Um blog de informações culturais, políticas e sociais, fazendo o contra ponto à mídia de esgoto.
domingo, 3 de julho de 2011
sábado, 2 de julho de 2011
Elitismo revestido de “meritocracia”
Brizola Neto no TIJOLACO
Obrigado
a ficar andando de carro, hoje de manhã, ouvi a pancadaria que recebeu a
UFRJ na rádio CBN por ter aderido ao ENEM como forma de seleção
exclusiva para o ingresso na mais antigas e uma das mais prestigiosas
universidades brasileiras.
Lucia Hippólito e o comentarista Sérgio Besserman Viana –
ex-presidente do IBGE no Governo FHC, dirigente nacional do PSDB –
disseram que isso era um “nivelamento por baixo”, algo como a destruição
do mérito e da qualidade acadêmica, porque não se faria uma seleção
“específica” para o nível e as pretensões de uma instituição do padrão
da UFRJ.
Não, não é. E Sergio Bessermann é, pessoalmente, prova de que isso
não é verdade, a não ser que não considere a si mesmo como exemplo de
aluno que não merecia ter sido aprovado. Ele passou no vestibular da
UFRJ no mesmo ano em que eu. Ambos sabemos que fomos selecionados num
exame igualmente geral – o então Cesgranrio – que servia de porta de
entrada a quase todas as universidades e faculdades do Rio de Janeiro.
Exatamente como é o Enem.
O único problema de Besserman com a UFRJ foi vocacional, não de
qualidade intelectual, tanto que a deixou para fazer História e, depois,
Economia na PUC.
O Cesgranrio tinha deficiências graves. Mas, no geral, passar para um
“federal” não era então e não é hoje coisa que aconteça com quem está
despreparado. Os pais de adolescentes – e eles, mais do que ninguém –
sabem disso, perfeitamente.
Não é o caso de discutir se, do ponto de vista acadêmico, uma
universidade pode ou deve ter seleções específicas. Esta é uma longa e
profunda discussão. Mas, mesmo que considere assim, igualmente deve usar
o Enem como pré-seleção, porque o gigantismo dos vestibulares das
universidades públicas tornou-se um processo monstruoso de distorção, em
vários aspectos.
Primeiro, das funções da Universidade. Preparar e realizar exames
simultâneos para cem mil ou mais vestibulandos, com os requisitos de
qualidade e segurança que isso impõe, na aplicação das provas e em sua
correção acabou se tornando uma das principais preocupações da academia.
E é caríssimo.
Daí, vem o segundo problema. O aluno que faz prova para a UFRJ, faz
outra prova para a UFF (em Niterói), outra para a UERJ (estadual) e, em
certos cursos, também para a Unirio (federal) e a Universidade Federal
Rural, em Seropédica. Em outros casos, havia mais um – o da
Universidade Estadual Darcy Ribeiro, em Campos, que hoje também adota
apenas o Enem. Para cada uma, uma taxa de inscrição. Em 2008, a
inscrição da UFRJ custava R$ 95. Imagine o custo, para uma família de
classe média baixa ou para um jovem trabalhador de fazer cinco
inscrições para cinco vestibulares?Ou seis, em alguns casos?
Afora isso, o fato de realizar dois ou até três dias de provas para
cada um dos cinco vestibulares públicos criava um período em absoluta
indisponibilidade e stress para estes jovens. Se, por acaso, tivessem um
emprego, era virtualmente impossível fazerem todas estas provas.
É evidente que a elevação do nível de nossas grandes universidades
depende, e muito, da qualidade do ensino básico e do médio. Embora a
política de cotas seja um correto remédio emergencial para as
desigualdades, ela não resolve sozinha estes problemas e nem se deseja
que seja eterna, pois que não se deseja a eternidade da desigualdade.
Mas nada justifica que, sob este argumento, seja mantido um sistema
de seleção que é caro, torturante e elitista.Tanto que das
universidades fluminenses – por decisão de seus conselhos acad~emicos e
não do Governo – só a UFF não aderiu ainda à seleção apenas pelo Enem.
É uma atitude estranha que isso seja proposto, em nome da “excelência
da UFRJ”, por alguém que chegou a ela por um exame geral como era o do
Cesgranrio, como Sérgio Besserman.
Com vestibular específico ou com Enem, passar para a UFRJ continuará
sendo uma façanha digna de aplauso, pela capacidade e pelo esforço, para
qualquer jovem. Como o foi, naquele vestibular de 1977, para o então
jovem e então esquerdista Sérgio BessermanViana.
Altamiro Borges: médicos marcam greve e peitam os planos de saúde
Por Vermelho
Em assembléia realizada na quinta-feira (30) à noite, médicos que
atendem os planos de saúde em São Paulo decidiram paralisar as suas
atividades. Cerca de 58 mil profissionais são explorados pelas empresas
privadas do setor no estado. A paralisação atingirá dez convênios, que
reúnem 3 milhões de usuários – no total, são 327 operadoras de planos de
saúde em São Paulo, que “atendem” 18,4 milhões de usuários.
A greve, por tempo indeterminado, afetará
uma especialidade médica por vez. Ao todo, são 53 especialidades, “o que
pode fazer com que a paralisação dure um ano inteiro por meio desse
rodízio”, informa o UOL. O objetivo, segundo Florisval Meinão,
vice-presidente da Associação Paulista de Medicina, é pressionar os
planos a negociarem reajuste dos honorários pagos aos médicos.
