carga tributária de 91%. Hoje, em troca, as rendas superiores a 3 milhões de dólares pagam cerca de 35% de impostos.

Esse índice de 91%, cabe lembrar, só era aplicado em 1961 às rendas que superassem os 400 mil dólares. As rendas abaixo desse limite pagavam taxas mais baixas. E mesmo alguns tipos de receitas acima dos 400 mil dólares, as taxas de capital, por exemplo, também enfrentavam tributações menores. Assim, sobre que parte de sua renda total pagavam impostos de verdade os autênticos ricos de 1961? Os contribuintes com uma renda acima dos 135 mil dólares anuais – o equivalente a 1 milhão de dólares hoje – acabavam pagando uma média de 43,1% de sua renda em impostos federais.

Em 2008, aqueles que ganharam mais de 1 milhão de dólares deram ao Tio Sam somente 23,1% de sua renda. Em outras palavras, os autênticos ricos pagavam há 50 anos quase o dobro de impostos ao governo federal do que pagam os ricos de agora.

Quanto o governo poderia arrecadar a mais se nossos ricos contemporâneos pagassem como impostos a mesma proporção de sua renda que pagavam os ricos de 1961?

O Comitê Conjunto sobre Impostos, do Congresso, fez uma previsão no ano passado estimando que os contribuintes que ganham mais de 1 milhão de dólares declarariam à Receita um total de mais de 1,1 bilhões de dólares. E as declarações daqueles que ganham entre 200 mil e 1 milhão de dólares somariam outros 1,9 bilhões.

Toda esta gente poderia pagar uns alucinantes 382 bilhões a mais de dólares em impostos se tivessem que tributar segundo as taxas efetivas de 1961 que, de fato, afrontavam os ricos de 50 anos atrás depois de aproveitarem toda brecha legal possível.

Isso é quase quatro vezes mais que os 100 bilhões que os conservadores no Congresso tratam de cortar do orçamento deste ano, afetando um amplo conjunto de políticas, como o programa Head Start (para atender a saúde e a educação infantil de crianças de famílias de baixa renda), os auxílios para estudantes universitários e a própria televisão pública.

Os defensores dos cortes no orçamento vão também atrás do IRS. Querem eliminar outros 285 milhões de dólares dos fundos de que a Agência dispõe para controles fiscais, no momento em que, após os obscuros anos de Bush, o IRS finalmente começou a ser algo mais sério nas auditorias das declarações de impostos das classes abastadas dos EUA. No ano passado, as auditorias de declarações acima dos 10 milhões de dólares quase duplicaram, registrando um aumento de 18,4%.

Por que precisamos de mais controles na parte superior da distribuição de renda? O último informe do IRS sobre a evasão fiscal (IRS Oversight Board report) estima que perdemos algo da ordem de 290 bilhões de dólares ao ano em impostos não pagos. Segundo um estudo de 2008, os contribuintes de maiores rendimentos escondem três vezes mais renda do que um cidadão médio.
Assim, a conclusão é a seguinte: taxar os ricos com os índices que existiam há meio século – esforçando-se mais para garantir que paguem o que devem pagar – faria com que este ano se arrecadasse em nível federal aproximadamente meio trilhão de dólares a mais.

Aumentar, aumentar, aumentar os impostos dos ricos, portanto!


Sam Pizzigati é editor de Too Much, um semanário eletrônico sobre abusos e desigualdades, publicado pelo Instituto de Estudos Políticos, sediado em Washington.

Tradução: Katarina Peixoto

Fonte: Too Much, na Carta Maior

Crime (financeiro) contra a humanidade

Por José Saramago* no Portal Grabois
 
A história é conhecida e – nos antigos tempos de uma escola que a si mesma se proclamava como perfeita educadora – era ensinada aos meninos como exemplo da modéstia e da discrição que sempre deverão acompanhar-nos quando nos sintamos tentados pelo demônio a ter opinião sobre aquilo que não conhecemos, ou conhecemos pouco e mal.
Apeles podia consentir que o sapateiro lhe apontasse um erro no calçado da figura que havia pintado, porquanto os sapatos eram o ofício dele, mas nunca que se atrevesse a dar parecer sobre, por exemplo, a anatomia do joelho. Em suma, um lugar para cada coisa e cada coisa no seu lugar. À primeira vista, Apeles tinha razão, o mestre era ele, o pintor era ele, a autoridade era ele; quanto ao sapateiro, seria chamado na altura própria, quando se tratasse de deitar meias-solas num par de botas. Realmente, aonde iríamos nós parar se qualquer pessoa, até mesmo a mais ignorante de tudo, se permitisse opinar sobre aquilo que não sabe? Se não fez os estudos necessários, é preferível que se cale e deixe aos sabedores a responsabilidade de tomar as decisões mais convenientes (para quem?).

Sim, à primeira vista, Apeles tinha razão, mas só à primeira vista. O pintor de Filipe e de Alexandre da Macedônia, considerado um gênio na sua época, esqueceu-se de um aspecto importante da questão: o sapateiro tem joelhos, portanto, por definição, é competente nestas articulações, ainda que seja unicamente para se queixar – sendo esse o caso – das dores que nelas sente.

A estas alturas, o leitor atento já terá percebido que não é propriamente de Apeles nem de sapateiro de que se trata nestas linhas. Trata-se, isso sim, da gravíssima crise econômica e financeira que está a convulsionar o mundo, a ponto de não escaparmos à angustiosa sensação de que chegamos ao fim de uma época sem que se consiga vislumbrar qual e como seja o que virá a seguir, após um tempo intermédio, impossível de prever, para levantar as ruínas e abrir novos caminhos. Como assim? Uma lenda antiga para explicar os desastres de hoje? Por que não? O sapateiro somos nós, nós todos que assistimos, impotentes, ao avanço esmagador dos grandes potentados econômicos e financeiros, loucos por conquistar mais e mais dinheiro, mais e mais poder, por todos os meios legais ou ilegais ao seu alcance, limpos ou sujos, correntes ou criminosos. E Apeles? Apeles são esses precisamente: os banqueiros, os políticos, os seguradores, os grandes especuladores que, com a cumplicidade dos meios de comunicação social, responderam nos últimos trinta anos a nossos tímidos protestos com a soberba de quem se considerava detentor da última sabedoria, isto é: ainda que o joelho nos doesse não nos seria permitido falar dele, denunciá-lo, apontá-lo à condenação pública. Foi o tempo do império absoluto do Mercado, essa entidade presuntivamente auto-reformável e autocorretora encarregada pelo imutável destino de preparar e defender para todo o sempre a nossa felicidade pessoal e coletiva, ainda que a realidade se encarregasse de o desmentir a cada hora.

E agora? Irão finalmente acabar os paraísos fiscais e as contas numeradas? Irá ser implacavelmente investigada a origem de gigantescos depósitos bancários, de engenharias financeiras claramente delituosas, de investimentos opacos que, em muitíssimos casos, não são mais que maciças lavagens de dinheiro negro, de dinheiro do narcotráfico? E já que falamos de delitos… Terão os cidadãos comuns a satisfação de ver julgar e condenar os responsáveis diretos do terremoto que está sacudindo as nossas casas, a vida das nossas famílias, o nosso trabalho? Quem resolve o problema dos desempregados (não os contei, mas não duvido de que já sejam milhões), vítimas do crash e que desempregados irão continuar a ser durante meses ou anos, malvivendo de míseros subsídios do Estado, enquanto os grandes executivos e administradores de empresas, deliberadamente levadas à falência, gozam de milhões e milhões de dólares a coberto de contratos blindados que as autoridades fiscais, pagas com o dinheiro dos contribuintes, fingiram ignorar? E a cumplicidade ativa dos governos, quem a apura? Bush, esse produto maligno da natureza numa das suas piores horas, dirá que o seu plano salvou (salvará?) a economia norte-americana, mas as perguntas a que terá de responder são estas: Não sabia o que se passava nas luxuosas salas de reunião em que até o cinema já nos fez entrar, e não só entrar, como assistir à tomada de decisões criminosas sancionadas por todos os códigos penais do mundo? Para que lhe serviram a CIA e o FBI, mais as dezenas de outros organismos de segurança nacional que proliferam na mal chamada democracia norte-americana, onde um viajante, à entrada do país, terá de entregar ao policial de turno o seu computador para que faça copiar o respectivo disco rígido? Não percebeu o senhor Bush que tinha o inimigo em casa, ou, pelo contrário, sabia e não o importou?

