sábado, 8 de novembro de 2008


A Casa Branca não tem leito de rosas
A histórica eleição do primeiro afro-americano à presidência dos Estados Unidos foi refletida, em diferentes nuanças, por três dos principais atores desse drama.Barack Obama, em seu discurso de aceitação, adotou um modelo tradicional. Elogiou o sistema político norte-americano e proclamou que "a mudança chegou à América (Estados Unidos)". Continuou parabenizando McCain e Sarah Palin; o vice-presidente eleito, Joseph Biden; sua família, com recordação especial para sua recém-falecida avó materna; reconheceu sua equipe de campanha e, sobretudo, os dois principais integrantes: David Plouffe e David Axelrod. Agradeceu o voto do cidadão comum e instou a assumir "um novo espírito de sacrifício... de trabalho duro e a preocupar-nos não só por nós, mas por todos os outros". Concluiu anunciando "um novo amanhecer para a liderança norte-americana" e proclamou a vigência do que considerou os "ideais" dos Estados Unidos: democracia, liberdade, oportunidade e esperança, embora sem definir nenhum deles.McCain reconheceu seu derrota perante uma congregação de seguidores em Phoenix, Arizona. Mostrou seu racismo oculto, enfatizando, a respeito da vitória, "o significado que tem para os afro-americanos e o orgulho especial que eles sentem nesta noite".O presidente Bush foi condescendente ao chamar Obama para felicitá-lo em nome de sua esposa Laura e no seu próprio; disse-lhe que tinha sido "uma noite assombrosa para o senhor, sua família e aqueles que o apóiam", e exortou-o a "desfrutá-la".A vitória pode ser analisada de vários pontos de vista, especialmente a dos resultados da eleição presidencial e do Congresso.A estratégia eleitoral aplicada por Obama na eleição presidencial, teve resultados ótimos. Ganhou a eleição em todos e cada um dos estados em que venceu o democrata John Kerry em 2004 e arrebatou a vitória aos republicanos em nove estados que Bush ganhou nessa mesma eleição: Virgínia (desde 1964, sempre elegeu o candidato republicano); Carolina do Norte (desde 1980, sempre elegeu o republicano); Indiana (sempre o republicano desde 1968); Colorado (igual, desde 1996), Iowa, Nevada, Ohio e a Flórida (elegeram Bush em 2000 e em 2004); e Novo México (ganho por Bush por estreita margem em 2004). Os nove deram 112 votos eleitorais a Obama. Ainda, na quinta-feira, a votação em Missouri não estava decidida, mas inclinava-se para McCain. Em Nebraska está ainda por decidir o voto eleitoral dum distrito. Com estes dados, Obama foi eleito por 364 votos eleitorais sobre os 173 obtidos por McCain (adjudicando-lhe os onze de Missouri), uma ampla margem, mas coloca Obama no oitavo lugar das votações mais altas obtidas pelos presidentes eleitos nas 12 eleições realizadas desde 1964.No chamado voto popular em nível nacional, com 120.884.874 votos escrutados, Obama obteve 52,5% (64.248.825 votos) e McCain 46,2% (56.635.874), dentro dos prognósticos feitos numa eleição deste tipo.De acordo com as pesquisas realizadas aos eleitores à saída das urnas, Obama ganhou pelo voto das mulheres (13% a mais que McCain, embora 7% menos entre as mulheres brancas), dos hispano-americanos, dos negros e dos jovens, obtendo, nessa ordem, 66%, 95% e 66% dos votos. Chama também a atenção que os 75% dos judeus votaram em Obama e que o voto dos católicos brancos foi igual nos dois candidatos, enquanto a direita religiosa evangélica favoreceu novamente o candidato republicano, embora Obama obtivesse 4% a mais de votos deste setor que os ganhos por Kerry em 2004.Ainda que Obama perdesse para McCain no voto da população branca, seu desempenho nesse setor foi semelhante ao de Al Gore em 2000 e ao de Kerry em 2004, o que indica que o fator étnico não prejudicou Obama e até pode tê-lo favorecido, devido à ampla maioria de afro-americanos e hispano-americanos que o apoiaram.Enquanto os eleitores foram identificados nas pesquisas como conservadores, moderados e liberais em percentagens similares às das eleições de 2004, houve mudanças na afiliação política, pois incrementou-se a de democratas para 40%, sendo a de republicanos de 32%. Em 2004, houve a mesma percentagem de democratas e republicanos.Em resumo, Obama ganhou, graças ao apoio esmagador da tradicional base democrata e de grande parte do eleitorado que se qualifica como "independente". Os comentaristas destacam o consenso sobre o ambiente das eleições, que num artigo do The New York Times é qualificado de "catarse nacional", resultado da profunda impopularidade do presidente Bush, do repúdio a suas políticas econômicas e externas, do