O péssimo atendimento “privado”
O grau de exploração dos planos privados de saúde é absurdo. Entre
2003 e 2009, as operadoras concederam reajustes salariais de 44%, em
média, índice bem abaixo da inflação acumulada no período. Em abril
passado, os médicos já realizaram uma greve nacional por melhores
salários. Eles recebem, em média, R$ 30 por consulta. Reivindicam
receber R$ 80,00.
Além do arrocho salarial e do ritmo desumano de trabalho, os planos
privados de saúde são alvos de crescentes denúncias sobre o péssimo
atendimento aos “clientes” – encarados como pura mercadoria. A demora no
agendamento das consultas, as filas nos consultórios e o atendimento às
pressas, tipo linha de produção fordista, têm irritado cada vez mais o
trabalhador que paga os caríssimos planos de saúde. Muitos inclusive têm
retornado aos hospitais públicos.
Fortalecimento do SUS
A paralisação dos médicos evidencia a gravidade do setor no Brasil.
Nas últimas décadas, ele foi duramente atingido pelo processo
mercantilista de privatização. Atualmente, o setor privado é dono de 69%
dos hospitais. Segundo reportagem de Cida de Oliveira, da Rede Brasil
Atual, “a maior parte da infra-estrutura da saúde no país está nas mãos
da iniciativa privada. Dos cerca de 6,3 mil hospitais, 69% são
particulares e destinam apenas 38% de seus leitos para o Sistema Único
de Saúde (SUS)”.
Célia Maria de Almeida, pesquisadora e coordenadora do Programa de
Desenvolvimento e Inovação Tecnológica em Saúde da Escola Nacional de
Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/Fundação Oswaldo Cruz), avalia que o
setor vive uma encruzilhada. Por um lado, o SUS representou uma
conquista da sociedade, com o aumento da cobertura e a descentralização
da gestão. Por outro, a crescente privatização do setor coloca em risco
estes avanços.
“Houve um aumento expressivo do setor privado, estimulado pelos
governos por meio de incentivos fiscais e de financiamento. Entre os
obstáculos que temos pela frente está o de aumentar o financiamento
federal da saúde, elevando assim investimentos em infra-estrutura”,
observa. Para ela, a questão central é fortalecer o SUS. O poder público
deve rever a sua política de subsidiar o setor privado, ao mesmo tempo
em que investe pouco no setor público.
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Sensação térmica pode chegar a -20ºC no Rio Grande do Sul neste fim de semana
É o Aquecimento Global do estúpido Al Gore |
Uma forte massa de ar
polar vinda diretamente da Antártida está fazendo com que as
temperaturas na região Sul do país despenquem neste fim de semana. Hoje à
noite, especialmente no Rio Grande do Sul, o frio intenso começa a
tomar conta de todas as regiões.
O
vento esperado para amanhã (domingo 3) deixará o mar agitado, com
chance de ressaca na costa, e pode gerar sensação térmica de -20ºC no
norte do Estado, nos Campos de Cima da Serra, onde a mínima deve chegar a
-7ºC.
O início da próxima semana
promete ser de temperaturas abaixo de zero, comparáveis aos casos de
frio mais intenso verificados nos últimos anos, como em julho de 2000,
julho de 2007 e julho de 2009, segundo a empresa de meteorologia MetSul.
A tendência é de tempo aberto, com máximas que não devam superar os
10ºC.
Existe a possibilidade de
nevar em diversas regiões, no entanto, com menos probabilidade do que no
domingo e segunda-feira da semana passada.
As
mínimas devem ficar ao redor de 0ºC ou negativas em quase todos os
municípios do Estado, inclusive em Porto Alegre, com formação de geada
generalizada.
Já no Planalto Sul Catarinense, as mínimas devem ficar entre -5ºC e -7ºC, e até -10ºC em pontos de vales e baixadas.
“Há
neste momento no Cone Sul uma sequência de erupções polares de forte
intensidade sem intervalo de aquecimento como poucas vezes se viu na
história recente dos últimos 10 a 20 anos”, disse o meteorologista Luiz
Fernando Nachtigall.
Cinzas
As
cinzas das erupções no complexo vulcânico Puyehue-Cordón Caulle, no
Chile, chegaram ao RS nesta madrugada. A fuligem está sobre a Fronteira
Oeste, em Uruguaiana (a 649 quilômetros de Porto Alegre), e avança rumo à
região da Campanha, na cidade de Bagé (a 366 quilômetros da Capital).
Na noite deste domingo, as cinzas podem chegar a Porto Alegre, alcançando o norte gaúcho e Santa Catarina.
Até
a metade desta manhã, dois vôos da Gol haviam sido cancelados no
aeroporto Internacional Salgado Filho, em Porto Alegre. Um tinha origem
em Montevidéu (Uruguai), e o outro, Buenos Aires (Argentina).
Fonte: Uol
A esquerda democrática e a revolução cubana
Fernando de La Cuadra
Claudia Hilb. Silêncio, Cuba. A esquerda democrática diante do regime da Revolução Cubana. Trad. Miriam Xavier. São Paulo: Paz e Terra, 2010. 111p.
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Quando
os tanques soviéticos invadiram Praga e o socialismo real se
apresentava aos nossos olhos — junto com o fascismo — como um grande
pesadelo do século XX, a revolução cubana surgia como uma experiência
inédita, diáfana e enaltecedora. E, inclusive, os fuzilamentos que se
seguiram ao triunfo de Santa Clara foram considerados consequências
inevitáveis das dores do parto.
