sábado, 30 de abril de 2011

Ser de Esquerda

Fernando Evangelista no blog Do Velho Cominista
 

Ser de esquerda é não aceitar as injustiças, sejam elas quais forem, como um fato natural. É não calar diante da violação dos Direitos Humanos, em qualquer país e em qualquer momento. É questionar determinadas leis – porque a Justiça, muitas vezes, não anda de mãos dadas com o Direito; e entre um e outro, o homem de esquerda escolhe a justiça.

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É ser guiado por uma permanente capacidade de se estarrecer e, com ela e por causa dela, não se acomodar, não se vender, não se deixar manipular ou seduzir pelo poder. É escolher o caminho mais justo, mesmo que seja cansativo demais, arriscado demais, distante demais. O homem de esquerda acredita que a vida pode e deve ser melhor e é isso, no fundo, que o move. Porque o homem de esquerda sabe que não é culpa do destino ou da vontade divina que um bilhão de pessoas, segundo dados da ONU, passe fome no mundo.
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É caminhar junto aos marginalizados; é repartir aquilo que se tem e até mesmo aquilo que falta, sem sacrifício e sem estardalhaço. À direita, cabe a tarefa de dar o que sobra, em forma de esmola e de assistencialismo, com barulho e holofotes. Ser de esquerda é reconhecer no outro sua própria humanidade, principalmente quando o outro for completamente diferente. Os homens e mulheres de esquerda sabem que o destino de uma pessoa não deveria ser determinado por causa da raça, do gênero ou da religião.
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Ser de esquerda é não se deixar seduzir pelo consumismo; é entender, como ensinou Milton Santos, que a felicidade está ancorada nos bens infinitos. É mergulhar, com alegria e inteireza, na luta por um mundo melhor e neste mergulho não se deixar contaminar pela arrogância, pelo rancor ou pela vaidade. É manter a coerência entre a palavra e a ação. É alimentar as dúvidas, para não cair no poço escuro das respostas fáceis, das certezas cômodas e caducas. Porém, o homem de esquerda não faz da dúvida o álibi para a indiferença. Ele nunca é indiferente. Ser de esquerda é saber que este “mundo melhor e possível” não se fará de punhos cerrados nem com gritos de guerra, mas será construído no dia-a-dia, nas pequenas e grandes obras e que, muitas vezes, é preciso comprar batalhas longas e desgastantes. Ser de esquerda é, na batalha, não usar os métodos do inimigo.
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Eventos tradicionais do RS foram usados para desviar recursos do Banrisul, denuncia MP



O período abrangido pelas investigações da Operação Mercari (18 meses) pega em cheio a gestão de Fernando Lemos na direção do Banrisul. Considerado da “quota do PMDB” e apontado como afilhado do senador Pedro Simon, Lemos participou, como presidente do banco, de uma grande ofensiva publicitária do governo tucano que despejou milhões de reais em anúncios, patrocínios de eventos e campanhas. Um dos 25 denunciados pelo MP, Rodolfo Rospide Neto, era seu assessor especial na época.
Parte das ações de comunicação ligadas à publicidade governamental deste período foi utilizada indevidamente para desviar recursos do Banrisul, conforme a denúncia do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Os fatos denunciados pelo MP na forma de peculato foram articulados por eventos nos quais o Banrisul desenvolveu ações de comunicação. Na denúncia encaminhada à Justiça, o MP afirma:
Um mesmo evento poderia gerar diversas ações de comunicação e, consequentemente, diversos pedidos de produção (PP) expedidos pelas agências de publicidade envolvidas e diversas solicitações de autorização para ação de comunicação (SAAC) emitidas pelo Banrisul. Em cada pedido de produção eram colhidos, no mínimo, três orçamentos (OC) para análise dos custos da ação de comunicação a ser realizada.
Várias destas ações de comunicação, diz ainda o MP, foram alvo de superfaturamento. Eventos tradicionais do Rio Grande do Sul como Expointer, Fenasoja, Festival de Cinema de Gramado e Festa da Uva foram utilizados para esse fim. Na Expointer 2009, por exemplo, teriam sido desviados R$ 854.032,02 em pagamentos superfaturados. Na Festa da Uva 2010, teriam sido R$ 39.421,80 também em pagamentos superfaturados. Na Fenasoja 2010, teriam outros R$ 79.992,00. E no 37° Festival de Cinema de Gramado outros R$ 30.536,00.
TCE apontou irregularidades nos gastos de publicidade do Banrisul
A publicidade oficial foi tema de denúncias e investigações durante o governo Yeda Crusius. A despesa total do governo tucano com publicidade aumentou consideravelmente a partir de 2008: cresceu 23% acima da inflação. Em dois anos, foram gastos em propaganda (a preços médios de 2008) cerca de R$ 306 milhões. Deste total, mais de 200 milhões foram gastos pelas estatais. Mais de 80% deste valor (cerca de 164 milhões de reais) vieram do Banrisul.
Segundo análise do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, relativa aos anos de 2007 e 2008, dos 164 milhões gastos pelo Banrisul em publicidade, menos da metade foi legalmente autorizada. Cerca de 90 milhões gastos pelo banco em publicidade contrariaram a Constituição Federal e as LDOs (Leis de Diretrizes Orçamentárias) de 2007 e 2008. Neste período, apenas 8% da despesa com publicidade se enquadra no item “publicidade legal obrigatória”. Cerca de 92% foram gastos com publicidade institucional, ou seja, propaganda do governo.
Em 2009, o governo Yeda gastou outros R$ 201 milhões em publicidade – quase três quartos do montante gasto em obras (271 milhões). Do total gasto em propaganda, quase a metade (99,5 milhões), veio do Banrisul. Cabe observar que só havia autorização orçamentária para o banco estatal despender 50 milhões, 49,5 milhões foram gastos ilegalmente, contrariando o disposto no artigo 149, § 7º da Constituição estadual.
Além da análise desses gastos, o Tribunal de Contas também realizou uma inspeção especial no banco a pedido do Procurador Geral do Ministério Público de Contas, Geraldo Da Camino. Em meio a esse processo de investigação, Fernando Lemos deixou a direção do banco no início deste ano, sendo premiado pela governadora Yeda Crusius com um cargo de juiz no Tribunal de Justiça Militar.