descontentamento com as guerras no Iraque e no Afeganistão, da eclosão da crise financeira e da aceitação do apelo de Obama a uma mudança da direção em que o país está encaminhado.As eleições do Congresso federal foram da maneira esperada. Os democratas conseguiram ampliar o número de senadores e representantes, consolidando o controle de ambas as câmaras atingido em 2006. Contudo, fracassaram na difícil tarefa de alcançar os 60 senadores, e na Câmara dos Representantes também não chegarão ao objetivo máximo (mais 30 vagas). Por enquanto, elegeram 19 novos legisladores, quando ainda estão contabilizando-se os votos em dez disputas.O Partido Democrata terá a maioria de, pelo menos, 56 senadores, ao derrotar os republicanos John Sununu, de New Hampshire, e Elizabeth Dole, de Carolina do Norte e ganhar as disputas abertas da Virgínia, Colorado e Novo México. Ainda há quatro eleições de senadores por resolver no Alasca, Oregon, Minnesota e Geórgia; os democratas parecem ter alguma possibilidade de vitória em Oregon e Minessota. Para frear as tácticas parlamentares de "fraude", com as quais os opositores republicanos e conservadores pretendem bloquear a agenda legislativa de Obama, será necessário o apoio de alguns senadores republicanos, fato que obrigaria o novo presidente a fazer concessões em seu programa de governo.Na Câmara dos Representantes, a situação aponta igualmente para a necessidade de trabalhar por consenso, já que muitos dos novos eleitos pelo Partido Democrata são de tendência conservadora e alguns dos republicanos derrotados eram de inclinação moderada. Portanto, os conservadores verão suas fileiras reforçadas, acima de diferenças partidárias.Obama terá que governar um país mergulhado numa crise econômica somente comparável à Grande Depressão que começou em 1929, mas agora com uma econmia globalizada; com dois impopulares guerras em curso; com uma gigantesca burocracia federal, estadual e municipal; com o país endividado tanto no contexto governamental quanto no familiar; com recursos financeiros insuficientes para cumprir suas promessas eleitorais de melhoras à saúde, à educação e à previdência social.Estas questões precisam de sua atenção desde o mesmo momento em que foi eleito e não podem ser adiadas durante as sete semanas do chamado período de "transição", quando se efetua a entrega de poder da administração Bush à administração Obama. Entre os assuntos governamentais que Obama não pode deixar de lado, está a elaboração, proposta e aprovação pelo atual Congresso federal de um novo plano de estímulo à economia, que segundo estimativas será de US$100 bilhões, o qual precisará da atenção imediata e prioritária de Obama. Também deverá atender a conclusão das negociações dum acordo com o Iraque que defina o papel, a duração da presença e as condições em que atuarão as tropas de ocupação norte-americanas. E, com certeza, não poderá estar à margem das negociações sobre a situação econômica mundial do Grupo dos 20, convocado por Bush em Washington para o próximo 15 de novembro.Nestas circunstâncias, a equipe de campanha eleitoral será substituída pela "equipe de transição". Segundo informações disponíveis, já Obama nomeou uma "troika" para dirigir esse processo. É composta por John Podesta, ex-chefe da equipe da Casa Branca de Bill Clinton, que projetou em 2000 o procedimento de transição atualmente vigente; Valerie Jarrett, assessora muito próxima de Obama; e Pete Rouse, o atual chefe do Gabinete do Senado de Obama em Washington.Como complemento do processo de "transição", soube-se que Obama nomeou chefe de Equipe da Casa Branca o congressista por Illinois e amigo próximo, Emanuel Rahn.O maior desafio que Obama enfrenta agora e deverá enfrentar nos meses próximos é estabelecer suas prioridades; consolidar a colaboração com os líderes democratas do Congresso; conseguir o apoio, a suas principais medidas, dos republicanos e conservadores do Congresso; atender e satisfazer ao máximo as promessas eleitorais que mobilizaram diferentes setores e grupos da população em seu apoio. E, sobretudo, mostrar que para governar conta com a mesma inteligência, capacidade, habilidade e destreza que lhe deu a vitória nas eleições de 4 de novembro. Caso contrário, sua passagem pela presidência poderia ser efêmera e descumprir a expectativa de mudança que prometeu e com cuja bandeira chegou à Casa Branca. Obama sabe disso. Na Casa Branca não há leito de rosas.
* O autor é especialista em Relações Internacionais e foi chefe da Repartição Consular de Cuba nos Estados Unidos de setembro de 1977 a abril de 1989.
Fonte: Granma