Mas como fazer a critica de uma
revolução que gerou tanta esperança na região e no mundo? Como
questionar um processo que se enraizava nos valores mais elevados da
humanidade, o fim da exploração dos mais desprovidos, dos mais
vulneráveis? Como abordar as práticas autoritárias do regime cubano, sem
fazer causa comum com os setores mais “reacionários”? Estas e outras
perguntas de similar teor acabaram por imunizar Cuba da crítica da
própria esquerda democrática. Por isso, já passadas mais de cinco
décadas desde aquele 1º. de janeiro de 1959, ainda existe um silêncio
cúmplice sobre os erros de rumo de uma revolução que continua
assombrando os intelectuais progressistas e a esquerda assumidamente
democrática.
É precisamente esse silêncio incômodo que estimula a reflexão de Claudia Hilb.
Esta socióloga e cientista política argentina, militante da esquerda
radical, teve de sair para o exílio depois do golpe de 1976. Em Paris,
realizou estudos de pós-graduação e frequentou os seminários de Claude Lefort,
sua principal fonte de inspiração intelectual. Colocada diante da
pergunta sobre a razão pela qual a esquerda democrática tem guardado um
conspícuo silêncio frente aos traços autoritários do regime cubano, ela
tenta responder através da seguinte hipótese: a recusa desta esquerda a
se pronunciar a este respeito se deve, em grande parte, ao fato de que
reconhece o esforço realizado pelo regime em termos de justiça social,
ou seja, este setor da esquerda reconhece “algumas realizações
indiscutíveis do regime em questão, particularmente o fato de igualar as
condições sociais e universalizar o acesso à saúde e à educação” (Hilb,
2010, p. 14).
Mas isso é suficiente para legitimar um regime
político que diz lutar por um mundo mais justo, livre e solidário?
Certamente não. Claudia Hilb decompõe os meandros deste dilema e conclui
com a certeza inquietante de que os esforços pela igualação radical das
condições de vida do povo cubano, na primeira década da revolução,
foram um fenômeno entrelaçado com o processo de concentração total do
poder nas mãos de Fidel Castro.
Ainda mais, no percurso do texto
a autora demonstra consistentemente como uma vocação de dominação
total, sustentada na vontade do líder máximo, transformou o entusiasmo e
a virtude revolucionária em obediência acrítica. De modo análogo, a
gesta revolucionária de inspiração emancipadora produziu, através do
medo, um comportamento oportunista e paralisador dos mesmos sujeitos
ativos da revolução. Ela argumenta que o processo de concentração de
poder nas mãos do Comandante Fidel foi um fenômeno de teor organicista,
pelo qual o líder se vê como reitor de uma sociedade, situado
legitimamente no topo de uma pirâmide a partir da qual o social torna-se
visível em sua plenitude.
Foi assim que, como consequência
inevitável desta visão, Fidel Castro se transformou na encarnação
suprema da revolução. Tudo o que provém dele representa a revolução, e,
como ele mesmo sentenciou na mensagem dirigida aos intelectuais cubanos
no ano seguinte ao seu triunfo, “dentro da Revolução, tudo; contra a
Revolução, nada.”
Desta forma — relata Hilb —, o regime passou a
cooptar ou subordinar a totalidade das dimensões que conformavam a
realidade cubana — as universidades e o movimento estudantil, as
fábricas e os sindicatos, os intelectuais e as entidades da cultura —,
numa velocidade vertiginosa e arrasadora que se consolida já nos
primeiros anos do regime socialista, sepultando qualquer vestígio de
critica, ainda que fosse realizada por eminentes figuras surgidas no
seio da própria luta revolucionária, como Huber Matos, Carlos Franqui ou
Heberto Padilla. O caso deste último foi o mais dramático e patético:
“A lamentável paródia da sua confissão de culpa foi o sinal definitivo
de que a possibilidade de discordar dentro da área cultural
revolucionária ficava eliminada e também foi um sinal que, apesar dos
esforços por ignorar o rumo que a Revolução tomava já há muito tempo,
muitos dos seus antigos amigos já não conseguiram ou quiseram deixar de
ouvir” (Hilb, op. cit., p. 35).
A excepcionalidade da
experiência cubana se transformou no mesmo pesadelo de matriz
stalinista, em que o poder do povo se transforma em poder do partido
revolucionário, deste se transfere para o comitê central e, finalmente, o
dito poder acaba concentrado nas mãos do ditador. Mas o que salienta a
autora, e certamente representa uma importante afirmação, é que este
processo de concentração do poder foi concomitante com as intensas e
veementes ações em prol do nivelamento das condições de vida da
população cubana. As mobilizações espontâneas de apoio à revolução —
como a campanha pela alfabetização, o trabalho voluntário durante a
safra do açúcar — foram constituindo-se numa prática formal destinada a
obter maiores benefícios e prebendas da parte do regime. Por sua vez, à
vasta e incondicional adesão e ao entusiasmo inicial captado pelo
movimento revolucionário seguiu-se um período de desconfiança e medo,
causado pelo crescente e perverso patrulhamento ideológico, a espionagem
e a delação entre vizinhos, fato este não só amplamente documentado em
milhares de relatórios sobre direitos humanos na ilha, mas também em
inumeráveis expressões no campo da cultura (literária e artística), como
o romance de Guillermo Cabrera Infante, Três tristes tigres, ou o livro autobiográfico de Reinaldo Arias, Antes que anochezca, levado posteriormente para o cinema.