Danny Glover vê Brasil como "laboratório" para mundo melhor

Por: Anselmo Massad e Paulo Salvador, da Rede Brasil Atual e Revista do Brasil


Danny Glover vê Brasil como "laboratório" para mundo melhor
Danny Glover, com um boné da CUT, diz que se considera, nesta ordem, pai, cidadão e, também, ator (Foto: © Jailton Garcia)

São Paulo - O ator e produtor de cinema Danny Glover acredita que o Brasil é um "laboratório" no sentido de se buscar um mundo melhor e mais digno para todos. Em visita à capital paulista para participar das comemorações do 1º de maio e de uma campanha internacional de trabalhadores da multinacional Sodexo, Glover concedeu entrevista de duas horas e 15 minutos a veículos da Rede Brasil Atual na manhã deste sábado (30). 
Com um boné da Central Única dos Trabalhadores (CUT), o ator de 64 anos mostrou muito bom humor e disposição, apesar de  dois dias de viagens seguidas de avião. Rapidamente ele superou o cansaço inicial para falar a respeito de seu engajamento social e de pontos de vista sobre o movimento negro, de trabalhadores e de mulheres.
Glover considera que o mundo todo presta atenção no Brasil neste momento, já que o país passa por importantes transformações, com sua economia a caminho de tornar-se a quinta maior do mundo. Ele lembrou que o movimento sindical emergiu e cresceu em um período de grandes mudanças e, neste momento, está na linha de frente da construção das formas para se lidar com essas alterações.
"A importância dos sindicatos no Brasil pode ser expressa pelo fato de que os dois últimos presidentes do país vêm de forças políticas ligadas a trabalhadores", destacou. "Mas o que vai acontecer no futuro é o que vai definir este país na relação com sindicatos."
Apesar de mostrar interesse pelos caminhos trilhados no país até aqui, ele sustenta que é preciso encontrar respostas para os novos desafios. "Sentar à mesa para negociar é uma forma de lidar com essa realidade, que inclui tudo, pobreza, segurança alimentar, como proteger a Mãe Terra", enumera.
"Tudo isso vai estar no 'laboratório' do Brasil", insiste. "Não podemos estar à margem, nem ser coadjuvantes, temos de apoiar esses esforços, se eles nos levarem a um mundo melhor, que permita uma vida digna a todos nós."

Pai, cidadão e também ator

Um dos sócios da produtora L'Overture, Glover falou ainda sobre cinema e a indústria cultural. Ele acredita que é possível apostar em produções diferentes das atuais, em que apenas filmes de ação e certa dose de violência têm espaço. "Bom, é o que meu neto quer assistir", diverte-se. "Mas não precisa haver apenas isso, as pessoas acabam sendo condicionadas na medida em que há apenas esse tipo de produção", criticou.
Ele explicou que, muito antes de se tornar um ator de Hollywood, já se considerava um ativista social, engajado em lutas do movimento de afrodescendentes e, especialmente, em questões comunitárias. "Antes de tudo, sou pai – aliás, tenho certeza de que é meu melhor trabalho (risos). Depois, sou um cidadão. E só depois, ator", resumiu.
Os principais trechos da entrevista serão publicados na edição de junho da Revista do Brasil, além de ser veiculada pela Rádio Brasil Atual. A TVT também participou da coletiva.

Um novo sentido para os produtos orgânicos




Em vigor há dois anos, uma nova regulamentação europeia permitiu 0,9% de organismos geneticamente modificados nos produtos orgânicos e o adiamento da aplicação de leis referentes ao uso de agrotóxicos. Aliada à produção em grande escala e por empresas do setor alimentício, a medida colocou em xeque a própria definição
por Phillipe Baque no LeMonde-Brasil