O que está a passar-se é, em todos os aspectos, um crime contra a humanidade. E é desta perspectiva que deveria ser objeto de análise em todos os foros públicos e em todas as consciências. Não estou a exagerar. Crimes contra a humanidade não são somente os genocídios, os etnocídios, os campos de morte, as torturas, os assassínios seletivos, as fomes deliberadamente provocadas, as poluições maciças, as humilhações como método repressivo da identidade das vítimas. Crime contra a humanidade é o que os poderes financeiros e econômicos dos Estados Unidos, com a cumplicidade efetiva ou tácita do seu governo, friamente perpetraram contra milhões de pessoas em todo o mundo, ameaçadas de perder o dinheiro que ainda lhes resta e depois de, em muitíssimos casos (não duvido de que eles sejam milhões), haverem perdido a sua única – e quantas vezes escassa – fonte de rendimento, o trabalho.

Os criminosos são conhecidos, têm nomes e sobrenomes, deslocam-se em limusines quando vão jogar golfe, e tão seguros de si mesmos que nem sequer pensaram em esconder-se. São fáceis de apanhar. Quem se atreve a levar esta gangue aos tribunais? Ainda que não o consiga, todos lhe ficaremos agradecidos. Será sinal de que nem tudo está perdido para as pessoas honestas.

*José Saramango é escritor, roteirista, jornalista e poeta português, vencedor do Nobel de literatura em 1998.

Referência
Texto publicado no blog http://caderno.josesaramago.org em 19 de outubro de 2008 e adaptado para o português do Brasil para esta edição de Princípios.

Aumento de juros ou taxa Tobin?


O neoliberalismo promoveu um processo global de desregulação da economia. Debilitou as formas de regulação estatal, da proteção aos mercados internos à garantia dos direitos sociais, da afirmação dos patrimônios públicos à garantia do acesso gratuito aos bens fundamentais. Seu diagnóstico era que o excesso de regulação inibia a livre circulação do capital. Destravado, o capital voltaria a promover investimentos produtivos, fazendo com que a economia voltasse a crescer.


Por Emir Sader no PORTAL VERMELHO

Não foi o que aconteceu. Livre de travas, o capital se transferiu maciçamente para o setor financeiro, passando a auferir enormes ganhos na especulação. Porque o capital não é feito para produzir, mas para acumular. Se pode dispor de taxas de juros altas, de baixa ou nenhuma taxação e de liquidez absoluta, ele se dirigirá para esse setor. Foi o que aconteceu com a desregulamentação.

Estados endividados, competindo para ver quem atrai a maior quantidade de capitais financeiros, com economias que passaram a depender cada vez mais desses capitais, não somente promoveram o enriquecimento brutal do setor financeiro, como deixaram os Estados vulneráveis à volatilidade de ataques especulativos. As crises econômicas do período neoliberal são basicamente produzidas por saídas bruscas e maciças de capitais especulativos.

Esses capitais, os de pior qualidade, porque não produzem bens, nem empregos, são assim produtores de crises. Alavancados pelos empréstimos do FMI a países em crise, ocuparam lugares estratégicos nas economias nacionais e no plano internacional e passaram a ser o setor hegemônico a nível nacional e internacional.

A luta contra o neoliberalismo e suas consequências negativas passou a ter na retomada da tese da Taxa Tobin – formulada por um economista - de taxação dos movimentos do capital financeiro a proposta central dos movimentos que posteriormente se agruparam no Forum Social Mundial. Essa taxação se faria para a criação de um fundo para promover os direitos de cidadania, atacados duramente pelos governos neoliberais. A proposta obteve grande difusão, mas não chegou a ser colocada em pratica, salvo alguns casos isolados.

A crise econômica atual não poupou sequer os EUA, surgindo do setor financeiro e estendendo-se ao resto da economia global. As reações das potencias centrais do capitalismo foram as tradicionais, salvando os bancos, na expectativa de que estes salvassem a economia. Os bancos se salvaram e deixaram as economias à deriva.

Países do Sul do mundo, que privilegiamos o intercambio Sul-Sul, os processos de integração regional e a expansão do mercado interno de consumo popular, pudemos superar rapidamente a crise, enquanto os países do Norte, sofrendo o seu próprio veneno, ainda tropeçam na crise, como os dramáticos casos da Irlanda, da Grécia, de Portugal e da Espana demonstram.

Mas a abertura das economias de praticamente todos os países, promovida pelo neoliberalismo, não nos faz imunes aos efeitos da crise. Sofremos da competitividade cambial de economias fortes como a dos EUA e da China, que ganham mercados com moedas nacionais artificialmente desvalorizadas, assim como drenam para países como o Brasil capitais atraídos pela taxa de juros real mais alta do mundo.

Uma margem restrita de manobra se apresenta, entre os riscos inflacionários e a desindustrialização que o real supervalorizado produz. As taxas de juros têm sido elevadas na contramão do objetivo de chegar ao final do governo atual para algo em torno de 2%, como media internacional de juros. Essas elevações e outras medidas complementares têm sido insuficientes e o dólar baixou não apenas de 1,65 – piso que o governo tinha estabelecido – como a para a casa dos 1,5.

Sair desse circulo vicioso supõe romper com os dilemas aparentemente insuperáveis que a situação nos apresenta. A Taxa Tobin, como forma de taxação de toda movimentação financeira, ao mesmo tempo que inibiria esses movimentos especulativos, geraria recursos para fortalecer e estender mais as politicas sociais. (As politicas de saúde, por exemplo, necessitadas urgentemente de recursos.)

É a hora de discutir seriamente entre instancias do governo, parlamento, partidos e movimentos do campo popular, esse tipo de medida, que contribuiria para superar a hegemonia persistente do capital financeiro sob sua forma especulativa e fortalecer o maior objetivo do país hoje – terminar com a extrema pobreza e desenvolver ainda mais a prioridade das políticas sociais.

Fonte: Carta Maior

Mais uma elevação dos juros!



A continuidade da política de elevação da taxa de juros é um tiro no pé. Ela não resolve adequadamente a questão que se propõe solucionar (queda da demanda) e provoca dois efeitos perversos adicionais: eleva os gastos públicos com pagamento de juros e serviços da dívida, e perpetua o fluxo internacional de capital especulativo em busca de rentabilidade fácil.


Infelizmente parece que a coisa está virando rotina. Apesar de todas as expectativas a respeito de uma mudança de rota a ser promovida pela Presidenta Dilma na condução da política econômica, as decisões tomadas até agora só fizeram reforçar o conteúdo da ortodoxia e do monetarismo.