Assim,
o regime cubano foi institucionalizando apoios e alimentando medos, e,
paradoxalmente, o custo político evidente de uma manifestação de
descontentamento também se estendeu a uma postura neutra. A
neutralidade, afinal, era uma posição mais sintomaticamente política que
qualquer adesão resignada e conservadora marcada pelo interesse
individual para obter benefícios do governo ou como disfarce diante de
possíveis represálias dos aparelhos de vigilância (por exemplo, os
Comitês de Defesa de Revolução — CDR). A “neutralidade” gerava igual ou
maior suspeita que uma posição decididamente opositora e, em definitivo,
resultava ser tanto ou mais perigosa que o enfrentamento direto: se
falo, sou um inimigo, mas, se não falo, também sou um inimigo em
potencial. Como depois seria emulado pelo socialismo bolivariano, o
regime cubano foi criando uma extensa trama de aduladores e seres
desprezíveis que fazem da complacência acrítica uma fórmula fácil para
ganhar as simpatias do líder e aceder aos privilégios proporcionados
pelo Estado, no melhor estilo stalinista descrito magistralmente por
George Orwell em seu romance distópico 1984.
Neste breve e
contundente ensaio, a autora nos lembra também que o ponto de vista
organicista não é privilégio somente das correntes “reacionárias” do
pensamento, mas também de certas vertentes que se dizem de esquerda ou
socialista. No caso cubano, é sintomático que qualquer arroubo de
crítica tenha sido automaticamente reprimido, qualquer sinal de
pensamento dissidente imediatamente expurgado, qualquer indício de
criatividade distinto do cânon institucionalizado igualmente extirpado,
como um câncer maligno que pretendesse se alastrar pelo conjunto do
corpo social.
Sistemas conceituais fechados de explicações
absolutas e totalizadoras não dão espaço para o debate democrático,
pois, qualquer que seja a natureza do questionamento das restrições às
liberdades políticas e individuais, a resposta quase sempre será que
aquele que age dessa forma pensa a partir de uma perspectiva
“pequeno-burguesa”, razão pela qual possui valores deturpados e uma
compreensão ofuscada da realidade derivada da sua condição privilegiada
de classe. Portanto, não existe espaço para devaneios e diletantismos
teóricos: “dentro da Revolução tudo; contra a Revolução, nada”, segundo o
axioma mencionado. O Comandante encarna, em última instância, o fulgor e
a epopeia revolucionária e, consequentemente, é também quem decide o
que está dentro e o que está fora.
Atribuindo-se a
si mesmo o espírito e o comando da revolução, Fidel conseguiu num breve
período de tempo — durante a primeira década do regime — concentrar
todo o poder do Estado cubano e sufocar qualquer tipo de iniciativa
política que pudesse colocar em risco sua liderança e autoridade. E
precisamente neste ponto a autora nos conduz para uma reflexão
perturbadora a respeito do fato de que a experiência revolucionária
acumulada — Rússia e China, entre outras — nos demonstraria que a
afinidade entre personalização e concentração de poder revolucionário
representa uma tendência constante e inevitável, baseada na “convicção
de que o afã construtivista, a pretensão de moldar de cima a sociedade
está indissoluvelmente ligada à convicção de que esta tarefa deve ser
encarada de modo onipotente desde o ponto mais alto da sociedade”. É aí
que a figura do Líder emerge como uma espécie de alquimia para organizar
o todo social, para definir metas, funções e responsabilidades de cada
um dos membros desse organismo. Assim, durante o processo de construção
da Revolução Cubana esse papel foi concentrado na pessoa de Fidel, que
com seu carisma e liderança resolveria, “definitiva e brutalmente”, a
polissemia revolucionária.
No entanto, esta síntese que define o
destino do povo cubano perde desde muito cedo seu verdadeiro caráter
emancipatório. Se bem que o projeto revolucionário tenha conseguido
resolver drasticamente a desigualdade prevalecente nos tempos de
Batista, ele não permitiu, simultaneamente, realizar os anseios de
autonomia e participação democrática entre os habitantes da ilha. Pelo
contrário, a aspiração liberadora das “garras” da ditadura batistiana
transformou-se num breve espaço de tempo no império da censura, do medo e
da submissão.
Tal contradição do socialismo “realmente existente” já tinha sido denunciada, há anos, por Rudolf Bahro no seu livro Die Alternative
(1977) [1]. Nele o escritor alemão constata — entre outros aspectos —
como o socialismo real dos países da Europa Oriental optou por priorizar
(ainda que com evidentes limitações) a resolução da questão da
igualdade e da justiça social, à custa dos princípios da liberdade civil
e política e do respeito aos direitos de participação democrática e
autorrealização dos cidadãos.
Também em Cuba a pretensão
construtivista e igualitária supôs que um conjunto de valores
coletivistas poderia ser inoculado nas pessoas para que elas superassem o
individualismo e o egoísmo particularista, criando uma entidade — com
características do tipo puro ideal weberiano — chamada de “homem novo”.
Mas este projeto transformador se realizou desde cima, desprezando e
coibindo qualquer pulsão dos indivíduos em prol da formação de um novo organismo
ou corpo social em que primassem os princípios igualitários consagrados
pela épica revolucionária: “A fabricação vertical da sociedade exige
que cada um cumpra um papel que o poder, desde a cúpula, lhe atribui; se
não cumprir por consciência, cumprirá por temor”.
De tal
modo, o desejo de liberdade se transformou em aceitação da opressão, o
Terror e o medo substituíram a adesão e o fervor revolucionário do povo
cubano. Quem não compartilha estes princípios converte-se em traidor e
pária: um gusano [2]. A execração das “Damas de Branco”,
que viraram arquétipo da deslealdade e alvo do repúdio dos populares,
que descarregam contra elas a palavra de ordem: “as ruas são de Fidel”,
expressa sem maiores subterfúgios a consagração de uma sociedade
amordaçada e imobilizada pelo temor.