Em junho de 2009, um técnico da cooperativa Terres du Sud, no sudoeste da França, organizava uma jornada de visitas às criações intensivas de frangos orgânicos. O desempenho das instalações, entregues prontas para o uso, assim como os créditos e o apoio público propostos visavam converter os agricultores convidados. Para garantir o fornecimento aos grandes distribuidores e às empresas de alimentação1, as poderosas cooperativas agrícolas mergulham, agora, numa concorrência selvagem para a criação de frangos acima de qualquer suspeita. Elas se beneficiam da nova regulamentação europeia, que permite ao criador produzir até 75 mil frangos de corte orgânicos por ano e não limita o tamanho das criações orgânicas de galinhas poedeiras.
Essas cooperativas perceberam que poderiam ganhar muito dinheiro com um tipo de agricultura que, por muito tempo, elas haviam criticado. “Os produtores perderam toda a autonomia”, conta Daniel Florentin, membro da Confédération Paysanne [Confederação Camponesa], ex-criador de aves orgânicas, que trabalhou com a cooperativa Maïsadour. “Eles estão endividados por pelo menos 20 anos e devem fornecer toda a sua produção para a cooperativa que se comprometer a comprá-la, sem preço predeterminado.”
Desde 1999, devido a problemas de saúde e relacionados ao meio ambiente, o consumo de produtos alimentares orgânicos vem crescendo 10% ao ano na França. Em 2009, apesar da crise, o volume de negócios de produtos orgânicos aumentou 19%.2 Este mercado, por muito tempo marginal, tornou-se relevante e foi ocupado pelos grandes distribuidores, que respondem atualmente por mais de 45% das vendas. Entretanto, em 2009, apenas 2,46% da superfície agrícola usada era destinada a produtos orgânicos. Para atender à demanda dos consumidores, os atores que dominam o mercado escolheram duas soluções: um apelo maciço às importações e o desenvolvimento de uma agricultura orgânica industrial e intensiva.
A noção de agricultura orgânica nasceu na Europa em reação à agricultura química e produtivista que se generalizou após a Segunda Guerra Mundial. No início dos anos 1960, uma rede de pequenos agricultores orgânicos e de consumidores criou a Nature & Progrès (N&P). A associação atraiu  grande parte das populações urbanas, que decidiu voltar à terra e tecer relações com os diferentes movimentos ecologistas e políticos, como o sindicato Paysans-travailleurs (Camponeses-trabalhadores) nos anos 1970 e a Confederação Camponesa e os antiOGM (Organismos Geneticamente Modificados) a partir dos anos 1990. Feito isso, a Nature et Progrès adotou alguns princípios: rejeição a produtos sintéticos, tratamentos naturais, diversificação e rotação das culturas, autonomia das explorações, energias renováveis, defesa dos pequenos camponeses, biodiversidade, sementes orgânicas etc. Para dar um novo sentido ao consumo e recriar relações sociais, a venda dos produtos orgânicos é assegurada por mercados locais, feiras e grupos de compras que formaram a rede Biocoop3. A carta da Nature et Progrès inspirou a da Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica (Ifoam), datada de 1972, que associava aos critérios agronômicos, objetivos ecológicos, sociais e humanistas.
Coerência
Mas o movimento camponês ligado a este tipo de cultura sofre para encontrar coerência interna. Nos anos 1980, a declaração oficial de finalidade da Nature et Progrès coabitava com uma quinzena de outras, criadas por diferentes movimentos. Em 1991, Bruxelas impôs uma definição de escopo para o conjunto da União Europeia, cuja aplicação pelo Estado francês fornece o selo nacional AB. Encarregados de fiscalizá-lo, os organismos certificadores, privados e comerciais, entram em confronto com o controle participativo realizado até então pelas comissões de produtores, consumidores e beneficiadores.
A Natute et Progrès vive uma grave crise. Alguns membros decidiram boicotar o selo. Outros, tentados por um mercado certificado em plena expansão, deixaram a associação. “A certificação favoreceu os grandes distribuidores em detrimento das redes solidárias”, explica Jordy Van Den Akker, ex-presidente da Nature et Progrès. “A ecologia e o social, que para nós são valores importantes, não estão mais associados ao econômico. O selo e a regulamentação europeia permitiram o desenvolvimento de um mercado internacional, facilitando a livre circulação dos produtos, o comércio e a concorrência.”
Em vigor a partir de 1o de janeiro de 2009, uma nova regulamentação europeia permitiu, entre outras coisas, 0,9% de organismos geneticamente modificados nos produtos orgânicos e o adiamento da aplicação de leis referentes ao uso de agrotóxicos.4 “O orgânico é incompatível com os organismos geneticamente modificados”, reagiu Guy Kastler, criador do departamento de Hérault e militante da N&P. “Nós continuamos exigindo 0% de OGM! A nova regulamentação definiu normas e não se preocupa mais com as práticas agrícolas. Passaram de uma obrigação de meios – qual método de cultura utilizado? – a uma obrigação de resultado – qual resíduo é recuperado no produto final? É a porta aberta para a generalização de uma agricultura orgânica industrial.”
As cooperativas agrícolas estão no auge. Graças, em particular, à alimentação das aves que elas produzem e fornecem aos agricultores, suas margens de lucro são consideráveis. A antiga regulamentação francesa impunha ao criador de orgânicos a produção de 40% da alimentação animal em suas terras. Essa ligação com o solo não existe mais na nova regulamentação europeia. O criador compra das cooperativas a totalidade dos alimentos, entre os quais a soja é um dos componentes principais. Em 2008, na França, a produção de aves orgânicas teve um aumento de 17%, enquanto a de soja orgânica caiu 28%. A soja importada, muito mais barata, se impôs.
Frutas e legumes
A França importa mais de 60% das frutas e legumes orgânicos que consome. A ProNatura é a líder francesa de comercialização nas lojas especializadas e supermercados. Em menos de dez anos, esta empresa do sudeste da França multiplicou seu volume de negócios por dez e absorveu quatro outras sociedades. Um quarto de seus produtos provém da França, mas o resto é importado da Espanha (18%), do Marrocos (13%), da Itália (10%) e de cerca de 40 outros países. A ProNatura foi a primeira sociedade a comercializar frutas e legumes orgânicos fora das estações. Isso não impede que seu fundador, Henri de Pazzis, preconize o respeito à terra, ao meio ambiente, ao camponês e ao consumidor.
Mas a lei ditada pelas empresas distribuidoras está bem longe desses princípios. “Elas adotam para o orgânico os mesmos mecanismos de compra destruidores que usam no convencional”, explica Pazzis. “Elas encorajam a concorrência de um modo agressivo. Alguns de nossos produtos são retirados do mercado, pois outros fornecedores propõem preços muito inferiores aos nossos.” Nessa guerra de preços, da qual a ProNatura e as outras empresas de importação e exportação escolheram participar, o social e o respeito ao meio ambiente têm bem pouco espaço.
Há 12 anos, a ProNatura importa morangos orgânicos da Espanha, produzidos pela sociedade Bionest. Os donos, Juan e Antônio Soltero, possuem 500 hectares de estufas que, à primeira vista, não se diferenciam em nada das milhares de estufas convencionais que cobrem a região de Huelva, prejudicada por uma monocultura de morangos particularmente poluidora e exploradora de mão de obra. Como outras empresas, a Bionest situa-se no seio do parque natural de Doñana, inscrito no Patrimônio Mundial da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura5. Segundo a WWF-Espanha, as estufas se multiplicam de maneira mais ou menos ilegal no parque, prejudicando o meio ambiente e ameaçando principalmente as reservas de água6.
A Bionest não respeita a biodiversidade – as poucas variedades de morangos utilizadas são as mesmas das estufas convencionais –, pratica a monocultura e aplica fertilizantes nas plantas através de um sistema de irrigação por gotejamento. Seus métodos de cultura não são radicalmente diferentes dos usados pelas estufas convencionais de Huelva. Apenas os insumos certificados lhes garantem o selo orgânico. Para a colheita, a Bionest emprega centenas de romenas, polonesas e filipinas, com uma relação trabalhista precária. O assunto é muito delicado e os donos da Bionest recusam-se a receber jornalistas para dar explicações.
Essas mulheres vêm todo ano para a Espanha, diretamente recrutadas em seus países pelas organizações patronais, com contratos e vistos de duração limitada. Não conhecendo seus direitos, elas ficam totalmente submissas aos empregadores, que as exploram à vontade.7 Francis Prieto, membro local do Sindicato dos Trabalhadores dos Campos (SOC), improvisa uma visita aos acampamentos das trabalhadoras da Bionest. Totalmente isoladas no meio das estufas, elas devem se submeter a um regulamento rigoroso: proibição de visitas, saídas controladas, passaportes confiscados. “Elas são aterrorizadas por seus patrões”, explica Francis Prieto, “e sofrem a mesma exploração que os outros empregados temporários de Huelva, com condições de trabalho particularmente difíceis.”
A Bionest não é um caso isolado na Andaluzia. Nos arredores de Almería, a AgriEco produz, embala e comercializa, de setembro até o final de junho, mais de 11 mil toneladas de tomates, pimentões e pepinos orgânicos. Nas estufas dotadas de tecnologias de ponta, os insumos são certificados como “eco” e as trabalhadoras temporárias são romenas e marroquinas. Miguel Cazorla, dirigente sorridente e afável, prevê com orgulho uma nova expansão da sociedade. Transportados em caminhões para todas as lojas especializadas em produtos orgânicos da Europa, os legumes da AgriEco estão concorrendo diretamente com os produtos das estufas “orgânicas” da Itália, do Marrocos e de Israel. No circuito do Mediterrâneo, a guerra comercial tornou-se acirrada para o proveito dos intermediários.
Bem longe dessa profusão de produtos orgânicos industriais, a pequena cooperativa agrícola La Verde, na serra de Cadix, foi criada nos anos 1980 por trabalhadores membros do SOC que conduziram, no final do franquismo, lutas para obter terras. Seis famílias cultivam ali legumes e frutas e criam algumas vacas e carneiros em 14 hectares. Elas comercializam toda a sua produção na Andaluzia por meio de outra cooperativa, a Pueblos Blancos, que agrupa 22 pequenos agricultores e cooperativas. “Nós fomos os primeiros a nos lançar na agricultura orgânica”, lembra Manolo Zapata. “Ela se assemelhava à agricultura de nossos bisavós e ia ao encontro da nossa luta. Se a agricultura orgânica não conseguir restabelecer a justiça, a autonomia, a autossuficiência e a soberania alimentar, ela não terá sentido algum. E os certificadores não nos ajudam. Um agricultor que diversifica suas culturas e cultiva muitas variedades será mais pesadamente taxado que aquele que pratica a monocultura intensiva.”
Por ter denunciado publicamente o apoio do principal organismo certificador espanhol – o Comitê Andaluz de Agricultura Ecológica (CAAE) – às grandes empresas do “biobusiness”, a La Verde sofreu uma avalanche de inspeções. Enquanto seus membros criaram o mais importante banco de sementes orgânicas da Espanha, que lhes permitiu garantir sua cultura e abastecer todos os pequenos produtores de orgânicos da região, eles temem que a repressão caia sobre eles. “Existem leis e normas que reprimem o direito ancestral de reproduzir sementes e que nos impedem de certificar essas variedades antigas que nós preservamos.” A regulamentação europeia de agricultura orgânica impõe de fato ao agricultor utilizar sementes certificadas orgânicas. Se elas não existem, ele deve recorrer às sementes convencionais do mercado autorizadas. “Por enquanto, tudo se passa no limite da legalidade, mas se amanhã a venda de nossos produtos for proibida, seremos obrigados a usar as sementes orgânicas vendidas pela Monsanto8.” Tomando como exemplo alguns camponeses da Nature et Progrès, os membros da La Verde pensam em se retirar da certificação orgânica.
Exemplos como o da La Verde se multiplicam atualmente, na Colômbia, Bolívia, Brasil, Índia, Itália e França. A resistência ao biobusiness organiza-se em todo o planeta. Cada vez mais camponeses, comunidades rurais e pequenas cooperativas de produtores defendem uma agricultura tradicional e tipos de culturas agroecológicas que privilegiem a produção com uma dimensão humana, respeitando a biodiversidade e a soberania alimentar. Muitos rejeitam as certificações e praticam os sistemas participativos de garantia fundados numa relação de troca e confiança entre produtores e consumidores. Redes de defesa das sementes orgânicas se desenvolvem para impor o direito dos camponeses de produzir e comercializar suas próprias sementes.
Na França, as associações para a manutenção da agricultura tradicional (Amap), que estabelecem trocas diretas entre produtores e consumidores sem passar pelo mercado, vivem tal euforia que não conseguem dar conta da demanda. A associação Terre de Liens coleta, com sucesso, fundos solidários para possibilitar o estabelecimento de jovens agricultores de orgânicos. Para se distinguir da regulamentação europeia, a Federação Nacional da Agricultura Biológica (FNAB) criou uma nova marca: a Bio-Cohérence. Ela complementará a certificação oficial, exigindo o respeito a metas muito mais rigorosas e a adesão a princípios inspirados naqueles adotados pela Ifoam em 1972. À parte da regulamentação, a Nature et Progrès segue defendendo a agricultura orgânica tradicional.
A integração, ou não, dos valores sociais e ecológicos no centro das preocupações dos produtores, intermediários e consumidores dos orgânicos determinará seu futuro. Tornar-se-á uma simples face do mercado, submissa aos únicos interesses do liberalismo econômico? Ou será ainda mensageira de uma alternativa a esse liberalismo?
Phillipe Baque
é jornalista, coordenador do projeto do livro De la bio alternative aux derives du “bio”-business, quel sens donner à la bio?, que será lançado no final de 2011; site: alterravia.com

