Autor(es): Denize Bacoccina - Isto é Dinheiro |
Marcio Pochmann, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) desde 2007, já foi criticado por ter direcionado pesquisas do órgão para respaldar programas do governo Lula. Dias atrás, o instituto, ligado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência, surpreendeu ao publicar uma pesquisa afirmando que os aeroportos não estarão prontos para a Copa de 2014. Não se trata de mais autonomia sob Dilma, diz Pochmann. “A autonomia do Ipea sempre existiu.” No que diz respeito à inflação, o economista está alinhado com o Planalto. Ele explicou à DINHEIRO por que vê “terrorismo de mercado” nessa discussão. Acompanhe: DINHEIRO – Na semana passada, um pesquisador do Ipea disse que o mercado faz terrorismo com a inflação. Faz mesmo? MARCIO POCHMANN – Sim, porque a agenda da inflação, associada ao receituário de corte de gastos e juros elevados, fez parte do debate eleitoral do ano passado. O resultado eleitoral estabeleceu um compromisso com o desenvolvimento nacional e, com ele, o enfrentamento das mazelas que o Brasil carrega, como é o caso da pobreza. O governo está enfrentando a pressão inflacionária por outros métodos, mais heterodoxos. Temos uma pressão inflacionária oriunda de fatores internacionais, mas também temos inflação decorrente de serviços. Isso é consequência justamente das mudanças na sociedade brasileira. DINHEIRO – Há mais gente consumindo, pessoas que antes não tinham dinheiro e agora passaram a ter? POCHMANN – Não é exatamente isso. Houve uma mudança na estratificação da sociedade. São serviços vinculados a trabalhos muito precários: cabeleireiro, serviços autônomos, que se prestam às famílias em geral. Como estão sendo abertos postos de trabalho com remuneração superior, há uma escassez relativa de mão de obra. De um lado, tem menos pessoas disponíveis a esse tipo de atividade, e de outro, as pessoas que ficam tendem a elevar sua renda. Enfrentar essa pressão de preços como sendo uma inflação de demanda, com uma elevação na taxa de juros, é matar a possibilidade dessa mobilidade social. Em países desenvolvidos, esses serviços têm preços bem maiores que os praticados no Brasil. DINHEIRO – Mas há reajustes em outros preços. Não é a volta da indexação? POCHMANN – Não acho que existe uma indexação, apenas os mecanismos que o Plano Real permitiu. Por exemplo, tivemos uma elevação de preços vinculados a tarifas municipais. Essa alta tem impacto num período do ano e gradualmente perde importância. O diagnóstico do governo Dilma, e até do final do governo Lula, é que a economia vinha num ritmo muito acelerado. A Dilma, enquanto ministra, teve a ousadia junto com o presidente de construir um Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) quando não havia crescimento. Podemos dizer, agora, que ela criou um plano de desaceleração do crescimento, que estava muito forte. É justamente essa adequação do crescimento que a levou a atender uma pressão de elevação dos juros, optar por uma restrição fiscal, para que a expansão da economia se desse num quadro mais adequado ao ritmo de expansão da oferta. Para além disso, radicalizar a política monetária e fiscal significa não apenas desacelerar o crescimento, mas impossibilitar os investimentos. E em médio e longo prazos, a melhor política de combate à inflação é a ampliação da capacidade de produção. Hoje, os investimentos estão crescendo três vezes mais do que a expansão do consumo. DINHEIRO – É possível crescer entre 4% e 5% do PIB, como prevê o Ipea, e ter inflação abaixo de 6%? POCHMANN – Uma elevação descontrolada do custo de vida, para além da meta da inflação, está fora do horizonte. Estamos vendo no governo da presidente Dilma, depois de muito tempo, uma convergência entre o Ministério da Fazenda e o Banco Central. Há um esforço de enfrentar a inflação sem que isso signifique a postergação ou interrupção dos investimentos. DINHEIRO – Daí a aplicação de medidas macroprudenciais em vez da elevação da taxa de juros? POCHMANN – Sim, porque a opção pela política de juros é de uma preguiça enorme. Basta elevá-los para segurar o consumo, mas seus efeitos vão além dos setores afetados pela inflação. Uma elevação de juros afeta toda a atividade econômica. E a intenção do governo é olhar os setores em dificuldade. Ninguém está dizendo que não tem pressão inflacionária hoje. A questão é olhar para o que provoca essa elevação de preços, e como enfrentá-la, sem afetar os setores que estão à margem. DINHEIRO – Qual o impacto do salário mínimo de R$ 616 em 2012 na inflação e em outros setores da economia? POCHMANN – Ele é compatível com a ampliação real que a economia teve dois anos atrás. Havendo crescimento econômico, a elevação do salário mínimo é plenamente compatível com o ganho de produtividade e com a escala de produção do País. Um reajuste desses terá um impacto positivo na medida em que se amplia a base da Previdência, eleva o poder de compra da base da pirâmide social, uma das locomotivas da expansão da economia brasileira. Mas é evidente que terá um impacto desfavorável nas contas públicas. Poderíamos reduzir gastos desnecessários e improdutivos, que são os gastos com os juros da dívida. DINHEIRO – Os juros poderiam cair para quanto? POCHMANN – Uma taxa de juros real acima de 2% já é pouco civilizada. Nós sabemos que o diferencial dos juros no Brasil em relação a outros países é um fator que torna nossa moeda extremamente valorizada. DINHEIRO – Em fevereiro, a taxa de desemprego foi de 6,4%. Com a economia desacelerando, podemos dizer que o desemprego já chegou no piso? POCHMANN – Teremos uma acomodação no mercado de trabalho nos níveis atuais. Isso dará um desemprego médio praticamente igual ao do ano passado. DINHEIRO – Qual o limite do pleno emprego no Brasil? POCHMANN – É difícil falar em pleno emprego num país que não tem um mercado de trabalho or-ganizado. Temos um mercado de trabalho ainda muito desorganizado pela presença da informalidade e relações de trabalho não assalariadas, como na agricultura familiar, de trabalhadores autônomos e de empregados sem carteira assinada. DINHEIRO – Não temos problemas de qualificação? Pesquisa do Ipea mostra que o desemprego é de 0,9% entre os 10% que ganham mais e de 30% entre os 10% que ganham menos. POCHMANN – É possível que o Brasil, mesmo não tendo um contexto de pleno emprego, tenha problemas de escassez de trabalhadores porque há um descompasso entre a necessidade das empresas e a capacidade de oferta do ponto de vista dos trabalhadores adequados a esse tipo de ocupação. Isso pode ser resolvido com um bom sistema público de emprego. Mas ainda estamos longe de ter um sistema que combine a formação de mão de obra, a intermediação e os benefícios para quem está desempregado. É preciso formar gente para o amanhã. DINHEIRO – A Foxconn anunciou um investimento de US$ 12 bilhões com criação de 100 mil empregos no Brasil. Vamos ter de importar engenheiros? POCHMANN – Hoje, praticamente dois terços dos engenheiros formados no Brasil exercem outra profissão. For-maram-se nos anos 80 e 90, quando o País não crescia. Temos um problema sério de evasão muito elevada no ensino superior e na engenharia não é diferente. O Brasil só forma 15% dos engenheiros que entram no curso em cinco anos. A cada ano, entram 322 mil estudantes nos cursos de engenharia, mas só formamos 47 mil. DINHEIRO – A China é um parceiro bom para resolver os problemas de infraestrutura que o Brasil precisa para se tornar um país mais competitivo? POCHMANN – Estamos num deslocamento do centro dinâmico do mundo. Os Estados Unidos continuarão sendo um país grande, competitivo, mas não serão mais o centro do mundo. O Brasil tem que se adequar a esta perspectiva. A China lembra a Inglaterra, que, no século XIX, produzia manufatura e dependia de matéria-prima. É um país que desenvolve sua tecnologia, mas tem problemas sérios de matéria-prima e de alimentos. O Brasil é um país grande, um dos poucos com capacidade de dobrar a área plantada. Tem uma excelente capacidade de produção alimentícia, excelentes recursos naturais. Então, esse é um risco da “fama”: fazenda com maquiladora. Não estamos condenados à “fama”. É possível, pela diplomacia, constituir uma relação menos desequilibrada. DINHEIRO – O Ipea publicou uma pesquisa dizendo que as obras dos aeroportos estão atrasadas para a Copa de 2014. Aumentou a autonomia? POCHMANN – A autonomia do Ipea sempre existiu. Nos anos 1990, o órgão produziu diversos estudos justificando a política de privatização. No período atual, o Ipea tem se voltado para o desenvolvimento em longo prazo e as políticas públicas. O que o Ipea torna público é apenas um terço de tudo o que produz. Dois terços estão associados às políticas públicas, aos ministérios, ao Poder Legislativo, ao Poder Executivo, ao Poder Judiciário. Fazemos coisas que não são divulgadas porque somos uma instituição de pesquisa aplicada às políticas públicas. DINHEIRO – Houve críticas dentro do governo por causa dessa pesquisa sobre os aeroportos? POCHMANN – Estou à frente do Ipea há quase quatro anos e já me acostumei a ser criticado, tanto pela imprensa quanto pela oposição. Uma instituição se mantém integra, transparente e comprometida com a pluralidade, que é natural dentro da sua autonomia, quando ela recebe críticas de todos os lados. Isso é um sinal de que o que ela produz está comprometido com a verdade e não com a política de “p” minúsculo. |
Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
domingo, 1 de maio de 2011
Marcio Pochmann: "A inflação não está fora de controle"
Eldorado dos Carajás: A escola é orgulho, para romper com passado de exclusão
Há quinze anos, depois do massacre de Eldorado dos Carajás,
no Pará, 690 famílias foram assentadas num latifúndio que tinha, então,
37 mil hectares. Muitos assentados eram analfabetos. Hoje, um dos
orgulhos do “17 de Abril” é a escola, que permite às novas gerações
romper com a história de exclusão das famílias. No terceiro retrato da
vida no assentamento, que visitou recentemente, a repórter Manuela Azenha,no VIOMUNDO, fala sobre educação:
Altamiro da Silva e sua esposa voltaram a estudar “depois de velhos”,
como ele mesmo diz. Vivem no assentamento 17 de abril. Altamiro veio de
Goiás para trabalhar no garimpo do sul do Pará, mas chegou tarde para a
extração manual, atividade já enfraquecida, então. Foi quando decidiu
entrar no Movimento dos Trabalhadores Sem Terra. Isso foi há 16 anos.
Ele e a esposa, ambos com mais de 40 anos de idade, estão
matriculados agora no ensino fundamental pelo EJA, o programa federal de
alfabetização voltado para jovens e adultos. “Essa camisa aqui é o
uniforme da escola. Está vendo o meu nome?”, mostra Altamiro.