Por isto, nos interrogamos —
tal como se interroga a autora —, o que resta da promessa da Revolução?
O que resta do sonho libertário e emancipatório que encarnava a façanha
revolucionária dos barbudos? O que dele pode restar para uma esquerda
democrática e plural que acredita na construção de uma sociedade mais
justa, igualitária e livre da opressão? Muito pouco ou nada.
A
Revolução que se fez para igualar e libertar os “de baixo” acabou por se
construir pelo alto, domesticando a população através de mecanismos de
persuasão e de coerção. Transformou-se, assim, na negação da esperança
de um mundo pluralista e tolerante, marca iniludível de um socialismo
moderno que não pode abjurar dos princípios democráticos. Ou quiçá,
também, na negação da esperança de um tipo de socialismo associativo
que, segundo a formulação de Paul Hirst, aspire a constituir-se numa
democracia social alternativa ao socialismo autocrático de Estado e ao
liberalismo do livre mercado [3].
Nesse contexto, adquirem maior significado as palavras do recentemente falecido Antonio Cortés Terzi,
para quem os ideais inovadores e pioneiros de Allende têm mais de
“socialismo do século XXI” que as práticas ortodoxas dos irmãos Castro
ou de Chávez.
Estas últimas parecem aproximar-se mais do legado stalinista do século
passado que de um socialismo renovado e projetado para resolver os
desafios futuros de nossas sociedades.
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Fernando de La Cuadra é sociólogo chileno e membro da Rede Universitária de Pesquisadores sobre a América Latina (RUPAL).
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Notas
[1] No Brasil: A alternativa – Para uma critica do socialismo real. São Paulo: Paz e Terra, 1980.
[2] Este temor ao linchamento social cria paralelamente uma “dupla moral”, uma dissociação entre a moral pública de fidelidade e apoio ao regime e a moral privada, de sobrevivência, que utiliza inúmeros recursos ilegais para resolver restrições e problemas da vida cotidiana.
[3] Paul Hirst. A democracia representativa e seus limites. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992.
[1] No Brasil: A alternativa – Para uma critica do socialismo real. São Paulo: Paz e Terra, 1980.
[2] Este temor ao linchamento social cria paralelamente uma “dupla moral”, uma dissociação entre a moral pública de fidelidade e apoio ao regime e a moral privada, de sobrevivência, que utiliza inúmeros recursos ilegais para resolver restrições e problemas da vida cotidiana.
[3] Paul Hirst. A democracia representativa e seus limites. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1992.
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Chile deve apresentar reforma educacional nos próximos dias
O subsecretário chileno da Educação, Fernando Rojas, disse nesta
sexta-feira (01) que o presidente Sebastián Piñera apresentará nos
próximos dias o projeto de reforma da educação, que estará centrado no
“financiamento estudantil”.
“Temos que nos encarregar de um sistema que dê acesso, que dê financiamento adequado e que reduza os custos que a educação superior tem para as famílias chilenas”, disse Rojas, em uma entrevista para a rádio Cooperativa.
“Temos que nos encarregar de um sistema que dê acesso, que dê financiamento adequado e que reduza os custos que a educação superior tem para as famílias chilenas”, disse Rojas, em uma entrevista para a rádio Cooperativa.
Segundo o subsecretário, o projeto será discutido no Congresso e “tem
que abordar matérias de qualidade”, assim como “a criação da
Subsecretaria da Educação Superior”. Em relação às recentes
manifestações, o representante do Ministério da Educação disse que os
jovens estão fazendo um chamado. “Temos que deixar de brigar e ir
trabalhar”, acrescentou.
Ontem à noite, depois de encerrados os protestos, Piñera convocou
vários ministros para analisar a marcha e estudar um projeto com o qual o
governo espera superar o conflito. Cerca de 400 mil pessoas se
mobilizaram ontem em seis cidades do país durante uma manifestação
convocada pela Confederação de Federações de Estudantes do Chile e pelo
Colégio de Professores, segundo o balanço entregue por ambas as
organizações.
Líder do Colégio de Professores, Jaime Gajardo, afirmou que o
movimento “vai continuar” e anunciou que já está sendo preparada uma
nova marcha nacional que pedirá a renúncia do ministro da Educação,
Joaquín Lavín. Segundo ele, essa “foi uma jornada de sucesso,
monumental, grandiosa, de caráter nacional”.
A maioria dos manifestantes, que ocuparam a principal avenida da
capital Santiago, é composta por estudantes universitários e
secundários, além de professores e funcionários públicos, que lutam por
melhores condições de trabalho e salário.
Com Ansa
Moradora de Hulha Negra é sétima vítima fatal da gripe A no RS
A Secretaria de Saúde do Rio Grande do Sul confirmou mais uma morte
causada pela gripe A H1N1 no Estado. O óbito, ocorrido em Hulha Negra, é
o sétimo caso fatal de gripe a ser registrado no Rio Grande do Sul. A
vítima, segundo o Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS), é uma
mulher de 55 anos, portadora de diabetes e que não tinha sido vacinada
contra a doença.
Até o momento, foram confirmados 37 casos de gripe A no RS. Em um
total de 536 notificações, ainda existem 134 casos sob investigação. Os
demais foram descartados. Segundo a chefe da Divisão de Vigilância
Sanitária do CEVS, Marilina Bercini, a situação está sob controle e não
está caracterizada uma epidemia de gripe a H1N1 no Rio Grande do Sul.
Um lote de 140 mil doses de vacina monovalente foi entregue no RS
nesta sexta-feira (1º). O plano da Secretaria de Saúde é distribuir as
vacinas no decorrer da semana que vem, priorizando áreas onde foram
registrados casos de gripe A.