1 Para atingir um dos objetivos fixados pela Grenelle de l’Environnement [Grenelle do Meio Ambiente], o Estado pretende introduzir, até 2012, 20% de mercadorias provenientes da agricultura orgânica no cardápio dos restaurantes das administrações e estabelecimentos públicos.
2 A maioria das cifras citadas provém do dossiê de imprensa da Agence Bio “Les chiffres de la bio sont au vert”, serviço de imprensa da Agence Bio, 2010, e da obra Agriculture biologique, chiffres clés, Agence Bio, Montreuil-sous-Bois, edição 2009.
3 Pascal Pavie e Moutsie, Manger Bio. Pourquoi? Comment? Le guide du consommateur éco-responsable, Edisud, Aix-en-Provence, 2008.
4 “Bio/OGM: o voto dos deputados europeus em detalhes”, 21 de maio de 2009, www.terra-economica.info
5 Ler “Importer des femmes pour exporter du bio?” [Importar mulheres para exportar orgânicos?], Silence, n° 384, novembro de 2010.
6  Communicado da WWF: “Fraises espagnoles: exigeons la traçabilité” [Morangos espanhóis, exijamos a identificação da origem], 23 de março de 2007.
7 Emmanuelle Hellio, “Importer des femmes pour exporter des fraises (Huelva)” [Importar mulheres para exportar morangos], Etudes rurales, Paris, julho-dezembro de 2008.
8 “A qui profite la récolte? La politique de certification des semences biologiques” [Quem se beneficia com a colheita? A política de certificação das sementes orgânicas], relatório da Grain, Barcelona, janeiro de 2008; www.grain.org