Desde a posse da nova ocupante do Palácio do Planalto, houve 3 reuniões do Comitê de Política Monetária (COPOM). Trata-se de um encontro dos próprios membros da diretoria do Banco Central (CBC), que ocorre com a periodicidade de cada 45 dias e dura 2 dias, em geral uma terça-feira e uma quarta-feira. Deixando-se de lado todo o jogo de cena e a pompa envolvendo o evento, o mais importante refere-se ao resultado da reunião: todos querem saber o que foi decidido a respeito da taxa oficial de juros do governo, a SELIC. Manter, reduzir ou elevar. Dias depois vem a público a ata da reunião, com toda a parafernália de interpretações a respeito das entrelinhas, das omissões, dos gerúndios, dos adjetivos e dos não ditos. Inicia-se a fase de apostas para a tendência possível para a próxima reunião.

Pois então, o fato é que em todas as oportunidades de 2011, a decisão dos membros do comitê foi de elevar a SELIC. Em meados de janeiro, no início de março e agora em 20 de maio a taxa de juros foi elevada em 0,5% e dessa vez “apenas” 0,25%. No total, um acumulado de 1,25% na taxa anual de juros que serve como base para a formação de todas as demais taxas no mercado financeiro.

Com isso, o BC está orientando as instituições que oferecem crédito e empréstimo a também elevarem as suas taxas para os indivíduos e as empresas que procurem os recursos em seus balcões. Com o agravante, porém, de que não há nenhuma iniciativa do governo em controlar ou reduzir os elevadíssimos “spreads” cobrados pelos bancos em tais operações. Nesse quesito, somos também campeões mundiais. Ou seja, além do Brasil oferecer a maior taxa de juros oficial do planeta, em nenhum outro lugar os bancos são autorizados pelo órgão responsável pelo controle e fiscalização a cobrar um diferencial tão elevado sobre os empréstimos, como ocorre em nosso País. Com essa liberdade, tais instituições se permitem optar por onde pretendem exercer sua altíssima lucratividade. Seja aplicando sem risco algum em títulos da dívida pública, com retorno recorde. Seja emprestando a quem quiser precisar recursos, com ganhos de mais de 40% nas operações. Seja administrando o dia-a-dia dos clientes cobrando tarifas igualmente escandalosas pelos serviços prestados.

Os argumentos de natureza macroeconômica para justificar as decisões de elevar a taxe de juros são - para dizer o mínimo - polêmicos. A maior parte dos planos de ajuste econômico das últimas décadas, a exemplo do Plano Real de 1994, incorporou a idéia de controle da inflação a partir do chamado regime de metas de inflação. Com isso, a autoridade econômica estabelecia uma meta de crescimento geral de preços no país para um período futuro (em geral, um ano). E ao longo desse espaço de tempo, acontecem reuniões de um órgão para avaliar o conjunto dos fatores e a conjuntura econômica mais geral, com o objetivo de balizar a ferramenta considerada eficaz para evitar que a inflação verificada na prática “escape” da meta previamente fixada. E esse instrumento é a taxa oficial de juros, a nossa SELIC.

Ao elevar a taxa de juros, a intenção é que ocorra uma redução no nível do chamado “consumo agregado”. Isso porque a maior rentabilidade dos instrumentos de poupança atrairia os recursos para esse fim, reduzindo a pressão da demanda agregada. Obviamente, tudo isso partindo do pressuposto de que a elevação dos preços estaria associada exclusivamente a um problema de excesso de demanda face à escassez de oferta. Assim, em tese, ao elevar a taxa de juros o governo estaria controlando a inflação.

Porém, o fenômeno econômico é bem mais complexo do que pretendem nos fazer crer esses modelos simplificadores e o buraco, na verdade, está muito mais embaixo. Existem vários trabalhos de economistas e pesquisadores que utilizam os mesmos dados sobre inflação e taxa de juros para chegar a conclusões opostas às dos modelos que embasam as decisões do “establishment”. Há um conjunto de fatores, que apenas listo abaixo, sem perder espaço com argumentação. Percebe-se uma diferença enorme entre a eficácia da política monetária, de acordo com os países considerados e a institucionalidade econômica. Por exemplo, uma coisa é o FED norte-americano elevar a sua taxa oficial de juros de 0,25% para 0,50% ao ano. Trata-se de um aumento de 100%, a taxa dobrou. Outra bem diferente, é o COPOM aumentar a SELIC de 11,75% para 12%. As conseqüências sobre a demanda agregada são bem menores. Uma coisa é tentar controlar a inflação quando a pressão dos preços se dá em setores em que há concorrência e outra bem distinta é atuar em situações em que os preços crescem por condições chamadas “exógenas”, pois tem origem fora do País e não conseguimos interferir diretamente nelas.

No caso atual, é importante separar o joio do trigo. Os grandes órgãos de comunicação prepararam a terra durante vários dias que antecederam a reunião do COPOM, criando o falso clima catastrofista – como costumam fazer sempre, aliás. As manchetes dos jornais e de seus cadernos de economia giravam em torno de variações no mesmo tema: “inflação está fora de controle”, “mercado espera que COPOM eleve a taxa de juros”, “analistas econômicos reafirmam necessidade de elevação da SELIC”, “governo não tem outra opção para evitar volta da inflação”, “previsão de inflação supera a meta oficial”, e por aí vai. Uma verdadeira faca no pescoço nos responsáveis pela área econômica e no COPOM para que eleve a taxa SELIC.

Ocorre que não cabe à Presidenta Dilma ficar refém de um reduzido grupo, que defende exclusivamente seus próprios interesses e não se preocupa com as necessidades do conjunto do País e da maioria de sua população. Face a tais pressões oportunistas, caberia ao governo responder com os argumentos e fatos da realidade e não se deixar levar pelo clima irresponsável dessas propostas, com receio de não enfrentar as “forças de mercado”. Afinal, quem é mesmo essa tão temida entidade - o “mercado” - que tudo pode, que tem tantos desejos assim e a quem não se pode contrariar? Por que não ouvir também a opinião de economistas ligados ao movimento sindical (além do patronal), a opinião dos pesquisadores das universidades que têm avaliação diferente dos interesses do sistema financeiro? Afinal, até mesmo Delfim Netto vem declarando ultimamente que a economia não é uma ciência exata e sim uma ciência social! Ou seja, a constatação de que há mais de uma avaliação a respeito de uma conjuntura e também mais de uma solução para um mesmo problema.

Antes de mais nada, é importante reafirmar que não é líquido e certo que a inflação esteja fora de controle. O modelo adotado pelo BC contém um chamado “centro” da meta e um intervalo de dois pontos percentuais para cima ou para baixo como margem de erro. Ou seja, com o centro definido em 4,5%, uma inflação de até 6,5% para os próximos 12 meses está dentro do aceitável. E as previsões ainda não chegaram a tanto. Os fatos demonstram que boa parte das pressões para a alta de preços estão localizadas nos preços das chamadas “commodities”, bens comercializáveis internacionalmente e sobre os quais o Brasil tem pouca capacidade de interferência, como petróleo, minério de ferro, soja, trigo, milho, arroz, etc. Tanto é assim, que boa parte dos países desenvolvidos estão sofrendo os efeitos também dessa alta de preços em seus próprios mercados. Além disso, há sinais que apontam para uma desaceleração da atividade econômica em cursos, em, função das 2 elevações que o COPOM já promoveu na SELIC no início do ano.