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

A maior piada do mundo

A maior piada do mundo foi dita ontem durante reportagem do 'brother' Pedro Bial, veiculada ao longo da excitada cobertura do Jornal Nacional. Pra ele, os EUA seriam a maior democracia do mundo. Curioso conceito de democracia... No mesmo texto o "jornalista" entrevista uma cubana raivosa, que quase cospe a dentadura ao esbravejar que esperaria quantas horas fossem necessárias para exercer seu divino direito ao voto, já que de onde ela vem não teria esse direito. A TV Globo é mesmo incrível. Consegue sustentar duas gigantestas mentiras ao mesmo tempo: que em Cuba não existem eleições e que nos EUA quem decide é o povo. O que a empresa da família Marinho esconde, assim como as demais corporações de mídia, é que as eleições nos EUA do século XXI ainda são INDIRETAS. Pouco importa se a palavra grega "democracia" seja a junção dos termos "demos" (povo) e "krátos" (governo, poder). Nos EUA quem decide mesmo é o Colégio Eleitoral. O vencedor será aquele que conquistar 270 delegados ou mais. Foi assim que Bush venceu em 2000 e em 2004, além de ter fraudado as urnas na Flórida - com o assentimento do Partido Democrata. "A maior democracia do mundo" comemora o índice recorde de 66% de comparecimento às urnas, lembrando que lá o voto não é obrigatório. Mas o fato de em Cuba esse índice ser de 98% não chama a atenção dessa mídia, apesar de também não ser obrigatório sair de casa no dia da votação.A noção da Globo de democracia, traduzindo para o português, é a seguinte: "um sistema é democrático enquanto servir para quem está inserido na sociedade de consumo. Continua sendo democrático mesmo se houver excluídos. Continua sendo democrático mesmo se esses excluídos passarem fome, morrerem de doenças curáveis, serem analfabetos ou não terem onde morar. Além disso, pouco importam os genocídios e a existência de campos de tortura espalhados pelo mundo, como Abuh Graib e Guantánamo". Por isso chamam os EUA de "a maior democracia do mundo".PS: Outra mentira divulgada com naturalidade pelas corporações de mídia é a noção de que os estadunidenses são "americanos". Está na boca de qualquer telejornal ou radiojornal e nas vinhetas várias dos jornais e revistas. Ao aceitar com servilidade a imposição de Washington, as corporações de mídia reforçam a dominação cultural do império, que atua com base na velha máxima da Doutrina Monroe: "América para os americanos", que na verdade pode ser traduzida para "América para os estadunidenses", já que americano é quem nasce em qualquer lugar do continente americano e não consta que um mexicano pobre, por exemplo, tenha o mesmo acesso ao território e às riquezas do continente que um canadense rico. Quando aceitamos a usurpação do termo, estamos de alguma forma aceitando a idéia de que os EUA têm o direito de controlar todo o continente americano. Ao mesmo tempo, toda a raiva que sentem dos EUA mundo afora acaba respingando nos americanos não-estadunidenses, que por serem americanos responderão pelas agressões da América.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Mongo Santamaria - Skin on Skin The Anthology (1958 - 1995)

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Mongo Santamaria - Skin on Skin The Anthology (1958 - 1995)
CD 1 @ 320

01 Afro Blue
02 Chano Pozo
03 Yambu
04 Mongorama
05 Barandanga
06 Guaguanco Mania
07 Para Ti
08 Las Guajiras
09 Tenderly
10 Bacoso
11 Introduction by Symphony Sid
12 My Sound (conga drum solo)
13 Canta Bajo
14 Watermelon Man
15 Sweet Tater Pie
16 Dirty Willie
17 Happy Now
18 Cuidado

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Mongo Santamaria - Skin on Skin The Anthology (1958 - 1995)
CD 2 @ 320

01 Cinderella
02 Black Stockings
03 Summertime
04 Cold Sweat
05 Fever
06 Adobo Criollo
07 Hippo Walk
08 Saoco
09 Sofrito
10 Virtue
11 Forked Tongue
12 Little Angel
13 Mayeya
14 Manteca
15 Bahia
16 Panamanian Aire

Total : 344,48MB

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Aracruz estima prejuízo de US$ 2,13 bilhões




















Maior fabricante de celulose de eucalipto do mundo, a Aracruz anunciou nesta terça-feira (4) que eliminou 97 por cento de sua “exposição a instrumentos derivativos de investimento”, sofrendo uma perda total de 2,13 bilhões de dólares, informa matéria da Agência Reuters. A Aracruz anunciou que chegou a um acordo com os bancos utilizados pela empresa nestas operações com derivativos. Segundo a empresa, por meio deste acordo as partes vão negociar "de boa-fé", até 30 de novembro, os termos da reestruturação dos valores devidos nessas operações (alongamento da dívida). A operação desastrada com os derivativos obrigou a Aracruz a suspender investimentos previstos para a ampliação da fábrica de celulose de Guaíba (RS) e para a compra de terras e formação de novas lavouras de eucalipto na Bahia e em Minas Gerais.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

A luta de classes persiste


Jorge Zabalza entrevistado por J. L. Berterretche, V. Loss e H. Peña.
www.alquimia.org

Quem é Jorge Zabalza? Jorge Pedro Zabalza Waksman nasceu na cidade de Minas, Uruguai, em 1943. Zabalza, “El Tambero” como é conhecido pelos movimentos sociais, foi dirigente do Movimento de Liberação Nacional Tupamaros – um dos movimentos guerrilheiros mais importantes da história da América Latina.