Mantida por Dilma, política de publicidade cria disputas 'intestinas'



 

Ampliação da lista de veículos pagos em troca de propaganda oficial incomoda adversários políticos do governo e cria dificuldade para entidades representantes de empresas administrar interesses conflitantes dos sócios.


BRASÍLIA – A política que desde a última década democratiza a verba publicitária federal, destinando-a a um número crescente de veículos espalhados hoje por metade do Brasil, tem sido até agora preservada pela presidenta Dilma Rousseff, mesmo sob críticas e alguma desconfiança. Os adversários do PT acham que se trata da “compra” de órgãos de imprensa pequenos sem fôlego para resistir à sedução. Já entidades representantes das empresas estão, no geral, de acordo, mas precisam lidar com uma questão que às vezes opõe associados.

Para a recém criada Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação com Participação Popular, a política publicitária federal merece ser preservada. “Tem que descentralizar tudo na comunicação. Comunicação é um direito humano”, afirma a coordenadora-geral da Frente, deputada Luíza Erundina (PSB-SP).

A Associação Brasileira de Empresas e Empreendedores de Comunicação (Altercom), que congrega órgãos de comunicação menores, sobretudo da internet, apoia a descentralização. Condena, no entanto, o uso da “mídia técnica” como critério definidor do rumo do dinheiro. Acredita que dar verba só para quem já está no mercado, e de acordo com o alcance de cada um, impede o desenvolvimento de novos veículos e daqueles de menor porte.

“O critério anterior à mídia técnica era elitista e tecnicamente injustificável, muito mais subjetivo e muito mais político”, diz o vice-presidente da Altercom, Renato Rovai. “Mas o investimento federal ainda é muito pequeno. E o governo trata de forma igual os desiguais. Devia investir mais nos veículos pequenos, é muito importante para democratizar a comunicação.”

De 2000 a 2010, o gasto do governo federal com propaganda, descontada a inflação, cresceu a um ritmo equivalente à metade do avanço da economia. E, quando as estatais entram na conta, ficaram 20% aquém da inflação.

Internet versus jornal
Celeiro de uma infinidade de pequenos veículos e da maioria dos sócios da Altercom, a internet fica atualmente com 3% da verba destinada à publicidade pelo governo. Cerca de R$ 15 milhões anuais, sem estatais. Mas, ao lado de cinemas, outdoors e mídia estrangeira, a internet representa mais de 30% dos oito mil órgãos de comunicação a receber dinheiro de propaganda do governo. Antes de 2002, quando não tinha o peso de hoje como fonte de informação, levava uma parcela irrisória da publicidade, inferior a meio por cento.