De outro lado, vale a pena reforçar o argumento de que a elevação da taxa SELIC tem efeito muito reduzido sobre a demanda interna, ao contrário do que pretende o atual modelo usado pelo BC. As camadas de renda mais elevada são as que mais se beneficiam da alta dos juros, pois conseguem aumentar seus rendimentos nas instituições financeiras. Com a alta dos juros e a disponibilidade de aplicações de curtíssimo prazo, elas ficam inclusive com maiores recursos disponíveis para... consumir! Ou seja, ocorre um resultado oposto ao esperado no modelo. A demanda desses setores pode até aumentar. Já as camadas de renda mais baixa apresentam comportamento oposto. As famílias dessas faixas de rendimento são caracterizadas pelo que o “economês” classifica como “baixa ou nula propensão a poupar”. Como têm renda reduzida e muita deficiência no atendimento das necessidades básicas de uma vida digna e cidadã, acabam gastando tudo o que ganham no consumo de bens e serviços básicos. Assim, esse tipo de demanda não é praticamente afetada pela elevação da SELIC. Os juros sobem, mas nem por isso as pessoas vão deixam de comprar. Esse comportamento ainda é reforçado por uma particularidade cultural de nosso povo, onde domina a lógica da “prestação que cabe no orçamento” ao invés da lógica racional de adiar o consumo para um momento de juros mais baixos.

Por tudo isso é que a continuidade da política de elevação da taxa de juros oficial é um verdadeiro tiro no pé. Não apenas por que ela deixa de resolver adequadamente a questão que se propõe solucionar (queda da demanda). O pior é que ela provoca dois efeitos perversos que fragilizam ainda mais o quadro da macroeconomia. De um lado, eleva os gastos públicos de forma extraordinária através aumento das despesas com uma atividade absolutamente improdutiva: pagamento de juros e serviços da dívida pública. Há projeções que falam de um total de 230 bilhões para esse item orçamentário até o final do ano. De outro lado, essa política perpetua o fluxo internacional do capital especulativo em busca da rentabilidade fácil e elevada. Com isso, mantém-se a armadilha do real valorizado em sua taxa de câmbio com as demais moedas do mundo. Nossas exportações perdem competitividade lá fora e nosso País fica exposto à competição injusta face aos produtos industrializados estrangeiros que para cá se dirigem.

A busca de soluções alternativas exige a coragem política de enfrentar os agentes do mercado financeiro. A elevação da taxa de juros pode ser substituída por outras medidas, a exemplo da elevação dos depósitos compulsórios dos bancos. A medida tem o mesmo efeito sobre a demanda e não eleva as despesas orçamentárias com juros. Já a questão da valorização cambial deve ser enfrentada de maneira urgente, para evitar os riscos do processo de desindustrialização já em marcha. Para tanto, o governo deve elevar de forma efetiva a taxação do capital especulativo do exterior e definir uma quarentena mínima de permanência após o ingresso no País.

Paulo Kliass é Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal e doutor em Economia pela Universidade de Paris 10.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

A VERDADEIRA PÁSCOA

 
"Mesmo que o Cristianismo tenha sido o veículo através do qual o Judaísmo ficou conhecido no Ocidente, devido à união da mensagem das duas religiões em um só livro, a Bíblia, são religiões diferentes com objetivos diferentes e mensagens quase opostas. A religião judaica, de acordo com a lenda, foi criada pelo seu deus, Jeová ou Javé, para unir o povo judeu em torno do objetivo material de conquistar a Terra Prometida, que seria, hoje, a Palestina. Mesmo sofrendo todas as perseguições conhecidas através dos tempos, o judeus nunca se afastaram dessa linha religiosa e usaram-na para invadir a terra dos palestinos e confiná-los na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. Com o apoio da ONU, que em 1948 criou o Estado de Israel em uma terra povoada por palestinos. Mas o Cristianismo, ao contrário, não é uma religião materialista. Jesus costumava dizer: "O meu reino não é deste mundo". E pregava aos seus seguidores a humildade, a paz, o amor e a busca da igualdade entre os povos."
 
A Páscoa cristã, este ano, quase coincidirá com a Páscoa judaica. A páscoa judaica é celebrada de 19 a 26 de abril e a páscoa cristã de 21 a 24 de abril, sendo que o dia exato é 24 de abril. Se houvesse a coincidência entre as duas páscoas, isso seria considerado quase como um sacrilégio pela Igreja Católica e demais igrejas cristãs.

Para que nunca houvesse essa coincidência, a Igreja Católica transformou a Páscoa numa festa móvel com o decreto do papa Gregório XIII (Ugo Boncampagni, 1502-1585), Inter Gravissimas em 24.02.1582, seguindo o primeiro concílio de Nicéia de 325 d.C., convocado pelo imperador romano Constantino. A data de Páscoa foi definida como o primeiro domingo após a primeira lua cheia da primavera (no hemisfério Norte). Esta data é muito próxima a 14º dia de Nisan. No caso de a data assim determinada coincidir ou se antecipar à celebração da Páscoa judaica (14 de Nisan), a Páscoa cristã deve ser adiada em uma semana para que seja conservada a analogia com a sucessão dos fatos históricos.

Mesmo havendo uma fórmula para determinar a Páscoa a cada ano, tornando-a distante ao menos uma semana da Páscoa dos judeus, o curioso e quase alarmante para os cristãos é que este ano quase coincidiu e a Igreja nada fez a respeito, ou seja, não adiou a Páscoa de uma semana, como seria o correto. Talvez essa inação por parte da Igreja seja consequência direta das tentativas de ecumenismo, o que pode parecer bom na aparência, mas poderá levar o Cristianismo novamente a diluir-se dentro do Judaísmo, perdendo a sua razão de ser.

  Novamente, porque nos primórdios do Cristianismo, quando da feitura da Bíblia - erradamente chamada de Bíblia cristã - juntou-se a ela, além dos 27 livros do Novo Testamento, incluindo, muito mais tarde, o Apocalipse, os 46 livros, atualmente considerados canônicos da religião judaica, chamados de Velho Testamento - que incluem o Torá ou Pentateuco , os Livros Históricos, os Livros Poéticos ou Sapienciais (Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cântico dos Cânticos - algumas outras igrejas cristãs adotando os livros Sabedoria e Eclesiástico) e os Livros dos Profetas. Além desses livros, considerados canônicos ou aceitos como verdadeiros pelas duas religiões, ficaram de fora 52 livros do Velho Testamento e 61 livros do Novo Testamento - todos considerados apócrifos.

Mas os livros que são a base da religião judaica, ou Velho Testamento, nada tem a ver com o Cristianismo. Foram adotados pelos cristãos, em momento de confusão quanto à verdadeira mensagem de Jesus, ou de tentativa de proselitismo entre os judeus. A própria religião judaica é completamente diferente da religião cristã. A única relação que existe com o Cristianismo é o fato de Jesus ter sido Judeu, porque a mensagem que ele passou é oposta à da religião dos judeus.

Ele disse que deixava aos seus seguidores apenas dois mandamentos: 1º Amar a Deus sobre todas as coisas; 2º Amar ao próximo como a si mesmo. Nada mais. E no momento em que ele falou isso, deixou claro que os dez mandamentos da religião judaica não tinham mais validade. Também colocou o amor no condicional: devemos amar ao próximo na mesma medida em que amarmos a nós mesmos. Se não gostarmos de nós, nunca poderemos amar, verdadeiramente, aos mais próximos. Ele era um judeu, submetido às leis do seu país, como todo judeu, mas trazia uma nova mensagem, que foi a mensagem do amor, da paz e da igualdade.

Nada tenho contra a religião dos judeus, que foi criada para unir um povo nômade e forjar uma raça. Mas o deus Judeu, Javé, era chamado de "Deus dos Exércitos", enquanto Jesus pregava a paz. Em nenhum momento do Novo Testamento é encontrada a palavra Javé, ou Jeová. Jesus, ao referir-se a Deus falou de um deus de bondade, a quem deu o nome de Pai e que está sempre pronto ao perdão. O deus Jeová dos judeus, de acordo com o Velho Testamento, mandava matar a todos os inimigos da nação hebraica e quando o primeiro rei judeu, Saul, desobedeceu essa ordem, depois de uma batalha, foi destituído da sua realeza.