Com informações da Secretaria de Saúde do RS
sexta-feira, 1 de julho de 2011
Consumidor trabalhador
E
o consumidor vai ao supermercado, enche o carrinho, fica na fila do
caixa; monta seu kit de móveis, instala seu decodificador de TV, ativa
sua conexão de internet; procura a referência da conexão da torneira do
banheiro, aprende a usar programas de computador, lê manuais...
|
por Laurent Cordonnier no LE MONDE - BRASIL |
Folga não é necessariamente descanso. Já sabemos que, quando o
trabalhador – e a trabalhadora, em especial – não está “no trabalho”,
ele continua a labutar, porque o tempo gasto em tarefas domésticas
ultrapassa o usado no trabalho remunerado.1 Mas prestamos
menos atenção ao fato de que ele consome e, como consumidor, muitas
vezes trabalha de graça para as empresas ou governos... para terminar,
justamente, o trabalho. Ele lê revistas de consumidores, faz pesquisas
na internet, organiza seus projetos, reserva suas passagens de trem; vai
ao supermercado, enche o carrinho, fica na fila do caixa; monta seu kit
de móveis, instala seu decodificador de TV, ativa sua conexão de
internet; procura a referência da conexão da torneira do banheiro,
aprende a usar programas de computador, lê manuais... e volta alguns
dias depois ao serviço de suporte de vendas, quando não ao balcão de
reclamações.
Se o consumidor trabalha, pode-se dizer que ele faz isso porque quer.
Participar da produção de bens de consumo seria uma forma agradável de
fazer horas extras, que não são pagas diretamente, mas na verdade
economizam o salário (permitindo comprar mercadorias mais baratas que
estão inacabadas). Para quem é corajoso e aprecia o “faça você mesmo”,
essa oferta de trabalho voluntário tem também a vantagem de não estar
exposta ao risco de desemprego. É um daqueles casos excepcionais, como o
de Robinson Crusoé em sua ilha, em que basta querer trabalhar para
encontrar um emprego. Alguns até defendem que esse trabalho benévolo é o
grau de autonomia que nos é oferecido, a oportunidade de não sermos
consumidores passivos. A figura do trabalhador manual hábil, do amador
entusiasta, da pessoa competente em consertar coisas, do “Consumidor
Atuante”, está sempre pronta para aparecer em cena.
O consumidor-trabalhador achará, no entanto, difícil admitir – porque
seu trabalho é também o de “positivar” esses momentos –, mas esse grau
de autonomia não é, realmente, opção sua. Tal como seu vizinho, ele leva
seus sapatos ao sapateiro, remove sua bandeja de fast-food,
preenche páginas de informações pessoais no momento da compra on-line,
passa as manhãs de sábado nas lojas tentando encontrar um armário de
rodinhas que não é mais fabricado... Mesmo que ele venha a desfrutar a
“liberdade” – uma ideia que alguém colocou em sua cabeça – de reservar
sua passagem de trem pela internet, de pijama, sentado confortavelmente
em sua cama, para sua viagem de negócios do dia seguinte, ele sabe,
talvez lá no fundo, que não está usando seu tempo livre para ir pescar. O
trabalhador ainda ousará, às vezes, admitir que não tem muita escolha,
as filas são longas nas bilheteiras da estação... Pois é desenvolvendo
todo tipo de alternativa desagradável para o consumidor que, este,
finalmente, achará mais conveniente fazer o serviço ele mesmo. O manejo
cuidadosamente calculado das filas nos correios, na Previdência Social,
no supermercado é certamente uma das artes consumadas da gestão
neoliberal, que consiste em transformar o comportamento de repúdio do
consumidor em uma marcha heroica para a liberdade de escolha.
Tornando-se um trabalhador, o consumidor descobre a produtividade. Que
vergonha se ele não tiver a destreza suficiente para parecer um ás do
caixa rápido. Ele vai sentir na nuca a respiração silenciosa e irritada
dos clientes na fila. O imperativo da produtividade o persegue até
quando sai de férias, quando ouve, encantado, as instruções da
recepcionista da companhia aérea para sua autorreserva que irá,
eventualmente, eliminar o próprio trabalho dela. Aos poucos, porém, ele
recebe algumas pequenas recompensas que lhe trarão a alegria de enfim
ter alcançado a conformidade: os caixas rápidos não lhe metem mais medo;
ele pilota com virtuosismo os terminais automáticos da empresa
ferroviária; sabe finalmente atualizar a licença de seu antivírus. O
consumidor certamente ganha competência. Mas, para fazer disso algo
totalmente positivo, seria necessário esconder o fato de que esse tipo
de qualificação – inegavelmente importante, pois sua ausência poderia
torná-lo inviável, social e economicamente – é apenas uma chave que abre
e fecha todas as portas de uma prisão... sem nunca se ver a luz do dia.
Em última análise, de que se ocupa o consumidor – como é que ele se
torna cada vez mais um trabalhador? Ele está ocupado esvaziando com uma
pequena colher o oceano de destroços de uma sociedade que teremos de
chamar um dia de “sociedade da pane”. Tudo o que funciona, tudo o que
pode ser feito sem muita dificuldade, tudo o que é regular (normal,
rotineiro, repetitivo), tudo o que “vai bem”, que “flui”, em suma, tudo o
que é suscetível de sucesso fácil tem sido confiado a autômatos
(tecnológicos ou de procedimento). Mas em um mundo em que o registro da
ação humana foi reduzido, de forma mortal, pelas operações técnicas,
confiar a melhor parte (as ações que produzem) às máquinas é morrer
antes do tempo.