O avanço da internet no bolo publicitário federal, de três pontos percentuais, se deu em cima dos jornais de papel, cuja fatia diminuiu quase na mesma magnitude. Aos impressos, destinam-se hoje R$ 30 milhões por ano, 6% do total. No início da década passada, antes do governo Lula, eles recebiam R$ 19 anuais, 10% do total. Além de perder espaço, ocorreu desconcentração no segmento. Se antes havia menos de 200 jornais a receber verba oficial, hoje são mais de 2 mil. Resultado da expansão dos jornais populares e dos jornais regionais, por meio dos quais o governo federal atinge mais pessoas, quando quer divulgar informações sobre políticas públicas.

Esse é um problema para os veículos maiores que a Associação Nacional dos Jornais equilibra-se para tentar administrar. Por meio da assessoria de imprensa, a entidade diz que defende o uso da mídia técnica e de critérios transparentes pelo governo, na distribuição do dinheiro de propaganda. Afirma ainda reconhecer que havia problemas para se medir o alcance dos jornais menores, mas que fez um acordo com o Instituto de Verificação de Circulação (IVC) para criar método simplificado de aferição das tiragens deles. Espera, em troca, que aqueles jornais filiem-se ao instituto e aceitem auditagens. O IVC é a referência para o governo aplicar mídia técnica no segmento impresso.

Emissoras versus emissoras
Na radiodifusão, também acontece disputa intestina pela verba publicitária oficial. E onde houve o mais significativo rearranjo interno nos últimos tempos, uma vez que é o tipo de mídia que mais movimenta dinheiro. Em número de veículos que contam com publicidade oficial, as emissoras de rádio e TV representam 40%. Mas, dado o alcance junto à população, ficam com mais de 70% do dinheiro, há mais de uma década. As TVs receberam R$ 288 milhões no ano passado e as rádios, R$ 141 milhões. Nos dois casos, de 2000 a 2010, a verba destinada a cada tipo de mídia mais ou menos dobrou. O número de emissoras atendidas, no entanto, subiu bem mais - vinte vezes entre as TVs e dez entre as rádios. Consequência: a briga pelo quinhão acirrou-se.

A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) prefere não comentar a política oficial. No governo Lula, o então presidente da entidade, Daniel Slaviero, era publicamente a favor. Carta Maior apurou que, por ora, o novo presidente da Abert, Emanuel Carneiro, compartilha da posição do antecessor, que considerava importante regionalizar e democratizar a distribuição da verba. A maior parte dos associados da Abert é formada de emissoras pequenas, que se beneficiam de tal política, ao contrário das grandes.

Até 2007, por exemplo, a principal TV brasileira tinha audiência no patamar de 50% e recebia mais de 70% dos recursos publicitários federais. Hoje, os dois números aproximaram-se e estabilizaram-se em torno de 45%.

Já o segmento “revistas” recebe cerca de R$ 30 milhões anuais de propaganda oficial, sem contar as estatais. A cifra é quase o dobro daquela de 2000 (R$ 14 milhões) e o triplo da de 2002 (R$ 10 milhões). Na última década, a participação deste tipo de mídia no bolo da publicidade oficial oscilou sempre na casa dos 7%. Já a quantidade de revistas atendidas, ao menos no governo Lula, caiu de 3% para 2%. Procurada, a Associação Nacional dos Editores de Revistas (ANER) não se manifestou.

CONTRA OS CHEFES, CONTRA AS OLIGARQUIAS


O nome dado ao livro com algumas entrevistas de Richard Rorty é bastante perspicaz para estabelecer algo que não está na plataforma dos governos petistas, mas que deveria ser um dos primeiros tópicos de qualquer “reforma política” que não fosse apenas uma mudança formal sem capacidade de mover o que especificamente merece ser movido.
Grande parte dos “escândalos” noticiados pela mídia envolvem o nome de Roseana Sarney. E no entanto sabemos que se trata de uma aliada do Governo Federal. Trata-se da aliança mais espúria e repugnante que o PT realizou ao longo dos últimos anos. Para mim e para tantos outros, com essa aliança o PT (enquanto projeto) simplesmente acabou. Se o Governo Dilma não fosse eminentemente uma tecnocracia de esquerda, saberia que o primeiro tema da política nacional deveria ser atacar chefes e oligarquias, dentre as quais a mais forte de todas – a Sarney.
Retomar a política não significa simplesmente se reduzir ao discurso moralista do combate à corrupção, como se tudo estivesse correto e o problema fosse do caráter individual. A corrupção no Brasil é endêmica não por ser abastecida por alguns indivíduos de correção duvidosa, mas porque ela consiste na privatização da esfera pública, ou seja, da democracia como fachada para o governo pactuado das oligarquias. Lula não tocou um dedo nisso nem parece que Dilma irá tocar. Ao contrário: ambos, aderindo a uma visão maquiavélica (no sentido técnico) de política, pactuaram com os fatores reais de poder que, como Lassalle sabia e os juristas fazem questão de esconder, são a verdadeira Constituição do nosso país.
Enfrentar as oligarquias em seu poder que produz miséria, desigualdade, violência e dominação nos lugares onde elas estão situadas significa aderir a uma política de alto nível, isto é, atacar verdadeiramente o poder que atinge nossas formas-de-vida. A luta contra a oligarquia Sarney, portanto, não é uma cruzada anticorrupção (como o jornalismo conservador gostaria de fazer crer, sacrificando um bode expiatório a fim de manter o resto como está), mas um conflito em nome da justiça para a vida nua que está sujeita ao poder descomunal de tais oligarquias, geralmente imposto com violência e não raro crueldade em seus domínios. Com isso, transformar-se-ia a “política” de baixo nível que frequenta o noticiário – a política dos acordos, das negociatas, das barganhas por cargos, das fofocas e dos diz-que-me-diz-que (o que faz o jornalismo político ser indissociável da Revista Caras) – numa verdadeira política, em que cujo centro não pode estar outra coisa se não o estado de exceção em que todos vivemos.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Desigualdade de tratamento para a promoção de equidade social