Zabalza esteve preso como refém no período nefasto da ditadura no Uruguai, governo de fato coincidente com todos os outros que assolaram e sacrificaram os povos da região entre os anos 70 e 80. Foi vereador de Montevidéu e exerceu a presidência da Câmara de Vereadores. Com uma posição crítica firme e uma coerência histórica incomparável, nestes tempos em que muitos dos principais dirigentes da esquerda uruguaia têm se entregado ao canto de sereia do neoliberalismo, Zabalza expressa ao Portal Desacato sua posição com ênfase e sem eufemismos inúteis. (N.R.)

DESACATO: - A quase quatro anos da experiência uruguaia com o governo progressista dá a impressão de que foi descartada tanto a reforma como a revolução. A opção parece ter sido o social-liberalismo. Que balanço você faz do governo atual?

Jorge Zabalza: - A herança que vem com a história do movimento popular constitui um mandato ético e moral que, segundo acredito, não tem sido ouvido pelo governo progressista. Há três parâmetros que dão a medida desse desconhecimento:

1) Durante o governo progressista cresceu a produção e cresceram as exportações do Uruguai, mas enquanto em 2004 a massa salarial era 30% do produto nacional, na atualidade se reduziu para 20%. Pese ao crescimento geral da riqueza, os ricos cada vez se apropriam de maior parte do bolo e os pobres cada vez recebem menos. Está comprovado que o novo imposto à renda não mexe no capital. Pode se disser que os conselhos de salário não conseguiram impedir que a redistribuição da riqueza funcionasse em favor dos que mais têm, aprofundando cada vez mais a brecha social. Fracassaram.

2) A pesar de ser verdade que há ditadores e verdugos presos, mesmo que seja em jaula de ouro, são as organizações e os advogados de Direitos Humanos os que devem manter viva a iniciativa por Verdade e Justiça. O governo progressista se limita a deixar os criminosos fora do marco protetor da lei de Caducidade ao contrário de brancos e colorados. A força política dos desaparecidos, assassinados e torturados deve ter uma atitude mais ativa e o companheiro Sr. Presidente deveria ordenar que os fiscais investiguem e processem tantos terroristas de Estado que estão soltos (o verdadeiro problema em matéria de falta de segurança). O que, pelo menos, se negaria a que as arcas do povo pagassem os advogados que os defendem a eles e aos três assassinos processados no Chile. A negativa a anular a lei de Caducidade (mesmo que com lei ou sem lei, a impunidade continue) e manter terroristas nos mandos das Forças Armadas e a Polícia, são uma mensagem clara de que os setores mais reacionários interpretam como consentimento e debilidade. Estão entreabrindo portas a futuros desmandos e golpes militares.

3) Em tempos de luta pela segunda independência da América Latina, uma luta favorecida pela recessão produtiva e a fraude financeira nos EUA, o governo progressista do Uruguai mantém uma política de muito boas maneiras com o imperialismo. Em lugar da solidariedade com os povos irmãos, uma espécie de neutralidade pela via de não tomar posições claras nos foros continentais. Se proclama que dá na mesma comerciar com deus que com o diabo, como se o comércio não tivesse nada a ver com o ideológico e o político. Contra a tradição histórica de seu movimento popular, o Uruguai está sendo o fura-greves latino-americano no conflito com os donos do mundo.

Em conclusão: em seus eixos centrais, o progressismo se limitou a uma mudança de caras no governo (mais doces que as anteriores, com mais gracejo popular) para benefício dos interesses dos mesmos privilegiados de sempre.

DESACATO – Há assuntos no país que parecem ser tabu para a grande maioria da esquerda. Um deles é o da propriedade da terra. A Frente Ampla em sua totalidade não a questiona nem nas suas palavras nem nos fatos. Isso já não é mais um problema? Raúl Sendic e os trabalhadores dos canaviais que foram os últimos que fizeram uma grande campanha pela socialização da terra, estavam equivocados?

Zabalza: - Há uma contra-reforma agrária. A propriedade da terra concentrada cada vez em menos mãos e dedicada ao cultivo da soja e o eucalipto dominados por grandes capitais transnacionais. O mono-cultivo desertifica nossos solos suaves e ondulados. O governo financia gratuitamente as caravanas e a computarização na cria de gado bovino. Mais da metade das indústrias de moinhos e frigoríficas em mãos estrangeiras… o que tem feito o governo progressista para frear o processo? Olhar pro lado e recitar versos gauchescos. Mantém-se a impunidade impositiva do latifúndio e os exportadores. Nem sequer foram anuladas as sociedades anônimas, base jurídica do grande negócio agro exportador.