A filha deles, Gislane, tem 18 anos. A primeira sala de aula em que
entrou foi na escola Oziel Alves Pereira, orgulho do assentamento, onde
estudou até o terceiro colegial. Os atuais professores do ensino
fundamental e muitos do ensino médio se formaram e hoje dão aulas na
Oziel.
Ela atende a mais de mil alunos em três turnos, do maternal ao
terceiro colegial. A escola leva o nome de um jovem militante que, já no
hospital, foi espancado até a morte, no dia do massacre de Eldorado dos
Carajás, em 1996.
Hoje, Gislane é professora e trabalha no programa estadual de
alfabetização “Sim, eu posso”, também voltado para jovens e adultos. O
programa tem 14 professores no assentamento, cada um com cerca de 10
alunos, número máximo por turma. As professoras dão aula em suas
próprias casas, mas se for preciso vão até onde os alunos vivem. Gislane
viu seis de seus alunos serem certificados este ano.
Ao longo de mais de uma década de militância, o pai dela, Altamiro,
ocupou inúmeros cargos dentro do movimento e hoje é fiscal da Associação
de Produção e Comercialização dos Trabalhadores Rurais do Assentamento
17 de Abril (ASPCTRA)
O lote de terra que ele ocupa é tido como exemplo de plantio orgânico
bem sucedido. Altamiro orgulha-se particularmente do cultivo de cacau,
que em 2010 rendeu duas toneladas e meia – mais do que qualquer outro
produtor do município.
Muitos dos assentados passam por um processo de formação do MST. Mas,
para Altamiro, foi na experiência cotidiana que aprendeu o que sabe:
“Já vi muita miséria. Aprendi simplesmente porque colono não pode errar,
se não a família toda sofre. É como na escola: quem tira nota baixa não
passa de ano”.
Altamiro gosta de se explicar fazendo comparações. Em relação à
terra, parece ser ela sua suprema companheira: “ É igual com mulher: no
começo você fica deslumbrado, mas depois que se acostuma com ela, já
quer trocar. Não pode ser assim, tem que tratar bem a terra, cuidar
dela, que a relação dura para sempre”. Quando perguntado se aplica
agrotóxicos em seu lote, responde com ternura: “Imagina, você ter uma
planta bem linda e alegre, depois você vai jogar veneno nela?”
Segundo Luis Lima, presidente da ASPCTRA, a escola adota o método
Paulo Freire, que associa a aprendizagem às questões concretas do
cotidiano. Os programas para adultos são sempre divididos em módulos: o
estudante passa 45 dias na escola e, em seguida, 60 dias no trabalho
prático do campo, para que não se desligue de sua realidade.
Diversas citações de Freire estão pintadas nas paredes da Oziel Alves Pereira.
A escola é reconhecida como uma das melhores da região. É uma
construção espaçosa e arejada, de 12 salas de aula equipadas com
ar-condicionado, auditório para 100 pessoas, laboratório de química,
salas de informática, de vídeo e biblioteca. Os equipamentos doados ao
laboratório de química ainda estão encaixotados, já que os professores
do próprio assentamento ainda não estão capacitados para utilizá-los:
“Já pedimos à Universidade Federal do Pará (UFPA) que mande alguém para
dar assistência aos professores. Tem produto químico que já está até
vencido”, explica a coordenadora Risângela Almeida.
O objetivo da escola é montar um programa pedagógico que contemple a
realidade do campo. Na biblioteca estão guardados dezenas de livros
didáticos que foram doados pela Secretaria Estadual de Educação mas que,
segundo a coordenadora, são inadequados para qualquer escola fora do
Sudeste: “Os jovens estão saindo do campo para trabalhar em qualquer
subemprego na Vale do Rio Doce. Queremos formá-los para que criem
vínculos com o campo e com sua história”.
Risângela vivia em Brasília quando foi visitar a irmã no assentamento
e decidiu que queria viver ali. “No começo é difícil, mas depois a
gente vai pegando amor pelas coisas daqui, pelas pessoas. É assim que
tem de ser”. Ela já tinha prestado o vestibular várias vezes quando
conseguiu entrar no curso de Letras da UFPA através de um convênio entre
a universidade e o MST. Durante o dia assistia às aulas e, à tarde,
voltava para o assentamento.
Risângela reclama da falta de autonomia em relação à Secretaria de
Educação, que é quem financiou a construção da escola. Os trinta
professores são selecionados pelo município de Eldorado dos Carajás:
“Conseguimos ao menos que a Secretaria desse prioridade a professores do
assentamento. Não queremos gente de fora”.
A coordenadora ressalta a importância do currículo de português.
Acredita que os alunos devam aprender a ler e a escrever com fluência
antes de estudarem a gramática: “Temos de dar o que eles realmente
precisam. Discutimos e interpretamos muitos textos na sala de aula”. Uma
vez por ano, é organizada a “Noite com poesias”. Na quadra da escola,
todos os alunos, do maternal ao colegial, declamam poesias de autoria
própria ou de poetas consagrados, como Cecília Meirelles, Vinícius de
Morais e até Charles Trocate, militante do MST e autor de três livros de
poesia.
Um exemplo sempre citado no assentamento é o de Leonildo, que entrou
na escola sem saber ler ou escrever. Agora, com mais de sessenta anos,
está na oitava série. Durante a semana de atividades para relembrar o
massacre de 17 de abril, ele subiu no palanque da praça central do
assentamento para declamar um poema em formato de cordel que ele mesmo
escreveu.
Charles Trocate entrou no MST aos 16 anos de idade. Passou nove meses
em um programa de estudos. “É aí que se consolidaram em mim
preocupações mais gerais, o hábito da leitura, a profunda fé no trabalho
coletivo e as primeiras formulações poéticas”, conta.
Hoje ele é da coordenação nacional do movimento. Um poeta
reconhecido: “Falam que meus poemas são difíceis, mas eu não sei
escrever de outro jeito. Com 16 anos entrei para a escola do movimento e
ficava lendo Marx, Gramsci… Imagina só o jeito que eu saía falando das
aulas!”, explica. A poesia do uruguaio Mario Benedetti foi uma de suas
primeiras leituras. “O poeta se constrói ao construir. Não fica
satisfeito até conseguir criar uma grande metáfora. Lia [Walt] Whitman,
que me ensinou o poema-conceito; Drummond, que é a base da nossa
educação sentimental; Maiakovski, que fala do trabalho na arte”. Tanto
aprecia Maiakovski que está aprendendo russo para traduzir um de seus
poemas para o português.
Expulso da escola depois de um ano, Charles nunca mais retornou ao
sistema de ensino convencional. Quando menino, trabalhou no garimpo por
dois anos. Como não era permitida a entrada de mulheres, nem de bebida,
os garimpeiros iam à chamada “Cidade do Trinta”, atual Curianópolis,
onde Charles passou a vender cuscuz às prostitutas na porta de boates.
Trabalhou de bananeiro a engraxate. Foi alfabetizado pela irmã mais
velha, que o ensinava a ler placas: “A gente morava na beira do rio,
então descíamos para lavar as placas e aprender as letras. Até hoje
tenho mania de ler todas as placas que vejo”.
Charles já publicou três livros de poesia pela editora Expressão
Popular. No ano passado, foi convidado para fazer parte do Academia de
Letras do Sul e Sudeste paraense: “Houve quem se opôs à minha aceitação
porque sou do MST”.
Apreciador e estudioso de música, ele também coordena um grupo
composto por jovens assentados e inspira-se em compositores consagrados:
“Minha mãe colocou o disco do Bob Dylan para tocar quando eu tinha dois
anos de idade. Desde então, sou marxista e poeta”, conta aos risos.
Atualmente, está escrevendo um texto sobre a relação entre a arte e o
movimento político: “Não acredito em arte camponesa porque não acredito
na arte operária. Arte é catarse, emancipa o homem e não pode estar
presa a uma classe social”, defende Charles.
Do Céu e da Terra
Deus necessita dos ladrões para castigar os empresários.
Para
os piedosos que ainda não foram infectados pelo vírus do ódio contra os
excluídos, esclareço que a frase acima é de Lutero e se encontra em seu
Do Comércio e da Usura.Portanto, roga-se aos desgarrados
adoradores do bezerro de ouro que retornem às hostes do Senhor antes de
sair por aí yankisisando a favor da pena de morte.
Muito bem farão também se consultarem o grande Catão que há mais de dois mil anos afirmou: “pequenos ladrões estão trancafiados nas torres e calabouços enquanto os ladrões públicos andam em ouro e sedas”.
Precisamos
decidir se queremos o futuro a nosso favor ou contra, pois vivemos num
mundo onde a geração de riquezas é a principal responsável pela pobreza.
Talvez a melhor explicação para esse paradoxo esteja no Discurso da Servidão Voluntária
de Etienne de La Boétie, mas para isso é necessário visitar o século
XVI. Ou então aceitar a afirmação de Marx de que o usurário, do ponto de
vista político, tem atuação revolucionária na medida em que arruína as
formas de propriedade.
Ao
contrário dos humanos, todos os animais possuem onde morar, além de não
oprimir ou explorar os seus semelhantes. E quando matam, o fazem para
se alimentar. Mas vá explicar isso a Israel e Estados Unidos.
Veja-se
o que acontece com os sem-terra. São perseguidos, caluniados,
maltratados e assassinados porque lutam pelo direito a um pedaço de
chão.
Chão
que lhes é recusado em vida, mas não lhes faltará ao morrer. Por isso
nunca é demais repetir que se a propriedade é um bem, vamos estende-la a
todos; se for um mal vamos acabar com ela.
Ou como dizem no deserto, os parasitas coletivizaram Deus e privatizaram a riqueza.
Elogio dos trabalhadores
Emir Sader no CARTA MAIOR
O homem se diferencia dos outros animais por
vários aspectos, mas o essencial é a capacidade de trabalho. Os outros
animais recolhem o que encontram na natureza, enquanto o homem tem a
capacidade de transformar a natureza. Para produzir as condições da sua
sobrevivência, o homem transforma o meio em que vive, pela sua
capacidade de trabalho, gerando a dialética mediante a qual ele modifica
o mundo e ao mesmo tempo se modifica, intermediado pela natureza.
Ao longo do tempo, a constante das sociedades humanas é a presença dos trabalhadores, sob distintas formas – escravos, servos, operários -, responsáveis pela produção dos bens da sociedade. A forma de exploração da força de trabalho é que variou, definindo o caráter diferenciado de cada sociedade.
Porém, a exploração do trabalho por outras classes sociais fez com que o trabalhador não controlasse sua força de trabalho, produzindo para a acumulação de riquezas dos outros. O trabalho foi sempre um trabalho alienado, em que os trabalhadores produzem, mas não são donos do produto do seu trabalho, nem decidem o que produzir, como produzir, para quem produzir, a que preço vender o que produzem. E tampouco são remunerados pela riqueza que produzem, recebendo apenas o indispensável para a reprodução da sua força de trabalho. Quem se apropria do fundamental da riqueza produzida é o capital, que assim acumula, se expande, se reproduz, enquanto os trabalhadores apenas sobrevivem.