Editorial do Sul21

Ainda que alguns possam considerar demagógica a recepção oferecida pelo governador Tarso Genro no Galpão Crioulo do Palácio Piratini às lideranças sindicais gaúchas em comemoração ao 1º de Maio, o fato é que o ato foi oportuno e revestiu-se de significado importante para o futuro do estado e da sociedade gaúcha. Além da comemoração, o governador aproveitou para apresentar e pedir apoio ao Programa de Sustentabilidade Financeira do Rio Grande do Sul, abordando de modo mais detalhado as mudanças na Previdência Social estadual.
Ainda que não tenham sido finalizadas, mudanças profundas deverão ser propostas pelo governo visando reformular o modelo previdenciário adotado no RS. O apoio dos sindicalistas será muito importante para que essas alterações venham a ser realizadas. Segundo diversos estudos, a mudança do perfil demográfico no Brasil e principalmente no Rio Grande do Sul, de um lado, e os desequilíbrios entre a arrecadação das contribuições e a forma de concessão dos benefícios, de outro, em pouco tempo tornarão insustentável a situação atuarial do estado.
Diversas entidades sindicais e diferentes segmentos políticos, inclusive da base governista, contestam os estudos que apontam os déficits e são contrários a que se promovam quaisquer mudanças na previdência social, seja dos servidores públicos ou dos trabalhadores da iniciativa privada. Por este motivo, o Cpers-sindicato, em nome dos professores estaduais, recusou-se a participar do encontro no Piratini e liderou manifestação, no mesmo horário, na praça em frente ao palácio governamental.
Mesmo que as propostas ainda não tenham sido concluídas e, por este motivo, não tenham sido apresentadas em sua integralidade, mesmo que os estudos sobre o sistema previdenciário necessitem aprofundamento e mesmo que se tenha como preocupação a defesa dos direitos e vantagens conquistados pelos trabalhadores, o fato é que o princípio enunciado pelo governador Tarso Genro como orientador do Programa de Sustentabilidade Financeira e da reforma da Previdência no RS merece elogios.
Segundo as palavras do governador, “para viabilizar a previdência social pública no estado do RS, teremos que ter um fundo. Para isto, quem recebe mais terá que pagar mais”. O princípio que rege este raciocínio se assenta sobre o ideário socialdemocrata. É coerente com a plataforma de campanha do governador, com as propostas de seu partido e de todos os partidos que integram a base governista.
Para se promover a igualdade, rezam os fundamentos democráticos e da justiça contemporânea, os diferentes têm que ser tratados de forma diferente. Nesta lógica, os que recebem mais devem pagar mais e os que recebem menos devem pagar menos. Se todos receberem tratamento igual, pagando igualmente, a desigualdade social se aprofundará continuamente.
Este mesmo raciocínio, aliás, deveria ser empregado para a construção da matriz tributária estadual e nacional. O grande imposto deveria ser o imposto de renda, com alíquotas crescentes para atingir os grandes ganhos de capital não reinvestido, mantendo-se isentos de tributação os salários mais baixos e promovendo-se, além disso, uma profunda desoneração fiscal sobre a produção e o consumo.

O que falta para o pleno emprego? Educação, ora…


Brizola Neto no TIJOLACO

Foi mais que providencial o lançamento, ontem, do Programa Nacional de Ensino Técnico, o Pronatec, pela Presidenta Dilma Rousseff. E, coincidentemente, a publicação de um estudo do IPEA que analisa a relação entre emprego, experiência e qualificação profissionais.
Dilma afirmou que o Brasil está, hoje, próximo ” do pleno emprego” e enfrenta “grande demanda de mão de obra qualificada”. Em alguns casos, disse ele, ” falta mão de obra qualificada, em outros, sobra mão de obra sem a qualificação necessária”.
O estudo do IPEA dá números concretos a esta afirmação da Presidente: para o estoque de desempregados estimado em 7,3 milhões de trabalhadores,  “somente 2 milhões (27%) tendem a apresentar qualificação e experiência profissional , enquanto dos 1,5 milhão de novos ingressantes no  mercado de trabalho, estima-se que apenas 762 mil (51%) devam  possuir qualificação e experiência profissional para o pronto exercício do trabalho”.
E, de outro lado, São Paulo e a Região Sul deverão apresentar déficits de mão de obra com qualificação, sobretudo na indústria.
“O sistema de capacitação profissional brasileiro já não corresponde às necessidades do país e às dimensões de nossa economia.”.
É absoluta verdade. Embora seja vital administrar a emergência das pessoas que já integram a população economicamente ativa com cursos rápidos, que possam ser quase simultâneos à sua alocação ou realocação ao mercado de trabalho, não podemos mais ter um sistema de ensino profissional fundado na “emergência”.
Não se pode pensar em educação técnica dissociada de formação geral, porque precisamos de algo muito além de “adestramento” profissional. É a economia moderna que pede essa base, para que sobre ela possam vir a inovação, a criatividade e a modernização da produção e do trabalho.
É animador que o programa tenha foco nos investimentos em ampliação da rede de escolas técnicas – e sua ampliação para o mundo virtual – e contemple a formação de profissionais de alto nível, com as 75 mil bolsas de extensão no estrangeiro, naturalmente com compromissos de multiplicação aqui do conhecimento absorvido.
E o Tijolaço, claro, não pode tratar deste tema sem bater na sua tecla: o Rio de Janeiro tem de ganhar, ontem, uma Escola Técnica de Petróleo e Gás.  A cadeia produtiva do petróleo – além da extração e do refino, propriamente, a indústria naval, a de máquinas e equipamentos, os serviços correlatos à operação das plataformas – vai, literalmente, devorar mão de obra qualificada.
Temos conhecimento acumulado na Petrobras e nas universidades para fazer deslanchar isso rapidamente. E  recurso, nos roylaties e no Fundo Social do Pré-sal, para bancar este esforço.
Vale o que Dilma falou, ao lançar o Pronatec: “nosso país aprendeu a se respeitar e a se fazer respeitar internacionalmente”  e será “do tamanho daquilo que cada um de nós fizermos por ele”.
Façamos, e já.