DESACATO: – O outro assunto é o da constituição. Comparando-a com a constituição de 1988 no Brasil dá a impressão que como mínimo está 50 anos atrasada em termos de direitos e liberdades. A Frente Ampla com maioria absoluta nas duas câmaras coincide agora com os setores políticos tradicionais em que a constituição de Jorge Batlle é uma maravilha? E tendo em conta que muitos países da América Latina estão redefinindo suas constituições.

Zabalza: - A Constituição atual do Uruguai é produto da reforma "laranja", a mesma que amparou a escalada autoritária e repressiva de Pacheco Areco. Em 1985, os uruguaios festejamos o regresso ao regime constitucional mais favorável às classes dominantes.

DESACATO: – O que parecia impossível aconteceu: uma greve general contra o governo progressista Qual é a situação no movimento social que levou à greve?

Zabalza: - Nas bases sociais há uma surda desconformidade com sua situação econômica e social. O amortecimento progressista do conflito social segue funcionando perfeitamente e os desconformes escolherão um novo governo progressista, enganados pela demagogia de Mujica, a quem crêem equivocadamente parado à esquerda de Astori e Tabaré. Mas a luta de classes persiste em seu trabalho incessante sobre as consciências…

DESACATO: - Tendo em conta que o Uruguai é um país netamente exportador e com sua economia interna dolarizada, Há forma de prever como pode afetar o colapso financeiro global à política uruguaia?

Zabalza: - A última mentira de Astori: o Uruguai está "blindado" contra a crise mundial… não estiveram a City londrina nem Wall Street, não esteve nenhum dos grandes ladrões universais, mas o progressismo convenceu a muitos que aqui nada acontecerá. Como todos os povos do mundo, o uruguaio pagará esta gigantesca fraude que se denomina "crise".

DESACATO: – Quais seriam os caminhos para a recomposição de um programa de esquerda radical no país?

Zabalza: - A luta social.

DESACATO: - Em que estrutura devem se localizar os verdadeiros militantes de esquerda que querem de verdade a revolução?

Zabalza: - Fora de toda a merda progressista e eleitoreira.

DESACATO: - Você quer acrescentar alguma reflexão a esta entrevista?

Zabalza: - Que papel teria o parlamentarismo em um projeto deste tipo? Um parlamentar extra - frenteamplista seria um vaso de hortênsias decorando o frondoso jardim do progressismo. O debate no parlamento foi substituído pelos grandes meios de comunicação. Através deles os lutadores sociais podem conseguir maior incidência na opinião que o melhor dos deputados "radicais". Citam que Lenin, que só contava com o Iskra para difundir as idéias revolucionárias… se deve fazer a revolução com todos os instrumentos atuais e não repetindo esquematicamente análises corretas nas condições de princípios do século passado… por favor!

Versão em português: Tali Feld Gleiser, de América Latina Palavra Viva.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Omar Sosa - Sentir

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Omar Sosa - Sentir @ 256

01. Opening For Elegguá
02. Sucesion En Blanco
03. Rojo Changó
04. Manto Blanco
05. Toridanzón
06. Azul Yemayá
07. Oda Al Negro
08. Sister In Yellow
09. Cielo Y Mar Azules
10. Tres Notas En Amarillo
11. Rojo Y Negro
12. Eggun
13. Sentir

Total: 107,03MB

Downloads abaixo

Parte 1

Parte 2

Blog da Cúpula Íbero-Americana













Gerhard Dilger, jornalista alemão que também é “cidadão porto-alegrense” há vários anos, está cobrindo a Cúpula Ibero-Americana 2008, que ocorre em El Salvador. Quem quiser acompanhar o andamento da reunião, pode acessar o blog da Cúpula que Gerhard está pilotando. Correspondente para a América do Sul do jornal alemão “Taz, die tageszeitung”, o jornalista destaca hoje as declarações do presidente Evo Morales na cúpula de El Salvador:

“Tivemos nossos recursos naturais saqueados, e a aplicação, nos últimos 20 anos, do neoliberalismo, o que foi outro saque, outro roubo. Em 2005, antes de que eu fosse presidente, a Bolívia recebia 300 milhões de dólares pela exploração dos hidrocarbonetos. No ano passado, depois da modificação na lei dos hidrocarbonetos e da nacionalização, a Bolívia recebe 2 bilhões de dólares. Como mudou a situação econômica! A partir de nossa experiência, o neoliberalismo, o sistema capitalista não é nenhuma solução em meu país”.

domingo, 2 de novembro de 2008

Como esses estúpidos selvagens chegaram a dominar Washington

Como a política nos EUA chegou a ser dominada por pessoas que fizeram da ignorância uma virtude? Num ponto isso é fácil de responder. Na nação mais poderosa do planeta, um em cada cinco adultos acredita que o sol gira em torno da terra; só 26% aceitam que a evolução ocorre por seleção natural e dois terços dos jovens adultos são incapazes de encontrar o Iraque num mapa.