Um dos fenômenos centrais para a instauração do capitalismo foi o término da servidão feudal, com os trabalhadores ficando disponíveis para vender sua força de trabalho para quem possui capital. Estes vivem do capital e da exploração da força de trabalho dos trabalhadores, enquanto estes, dispondo apenas dessa força tem que vendê-la, para poder acoplá-la a meios de produção, nas mãos dos capitalistas.
Essa imensa massa de trabalhadores que passou a produzir toda a riqueza das sociedades contemporâneas foi objeto de um processo de intensa exploração do seu trabalho, com condições brutais de trabalho, jornadas longas – de 14 ou até 16 horas. Na resistência a essas condições de exploração foi se organizando o movimento operário, tanto em sindicatos, como em partidos políticos, gerando um protagonista essencial na democratização das nossas sociedades.
A direita não perdoa os sindicatos. Na ultima campanha eleitoral brasileira e na velha mídia, os dirigentes sindicais não são tratados como representantes democráticos e legítimos dos trabalhadores, mas quase como gangsters, que se infiltram no governo para defender seus interesses contra os interesses da maioria. Faz parte do ódio que as velhas elites têm do povo brasileiro, que é trabalhador, que produz as riquezas do Brasil, que trabalha jornadas longuíssimas, é explorado pelas grandes empresas, mas não teve, até recentemente, possibilidade de fazer ouvir sua voz no país e no Estado.
Neste Primeiro Dia de Maio, Dia dos Trabalhadores (e não do Trabalho, como insiste a velha mídia), é preciso recordar que a data vem de uma grande manifestação realizada em Chicago em 1886, pela diminuição da jornada de trabalho para 8 horas, duramente reprimida pela polícia, com a morte de vários trabalhadores.
Que a jornada é praticamente a mesma, embora as condições tecnológicas para explorá-la tenha avançado gigantescamente e, com ela, os lucros das grandes empresas que exploram os trabalhadores. Um momento propício para avançar no projeto de redução da jornada de trabalho, para fazer um mínimo de justiça ao esforço heróico e anônimo dos milhões de trabalhadores que constroem o progresso do Brasil.
Ao longo do tempo, a constante das sociedades humanas é a presença dos trabalhadores, sob distintas formas – escravos, servos, operários -, responsáveis pela produção dos bens da sociedade. A forma de exploração da força de trabalho é que variou, definindo o caráter diferenciado de cada sociedade.
Porém, a exploração do trabalho por outras classes sociais fez com que o trabalhador não controlasse sua força de trabalho, produzindo para a acumulação de riquezas dos outros. O trabalho foi sempre um trabalho alienado, em que os trabalhadores produzem, mas não são donos do produto do seu trabalho, nem decidem o que produzir, como produzir, para quem produzir, a que preço vender o que produzem. E tampouco são remunerados pela riqueza que produzem, recebendo apenas o indispensável para a reprodução da sua força de trabalho. Quem se apropria do fundamental da riqueza produzida é o capital, que assim acumula, se expande, se reproduz, enquanto os trabalhadores apenas sobrevivem.
Um dos fenômenos centrais para a instauração do capitalismo foi o término da servidão feudal, com os trabalhadores ficando disponíveis para vender sua força de trabalho para quem possui capital. Estes vivem do capital e da exploração da força de trabalho dos trabalhadores, enquanto estes, dispondo apenas dessa força tem que vendê-la, para poder acoplá-la a meios de produção, nas mãos dos capitalistas.
Essa imensa massa de trabalhadores que passou a produzir toda a riqueza das sociedades contemporâneas foi objeto de um processo de intensa exploração do seu trabalho, com condições brutais de trabalho, jornadas longas – de 14 ou até 16 horas. Na resistência a essas condições de exploração foi se organizando o movimento operário, tanto em sindicatos, como em partidos políticos, gerando um protagonista essencial na democratização das nossas sociedades.
A direita não perdoa os sindicatos. Na ultima campanha eleitoral brasileira e na velha mídia, os dirigentes sindicais não são tratados como representantes democráticos e legítimos dos trabalhadores, mas quase como gangsters, que se infiltram no governo para defender seus interesses contra os interesses da maioria. Faz parte do ódio que as velhas elites têm do povo brasileiro, que é trabalhador, que produz as riquezas do Brasil, que trabalha jornadas longuíssimas, é explorado pelas grandes empresas, mas não teve, até recentemente, possibilidade de fazer ouvir sua voz no país e no Estado.
Neste Primeiro Dia de Maio, Dia dos Trabalhadores (e não do Trabalho, como insiste a velha mídia), é preciso recordar que a data vem de uma grande manifestação realizada em Chicago em 1886, pela diminuição da jornada de trabalho para 8 horas, duramente reprimida pela polícia, com a morte de vários trabalhadores.
Que a jornada é praticamente a mesma, embora as condições tecnológicas para explorá-la tenha avançado gigantescamente e, com ela, os lucros das grandes empresas que exploram os trabalhadores. Um momento propício para avançar no projeto de redução da jornada de trabalho, para fazer um mínimo de justiça ao esforço heróico e anônimo dos milhões de trabalhadores que constroem o progresso do Brasil.
Política, religião e violência
“O desejo de saber o porquê e o como chama-se curiosidade, e não existe em qualquer criatura viva a não ser no homem. Assim, não é só por sua razão que o homem se distingue dos outros animais, mas também por esta singular paixão”, afirma Hobbes.[1] A curiosidade humana pressupõe uma atitude crítica diante dos fatos, dos discursos e das ideologias que interpretam-nos. Trata-se uma postura de ruptura com o maniqueísmo, o sectarismo e o dogmatismo que tomam a sua verdade como a verdade absoluta.
O olhar curioso não se contenta com a divisão do mundo em polaridades absolutas, entre o mal e o bem; é um olhar
que coloca em suspenso as nossas certezas, os nossos preconceitos e os
princípios que geralmente aceitamos como dados para a análise da
realidade. Esta é muito mais complexa do que os fáceis raciocínios
esquemáticos e próprios dos que se vêem como profetas e guardiões do
bem, da palavra e do livro sagrados, contra o outro, o qual representaria o mal.
Embora sejam esferas autônomas da ação humana, política e religião se
mesclam tanto no que diz respeito ao quanto aos recursos práticos. Na
verdade, a política não pode prescindir plenamente da religião e, em
certas circunstâncias, o discurso religioso cumpre uma função claramente
política. Dessa forma, o dissidente político passa a ser tratado como o
herege, merecedor de todas as punições; os que não aceitam o poder
político imperial e hegemônico passam a ser classificados como
representantes das forças do mal; os que defendem a ordem social vigente
não titubeiam em demonizar os seus oponentes; o mal é incorporado no outro.
A linguagem maniqueísta transforma o bem em mal e vice-versa. Pois o
que representa o paraíso para uns, pode ser o inferno para outros. Nesta
senda, a política é pensada como a luta entre o bem e mal.
A modernidade pretendeu romper as amarras da superstição e da
ignorância e instituir a razão; pleiteou a separação do Estado das
amarras da moral religiosa e do poder espiritual representado pelas
autoridades eclesiásticas. Maquiavel advogou que a ação política tem um status
próprio e diferente da moral religiosa. A ação política busca
resultados; o estadista, ao contrário do profeta, é julgado por sua
eficácia. O florentino observa que, do ponto de vista da política, o mal
e o bem não são absolutos; o mal pode se transmutar em bem, e
vice-versa. Cabe ao estadista ter a sabedoria (virtù) para usar
o mal e o bem conforme a necessidade. Como afirma Maquiavel, “o tempo
arrasta consigo todas as coisas e pode transmudar o bem em mal e o mal
em bem”.[2]
A lógica da força
Referir-se ao bem e ao mal nos leva a um aspecto negligenciado e/ou objeto de polêmica: a violência na política. Os gregos ensinaram que a política é a esfera da pólis, o que pressupõe argumentação e discussão de idéias. Hannah Arendt observou que a política, isto é, o poder político, se refere ao coletivo, pressupõe consenso e se legitima no consentimento do povo. “O poder e a violência se opõem: onde um predomina de forma absoluta, o outro está ausente”. [3]
Porém, se é verdade que o poder, em sua essência, se distingue da
violência e que não se sustenta única e exclusivamente pelo recurso a
esta, também é fato que o poder não prescinde da violência e recorre à
mesma sempre que necessário. Como escreve Bobbio:
“O que caracteriza o poder político é a exclusividade do uso da força em relação à totalidade dos grupos que atuam num determinado contexto social, exclusividade que é o resultado de um processo que se desenvolve em toda sociedade organizada, no sentido de monopolização da posse e uso dos meios com que se pode exercer a coerção física”.[4]
O monopólio da coerção física é a condição sine qua non da soberania do Estado moderno. Essa tese, compartilhada por marxistas e liberais, concebe a política como uma atividade cujo locus
e referência é o Estado. Foucault expressa a voz dissonante nessa
maneira de ver a política. Para ele o poder está difuso pela sociedade:
“A questão do poder fica empobrecida quando é colocada unicamente em
termos de legislação, de Constituição, ou somente em termos de Estado ou
de aparelho de Estado”.[5]
O poder se manifesta em todos os aspectos da vida humana, em todos os
níveis da sociedade, interligados ou não ao Estado. Na concepção
foucaultiana, o poder impregnou o próprio corpo, encontra-se exposto
neste.
Chega a ser preocupante como a santa ingenuidade e/ou a
ignorância quanto aos fatos históricos resultam em um moralismo abstrato
no que se refere à presença da violência na política. As boas consciências
ficam estupefatas e até demonstram um certo mal estar quando se
confrontam com esta realidade histórica. “Mas como pode ter sido
assim?”, se perguntam; e terminam por debitar tais eventos à sanha pelo
poder deste ou daquele indivíduo, desconsiderando-se o processo
histórico e, inclusive, a realidade presente.
A política, para o bem ou para o mal, não prescinde da violência. A
ascensão política da burguesia exigiu rupturas fundadas no recurso à
guerra e à revolução; do ponto de vista econômico, não foi diferente: a
burguesia precisou expropriar violentamente os camponeses e
transformá-los em mão-de-obra livre, isto é, prisioneiros do
sistema industrial enquanto trabalhadores assalariados. A revolução
industrial consumiu, literalmente, milhares de corpos, em especial as
mulheres e crianças. O progresso da civilização encontra-se
estreitamente vinculado ao sangue de milhões, vítimas da expansão
colonialista e da escravidão. [6] Eis o pecado original da burguesia ou “o segredo da acumulação primitiva” desvendado por Marx em O Capital.[7]
Que seria dos poderosos e suas nações sem o extermínio de populações
inteiras? Por acaso as duas grandes guerras mundiais, o holocausto, o
nazismo e o stalinismo, são obras apenas da irracionalidade humana
desvinculadas dos interesses políticos e econômicos em permanente
disputa? Foi a lógica da força que se impôs.