Verissimo e a revolta da classe média

Altamiro Borges em seu blog

Reproduzo crônica de Luis Fernando Verissimo, publicada no jornal O Estado de S.Paulo:

Diálogo urbano, no meio de um engarrafamento. Carro a carro.

- É nisso que deu, oito anos de governo Lula. Este caos. Todo o mundo com carro, e todos os carros na rua ao mesmo tempo. Não tem mais hora de pique, agora é pique o dia inteiro. Foram criar a tal nova classe média e o resultado está aí: ninguém consegue mais se mexer. E não é só o trânsito. As lojas estão cheias. Há filas para comprar em toda parte. E vá tentar viajar de avião. Até para o exterior - tudo lotado. Um inferno. Será que não previram isto? Será que ninguém se deu conta dos efeitos que uma distribuição de renda irresponsável teria sobre a população e a economia? Que botar dinheiro na mão das pessoas só criaria esta confusão? Razão tinha quem dizia que um governo do PT seria um desastre, que era melhor emigrar. Quem pode viver em meio a uma euforia assim? E o pior: a nova classe média não sabe consumir. Não está acostumada a comprar certas coisas. Já vi gente apertando secador de cabelo e lepitopi como e fosse manga na feira. É constrangedor. E as ruas estão cheias de motoristas novatos com seu primeiro carro, com acesso ao seu primeiro acelerador e ao seu primeiro delírio de velocidade. O perigo só não é maior porque o trânsito não anda. É por isso que eu sou contra o Lula, contra o que ele e o PT fizeram com este país. Viver no Brasil ficou insuportável.

- A nova classe média nos descaracterizou?

- Exatamente. Nós não éramos assim. Nós nunca fomos assim. Lula acabou com o que tínhamos de mais nosso, que era a pirâmide social. Uma coisa antiga, sólida, estruturada...

- Buuu para o Lula, então?

- Buuu para o Lula!

- E buuu para o Fernando Henrique?

- Buuu para o... Como, "buuu para o Fernando Henrique"?!

- Não é o que estão dizendo? Que tudo que está aí começou com o Fernando Henrique? Que só o que o Lula fez foi continuar o que já tinha sido começado? Que o governo Lula foi irrelevante?

- Sim. Não. Quer dizer...

- Se você concorda que o governo Lula foi apenas o governo Fernando Henrique de barba, está dizendo que o verdadeiro culpado do caos é o Fernando Henrique.

- Claro que não. Se o responsável fosse o Fernando Henrique eu não chamaria de caos, nem seria contra.

- Por quê?

- Porque um é um e o outro é outro, e eu prefiro o outro.

- Então você não acha que Lula foi irrelevante e só continuou o que o Fernando Henrique começou, como dizem os que defendem o Fernando Henrique?

- Acho, mas...

Nesse momento o trânsito começou a andar e o diálogo acabou.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Altamiro Borges: “Casamento real” e os súditos da mídia


A busca por audiência não deve ser a única justificativa para a overdose midiática na cobertura do “Casamento Real”. Revistonas dão capas melosas para a união do príncipe William com a “plebéia” Kate. Jornalões gastam papel com fofocas e futricas. O pior, porém, ocorre nas emissoras de televisão – em todas elas, sem exceção. Blocos e blocos nos telejornais para divulgar banalidades.

por Altamiro Borges, em seu blog


A mídia corporativa parece adorar a vassalagem. É servil diante das monstruosidades imperiais dos EUA, assim como é vassala diante da monarquia decadente da Grã-Bretanha. A mídia dominante reproduz a ideologia das classes dominantes. Criminaliza os pobres e reverencia os ricaços – inclusive as ostentações e sandices da decrépita “família real”.

Monarquia decadente e parasitária

Na difusão dos valores “morais” da aristocracia, a imprensa sensacionalista deixa de lado até as agruras do capitalismo no país. No primeiro trimestre deste ano, o PIB britânico cresceu apenas 0,5% – após uma contração, também de meio por cento, nos últimos três meses de 2010. Milhões de trabalhadores estão sem emprego e salário, mas a mídia só fala no tal “casamento real”.

A decadente monarquia agradece tanta vassalagem. Com as festanças, ela tenta sair do atoleiro. No ano passado, a “família real” foi obrigada a cortar 12,2% das despesas oficiais com sua vida parasitária. Mesmo assim, a realeza custou mais de 46,1 milhões de euros para os contribuintes britânicos – seis vezes mais do que outra monarquia decadente, a da Espanha.