A sociedade de serviços não tem se tornado o recipiente, muitas vezes lucrativo,2
sempre bastante mórbido, dessa economia de pane? Uma economia que faz
que as oportunidades de encontro, intercâmbio e troca de palavras se
realizem em torno do fracasso: nos balcões de serviço ao consumidor, no
guichê de reclamações, no pronto-socorrodo hospital, na delegacia, ou
seja, onde quer que se forneçam as soluções para colocar de volta nos
trilhos de um protocolo automatizado uma situação que foge das normas,
um caso difícil, um mal-entendido, aquilo que escapou por um momento. Os
funcionários que trabalharam durante todo o fim de semana encontram na
segunda-feira, no emprego, os náufragos do protocolo: aqueles para quem o
tratamento de antibióticos não funcionou (os pacientes curados
raramente retornam para cumprimentar o médico), os que perderam sua
correspondência, o viajante que teve sua bagagem extraviada no
aeroporto, os analfabetos que “não compreenderam direito” os termos do
contrato de empréstimo ao consumidor, um inquilino que não paga o
aluguel há três meses...
Marcadas com o selo do fracasso, do fiasco, da má sorte, as
oportunidades que nos são dadas para “restaurar algo de humano em tudo
isso” se transformam em amargura, desconfiança, queixas e protestos
vazios. Sentimo-nos então quase apaziguados quando todas essas
respostas, como a descarga de agressividade que acabamos de lançar no
sistema de telemarketing de nosso provedor de internet, são capturadas
de forma higiênica e retificadas por uma salva de boas maneiras
formulada também automaticamente: “Obrigado por sua confiança, Sr.
Robinson; a empresa Quesabeoquefaz lhe deseja uma boa noite!”.
A ambição de automatizar os excessos do sistema pode ser nosso novo
Eldorado. Começamos a sonhar, imperceptivelmente, com coisas que
poderiam funcionar “realmente bem”. De repente passamos a sentir a
satisfação narcisista de nos reconhecer nesse universo de causalidades
implacáveis, dissimulando cada vez menos nosso entusiasmo tecno-cool.
Como dizia André Gorz, “a mente, que se torna capaz de funcionar como
uma máquina, se reconhece na máquina capaz de funcionar como ela – sem
perceber que na verdade a máquina não funciona como o espírito, mas
apenas como o espírito que aprendeu a funcionar como uma máquina.”3
Laurent Cordonnier é economista e mestre de conferências da Universidade Lille-I. Autor de Pas de pitié pour les gueux (Nenhuma piedade para os miseráveis), Paris, Raisons d'Agir, 2000 e de L’Economie des Toambapiks, Raisons d’Agir, Paris, 2010.
Ilustração: André Dahmer *Laurent Cordonnier, economista, é autor de A economia dos Toambapiks: uma fábula que não tem nada de ficção, Raisons d’agir, Paris, 2010.
1 Estimada entre um quarto e três quartos do Produto Interno Bruto, a
autoprodução dos serviços domésticos não se reflete na contabilidade
nacional, em parte porque são as mulheres que a realizam.
2 Ver Tahar ben Jelloun, “34 centavos de euro por minuto”, Le Monde, 10-11 de outubro de 2010.
3 André Gorz, Metamorfoses do trabalho: Busca de sentido, Galilée, Paris, 1988. |
O governo Tarso e algumas gotas de governo Olívio
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Marco Aurélio Weissheimer |
Alguns leitores fizeram
referência ao governo Olívio Dutra no contexto do debate sobre o Plano
de Sustentabilidade Financeira apresentado pelo governo Tarso Genro à
Assembleia Legislativa. Estaria faltando, segundo eles, algumas “gotas
de governo Olívio” ao atual governo. A referência é interessante e
oportuna, pois permite lembrar alguns episódios, no início do governo
Olívio que, de certo modo, se repetem agora.
Em maio de 1999, o CPERS realizou uma acalorada assembleia geral no Ginásio Tesourinha. O governo Olívio contava, então, com cinco meses de vida e foi alvo de pesadas críticas, entre outras coisas, por não dar o aumento pretendido pelos professores e por não suspender o pagamento da dívida à União. Argumentava-se que se o governo suspendesse o pagamento da dívida poderia dar um aumento de 99,9% para os professores (não lembro bem se era exatamente esse o valor, mas a ideia era essa). Ali se configurou um bloco partidário dentro do PT que faria oposição “interna” ao longo de todo o governo. O grupo ligado à então deputada estadual Luciana Genro era um dos principais protagonistas desse movimento que contou com o apoio direto ou indireto (pelo silêncio) de outras importantes correntes petistas, formando uma indigesta mistura de esquerdismo e oportunismo.
Na assembleia em questão, chegou-se a apresentar uma proposta para o lançamento de uma campanha de outdoors apresentando os nomes e as fotos de Olívio Dutra, Miguel Rossetto (vice-governador) e Flávio Koutzii (chefe da Casa Civil) como “traidores”. A proposta, apoiada por boa parte da mesa, acabou sendo rejeitada pela maioria da assembleia.
A lembrança é oportuna, uma vez que, nos últimos dias, ouviram-se gritos semelhantes em função principalmente da proposta de Reforma da Previdência, apresentada pelo governo Tarso. O mesmo ocorreu, aliás, no início do primeiro governo Lula, também com a Reforma da Previdência. Acusações enfáticas de “traição” cruzaram os ares com muita rapidez. Nesta terça-feira, foi a vez de Raul Pont receber essa acusação de servidores que estavam nas galerias da Assembleia.