Eis a outra face da política: a força materializada na violência em
toda a sua crueldade. Este fator, por mais bárbaro que se apresente, não
é estranho à ação política. Maquiavel, analisando os exemplos
históricos do seu tempo, observou como o uso da violência aberta
resultou em determinados casos em fracasso e noutros em sucesso. A que
se deve esta diferença? Ele responde:
“Creio seja isto conseqüência de as crueldades serem mal ou bem praticadas. Bem utilizadas podem ser chamadas aquelas (se bem se pode dizer do mal) feitas de uma vez só, pela necessidade de prover sua própria segurança, e depois são relegadas à margem tornando-se o mais possível em vantagens para os súditos. Mal utilizadas são as que, se bem sejam a princípio poucas, não se extinguem mas crescem com o tempo”..
Referências
ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Religião e Sociedade 15/1 1990, p.142-150.BOBBIO, Norberto. Política. In: BOBBIO, Norberto, MATTEUCCU, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Brasília: Editora da UnB: 1992 (Volume 2).FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro, Edições Graal, 1979.HOBBES, Thomas Hobbes. Leviatã. São Paulo: Abril Cultural, s.d. (Os Pensadores).MACHIAVELLI, Niccolò. O Príncipe. São Paulo: Hemus, 1977.MARX, Karl. O Capital. São Paulo: Nova Cultural, 1985. (Os Economistas – Volume II)
[1] HOBBES, Thomas. Leviatã. São Paulo: Abril Cultural, s.d,. p.39.[2] MACHIAVELLI, Niccolò. O Príncipe. São Paulo: Hemus, 1977, p.20.
[3] ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Religião e Sociedade 15/1 1990, p.30.
[4] BOBBIO, Norberto. Política. In: BOBBIO, Norberto, MATTEUCCU, Nicola e PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Brasília: Editora da UnB: 1992, p.956.
[5] FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro, Edições Graal, 1979, p.221.
[6] “Se o dinheiro, segundo Augier, “vem ao mundo com manchas naturais de sangue em uma de suas faces”, então o capital nasce escorrendo por todos os poros sangue e sujeira da cabeça aos pés” (MARX, 1985: p.292).[7] “Essa acumulação primitiva desempenha na Economia Política um papel análogo ao Pecado original na Teologia. Adão mordeu a maça e, com isso, o pecado sobreveio à humanidade. Explica-se sua origem contando-a como anedota ocorrida no passado. Em tempos muito remotos, havia por um lado, uma elite laboriosa, inteligente e sobretudo parcimoniosa, e, por outro, vagabundos dissipando tudo o que tinham e mais ainda. A legenda do pecado original teológico conta-nos, contudo, como o homem foi condenado a comer seu pão com o suor de seu rosto; a história do pecado original econômico no entanto nos revela por que há gente que não tem necessidade disso. Tanto faz. Assim se explica que os primeiros acumularam riquezas e os últimos, finalmente, nada tinham para vender senão sua própria pele. E desse pecado original data a pobreza da grande massa que até agora, apesar de todo seu trabalho, nada possui para vender senão a si mesma, e a riqueza dos poucos, que cresce continuamente, embora há muito tenham parado de trabalhar” (MARX, 1985: p.261).[8] MACHIAVELLI, Niccolò. O Príncipe. São Paulo: Hemus, 1977, p.54.
Economia colaborativa
Em decorrência do avançadíssimo processo tecnológico que
vivenciamos, cujas expressões mais significativas talvez ocorram nos
campos da medicina, cibernética, robótica e, principalmente, na
informática, uma nova situação se irrompe com clareza para a ciência
econômica e, em especial, para o conhecimento em geral. Em termos de
conhecimento/aprendizagem a pergunta mais pertinente talvez seja a de
como se adaptar rapidamente ao avanço das ferramentas que cercam a
informática, em especial a mais usada delas: a rede internet e toda sua
gama de opções.
Nesse pormenor, é ilustrativo resgatarmos a opinião de Don
Tapscott, autor de “Wikinomics” que pontua com firmeza que “a internet
não é uma nova forma de conhecimento e sim uma ferramenta que deverá
mudar a nossa forma de adquirir conhecimento”. A economia, assim como
todas as outras ciências, precisa estar adaptada a essa nova mudança. Um
grande desafio que se vislumbra é fazer com que nossa economia esteja
toda ela baseada no conhecimento, sendo mais dinâmica e competitiva,
garantindo crescimento sustentado, gerando empregos de qualidade,
distribuindo a renda, assegurando coesão social.
Nesse sentido, o MCT – Ministério de Ciência e Tecnologia, pasta
dirigida pelo professor Aloizio Mercadante, envereda esforços para
adotar a “Estratégia de Lisboa” - documento divulgado em 2000 que contém
as principais diretrizes da União Européia voltadas para a Ciência,
Tecnologia e Inovação.
Nessa mesma linha de defesa, fazendo da economia uma nova base
pautada no conhecimento e na colaboração, somos partidários com
Tapscott, pois, assim como ele, entendemos que o conhecimento hoje tem
sido facilmente gerado e está à disposição de muito mais gente na
atualidade do que há 30 anos.
A facilidade de acesso às informações somente foram (e tem sido)
facilitadas tendo em vista que a rede internet pode se infiltrar em
todos os segmentos populacionais. Embora ainda haja certas restrições de
acesso à rede, mesmo restrição de ordem orçamentária, é fato inconteste
que uma infinidade maior de pessoas fazem uso diariamente do “conteúdo”
disponibilizado pela rede. Mesmo as relações humanas, saindo um pouco
do espectro informal, já contam com uma participação invejável. O
Facebook, página de relacionamento social, por exemplo, já conta com
mais de meio bilhão de usuários espalhados pelo mundo.
O grande problema que notamos, no entanto, em se tratando da rede
internet, é o excesso de informação (curiosamente, antes era a falta
disso). Nesse contexto, aprender requer então maior e melhor poder de
concentração e capacidade de filtrar, sistematicamente, a abundante
informação que se encontra disponível.
O fato é que a linguagem deixou de ser plana, agora é
hiper-textual. Nesse sentido, é ilógico pensar que os livros digitais
não serão o sucesso que, por exemplo, a música digital alcançou. Disso
decorre a necessidade de se repensar, pormenorizadamente, a “construção”
de uma economia colaborativa.
O
queremos dizer com economia colaborativa? Seria simplesmente a
capacidade de várias pessoas construirem conhecimento mesmo que essas
pessoas não se encontrem fisicamente num mesmo e único lugar; mesmo que
estejam longes umas das outras. É a internet que propicia, sobremaneira,
essa “aproximação”.
O Wikipédia, guardadas suas limitações e confiabilidade em certos
textos e fontes, é um ilustrativo e excelente exemplo disso. Não
estranhemos se, em breve, essa ferramenta se converter numa respeitada
enciclopédia, superando as antigas e ainda famosas Barsa, Britânica e
outras.
Outros bons exemplos de informações divulgadas em rede não param de
acontecer. Em dezembro de 2006, um site sediado na Suíça publicava o
seu primeiro documento sobre supostos acontecimentos que incriminavam
governos de vários países. Esse site, o WikiLeaks, nasceu com a
perspectiva de divulgar acontecimentos sigilosos realizados pelos
governos poderosos do mundo todo. O tom denuncista do WikiLeaks
incriminava diretamente procedimentos que ora comprometem os direitos
humanos ou ferem as práticas da diplomacia internacional. Porém, qual
seria a fonte de informações desse site? Eminentemente os dados provem
dos mesmos organismos que executam essas ações, só que são divulgadas de
forma sigilosa e tem a intenção colaborativa de disseminar informações a
todos. Nenhuma noticia foi, até agora, desmentida. Cada vez que o site
publica alguma nota, a imprensa mundial repercute esses acontecimentos. A
credibilidade do WikiLeaks é elevada e incomoda muita gente. Não por
acaso, seu principal fundador, o australiano Julian Assange está sendo
processado sob a acusação de crime sexual, numa tentativa pífia de
silenciá-lo. Só que o efeito é o contrário: quanto mais os incomodados
batem, mais populariza o site. A viabilidade econômica do WikiLeaks
também é realizada de forma colaborativa. Qualquer pessoa pode doar
recursos para a causa.
Com os serviços prestados pelo site de Assange, todos vão aos
poucos tomando conhecimento de informações outrora mantidas em sigilo
absoluto. Inequivocamente, a rede Internet permite de bom grado esse
“espírito colaborativo”, preservando a autoria e permitindo que o
conhecimento seja tecido como se fosse uma teia de aranha. Porém, no
lugar de uma aranha só, muitas seriam essas “aranhas” que cumpririam a
função do conhecimento colaborativo dentro dessa idéia aqui denominada
de “economia colaborativa”.
Contudo, é necessário ter ciência que, infelizmente, nem sempre as
boas ações irão sempre aflorar. Para desespero de todos que sonhamos com
um mundo melhor e mais fraterno, é mister pontuar que temos visto uma
incrível capacidade do homem em fazer mal a seu semelhante. E também
para isso o mau uso da rede internet tem sua parcela de colaboração. O
triste caso de Realengo é uma amostra perversa desse conhecimento
colaborativo tecido no sentido da “destruição”. O ex-aluno Wellington
Oliveira tinha informações diversas sobre Bullying e sobre como fazer
bombas. Além disso, pelas informações já fartamente divulgadas, sabemos
que idolatrava histórias de atentados, principalmente as do “11 de
setembro”. Wellington chamava de irmãos outros assassinos de estudantes.
Enfim, tinha pleno conhecimento para realizar suas motivações
psicopatas. Esse mesmo perfil é também o de outros matadores que nessas
últimas duas décadas tem surgido de forma pontual. A principal fonte de
informações desses matadores, em geral, tem sido a rede internet.
Sabe-se que o matador de Realengo passava horas na internet tecendo o
final da teia de aranha do conhecimento do mal que teve como resultado o
lamentável assassinato de doze crianças.
Diante disso, cabe profunda reflexão: como os agentes envolvidos
com educação, por exemplo, estão se comportando diante dessas iminentes
possibilidades perversas? Será que as novas práticas pedagógicas estão
sendo adaptadas a encarar esse contexto? Como pode também a economia, a
seu turno, se adaptar frente a essa realidade? Essas são perguntas que
ainda levarão certo tempo a serem prontamente respondidas.