No entanto, as igrejas cristãs pregam o Judaísmo junto com o Cristianismo, o que é um absurdo. Isto, graças ao fato de que o livro que deveria pregar unicamente a mensagem de Jesus - a Bíblia - foi unido ao chamado "Velho Testamento", que prega a mensagem do Judaísmo. E uma religião que estava confinada a uma raça, por vontade explícita dessa raça, e que somente era divulgada entre os membros dessa raça, em uma faixa estreita do Oriente Médio, graças ao Cristianismo é conhecida pelo mundo inteiro.

Porque o Cristianismo foi - e continua sendo - o principal veículo de divulgação do Judaísmo.

A Páscoa da religião judaica significa "passagem" ou "libertação", porque, segundo a fé dos judeus, o seu deus os teria tirado do Egito no dia 14 do mês de Nisan do ano 5771, de acordo com o calendário judaico. Naquele dia, depois de muito insistir com o Faraó para que o povo judeu pudesse sair do Egito, Jeová teria mandado o seu anjo para matar todos os primogênitos das famílias egípcias. Enquanto os egípcios choravam os seus filhos, os judeus foram embora, depois de um jantar que incluía um cordeiro assado e pão sem fermento.

Desde aquele dia, os judeus comemoram esse feito no dia 14 do mês de Nisan.

Os cristãos faziam o mesmo, nos primórdios do Cristianismo, porque os primeiros cristãos eram judeus. E provavelmente Jesus participou muitas vezes da celebração da páscoa judaica. A última vez foi chamada de Santa Ceia, ou Última Ceia, quando Jesus disse que ele era, doravante, o cordeiro de Deus, aquele que tirava os pecados do mundo. E disse que o pão que eles estavam comendo era o seu corpo, o corpo do cordeiro de Deus, e que o vinho que estavam bebendo era o seu sangue, o sangue do cordeiro de Deus. E pediu aos apóstolos que fizessem isso, seguidamente, para lembrá-lo. E foi naquela santa ceia que foi instituída a eucaristia.

O significado de eucaristia é "reconhecimento", "ação de graças". E uma celebração em memória da morte e ressurreição de Jesus Cristo. Também é denominada "comunhão", "ceia do Senhor", "primeira comunhão", "santa ceia", "refeição noturna do Senhor".

O evangelista Lucas registrou esse mandamento da seguinte forma: "E, tomando um pão, tendo dado graças, o partiu e lhes deu, dizendo: Isto é o meu corpo oferecido por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este é o cálice da Nova Aliança [ou Novo Pacto] no meu sangue derramado em favor de vós." (Lucas 22:19-20, e também Mateus 26;26-29, Marcos 14:22-25, I Coríntios 11:23-26).

Naquela noite ele foi preso, depois de ser entregue pelo traidor Judas Iscariotes ao Sinédrio, que era uma espécie de conselho maior da religião judaica. Os sacerdotes judeus o entregaram ao braço secular romano. Poncio Pilatos, que era o governador da Galiléia, entregou Jesus ao tetrarca da Galiléia, Herodes Antipas, alegando que Jesus era da jurisdição de Herodes, o qual, depois de humilhar Jesus de todas as maneiras, enviou-o de volta a Pilatos. Cabia a Pilatos a decisão. Jesus foi interrogado, açoitado e Pilatos não achou nele culpa alguma.

Naquele tempo havia o costume judeu de libertar um prisioneiro durante a Páscoa. Pilatos perguntou se queriam libertar Jesus ou Barrabás, que era um perigoso criminoso. Os judeus disseram que queriam que Pilatos crucificasse Jesus e que soltasse Barrabás. Pilatos lavou as mãos, simbolicamente, dizendo que estava isento daquele crime e que a culpa recairia sobre os judeus. Os judeus retrucaram dizendo que assumiam a culpa do crime.

Jesus foi crucificado na sexta-feira, véspera da Páscoa dos judeus, que era no sábado. Morreu e ressuscitou ao terceiro dia, no domingo, que passou a ser o dia sagrado dos cristãos, porque naquele dia Jesus venceu a morte.

Durante o I Concílio de Nicéia (325 d.C.), entre outras questões doutrinárias ficou estabelecido que a Páscoa cristã deveria ser celebrada separadamente da Páscoa judaica, porque os significados das duas Páscoas eram diferentes e também porque os judeus é que tinham mandado matar Jesus. Isso foi referendado pelo Concílio de Antioquia (341 d.C.) que proibiu os cristãos de comemorar a Páscoa junto com os judeus. Já o Concílio de Laodicéia (363 d.C.) proibiu os cristãos de observar o Shabbat e de receber prendas de judeus ou mesmo de comer pão ázimo nos festejos judaicos.

Assim, quando da instituição do Calendário Gregoriano, ficou fixado que a Páscoa aconteceria no primeiro domingo após a lua cheia que ocorre em ou logo após 21 de março. Sendo que 21 de março nem sempre é o dia do equinócio, mas para a Igreja era necessário encontrar um dia fixo, para basear a sua fórmula que estabelece a Páscoa a cada ano. Mas, principalmente, era importante que os dias da Páscoa cristã - a Semana Santa - jamais coincidissem com os dias da Páscoa judaica, porque o significado da Páscoa cristã difere completamente do significado da Páscoa judaica.

Mesmo que o Cristianismo tenha sido o veículo através do qual o Judaísmo ficou conhecido no Ocidente, devido à união da mensagem das duas religiões em um só livro, a Bíblia, são religiões diferentes com objetivos diferentes e mensagens quase opostas.

A religião judaica, de acordo com a lenda, foi criada pelo seu deus, Jeová ou Javé, para unir o povo judeu em torno do objetivo material de conquistar a Terra Prometida, que seria, hoje, a Palestina. Mesmo sofrendo todas as perseguições conhecidas através dos tempos, o judeus nunca se afastaram dessa linha religiosa e usaram-na para invadir a terra dos palestinos e confiná-los na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. Com o apoio da ONU, que em 1948 criou o Estado de Israel em uma terra povoada por palestinos.

Mas o Cristianismo, ao contrário, não é uma religião materialista. Jesus costumava dizer: "O meu reino não é deste mundo". E pregava aos seus seguidores a humildade, a paz, o amor e a busca da igualdade entre os povos.

Mesmo com todas as contradições e erros da Igreja através dos tempos, essa mensagem de Jesus atravessou os séculos e perpetua-se como o esteio espiritual do Cristianismo. Além disso, persiste o erro histórico de se considerar o deus dos judeus o mesmo deus que Jesus chamava de Pai - e passará ainda um bom tempo antes que esse erro seja suprimido de vez.

Nesta Páscoa devemos lembrar que a ressurreição está presente em todos nós. Como seres materiais devemos, naturalmente, morrer, mas mesmo a morte é a contraparte da vida conhecida e devemos encará-la como mais uma etapa a ser percorrida sem o corpo material. Talvez uma etapa de preparação para uma vida superior e mais espiritualizada.

O ovo da Páscoa - apesar da sua utilização comercial pelo nosso atual mundo mercantilista - simboliza a ressurreição, porque tudo está em tudo e a vida é eterna, em suas diferentes formas ou aparências. Mas o principal símbolo, eternamente vivo, que devemos sempre lembrar, é o deixado por Jesus através do seu sacrifício, para nos lembrar que a vida é muito mais do que a matéria conhecida e que a busca da transcendência deve ser uma constante em todos nós.

Ele disse: "Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim, mesmo que esteja morto, viverá."