Hoje, ironicamente, alguns petistas e não petistas críticos do governo Tarso lembram com saudade do governo Olívio, sem lembrar, porém, que, naquele período, as acusações de “traição” também foram esgrimidas nos primeiros meses de governo. Algumas das vozes que denunciaram a “traição” naquele maio de 1999 saíram do PT, outras seguem no partido e ocupam hoje cargos de governo. Muitas dessas vozes iradas e enfáticas modulam o seu volume de acordo com as circunstâncias.
O tema do financiamento da Previdência Pública e do Estado é extremamente polêmico e costuma ser causa desse tipo de acusação. O governo Tarso está jogando uma cartada audaciosa, contando com a maioria política que construiu na Assembleia Legislativa, o que se tratando da história do PT no Rio Grande do Sul, é uma novidade importante. A aprovação do projeto terá um custo político sem dúvida, cuja dimensão, porém, dependerá do desempenho geral do governo em seus quatro anos. Se Tarso mantiver a Previdência Pública, se não privatizar empresas públicas, se revitalizar a democracia participativa no Estado, se conseguir recursos para fazer novos investimentos no Estado e implementar políticas sociais que beneficiem os setores mais pobres da população terá feito um bom governo.
As “gotas do governo Olívio” desejadas por alguns deveriam servir para refrescar a memória política de quem já esqueceu que aquele governo apontado, justificadamente, como uma referência para a esquerda, foi acusado de traição com cinco meses de vida, sofreu uma oposição interna dilacerante – além da externa, não menos virulenta – e que acabou derrotado numa prévia interna absurda pelo atual governador. A vida dá voltas estranhas e irônicas. Não seria nada mal que as pessoas tentassem aprender um pouco com elas. Se Lula, Olívio Dutra, Tarso Genro, Raul Pont, Miguel Rossetto e Flavio Koutzii são os “traidores” quem é que são mesmo os “heróis”???
Em maio de 1999, o CPERS realizou uma acalorada assembleia geral no Ginásio Tesourinha. O governo Olívio contava, então, com cinco meses de vida e foi alvo de pesadas críticas, entre outras coisas, por não dar o aumento pretendido pelos professores e por não suspender o pagamento da dívida à União. Argumentava-se que se o governo suspendesse o pagamento da dívida poderia dar um aumento de 99,9% para os professores (não lembro bem se era exatamente esse o valor, mas a ideia era essa). Ali se configurou um bloco partidário dentro do PT que faria oposição “interna” ao longo de todo o governo. O grupo ligado à então deputada estadual Luciana Genro era um dos principais protagonistas desse movimento que contou com o apoio direto ou indireto (pelo silêncio) de outras importantes correntes petistas, formando uma indigesta mistura de esquerdismo e oportunismo.
Na assembleia em questão, chegou-se a apresentar uma proposta para o lançamento de uma campanha de outdoors apresentando os nomes e as fotos de Olívio Dutra, Miguel Rossetto (vice-governador) e Flávio Koutzii (chefe da Casa Civil) como “traidores”. A proposta, apoiada por boa parte da mesa, acabou sendo rejeitada pela maioria da assembleia.
A lembrança é oportuna, uma vez que, nos últimos dias, ouviram-se gritos semelhantes em função principalmente da proposta de Reforma da Previdência, apresentada pelo governo Tarso. O mesmo ocorreu, aliás, no início do primeiro governo Lula, também com a Reforma da Previdência. Acusações enfáticas de “traição” cruzaram os ares com muita rapidez. Nesta terça-feira, foi a vez de Raul Pont receber essa acusação de servidores que estavam nas galerias da Assembleia.
Hoje, ironicamente, alguns petistas e não petistas críticos do governo Tarso lembram com saudade do governo Olívio, sem lembrar, porém, que, naquele período, as acusações de “traição” também foram esgrimidas nos primeiros meses de governo. Algumas das vozes que denunciaram a “traição” naquele maio de 1999 saíram do PT, outras seguem no partido e ocupam hoje cargos de governo. Muitas dessas vozes iradas e enfáticas modulam o seu volume de acordo com as circunstâncias.
O tema do financiamento da Previdência Pública e do Estado é extremamente polêmico e costuma ser causa desse tipo de acusação. O governo Tarso está jogando uma cartada audaciosa, contando com a maioria política que construiu na Assembleia Legislativa, o que se tratando da história do PT no Rio Grande do Sul, é uma novidade importante. A aprovação do projeto terá um custo político sem dúvida, cuja dimensão, porém, dependerá do desempenho geral do governo em seus quatro anos. Se Tarso mantiver a Previdência Pública, se não privatizar empresas públicas, se revitalizar a democracia participativa no Estado, se conseguir recursos para fazer novos investimentos no Estado e implementar políticas sociais que beneficiem os setores mais pobres da população terá feito um bom governo.
As “gotas do governo Olívio” desejadas por alguns deveriam servir para refrescar a memória política de quem já esqueceu que aquele governo apontado, justificadamente, como uma referência para a esquerda, foi acusado de traição com cinco meses de vida, sofreu uma oposição interna dilacerante – além da externa, não menos virulenta – e que acabou derrotado numa prévia interna absurda pelo atual governador. A vida dá voltas estranhas e irônicas. Não seria nada mal que as pessoas tentassem aprender um pouco com elas. Se Lula, Olívio Dutra, Tarso Genro, Raul Pont, Miguel Rossetto e Flavio Koutzii são os “traidores” quem é que são mesmo os “heróis”???
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