De nossa parte, fazemos votos que a economia colaborativa venha com
força total para aquilo que de fato urge em termos de resgate social,
qual seja, aplainar os caminhos para a construção de uma sociedade mais
igual e menos perversa.
Programa de expansão de cursos técnicos deverá beneficiar 8 milhões
Ana Guimarães no PORTAL DO MEC
A
presidenta da República, Dilma Rousseff, e o ministro da Educação,
Fernando Haddad, lançaram nesta quinta-feira, 28, no Palácio do
Planalto, em Brasília, o projeto de lei que cria o Programa Nacional de
Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec). O texto segue para o
Congresso Nacional, onde tramitará em regime de urgência. Pelo projeto,
R$ 1 bilhão serão investidos, ainda este ano, para concessão de bolsas e
para o financiamento de cursos de educação profissional. A previsão é
de que 8 milhões de pessoas sejam beneficiadas pelo programa no prazo de
4 anos.
“Temos pela frente a perspectiva de um rigoroso
processo de desenvolvimento econômico e precisamos de mão de obra
qualificada para manter esse crescimento sustentável”, destacou a
presidenta Dilma Rousseff, na cerimônia de lançamento do projeto. O
Pronatec funcionará como uma espécie de “guarda-chuva”, unindo e
financiando programas vinculados à educação profissional. O programa
traz novo fôlego à expansão da Rede Federal de Educação Profissional e
Tecnológica, com a entrega de 81 novas escolas ainda este ano, com
previsão de funcionamento já no primeiro semestre de 2012. Outras 120
novas escolas técnicas federais serão entregues nos próximos quatro
anos.
Pelo projeto, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) passará a atender também a estudantes de nível médio que estejam cursando cursos técnicos.
O projeto prevê ainda a concessão de 3,5 milhões de bolsas de estudos até o final de 2014, que poderão beneficiar tanto estudantes de nível médio quanto trabalhadores. Os recursos para as bolsas são de R$ 700 milhões e vão diretamente para as instituições de ensino. Outros R$ 300 milhões serão destinados à concessão de financiamento estudantil, por meio do Fies, com os mesmos juros praticados para os cursos superiores – de 3,4% ao ano.
“Temos 7 milhões de estudantes cursando nível médio hoje no país. A concessão de 3,5 milhões de bolsas para cursos técnicos dá a idéia do impacto desse programa”, afirmou Haddad.
Novidades – O Pronatec modifica ações que já estão em curso e agrupa novas iniciativas ao fomento da educação profissional. O Fies, por exemplo, além de ser estendido a alunos de cursos técnicos, também poderá ser utilizado por empresas que desejem qualificar seus trabalhadores. Os empresários que desejem oferecer capacitação aos seus empregados terão, portanto, acesso às linhas de financiamento do Fies com os baixos juros praticados pelo fundo.
Outra novidade é a conexão entre a concessão de bolsas do Pronatec e o seguro desemprego. Pelo projeto encaminhado nesta quinta-feira ao Congresso, os trabalhadores reincidentes no pedido de auxílio desemprego serão prioritários para a concessão de bolsas do Pronatec. Em contrapartida, eles só poderão receber o benefício se comprovarem estar matriculados nos cursos de educação profissional.
Uma das novas iniciativas trazidas pelo Pronatec, a concessão de bolsas de estudos para cursos técnicos, funcionará em duas modalidades: bolsa formação estudante e bolsa formação trabalhador, sendo que esta última também poderá ser concedida para beneficiários do Programa Bolsa Família.
O Pronatec pretende ainda aumentar a rede de escolas estaduais, por meio do programa Brasil Profissionalizado, e de instituições ligadas ao Sistema S (Sesc, Sesi, Senai e Senac).Tanto para o Brasil Profissionalizado quanto para as entidades do Sistema S haverá maior aporte de recursos, sendo que há a possibilidade de empréstimos do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) para a construção de novas escolas do Sistema S. “O Plano Plurianual de 2012 em diante já contemplará todas as ações do Pronatec”, esclareceu o ministro.
Pesquisas - Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2008 demonstram que apenas 25,5% da população de jovens de 18 a 24 anos alcançam o ensino superior. Os cursos técnicos de nível médio despontam, portanto, como alternativa de qualificação e inserção no mercado de trabalho para mais 74% desse contingente
Pesquisa recente da Fundação Getúlio Vargas (FGV) demonstrou que ter formação profissional aumenta em 48% as chances de um indivíduo em idade ativa ingressar no mercado de trabalho. O estudo A educação profissional e você no mercado de trabalho também constatou que os salários daqueles que têm um curso profissionalizante são até 12,94% mais altos e é de 38% a probabilidade de se conseguir um trabalho com carteira assinada, em confronto com candidatos com escolaridade inferior.
A pesquisa da FGV reforça um estudo anterior, feito pelo MEC, com estudantes egressos da rede federal de educação profissional. O levantamento, divulgado em 2008, demonstrou a empregabilidade de 72% dos técnicos de nível médio formados de 2003 a 2007 pelos institutos federais.
Leia a relação dos 81 novos campi em construção
Pelo projeto, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) passará a atender também a estudantes de nível médio que estejam cursando cursos técnicos.
O projeto prevê ainda a concessão de 3,5 milhões de bolsas de estudos até o final de 2014, que poderão beneficiar tanto estudantes de nível médio quanto trabalhadores. Os recursos para as bolsas são de R$ 700 milhões e vão diretamente para as instituições de ensino. Outros R$ 300 milhões serão destinados à concessão de financiamento estudantil, por meio do Fies, com os mesmos juros praticados para os cursos superiores – de 3,4% ao ano.
“Temos 7 milhões de estudantes cursando nível médio hoje no país. A concessão de 3,5 milhões de bolsas para cursos técnicos dá a idéia do impacto desse programa”, afirmou Haddad.
Novidades – O Pronatec modifica ações que já estão em curso e agrupa novas iniciativas ao fomento da educação profissional. O Fies, por exemplo, além de ser estendido a alunos de cursos técnicos, também poderá ser utilizado por empresas que desejem qualificar seus trabalhadores. Os empresários que desejem oferecer capacitação aos seus empregados terão, portanto, acesso às linhas de financiamento do Fies com os baixos juros praticados pelo fundo.
Outra novidade é a conexão entre a concessão de bolsas do Pronatec e o seguro desemprego. Pelo projeto encaminhado nesta quinta-feira ao Congresso, os trabalhadores reincidentes no pedido de auxílio desemprego serão prioritários para a concessão de bolsas do Pronatec. Em contrapartida, eles só poderão receber o benefício se comprovarem estar matriculados nos cursos de educação profissional.
Uma das novas iniciativas trazidas pelo Pronatec, a concessão de bolsas de estudos para cursos técnicos, funcionará em duas modalidades: bolsa formação estudante e bolsa formação trabalhador, sendo que esta última também poderá ser concedida para beneficiários do Programa Bolsa Família.
O Pronatec pretende ainda aumentar a rede de escolas estaduais, por meio do programa Brasil Profissionalizado, e de instituições ligadas ao Sistema S (Sesc, Sesi, Senai e Senac).Tanto para o Brasil Profissionalizado quanto para as entidades do Sistema S haverá maior aporte de recursos, sendo que há a possibilidade de empréstimos do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) para a construção de novas escolas do Sistema S. “O Plano Plurianual de 2012 em diante já contemplará todas as ações do Pronatec”, esclareceu o ministro.
Pesquisas - Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2008 demonstram que apenas 25,5% da população de jovens de 18 a 24 anos alcançam o ensino superior. Os cursos técnicos de nível médio despontam, portanto, como alternativa de qualificação e inserção no mercado de trabalho para mais 74% desse contingente
Pesquisa recente da Fundação Getúlio Vargas (FGV) demonstrou que ter formação profissional aumenta em 48% as chances de um indivíduo em idade ativa ingressar no mercado de trabalho. O estudo A educação profissional e você no mercado de trabalho também constatou que os salários daqueles que têm um curso profissionalizante são até 12,94% mais altos e é de 38% a probabilidade de se conseguir um trabalho com carteira assinada, em confronto com candidatos com escolaridade inferior.
A pesquisa da FGV reforça um estudo anterior, feito pelo MEC, com estudantes egressos da rede federal de educação profissional. O levantamento, divulgado em 2008, demonstrou a empregabilidade de 72% dos técnicos de nível médio formados de 2003 a 2007 pelos institutos federais.
Leia a relação dos 81 novos campi em construção
Combate à inflação
O cenário externo será o fio condutor da inflação e do câmbio no mundo. Fechar os olhos para isso, pode constituir grave erro de política econômica. A melhor proteção contra as ameaças externas é o fortalecimento do mercado interno, especialmente pelo estímulo na renda para a base da pirâmide social e nos investimentos, e reduções de custos para as empresas. Assim, preocupam análises que para combater a escalada inflacionária pedem mais elevação da Selic, pouco se preocupam com a valorização cambial, e querem forte contração fiscal. No fundo, pregam a derrubada do crescimento econômico para reduzir a inflação. O artigo é de Amir Khair.
Amir Khair (*) no CARTA MAIOR
Desde o último quadrimestre do ano passado a
inflação foi crescendo e passou a ser o foco das críticas ao governo e,
particularmente ao Banco Central (BC), por parte do mercado financeiro,
que defendia o aumento da Selic para combater a escalada inflacionária.
Como ela não foi elevada até o final do ano, as críticas foram subindo
de tom e argumentava-se que a razão disso era política, para não
prejudicar a candidata à presidência Dilma Rousseff.
Mesmo após a vitória eleitoral, na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em 08/12, a decisão de não elevar a Selic, foi:“Nesse contexto, avaliando a conjuntura macroeconômica e as perspectivas para a inflação, o Copom decidiu, por unanimidade, manter a taxa Selic em 10,75% a.a., sem viés. Diante de um cenário prospectivo menos favorável do que o observado na última reunião, mas tendo em vista que, devido às condições de crédito e liquidez, o Banco Central introduziu recentemente medidas macroprudenciais, prevaleceu o entendimento entre os membros do Comitê de que será necessário tempo adicional para melhor aferir os efeitos dessas iniciativas sobre as condições monetárias. Nesse sentido, o Comitê entendeu não ser oportuno reavaliar a estratégia de política monetária nesta reunião e irá acompanhar atentamente a evolução do cenário macroeconômico até sua próxima reunião, para então definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária.”
Foi a primeira vez que ocorreu a novidade de usar as medidas macroprudenciais, lançadas em 6/dez, em vez da elevação da Selic, que foi o que comandou a política monetária de FHC e Lula. Essa decisão pode ter sido influenciada pelo desejo da presidente recém eleita de baixar as taxas de juros no Brasil.