Como se permitiu que se chegasse a esse ponto? Como a política nos EUA chegou a ser dominada por pessoas que fizeram da ignorância uma virtude? Foi a caridade que permitiu que um parente mais próximo do homem chegasse a gastar dois mandatos como presidente? Como foi possível que Sarah Palin, Dan Quayle e outros estúpidos do gênero chegassem aonde chegaram? Como foi possível que os comícios republicanos em 2008 fossem tomados por gritarias ignorantes insistindo que Barack Obama era um muçulmano e terrorista?

Como muitos deste lado do Atlântico, eu fui por muitos anos encantado com a política americana. Os EUA têm as melhores universidades do mundo e atrai as mentes mais brilhantes. Domina descobertas na ciência e na medicina. Sua riqueza e seu poder dependem da aplicação do conhecimento. Ainda assim, de maneira única dentre as muitas nações desenvolvidas (com a exceção possível da Austrália), o conhecimento é uma desvantagem política grave nos EUA.

Houve exceções ao longo do século passado – Franklin Roosevelt, JF Kennedy e Bill Clinton temperaram seu intelectualismo com um toque de senso comum e sobreviveram -, mas Adlai Stevenson, Al Gore e John Kerry foram respectivamente fulminados por seus oponentes por serem membros de uma elite cerebral (como se isso não fosse uma qualificação para a presidência). Talvez o momento decisivo no colapso da política inteligente tenha sido a resposta de Ronald Reagan a Jimmy Carter, no debate presidencial de 1980. Carter – tropeçando um pouco, usando longas palavras – cuidadosamente enumera os benefícios do sistema nacional de saúde. Reagan sorri e diz: “Lá vem você de novo”. Seu próprio programa de saúde teria apavorado muitos americanos, caso tivesse sido explicado tão cuidadosamente como o fez Carter, mas ele tinha encontrado a fórmula para se prevenir de questões políticas sérias ao fazer com que seus oponentes parecessem intelectuais “engomados” que não mereciam confiança.

Não foi sempre assim. Os pais fundadores da República – Benjamin Franklin, Thomas Jefferson, James Madison, John Adams, Alexander Hamilton e outros – estavam entre os maiores pensadores de sua época. Eles não sentiam necessidade de tornar isso um segredo. Como o projeto por eles construído degenerou-se em George W. Bush e Sarah Palin?

Num ponto isso é fácil de responder. Políticos ignorantes são eleitos por povos ignorantes. A educação norte-americana, assim como seu sistema de saúde, é notória por seus fracassos. Na nação mais poderosa do planeta, um em cada cinco adultos acredita que o sol gira em torno da terra; só 26% aceitam que a evolução ocorre por seleção natural; dois terços dos jovens adultos são incapazes de encontrar o Iraque num mapa, dois terços dos votantes norte-americanos não são capazes de nomear três organizações governamentais; a competência matemática dos adolescentes de 15 anos nos Estados Unidos está em vigésimo quarto dos vinte e nove países da OECD.

Mas isso só aumenta o mistério: como tantos cidadãos norte-americanos tornaram-se tão estúpidos, e desconfiados da inteligência? Até onde li, o livro de Susan Jacoby, The Age of America Unreason [algo como A Era da des-Razão Americana], fornece uma explicação completa. Ela mostra que a degradação da política norte-americana resulta de uma série de tragédias interligadas.

Um tema é muito familiar e claro: religião – particularmente religião fundamentalista – torna você estúpido. Os EUA é o único país rico em que o fundamentalismo cristão é vasto e crescente.

Jacoby mostra que já houve uma certa lógica nesse anti-racionalismo. Durante as algumas décadas após a publicação de A Origem das Espécies, por exemplo, os americanos tinham boas razões para rejeitar a teoria da seleção natural e para tratar os intelectuais públicos com suspeita. Desde o começo, a teoria de Darwin foi misturada, nos EUA, com a filosofia brutal – agora conhecida como darwinismo social – do escritor britânico Herbert Spencer. A doutrina de Spencer, promovida na imprensa popular com o financiamento de Andrew Carnegie, John D. Rockefeller e Thomas Edison, sugeria que os milionários estavam no topo da escala estabelecida pela evolução. Ao impedir os desajustados de serem eliminados, a intervenção governamental enfraquecia a nação. A maioria das desigualdades econômicas eram tanto justificáveis como necessárias.

O darwinismo, em outras palavras, tornou-se indistinguível da forma mais bestial do laissez-faire econômico. Muitos cristãos responderam a isso com náusea. É profundamente irônico que a doutrina rejeitada um século atrás por proeminentes fundamentalistas como William Jennings Bryan seja agora determinante para o pensamento da direita cristã. Fundamentalistas modernos rejeitam a ciência darwinista da evolução e aceitam a pseudociência do darwinismo social.

Mas há outras razões, mais poderosas, que explicam o isolamento intelectual dos fundamentalistas. Os EUA são peculiares ao delegarem o controle da educação a autoridades locais. Ensinar nos estados do sul era ser dominado por uma elite aristocrática e ignorante de donos de terras, e um grande abismo educacional foi aberto. “No sul”, escreve Jacoby, “só o que pode ser descrito é que um bloqueio intelectual foi imposto para manter do lado de fora idéias que pudessem ameaçar a ordem social”.