Cinco mitos sobre a idade da informação



Por Robert Darnton no Observatorio da Imprensa
Reproduzido de The Chronicle of Higher Education,17/4/2011; este texto baseia-se numa palestra que o autor fez em março sobre o "Futuro das Humanidades", no Council of Independent Colleges Symposium, em Washington; tradução de Jô Amado
A confusão em torno da natureza da chamada idade da informação levou a uma situação de falsa consciência coletiva. Não é culpa de ninguém, e sim, um problema de todos porque ao tentarmos nos orientar no ciberespaço, frequentemente apreendemos coisas de forma errada e esses equívocos se disseminam tão rapidamente que são incorrigíveis. Considerados em seu conjunto, constituem a origem de uma proverbial não-sabedoria. Cinco deles se destacam:
1. "O livro morreu." Errado: são impressos a cada ano mais livros que no ano anterior. Até agora, foram publicados um milhão de novos títulos em 2011, no mundo inteiro. Na Grã-Bretanha, em um único dia – a "super quinta-feira", 1º de outubro de 2010 – foram publicadas 800 novas obras. Em relação aos Estados Unidos, os números mais recentes só cobrem 2009 e não fazem distinção entre livros novos e novas edições de livros antigos. Mas o número total – 288.355 – sugere um mercado saudável e o crescimento em 2010 e 2011 provavelmente será muito maior. Além disso, estes números, fornecidos por Bowker, não incluem a explosão na produção de livros "não-tradicionais" – mais 764.448 títulos produzidos por edições dos próprios autores ou editados, a pedido, por microempresas. E o negócio de livros também está crescendo em países emergentes, como a China e o Brasil. Qualquer que seja a forma de avaliar, a população de livros está crescendo, não decrescendo e, com certeza, não está morrendo.

Deterioração dos textos digitais

2. "Entramos na idade da informação." Este anúncio normalmente é entoado com solenidade, como se a informação não existisse em outras épocas. Mas toda era é uma era da informação, cada uma à sua maneira e de acordo com a mídia disponível nesse momento. Ninguém negaria que os modos de comunicação estão mudando rapidamente, talvez tão rapidamente quanto na época de Gutenberg, mas é um equívoco interpretar essa mudança como sem precedentes.
3. "Agora, toda a informação está disponível online." O absurdo dessa afirmação é óbvio para quem quer que já tenha feito pesquisa em arquivos. Somente uma mínima fração do material arquivado já foi lido alguma vez, muito menos foi digitalizado. A maioria das decisões judiciais, assim como a legislação – tanto estadual, quanto federal –, nunca apareceu na web. A imensa divulgação de regulações e relatórios por órgãos públicos permanece, em grande parte, inacessível aos cidadãos a quem diz respeito. O Google avalia que existem no mundo 129.864.880 livros e afirma ter digitalizado 15 milhões deles – ou cerca de 12%. Como conseguirá preencher a lacuna se a produção continuar a se expandir a uma média de um milhão de novas obras por ano? E como será divulgada maciçamente, e online, a informação em formatos não-impressos?
Metade dos filmes realizados antes de 1940 sumiu. Qual o percentual do atual material audiovisual que sobreviverá, ainda que numa aparição fugaz, na web? Apesar dos esforços para preservar os milhões de mensagens trocadas por meio de blogs, e-mails e instrumentos manuais, a maior parte do fluxo diário de informação desaparece. Os textos digitais deterioram-se muito mais facilmente que as palavras impressas em papel. Brewster Kahle, o criador do Internet Archive, avaliava, em 1997, que a média de vida de uma URL era de 44 dias. Não só a maioria das informações não aparece online, como a maioria das informações que alguma vez apareceu provavelmente se perdeu.

Transição para a ecologia digital

4. "As bibliotecas são obsoletas." Biblioteconomistas do país inteiro relatam que nunca tiveram tantos clientes. Em Harvard, nossas salas de leitura estão cheias. As 85 bibliotecas vinculadas ao sistema da Biblioteca Pública de Nova York estão abarrotadas de gente. As bibliotecas fornecem livros, vídeos e outro tipo de material, como sempre fizeram, mas também preenchem novas funções: acesso a informação para pequenas empresas, ajuda nos deveres de casa e atividades pós-escolares das crianças e informações sobre emprego para desempregados (o desaparecimento dos anúncios "precisa-se" nos jornais impressos tornou os serviços da biblioteca fundamentais para os desempregados).
Os biblioteconomistas atendem às necessidades de seus clientes de muitas maneiras novas, principalmente guiando-os através dos mistérios do ciberespaço para material digital relevante e confiável. As bibliotecas nunca foram armazéns de livros. Embora continuem a fornecer livros no futuro, também funcionarão como centros nervosos para a informação digitalizada – tanto em termos de vizinhança, quanto dos campi universitários.
5. "O futuro é digital." Relativamente verdadeiro, mas equivocado. Em 10, 20 ou 50 anos, o ambiente da informação será esmagadoramente digital, mas a predominância da comunicação eletrônica não significa que o material impresso deixe de ser importante. Pesquisa feita na História do Livro, disciplina relativamente recente, demonstrou que novos modos de comunicação não substituem os velhos – pelo menos no curto prazo. Na verdade, a publicação de manuscritos se expandiu após Gutenberg e continuou progredindo por três séculos. O rádio não destruiu o jornal, a televisão não matou o rádio e a internet não extinguiu a TV. Em cada caso, o ambiente de informação se tornou mais rico e mais complexo. É essa a experiência por que passamos nesta fase crucial de transição para uma ecologia predominantemente digital.

Leituras descontínuas

Menciono esses equívocos porque acho que eles atrapalham a compreensão das mudanças no ambiente da informação. Fazem com que as mudanças pareçam muito dramáticas. Apresentam as coisas fora de seu contexto histórico e em nítidos contrastes – antes e depois, e/ou, preto e branco. Uma visão mais sutil recusaria a noção comum de que livros velhos e e-books ocupam os extremos opostos e antagônicos num espectro tecnológico. Devia-se pensar em livros velhos e e-books como aliados, e não como inimigos. Para ilustrar esta afirmação, gostaria de fazer algumas breves observações sobre o mercado de livros – ler e escrever.
No ano passado, a venda de e-books (textos digitalizados criados para leitura manual) duplicou, respondendo por 10% das vendas no mercado de livros. Este ano, espera-se que atinjam 15%, ou mesmo 20%. Mas há indícios de que a venda de livros impressos também aumentou no mesmo período. O entusiasmo pelos e-books pode ter estimulado a leitura em geral e o mercado, como um todo, parece crescer. Novos leitores eletrônicos de livros, que operam como o ATM (protocolo de telecomunicações), reforçaram essa tendência. Um cliente entra numa livraria e solicita um texto digitalizado de um computador. O texto é baixado para o leitor eletrônico, impresso e entregue na forma de uma brochura em quatro minutos. Esta versão do serviço "impresso-por-pedido" mostra como o antiquado manuscrito pode ganhar vida nova com a adaptação à tecnologia eletrônica.
Muitos de nós nos preocupamos com a diminuição da leitura profunda, reflexiva, de ponta a ponta do livro. Deploramos a guinada para blogs, fragmentos de texto e tuítes. No caso da pesquisa, poderíamos reconhecer que os instrumentos de busca têm vantagens, mas nos recusamos a acreditar que eles possam conduzir ao tipo de compreensão que se adquire com o estudo contínuo de um livro.
Seria verdade, entretanto, que a leitura profunda diminuiu, ou mesmo que ela sempre tenha prevalecido? Estudos feitos por Kevin Sharpe, Lisa Jardine e Anthony Grafton provaram que os humanistas dos séculos 16 e 17 muitas vezes faziam leituras descontínuas, procurando passagens que poderiam ser usadas nas ácidas batalhas de retórica em juízo, ou pedaços de sabedoria que podiam ser copiados para livros banais e consultados fora de seu contexto.