Ocorre que num mundo globalizado o processo inflacionário atinge a todos. Desde dez/2008 os juros básicos nos Estados Unidos estão próximos a zero e o Banco Central americano (Fed) no auge da crise, recomprou US$ 1,7 trilhões em títulos privados para ativar o crédito e o consumo. Como até ago/2010 a economia quase não reagiu, o Fed decidiu recomprar esses títulos e mais US$ 600 bilhões até junho deste ano.
Em consequência dessa forte injeção de liquidez, a partir de setembro do ano passado, ocorreu forte subida nos preços dos alimentos e commodities. Isso elevou a inflação em todos os países, especialmente nos emergentes, onde os alimentos têm peso significativo na composição da inflação. Segundo o FMI, cresceram cerca de 30% nos últimos seis meses de 2010. Como a nova injeção dos US$ 600 bilhões só vai terminar em junho deste ano é provável que continuem subindo os preços dos alimentos e commodities para preservar seus valores em dólares.
Este processo nos atingiu duramente e gerou intensa discussão sobre que políticas se deveriam adotar para brecar a inflação.
Posições em debate
Duas posições estão em debate. Uma, liderada pelo mercado financeiro, atribui importância maior ao que considera haver um excesso de demanda na economia e defende a elevação da Selic, deixar o câmbio flutuar, para reduzir os preços dos produtos importados (âncora cambial), e conter o crescimento econômico através de forte contração fiscal para a redução da demanda.
A outra, na qual me incluo, atribui peso maior à inflação importada, que já preocupa todos os países, a redução da Selic para a contração fiscal por reduzir as despesas com juros do governo, o uso de medidas macroprudenciais para elevar o valor das prestações nas compras, e o controle cambial para não prejudicar a competitividade das empresas e não elevar o rombo das contas externas.
Fatores externos
É bom recordar que em junho, julho e agosto do ano passado a inflação foi zero, devido à queda de 1,89% no preço dos alimentos. No último quadrimestre de 2010 o IPCA atingiu a média mensal de 0,66%, os alimentos 1,63% e os demais itens 0,37%. Caso os alimentos tivessem acompanhado a inflação média dos demais itens, a inflação anualizada seria de 4,54%, portanto, no centro da meta prevista para este ano.
É interessante comparar a inflação média mensal do 3º quadrimestre com a do último quadrimestre de 2010 das commodities (que inclui alguns alimentos) e sua repercussão sobre os preços no atacado e destes, com defasagem, para o varejo. Conforme quadro à esquerda (publicado acima), na coluna “4º quadrim”, a média mensal de inflação das commodities foi de 3,82% (petróleo e derivados: 4,00%, matérias rimas: 2,96%, carnes: 1,88 e grãos, oleaginosas e frutas: 4,98%). O quadro à direita na coluna “4º quadrim”, mostra o impacto das commodities sobre os preços por atacado IPA (1,24%) e os índices gerais de preço (IGP-DI: 1,02% e IGP-M: 1,07%), onde o preço por atacado tem peso de 60% e sobre a inflação ao consumidor (INPC, IPC e IPCA) no entorno de 0,7%, ainda não suficientemente contaminada.
A contaminação sobre a inflação ao consumo ocorreu de forma mais intensa neste início de ano, quando o IPCA médio do primeiro trimestre atingiu 0,81% contra 0,66% do último quadrimestre de 2010.
O mercado financeiro, interessado em elevar a Selic, desconsiderou isso e vem pressionando o Banco Central (BC) para novas elevações, usando para isso o boletim Focus – sua principal arma - com previsões de inflação cada vez maiores a cada semana de publicação deste boletim, cujos dados são do mercado financeiro!
Está surtindo efeito essa pressão, pois o Copom, temendo as críticas de que perdeu o controle da inflação, voltou a elevar a Selic pela terceira vez neste ano e deverá continuar a elevá-la conforme divulgado dia 27/4 na sua última ata: “O Copom entende, de forma unânime que, diante das incertezas quanto ao grau de persistência das pressões inflacionárias recentes, e da complexidade que envolve hoje o ambiente internacional, o ajuste total da taxa básica de juros deve ser, a partir desta reunião, suficientemente prolongado.” O grotesco é que a Selic já é o triplo (!) do país que vem em segundo lugar no ranking das mais altas taxas básicas de juros, a Turquia.
Limites de atuação
Diante desses fatos surge a questão: o que fazer para conter essa escalada inflacionária.
Em primeiro lugar é reconhecer o que não depende de ação do governo. É o caso da inflação proveniente do exterior nas commodities e alimentos. Só são passíveis de intervenção, com a continuação da valorização do real, que já atingiu níveis preocupantes para a indústria e sangrou as contas externas.
Também não depende de ações do governo, a inflação dos preços administrados, que pesam 30% na composição do IPCA. Eles são insensíveis às condições de oferta e de demanda porque são estabelecidos por contrato, por órgão público ou agências reguladoras: serviços telefônicos, derivados de petróleo (gasolina, gás de cozinha, óleo para motores), eletricidade, planos de saúde, taxa de água e esgoto, IPVA, IPTU e tarifas de transporte público. Só em pequena parte pode atuar o governo federal, como no caso dos combustíveis. No momento o governo resiste em elevar o preço da gasolina, mas a última ata do Copom considera que haverá aumento de 2,2% neste ano.
Excluindo a inflação importada e os preços administrados sobram cerca de 30% de componentes sobre os quais o governo pode agir para tentar segurar a inflação, o que evidencia as limitações das autoridades para um combate amplo à inflação. Tendo isso presente, é importante considerar os principais fatores que estão influenciando a inflação.
Fatores que influenciam a inflação
Elevam a inflação especialmente os preços de alimentos, commodities e, em parte, o petróleo, que repercute a inflação importada, os preços dos serviços (que não sofrem concorrência externa), a indexação de alguns contratos que se baseiam na inflação ocorrida no passado, e dificuldades para a contratação de mão de obra devido ao desemprego ter atingido níveis considerados baixos. Olhando para 2012 há a elevação do salário mínimo, que por lei deverá subir entre 13% e 14% injetando recursos que irão aumentar o consumo das famílias da base da pirâmide social e, consequentemente, a demanda.
Reduz a inflação a safra recorde prevista de produtos agrícolas, um abrandamento do consumo das famílias devido à perda inflacionária de seus rendimentos, o maior comprometimento de sua renda disponível em função de compras feitas no passado, especialmente com prestações de imóveis, automóveis e eletrodomésticos e a valorização do real reduzindo os preços dos produtos importados, o que serve para a contenção dos reajustes dos preços internos.
Vale destacar, também, as perspectivas da oferta e da procura. No ano passado, a Formação Bruta de Capital Fixo, que representa os investimentos na economia, cresceu 21,8% e o consumo 6,1%. Esse crescimento dos investimentos acima do consumo já vem ocorrendo há tempos. Nos últimos sete anos (2004 a 2010) em termos médios anuais os investimentos cresceram 7,0% e o consumo 4,4%. Isso significa que a capacidade de produção vem crescendo acima do consumo, o que é um bom sinal para as perspectivas inflacionárias. Fora isso, o governo através de medidas macroprudenciais encareceu o crédito, especialmente para compras superiores a 24 meses, enxugou cerca de R$ 80 bilhões em depósitos compulsórios dos bancos e cortou R$ 50 bilhões do orçamento.
Para surpresa de muitos, pelas Contas Nacionais, que registram a evolução do PIB, os gastos do governo vêm crescendo em níveis abaixo do crescimento do PIB em todos os anos, à exceção de 2009, quando evoluíram 3,9% para conter a queda do PIB que chegou a 0,6%. Na média anual entre 2003 a 2010, o PIB cresceu 4,0%, o consumo das famílias 4,4%, os investimentos 6,7% e os gastos do governo 3,2%. Em 2010 os gastos do governo cresceram 3,3% e o PIB 7,5%.
Combate eficaz
Conforme tratado em artigo anterior o máximo de redução de despesas do governo federal tem baixo efeito sobre a demanda, pois: a) pelas Contas Nacionais os gastos do governo são 21% da demanda, dos quais 57% são de Estados e Municípios; b) dos 43% do governo federal, apenas 20%, inclusos aí os investimentos, são passíveis de gestão devido às amarrações legais do orçamento e; c) caso se consiga reduzir 20% via gestão, se teria uma redução de apenas 0,36% (!) da demanda (21% x 43% x 20% x 20%).
Diante deste quadro, caso se atribua à demanda (consumo das famílias, gastos do governo e investimentos) o crescimento da inflação, o mais acertado seria reduzir o ritmo de crescimento do consumo das famílias, já que os investimentos constituem o alimento para o crescimento da oferta futura, ou seja, o antídoto da inflação, e a possível redução de gastos do governo é pequena. Mas caso fosse o caso de atenuar o crescimento do consumo, o melhor caminho seria encarecer o crédito, especialmente para compras com prazos mais longos. Isso tem a vantagem de elevar as prestações e, principalmente, proteger o consumidor de riscos de inadimplência. O governo fez isso a partir de 6/dez com as medidas macroprudenciais, com bons resultados. Se necessário pode elevar mais ainda o valor das prestações para prazos inferiores a 24 meses. Basta querer.
A outra componente do consumo é a massa salarial que vem evoluindo devido às políticas que incorporaram enorme contingente de trabalhadores ao mercado de trabalho, estimulados pelas elevações do salário mínimo e de programas sociais como o Bolsa Família. Este componente deve ser preservado e estimulado, pois a geração de empregos induz o aumento da produção, dos investimentos e da economia. O importante é que o consumo evolua mais naturalmente com a massa salarial, do que pelo estímulo exagerado do crédito como ocorreu nos últimos anos.
Mas não creio que seja a demanda a responsável pela elevação da inflação. O fator externo tem feito a inflação saltar em todos os países, muitos dos quais já ultrapassaram o piso superior de suas metas de inflação. Até países como a China, onde o governo tem um controle mais rígido da economia, já atingiu 5,4% e provavelmente irá crescer ainda mais neste ano. Os Estados Unidos, ainda sob o efeito da crise, já bateu nos 2,7% e há previsões de que atinja 4,5% no final do ano. O Banco Central Europeu preocupado com a inflação na zona do euro, que caminha para 3%, já começou a elevar os juros, apesar da série crise fiscal e social em vários países da zona.
Fato é que estamos ao sabor dos humores externos da política monetária dos Estados Unidos, da crise na Europa, da indefinição do futuro do Japão face às conseqüências do terremoto e da insegurança do sistema de geração de energia nuclear, e da conflagração do norte da África e no Oriente Médio.
Enquanto não for enxugada a elevada liquidez internacional, os preços de alimentos, commodities e petróleo continuarão elevados e, com propensão a subir puxados pelo crescente consumo asiático e de outros países emergentes.