A Convenção Batista do Sul, agora a maior congregação religiosa dos EUA, era para a escravidão e a segregação o que a Igreja Reformada Holandesa (Dutch Reformed Church) era para o apartheid na África do Sul. Ela fez mais do que qualquer força política para manter o sul estúpido. Nos anos 60 tentou disseminar a desagregação estabelecendo um sistema privado de escolas e universidades cristãs. Hoje, um estudante pode ir do jardim da infância até o mais alto grau de estudos sem qualquer exposição ao ensino secular. As crenças batistas do sul também passam imunes ao sistema de escola pública. Uma enquete feita por pesquisadores na Universidade do Texas em 1998 revelou que um em cada quatro professores de biologia das escolas do estado acreditavam que humanos e dinossauros viveram na Terra ao mesmo tempo.

Essa tragédia vem sendo assistida pela fetichização americana da auto-educação. Apesar de seu lamento por sua falta de educação formal, a carreira de Abraham Lincoln é repetidamente citada como evidência de que a boa educação fornecida pelo estado não é necessária: tudo de que se precisa para ter sucesso é determinação e individualismo vigoroso. Isso pode ter servido bem para as pessoas quando os genuínos movimentos de auto-educação, como o que se construiu em torno dos Little Blue Books na primeira metade do século XX estiveram em voga. Na era do info-entreternimento (1), esse tipo de coisa é receita para a confusão.

Além da religião fundamentalista, talvez a razão mais potente para o combate dos intelectuais na eleição seja que o intelectualismo tem sido equiparado à subversão. O breve flerte de alguns pensadores com o comunismo há muito tempo atrás tem sido usado para criar uma impressão na mente do público de que todos os intelectuais são comunistas. Quase todo dia homens como Rush Limbaugh e Bill O'Reilly vociferam contra as “elites liberais” que estão destruindo a América.

O espectro das grandes cabeças alienígenas subversivas foi crucial para a eleição de Reagan e de Bush. Uma elite intelectual genuína – como os neocons (alguns deles ex-comunistas) em torno de Bush – deu o tom dos conflitos políticos como uma batalha entre americanos comuns e bem sucedidos e super-educados pinkos (2). Qualquer tentativa de desafiar as idéias da elite intelectual da direita tem sido atacada, com sucesso, como sendo elitismo.

Obama tem muito a oferecer aos EUA, mas nada disso vai parar se ele vencer. Até que os grandes problemas do sistema educacional sejam revertidos ou que o fundamentalismo religioso perca sua força, haverá oportunidade política para que gente como Bush e Palin ostentem sua ignorância.

Publicado originalmente no Guardian, em 28 de outubro de 2008

O artigo também está publicado na página de George Monbiot

(1) Neologismo usado pelo autor (infotainment), que resulta da junção das palavras informação com entreternimento. N.deT.

(2) Pinko é um termo pejorativo criado pela direita norte-americana para designar intelectuais supostamente comunistas ou simpáticos ao comunismo que, contudo, não são militantes partidários. A palavra pinko deriva do nome da cor rosa, em inglês – pink -, que resulta da mistura do vermelho com o branco. Pinko seria uma forma light de comunismo, assumida supostamente por aqueles “intelectuais” que não pretendem ser associados diretamente ao comunismo. Termo aparece pela primeira vez, segundo a Wikipédia, em 1926, no semanário Time. N.deT.

Tradução: Katarina Peixoto

"História dos árabes"...

Registros ingleses e israelenses… da história dos árabes*


ROBERT FISK - Blog do Bourdoukan



Em Damasco, há enorme estátua do falecido presidente Hafez al-Assad, sentado em imponente cadeira de ferro, à frente da Biblioteca Assad, de 22 mil metros quadrados; na mão direita, um livro-gigante, aberto, de ferro.

Às costas de Assad, estão os arquivos da correspondente ditadura. Mas são documentos secretos e nem uma folha impressa é acessível aos cidadãos sírios. Não há arquivos do ministério de relações exteriores, nem interiores, nem do ministério da defesa. Não há cláusula que proíba publicar alguma coisa por 30 anos. Há proibição eterna. Não há Arquivo Nacional no mundo árabe, nem há pesquisadores esperando para entrar em algum Arquivo Nacional em país árabe.

É assim no Cairo, em Riad, em Beirute e em Trípoli. Ditaduras e califados zelam pelos próprios segredos.

O único país do Oriente Médio no qual é possível consultar arquivos nacionais públicos atende pelo nome de Israel – e bom para os israelenses. Mas o resultado é óbvio. Pesquisadores israelenses tem podido desconstruir a história tradicional da pequena Israel – provando que jamais houve rádios árabes que mandassem os palestinos deixar a própria terra, que os árabes foram sim, expulsos de suas cidades, por métodos de limpeza étnica, pelos grupos Irgun e Hagana.