Informação histórica

Em seus estudos sobre cultura entre pessoas comuns, Richard Hoggart e Michel de Certeau enfatizaram o aspecto positivo de uma leitura intermitente e em pequenas doses. Em sua opinião, cada leitor comum se apropria de livros (incluindo panfletos e romances de paixão) à sua maneira, induzindo-lhes o significado que faz sentido para sua compreensão. Longe de serem passivos, esses leitores, segundo Certeau, agem como "plagiadores", pescando um significado daquilo a que têm acesso.
A situação da escrita parece tão ruim quanto a da leitura para aqueles que só veem o declínio, com o advento da internet. Um deles lamenta-se: os livros costumavam ser escritos para o leitor comum; agora, eles são escritos pelo leitor comum. É evidente que a internet estimulou a autopublicação, mas o que há de errado nisso? Muitos escritores, com coisas importantes a dizer, nunca haviam conseguido uma editora para publicá-los – e quem achar seu trabalho de pouco valor, pode simplesmente ignorá-lo.
A versão online das publicações pagas pelo autor pode contribuir para sobrecarregar as informações, mas os editores profissionais se sentirão aliviados com esse problema e continuarão fazendo o que sempre fizeram – selecionado, editando, diagramando e negociando as melhores obras. Terão que adaptar seus talentos à internet – mas já o fazem – e podem tirar vantagem das novas possibilidades oferecidas pela nova tecnologia.
Para citar um exemplo de minha experiência, recentemente escrevi um livro impresso com um suplemento eletrônico, Poetry and the Police: Communication Networks in Eighteenth-Century Paris (Harvard University Press). Descreve como as canções de rua mobilizaram a opinião pública numa sociedade amplamente analfabeta. A cada dia, os parisienses improvisavam novas letras para antigas melodias e as canções fluíam com tamanha força que precipitaram uma crise política em 1749. Mas como é que as melodias alteravam seu significado? Depois de localizar as anotações musicais de uma dúzia de canções, pedi a uma artista de cabaré, Hélène Delavault, para gravá-las para o suplemento eletrônico do livro. Assim, o leitor pode estudar o texto das canções no livro ao mesmo tempo em que as escuta online. O ingrediente eletrônico de um antigo manuscrito torna possível explorar uma nova dimensão do passado, capturando seus sons.
Poderiam ser citados outros exemplos de como a nova tecnologia reforça velhos modos de comunicação, ao invés de miná-los. Não pretendo minimizar as dificuldades que enfrentam escritores, editores e leitores, mas acredito que uma reflexão com base na informação histórica poderia eliminar os equívocos que nos impedem de usufruir ao máximo da "idade da informação" – se assim a devemos chamar.

Volta às armas - Reaparelhamento das Forças Armadas

Do blog Aposentado Invocado

A indústria bélica está em polvorosa no Brasil. O governo vai investir mais de R$ 30 bilhões no reaparelhamento das Forças Armadas. Fusões e aquisições movimentam o mercado e atraem novas empresas, como a Embraer e a Odebrecht Por Guilherme Queiroz e Carlos Eduardo Valim
 
Para a indústria de defesa brasileira, o nome Osório carrega um fardo histórico. Projetado pela extinta Engesa, em meados da década de 1980, era tido, à época, como um tanque inovador, mais moderno e mais barato que os concorrentes. Mesmo com credenciais como essas, o Osório não conseguiu sair do estágio do protótipo da Engesa.
Numa concorrência aberta pelo governo da Arábia Saudita, foi derrotado por um similar dos Estados Unidos, o M1 Abrams. Reza a lenda que foi uma jogada diplomática não muito leal dos americanos, que acusaram o Brasil de estar alinhado à antiga União Soviética. A derrota ajudou a precipitar a falência da então maior fabricante de blindados da América Latina, que havia investido US$ 100 milhões no protótipo do Osório.
Com a morte do tanque brasileiro, boa parte da indústria local de armamentos perdeu o rumo por muito tempo. 
Agora, quase duas décadas depois, o fracasso do Osório começa a ser exorcizado com um novo ciclo de investimentos. Nos próximos 15 anos, mais de R$ 30 bilhões devem ser gastos para reaparelhar as Forças Armadas. A boa notícia é que, em vez de ser gasto na compra de equipamentos de segunda mão, descartados por outros países – prática recorrente até há pouco tempo –, esse dinheiro será aplicado na indústria nacional, chamada a desenvolver tecnologias para modernizar as obsoletas frotas do Exército, Marinha e Aeronáutica. “Saímos da vida vegetativa para o renascimento da indústria”, diz Carlos Pierantoni, presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa (Abimde).

A justificativa para o novo ciclo de investimentos está no plano do governo de estruturar uma capacidade dissuasória contra ataques à América do Sul. “Temos recursos na região que serão objeto de disputa em 50 anos: água, solo, capacidade energética”, afirma o ministro da Defesa, Nelson Jobim. A nova Estratégia Nacional de Defesa (END) prevê duas frentes principais de investimentos: para o monitoramento das fronteiras e para a mobilidade de tropas.

A perspectiva de participar como fornecedor dos grandes projetos militares gera uma movimentação intensa no setor bélico brasileiro. Há duas semanas, o LAAD, maior evento de defesa da América Latina, realizado no Rio de Janeiro, reuniu 663 expositores de 40 países, o dobro de 2009.

Um dos “xodós” das Forças Armadas é o cargueiro KC 390, em desenvolvimento na Embraer, que deve consumir US$ 1,7 bilhão em investimento até o voo do primeiro protótipo, em 2014. Candidata a conquistar 30% do mercado mundial, a Embraer já soma 60 intenções de compra de oito países e dois parceiros internacionais na produção: a Argentina FAdeA, para construção de partes da asa, e a tcheca Aero Vodochody, que fornecerá aeroestruturas. A Embraer também já mapeou oportunidades para investir em sistemas de defesa antiaérea e radares e desenvolve um veículo aéreo não tripulado em parceria com a gaúcha AEL Sistemas S.A.
As perspectivas de negócios são tantas que a empresa, sediada em São José dos Campos, criou em março uma divisão específica para executar sua estratégia no setor de defesa. “Estima-mos participar de projetos com valor de até US$ 15 bilhões nos próximos 15 anos”, disse à DINHEIRO Luiz Carlos Aguiar, presidente da Embraer Defesa e Segurança.

A empresa não tem medido esforços para demarcar território no setor. Em março, adquiriu a Orbisat, fabricante paulista de radares, por R$ 28,5 milhões. Neste mês, anunciou a aquisição de 50% da Atech, responsável pelo projeto básico do Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron), que vai consumir US$ 6 bilhões.

Com a aquisição, um negócio avaliado em R$ 36 milhões, a Embraer ganha espaço para ser a gestora das próximas etapas de instalação de radares e integração dos sistemas. “As Forças Armadas darão esse papel a uma companhia brasileira”, diz o general Antonino Guerra, comandante de comunicação e guerra eletrônica do Exército.
A Embraer não está sozinha nesse páreo.

Segundo o general Guerra, empresas de outros segmentos demonstraram interesse no projeto. O grupo Odebrecht, potência nas áreas petroquímica e de infraestrutura, aposta muitas fichas na área de defesa. Em 2008, o grupo já havia fechado contrato, no valor de R$ 20 bilhões, com a francesa DCNS para construir submarinos convencionais e de propulsão nuclear, além do estaleiro em que serão fabricados, no Porto de Sepetiba, no Rio de Janeiro.