É de se destacar que, além dos riscos à segurança alimentar e energética, as altas nos preços dos alimentos, commodities e do petróleo comprometem o crescimento econômico mundial, pois reduzem a disponibilidade para o consumo de outros bens e serviços, reduzindo a arrecadação dos governos. Isso é particularmente importante no caso dos Estados Unidos, pois começam a surgir dúvidas sobre sua capacidade de pagar sua dívida de US$ 14,3 trilhões, tendo sido rebaixada sua classificação de risco pela Standard & Poor’s. Os Estados Unidos têm o maior déficit fiscal do mundo, como parcela do PIB (10,8% neste ano), e a segunda maior necessidade de financiamento, superada só pela do Japão.”
Da mesma forma que até 2008 não se encarou os riscos da crise da bolha imobiliária nos Estados Unidos, há uma tendência a minimizar a ascensão dos déficits fiscais e das dívidas nos Estados Unidos, Europa e Japão. Em 2007, antes da crise, a dívida dos países ricos era de US$ 26 trilhões ou 47% do PIB global. Atualmente é de US$ 42 trilhões, ou 61% do PIB global e a tendência é crescer ainda mais. Essa pode ser uma das principais ameaças à recuperação da economia mundial.
O cenário externo será sem dúvida o fio condutor da inflação e do câmbio no mundo, e fechar os olhos para isso, pode constituir grave erro de política econômica. Portanto, a melhor proteção contra as ameaças externas é o fortalecimento do mercado interno, especialmente pelo estímulo na renda para a base da pirâmide social e nos investimentos, e reduções de custos para as empresas. Assim, preocupam análises que para combater a escalada inflacionária pedem mais elevação da Selic, pouco se preocupam com a valorização cambial, e querem forte contração fiscal. No fundo, pregam a derrubada do crescimento econômico para reduzir a inflação.
O que poderia justificar um efeito favorável da Selic para a contenção inflacionária seria sua função de favorecer a âncora cambial, barateando as importações e ajudando a abrandar o efeito externo dos preços das commodities que importamos, mas isso tem efeitos colaterais adversos: redução da competitividade das empresas, forte elevação dos rombos nas contas externas e crescente custo de carregamento das reservas internacionais.
A consequência dessa irresponsabilidade cambial é a crescente transferência de indústrias brasileiras para o exterior, por meio de investimentos em novas fábricas ou aquisição de empresas já em operação.
É necessário separar o joio do trigo no ataque à inflação, reconhecer nossas limitações e inovar com medidas macroprudenciais o que não se consegue com os males causados pela elevada Selic. Tenho dúvidas se o governo irá enfrentar o mercado financeiro. Por enquanto se submete a ele, o que contraria um desenvolvimento sustentável com distribuição de renda.
(*) Mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor
Mesmo após a vitória eleitoral, na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em 08/12, a decisão de não elevar a Selic, foi:“Nesse contexto, avaliando a conjuntura macroeconômica e as perspectivas para a inflação, o Copom decidiu, por unanimidade, manter a taxa Selic em 10,75% a.a., sem viés. Diante de um cenário prospectivo menos favorável do que o observado na última reunião, mas tendo em vista que, devido às condições de crédito e liquidez, o Banco Central introduziu recentemente medidas macroprudenciais, prevaleceu o entendimento entre os membros do Comitê de que será necessário tempo adicional para melhor aferir os efeitos dessas iniciativas sobre as condições monetárias. Nesse sentido, o Comitê entendeu não ser oportuno reavaliar a estratégia de política monetária nesta reunião e irá acompanhar atentamente a evolução do cenário macroeconômico até sua próxima reunião, para então definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária.”
Foi a primeira vez que ocorreu a novidade de usar as medidas macroprudenciais, lançadas em 6/dez, em vez da elevação da Selic, que foi o que comandou a política monetária de FHC e Lula. Essa decisão pode ter sido influenciada pelo desejo da presidente recém eleita de baixar as taxas de juros no Brasil.
Ocorre que num mundo globalizado o processo inflacionário atinge a todos. Desde dez/2008 os juros básicos nos Estados Unidos estão próximos a zero e o Banco Central americano (Fed) no auge da crise, recomprou US$ 1,7 trilhões em títulos privados para ativar o crédito e o consumo. Como até ago/2010 a economia quase não reagiu, o Fed decidiu recomprar esses títulos e mais US$ 600 bilhões até junho deste ano.
Em consequência dessa forte injeção de liquidez, a partir de setembro do ano passado, ocorreu forte subida nos preços dos alimentos e commodities. Isso elevou a inflação em todos os países, especialmente nos emergentes, onde os alimentos têm peso significativo na composição da inflação. Segundo o FMI, cresceram cerca de 30% nos últimos seis meses de 2010. Como a nova injeção dos US$ 600 bilhões só vai terminar em junho deste ano é provável que continuem subindo os preços dos alimentos e commodities para preservar seus valores em dólares.
Este processo nos atingiu duramente e gerou intensa discussão sobre que políticas se deveriam adotar para brecar a inflação.
Posições em debate
Duas posições estão em debate. Uma, liderada pelo mercado financeiro, atribui importância maior ao que considera haver um excesso de demanda na economia e defende a elevação da Selic, deixar o câmbio flutuar, para reduzir os preços dos produtos importados (âncora cambial), e conter o crescimento econômico através de forte contração fiscal para a redução da demanda.
A outra, na qual me incluo, atribui peso maior à inflação importada, que já preocupa todos os países, a redução da Selic para a contração fiscal por reduzir as despesas com juros do governo, o uso de medidas macroprudenciais para elevar o valor das prestações nas compras, e o controle cambial para não prejudicar a competitividade das empresas e não elevar o rombo das contas externas.
Fatores externos
É bom recordar que em junho, julho e agosto do ano passado a inflação foi zero, devido à queda de 1,89% no preço dos alimentos. No último quadrimestre de 2010 o IPCA atingiu a média mensal de 0,66%, os alimentos 1,63% e os demais itens 0,37%. Caso os alimentos tivessem acompanhado a inflação média dos demais itens, a inflação anualizada seria de 4,54%, portanto, no centro da meta prevista para este ano.
É interessante comparar a inflação média mensal do 3º quadrimestre com a do último quadrimestre de 2010 das commodities (que inclui alguns alimentos) e sua repercussão sobre os preços no atacado e destes, com defasagem, para o varejo. Conforme quadro à esquerda (publicado acima), na coluna “4º quadrim”, a média mensal de inflação das commodities foi de 3,82% (petróleo e derivados: 4,00%, matérias rimas: 2,96%, carnes: 1,88 e grãos, oleaginosas e frutas: 4,98%). O quadro à direita na coluna “4º quadrim”, mostra o impacto das commodities sobre os preços por atacado IPA (1,24%) e os índices gerais de preço (IGP-DI: 1,02% e IGP-M: 1,07%), onde o preço por atacado tem peso de 60% e sobre a inflação ao consumidor (INPC, IPC e IPCA) no entorno de 0,7%, ainda não suficientemente contaminada.
A contaminação sobre a inflação ao consumo ocorreu de forma mais intensa neste início de ano, quando o IPCA médio do primeiro trimestre atingiu 0,81% contra 0,66% do último quadrimestre de 2010.
O mercado financeiro, interessado em elevar a Selic, desconsiderou isso e vem pressionando o Banco Central (BC) para novas elevações, usando para isso o boletim Focus – sua principal arma - com previsões de inflação cada vez maiores a cada semana de publicação deste boletim, cujos dados são do mercado financeiro!
Está surtindo efeito essa pressão, pois o Copom, temendo as críticas de que perdeu o controle da inflação, voltou a elevar a Selic pela terceira vez neste ano e deverá continuar a elevá-la conforme divulgado dia 27/4 na sua última ata: “O Copom entende, de forma unânime que, diante das incertezas quanto ao grau de persistência das pressões inflacionárias recentes, e da complexidade que envolve hoje o ambiente internacional, o ajuste total da taxa básica de juros deve ser, a partir desta reunião, suficientemente prolongado.” O grotesco é que a Selic já é o triplo (!) do país que vem em segundo lugar no ranking das mais altas taxas básicas de juros, a Turquia.
Limites de atuação
Diante desses fatos surge a questão: o que fazer para conter essa escalada inflacionária.
Em primeiro lugar é reconhecer o que não depende de ação do governo. É o caso da inflação proveniente do exterior nas commodities e alimentos. Só são passíveis de intervenção, com a continuação da valorização do real, que já atingiu níveis preocupantes para a indústria e sangrou as contas externas.
Também não depende de ações do governo, a inflação dos preços administrados, que pesam 30% na composição do IPCA. Eles são insensíveis às condições de oferta e de demanda porque são estabelecidos por contrato, por órgão público ou agências reguladoras: serviços telefônicos, derivados de petróleo (gasolina, gás de cozinha, óleo para motores), eletricidade, planos de saúde, taxa de água e esgoto, IPVA, IPTU e tarifas de transporte público. Só em pequena parte pode atuar o governo federal, como no caso dos combustíveis. No momento o governo resiste em elevar o preço da gasolina, mas a última ata do Copom considera que haverá aumento de 2,2% neste ano.
Excluindo a inflação importada e os preços administrados sobram cerca de 30% de componentes sobre os quais o governo pode agir para tentar segurar a inflação, o que evidencia as limitações das autoridades para um combate amplo à inflação. Tendo isso presente, é importante considerar os principais fatores que estão influenciando a inflação.
Fatores que influenciam a inflação
Elevam a inflação especialmente os preços de alimentos, commodities e, em parte, o petróleo, que repercute a inflação importada, os preços dos serviços (que não sofrem concorrência externa), a indexação de alguns contratos que se baseiam na inflação ocorrida no passado, e dificuldades para a contratação de mão de obra devido ao desemprego ter atingido níveis considerados baixos. Olhando para 2012 há a elevação do salário mínimo, que por lei deverá subir entre 13% e 14% injetando recursos que irão aumentar o consumo das famílias da base da pirâmide social e, consequentemente, a demanda.
Reduz a inflação a safra recorde prevista de produtos agrícolas, um abrandamento do consumo das famílias devido à perda inflacionária de seus rendimentos, o maior comprometimento de sua renda disponível em função de compras feitas no passado, especialmente com prestações de imóveis, automóveis e eletrodomésticos e a valorização do real reduzindo os preços dos produtos importados, o que serve para a contenção dos reajustes dos preços internos.
Vale destacar, também, as perspectivas da oferta e da procura. No ano passado, a Formação Bruta de Capital Fixo, que representa os investimentos na economia, cresceu 21,8% e o consumo 6,1%. Esse crescimento dos investimentos acima do consumo já vem ocorrendo há tempos. Nos últimos sete anos (2004 a 2010) em termos médios anuais os investimentos cresceram 7,0% e o consumo 4,4%. Isso significa que a capacidade de produção vem crescendo acima do consumo, o que é um bom sinal para as perspectivas inflacionárias. Fora isso, o governo através de medidas macroprudenciais encareceu o crédito, especialmente para compras superiores a 24 meses, enxugou cerca de R$ 80 bilhões em depósitos compulsórios dos bancos e cortou R$ 50 bilhões do orçamento.
Para surpresa de muitos, pelas Contas Nacionais, que registram a evolução do PIB, os gastos do governo vêm crescendo em níveis abaixo do crescimento do PIB em todos os anos, à exceção de 2009, quando evoluíram 3,9% para conter a queda do PIB que chegou a 0,6%. Na média anual entre 2003 a 2010, o PIB cresceu 4,0%, o consumo das famílias 4,4%, os investimentos 6,7% e os gastos do governo 3,2%. Em 2010 os gastos do governo cresceram 3,3% e o PIB 7,5%.
Combate eficaz
Conforme tratado em artigo anterior o máximo de redução de despesas do governo federal tem baixo efeito sobre a demanda, pois: a) pelas Contas Nacionais os gastos do governo são 21% da demanda, dos quais 57% são de Estados e Municípios; b) dos 43% do governo federal, apenas 20%, inclusos aí os investimentos, são passíveis de gestão devido às amarrações legais do orçamento e; c) caso se consiga reduzir 20% via gestão, se teria uma redução de apenas 0,36% (!) da demanda (21% x 43% x 20% x 20%).
Diante deste quadro, caso se atribua à demanda (consumo das famílias, gastos do governo e investimentos) o crescimento da inflação, o mais acertado seria reduzir o ritmo de crescimento do consumo das famílias, já que os investimentos constituem o alimento para o crescimento da oferta futura, ou seja, o antídoto da inflação, e a possível redução de gastos do governo é pequena. Mas caso fosse o caso de atenuar o crescimento do consumo, o melhor caminho seria encarecer o crédito, especialmente para compras com prazos mais longos. Isso tem a vantagem de elevar as prestações e, principalmente, proteger o consumidor de riscos de inadimplência. O governo fez isso a partir de 6/dez com as medidas macroprudenciais, com bons resultados. Se necessário pode elevar mais ainda o valor das prestações para prazos inferiores a 24 meses. Basta querer.
A outra componente do consumo é a massa salarial que vem evoluindo devido às políticas que incorporaram enorme contingente de trabalhadores ao mercado de trabalho, estimulados pelas elevações do salário mínimo e de programas sociais como o Bolsa Família. Este componente deve ser preservado e estimulado, pois a geração de empregos induz o aumento da produção, dos investimentos e da economia. O importante é que o consumo evolua mais naturalmente com a massa salarial, do que pelo estímulo exagerado do crédito como ocorreu nos últimos anos.
Mas não creio que seja a demanda a responsável pela elevação da inflação. O fator externo tem feito a inflação saltar em todos os países, muitos dos quais já ultrapassaram o piso superior de suas metas de inflação. Até países como a China, onde o governo tem um controle mais rígido da economia, já atingiu 5,4% e provavelmente irá crescer ainda mais neste ano. Os Estados Unidos, ainda sob o efeito da crise, já bateu nos 2,7% e há previsões de que atinja 4,5% no final do ano. O Banco Central Europeu preocupado com a inflação na zona do euro, que caminha para 3%, já começou a elevar os juros, apesar da série crise fiscal e social em vários países da zona.
Fato é que estamos ao sabor dos humores externos da política monetária dos Estados Unidos, da crise na Europa, da indefinição do futuro do Japão face às conseqüências do terremoto e da insegurança do sistema de geração de energia nuclear, e da conflagração do norte da África e no Oriente Médio.
Enquanto não for enxugada a elevada liquidez internacional, os preços de alimentos, commodities e petróleo continuarão elevados e, com propensão a subir puxados pelo crescente consumo asiático e de outros países emergentes.
É de se destacar que, além dos riscos à segurança alimentar e energética, as altas nos preços dos alimentos, commodities e do petróleo comprometem o crescimento econômico mundial, pois reduzem a disponibilidade para o consumo de outros bens e serviços, reduzindo a arrecadação dos governos. Isso é particularmente importante no caso dos Estados Unidos, pois começam a surgir dúvidas sobre sua capacidade de pagar sua dívida de US$ 14,3 trilhões, tendo sido rebaixada sua classificação de risco pela Standard & Poor’s. Os Estados Unidos têm o maior déficit fiscal do mundo, como parcela do PIB (10,8% neste ano), e a segunda maior necessidade de financiamento, superada só pela do Japão.”
Da mesma forma que até 2008 não se encarou os riscos da crise da bolha imobiliária nos Estados Unidos, há uma tendência a minimizar a ascensão dos déficits fiscais e das dívidas nos Estados Unidos, Europa e Japão. Em 2007, antes da crise, a dívida dos países ricos era de US$ 26 trilhões ou 47% do PIB global. Atualmente é de US$ 42 trilhões, ou 61% do PIB global e a tendência é crescer ainda mais. Essa pode ser uma das principais ameaças à recuperação da economia mundial.
O cenário externo será sem dúvida o fio condutor da inflação e do câmbio no mundo, e fechar os olhos para isso, pode constituir grave erro de política econômica. Portanto, a melhor proteção contra as ameaças externas é o fortalecimento do mercado interno, especialmente pelo estímulo na renda para a base da pirâmide social e nos investimentos, e reduções de custos para as empresas. Assim, preocupam análises que para combater a escalada inflacionária pedem mais elevação da Selic, pouco se preocupam com a valorização cambial, e querem forte contração fiscal. No fundo, pregam a derrubada do crescimento econômico para reduzir a inflação.
O que poderia justificar um efeito favorável da Selic para a contenção inflacionária seria sua função de favorecer a âncora cambial, barateando as importações e ajudando a abrandar o efeito externo dos preços das commodities que importamos, mas isso tem efeitos colaterais adversos: redução da competitividade das empresas, forte elevação dos rombos nas contas externas e crescente custo de carregamento das reservas internacionais.
A consequência dessa irresponsabilidade cambial é a crescente transferência de indústrias brasileiras para o exterior, por meio de investimentos em novas fábricas ou aquisição de empresas já em operação.
É necessário separar o joio do trigo no ataque à inflação, reconhecer nossas limitações e inovar com medidas macroprudenciais o que não se consegue com os males causados pela elevada Selic. Tenho dúvidas se o governo irá enfrentar o mercado financeiro. Por enquanto se submete a ele, o que contraria um desenvolvimento sustentável com distribuição de renda.
(*) Mestre em Finanças Públicas pela FGV e consultor
Caminhos para transformação da escola:Da prática à teoria
Caminhos para transformação da Escola – reflexões
desde práticas da Licenciatura em Educação do Campo é um livro para
educadores comprometidos com a transformação da escola brasileira
Cecilia Luedemann no BrasilDeFato
Caminhos
para transformação da Escola – reflexões desde práticas da Licenciatura
em Educação do Campo, organizado por Roseli Salete Caldart e com
artigos de Andréa Rosana Fetzner, Romir Rodrigues e Luiz Carlos de
Freitas, é uma grande contribuição para educadores e educandos que
buscam novas referências teóricas e práticas para a criação de uma
escola para os trabalhadores.
Esta publicação
comemora os 15 anos do Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da
Reforma Agrária (Iterra), em 2010, com experiências e reflexões sobre a
educação desenvolvidas pelo MST. Dividido em três partes, o livro trata
sobre os seminários e documentos de sistematização, sobre a organização
escolar e o trabalho pedagógico e as reflexões específicas sobre a
Educação Básica de Nível Médio.
Em todos os
textos há uma preocupação em relatar e sistematizar as experiências
pedagógicas à luz do marxismo, relacionando a história da educação
brasileira, suas principais teses e as propostas de superação da
realidade atual. Essa retomada da vertente marxista pode ser claramente
identificada no artigo A Escola Única do Trabalho: explorando os
caminhos de sua construção, de Luiz Carlos Freitas (Unicamp). Estudioso
de Moisey Pistrak, pioneiro da revolução educacional russa, traduziu o
surpreendente relato da experiência pedagógica da primeira fase da
revolução russa, o Escola-Comuna.
É surpreendente
ler as análises sobre cada um dos temas da educação, como a questão dos
ciclos, da interdisciplinaridade, os conteúdos das áreas, a organização
escolar, etc, contextualizados na história da educação brasileira e nas
experiências de criação de uma nova escola. As experiências de
licenciatura em educação do campo apresentam alternativas concretas,
como a de conteúdos específicos da realidade dos trabalhadores rurais,
bem como a reorganização da escola, retirando a sala de aula do centro e
relacionando-a com a vida de seu entorno.
Questões
como currículo são debatidas à luz da noção de complexo de estudo com
base nas análises de Moisey Pistrak, Celestin Freinet, Isabela Camini e
Roseli Caldart. Uma relação dinâmica entre a teoria marxista e as
experiências desenvolvidas pelos educadores e educandos do MST. Leitura
obrigatória nesse sentido é o livro de Isabela Camini, Escola Itinerante
– na fronteira de uma nova escola. A autora analisa a história e
realidade de uma escola criada na luta contra a educação liberal
burguesa pelo MST. E tanto no livro Escola Itinerante quanto no Caminhos
para transformação da Escola, os autores colhem o resultado de anos e
anos de experiências para a criação de uma nova teoria e uma nova
prática educacional transformadoras.
E nesses
caminhos para a transformação da Escola encontramos um acerto de contas
teórico. Não há como seguir em frente se não for possível discutir os
conceitos educacionais no campo do marxismo, como faz Freitas com a
matriz teórica da pedagogia histórico-crítica. Parafraseando Pistrak
(Freitas, 2009) poderíamos dizer que o que se propõe é uma “prática
social sentada” no interior das salas de aula das nossas escolas. Talvez
este seja o limite das nossas escolas, mas não pode ser o limite da
nossa teoria.”(p.163)
O desafio é criar uma
teoria pedagógica que ultrapasse as limitações da atual escola liberal
burguesa para a criação da Escola Única do Trabalho. Como explica
Freitas (p.174): “À medida que a experimentação desses processos avance,
poderemos começar a lidar com situações concretas encontradas pelas
escolas e que poderão mostrar melhor o que se pretende com esta
abordagem. Os caminhos aqui apresentados, com certeza, serão recriados
pelas próprias escolas na prática. Esta atividade prática do magistério,
em espaços privilegiados como o dos movimentos sociais, deve ser a base
para a construção coletiva, com o magistério, de uma nova escola e sua
teoria pedagógica correspondente, como queria Krupskaya.”
Cecilia Luedemann é jornalista e professora universitária
Caminhos para transformação da escola
ISBN: 9788577431649
Autor: Roseli Salete Caldart (Org.)
Número de Páginas: 241
Editora: Expressão Popular (www.expressaopopular.com.br)
Valor: R$ 15,00
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