No ano passado, a Odebrecht assumiu a Mectron, fabricante paulista de mísseis, e firmou uma joint venture com a francesa Cassidian, braço de defesa do grupo EADS. Esses movimentos foram consolidados há duas semanas com a criação de seu braço bélico, a Odebrecht Defesa e Tecnologia. “Acreditamos nesse mercado, mas é um projeto de longuíssimo prazo”, diz Roberto Simões, presidente da nova divisão. Outras aquisições este ano, porém, não estão descartadas.

Nesta nova etapa para o setor, um dos maiores incentivos para as empresas locais é a exigência das Forças Armadas de um percentual mínimo de componentes nacionais nos projetos em curso. A Iveco, de Minas Gerais, fábrica de caminhões da Fiat, estima em um total de 100 as empresas brasileiras que participarão da produção do blindado Guarani, que começa a ser fabricado em Sete Lagoas (MG), no fim de 2012. O contrato de R$ 6 bilhões, firmado com o Exército, prevê a entrega de 2.044 unidades com 60% de índice de nacionalização. “Todas as tecnologias, de mecânica e eletrônica à fabricação do motor, foram desenvolvidas no Brasil”, afirma Marco Mazzu, presidente da Iveco Latin America. Outra empresa instalada em Minas que vê benefícios no índice de nacionalização é a Helibrás, fabricante do helicóptero EC-725 Super Cougar. A empresa tem uma encomenda de 50 aeronaves, que serão produzidas em Itajubá (MG).
Parte das peças serão importadas da matriz – seu principal controlador é a Eurocopter, do grupo EADS – e 50% dos componentes serão nacionais. Alguns helicópteros, porém, não devem ser produzidos no Brasil. Eduardo Marson, presidente da Helibrás, não vê nisso um problema. “Nossos fornecedores locais serão integrados à enorme cadeia global da Eurocopter”, diz.

Tornar-se fornecedor em escala global é o sonho de produção de qualquer fabricante que se preze. Ainda mais num segmento que movimenta US$ 1,5 trilhão por ano no mundo. Mas o mercado interno também pode garantir pedidos da indústria para o setor civil. A paulistana Atmos, por exemplo, que desenvolve radares meteorológicos para uso militar, já pensa numa nova finalidade para seus sistemas. “A Copa do Mundo e as Olimpíadas de 2016 vão impulsionar nosso mercado”, diz Cláudio Carvas, presidente da Atmos.

Diversificar mercados é também uma chance de as empresas se tornarem menos suscetíveis às restrições no orçamento do Ministério da Defesa, uma das primeiras pastas a sofrer cortes quando o governo precisa apertar o cinto. Em 2011, a tesourada atingiu R$ 4,3 bilhões dos investimentos, forçando o Ministério da Defesa a malabarismos para manter programas como o do blindado Guarani.

Por outro lado, o setor tem se mostrado otimista com a elevação dos investimentos, que quadriplicaram nos últimos cinco anos, chegando a R$ 7,7 bilhões em 2010. Segundo o Instituto Internacional de Estudos da Paz de Estocolmo (Sipri), entidade que mede e analisa orçamentos de defesa em todo mundo, o Brasil foi o principal responsável pela alta de 5,8% dos gastos militares da América Latina. “O Brasil está buscando projetar seu poder e influência por meio da modernização militar’’, constatou a entidade.

Reforma na saúde coloca Reino Unido à beira de uma crise política

Alfonso Daniels no OperaMundi


Em meio a edifícios semidestruídos no humilde bairro de Tower Hamlets, no leste de Londres, e muito próximo da futura zona olímpica, ergue-se um dos muitos centros médicos públicos espalhados pela cidade. Diante do prédio, uma dona de casa bengalesa de 40 anos que se apresenta como Tara, uma das milhares de imigrantes que lá vivem, afirma indignada que tem de esperar mais de três meses para ser atendida por um médico especialista, embora o tempo máximo de espera seja, em teoria, de 21 dias.

"Um amigo que sentia dores no corpo levou semanas para conseguir consultar um médico de família, que lhe receitou alguns comprimidos", conta ela. "No começo, ele disse que era tuberculose. Depois, câncer. Meu amigo teve de esperar meses para consultar um especialista e acabou morrendo. Sofria de uma doença pulmonar. Neste país, se você é pobre e fica doente, está perdido".

Ao seu lado, Monique, uma jovem francesa que trabalha como assistente social e mora em Londres há oito anos, concorda acenando a cabeça: "Em meu país, você sempre pode visitar seu médico. Aqui, você é atendido por alguém diferente a cada vez, e o serviço é péssimo. Há muita burocracia, é um desastre".


Justamente para resolver esses problemas e economizar 33 bilhões de dólares em quatro anos, em meio a uma crise econômica e com um déficit público nas nuvens, o governo da coalizão conservadora e liberal-democrata britânica propôs no outono a maior reforma do Serviço Nacional de Saúde (NHS, na sigla em inglês) desde a criação da instituição, depois da Segunda Guerra Mundial. A proposta já percorreu metade do caminho para a aprovação parlamentar.

A ideia é conceder aos médicos de família o controle de 80% do orçamento de saúde, incluindo a distribuição de fundos e a compra de serviços para os pacientes, hoje a cargo de centros de gestão sanitária. A reforma também prevê a participação de empresas privadas e associações de caridade na oferta de serviços de saúde.

Alfonso Daniels

O Gill Street Health Care Center é um dos muitos centros hospitalares que apresentam problemas em Londres.

No entanto, o governo pouco esperava a tormenta política que provocaria, com fortes críticas dos sindicatos e associações médicas até a oposição trabalhista. O último a levantar a voz contra a reforma foi Norman Lamb, assessor político do vice-primeiro-ministro liberal, Nick Clegg, que neste fim de semana ameaçou renunciar se a proposta não for modificada.

Ele a qualificou de "arriscada", pois não fica claro o funcionamento da nova estrutura, embora ela deva entrar em vigor já em 2013. Outros afirmam que a entrada de empresas privadas poderia levar estas a escolher tratar os casos simples e deixar os mais complexos e custosos para os serviços públicos. E advertem para a falta de um sistema de controle sobre os novos administradores da saúde, as associações de médicos de família.

A crescente pressão obrigou na semana passada o primeiro-ministro David Cameron e seu ministro da Saúde, Andrew Lansley, a suspender temporariamente a reforma. Eles também anunciaram que, nas próximas semanas, participarão de diversos eventos para "escutar" a opinião dos cidadãos antes de reapresentar sua proposta – algo que, dizem muitos, deveria ter sido feito antes da apresentação ao Parlamento.


“É raríssimo um governo frear uma proposta nessa etapa da ratificação parlamentar. Isso reflete seu grau de preocupação”, afirmou ao Opera Mundi Chris Ham, diretor da fundação King's Fund e um dos mais destacados especialistas no tema. “O plano atual tem muitos problemas. No final, certamente haverá modificações substanciais, e não seria absurdo abrir um período de consultas”.
 
Ham observou que quase todos concordam com a necessidade de uma reforma. O fato é que, apesar de o sistema ter melhorado na última década graças a um maior investimento por parte de governos trabalhistas, a Inglaterra continua atrás da Europa, entre outros, no tratamento do câncer e nos cuidados ao idoso. Mas Ham advertiu: “A reforma, como está proposta agora, poderia piorar as coisas ainda mais. Se o governo não mudar seu curso, tentando evoluir, em vez de revolucionar o sistema, o desfecho poderá ser fatal. Logo veremos”.