Mas não há pesquisador árabe que possa responder à propaganda, com argumentos coletados dos arquivos de história árabe. Quem queira tentar, tem de ir aos Arquivos Nacionais em Londres, e ler os despachos, de 1948, enviados da Palestina, pelo General Cunningham; ou tem de citar historiadores israelenses. E acabaram-se as fontes. Se não se contam as biografias autolouvatórias de ditadores e generais árabes, o que há está em Londres. Mesmo os pesados volumes escritos por Walid Khalidi sobre as cidades palestinas destruídas dependem, completamente, da pesquisa do historiador israelense Benny Morris.

Lentamente, contudo, começa a acumular-se na Região uma pequena bagagem de referência histórica. Se não há como conhecer os documentos privados dos líderes do lamentável Exército Árabe de Libertação de 1948, pode-se pelo menos, ainda, ouvir o depoimento dos sobreviventes palestinos.

Rosemarie Esber, por exemplo, deu bom uso aos saberes que obteve nas universidades de Londres e Johns Hopkins e entrevistou, na Jordânia e no Líbano, 126 homens e mulheres palestinos que perderam casas e terras em 1948 e 1949. Seu livro, Under the Cover of War [Sob a camuflagem da guerra] ajuda a equilibrar o que narrem documentos e diários de um lado, com história oral recolhida do outro lado. O livro não poupa os árabes – não, pelo menos, os árabes que cometeram atrocidades ou os voluntários iraquianos que se apresentaram para defender a Palestina, sem nada saber da geografia do país – mas, mesmo assim, o sofrimentos dos que tiveram de fugir está registrado.

Por exemplo, a fala de Abu Mohamed, da vila de Saquiia, leste de Telaviv, contando o que aconteceu dia 25/4/1948: "Os judeus entraram na cidade e começaram a atirar em mulheres, homens e velhos. Prenderam as meninas e até hoje não se sabe o que aconteceu a elas. Vieram da colônia que havia perto da vila... Usavam armas Bren [1]. Os tanques estacionaram no centro da vila. Naquele dia, morreram 14. Duas mulheres não conseguiram correr e foram mortas na vila... As pessoas correram juntas na direção de al-Lid (Lod, onde, na Israel atual, está o aeroporto Ben Gurion). Depois, as famílias correram separadas... Deixamos tudo o que tínhamos. Imaginamos que seria por pouco tempo e que poderíamos voltar."

No Líbano também floresce um comércio de livros baseados em diários e arquivos pessoais. Um dos mais intrigantes é A Face in the Crowd: The Secret Papers of Emir Farid Chehab, 1942-1972 [Um rosto na multidão: Os papéis secretos de Emir Farid Chehab], com os documentos privados do chefe do serviço de inteligência do Líbano, imediatamente depois da II Guerra Mundial. Além de demonstrar que as relações Síria-Líbano podiam ser tão ruins nos anos 40 quanto nos anos 90, aprende-se ali que Chehab foi espião ativo, cujos agentes na Jordânia, em 1956, trabalharam para descobrir por que o jovem Rei Hussein demitiu o comandante britânico da Legião Árabe, Glubb Pasha. "Glubb gastava mal, controlava com mão de ferro as finanças do Exército e as despesas secretas, e recusava-se a partilhar informação relevante com os oficiais e comandantes árabes", escreveu um informante que permanece incógnito, em carta para Chehab, dia 11/3/1956.

"[Glubb] interferia em tudo, [controlava até] as linhas telefônicas de vários ministérios. Um telefonista que trabalha em Aman admitiu para mim que até as redes de comunicação do Palácio e do Primeiro-ministro eram controladas pelo exército. Um comunicado secreto emitido por Glubb para todos os chefes de unidades britânicas foi descoberto recentemente; dizia que, em caso de ataque israelense os britânicos deveriam retirar-se sem resistência. Oficiais independentes levaram esse comunicado ao Rei." Então, adeus, Glubb Pasha.

Mas teria isso algo a ver, talvez, com a também secreta "Operation Cordage", citada pela primeira vez por Keith Kyle em seu excelente livro sobre Suez, e ainda mais rigorosamente investigada por Eric Grove da Universidade Salford? "Cordage" foi o plano inglês para defender seu aliado jordaniano, no caso de Israel atacar o Egito. O plano, segundo Grove, incluída "campanha aérea conduzida pelos Venoms (ingleses, da RAF) das bases de Aman e Mafraq na Jordânia, para destruir a Força Aérea israelense em 72 horas... A Alemanha colaborará com uma esquadrilha de aeronaves (Sabres ou Hunters) operada a partir de Chipre..." Uma brigada de pára-quedistas seria levada à Jordânia para defender as bases aéreas britânicas e, assim – junto com a Legião Árabe de Glubb –, também para defender Amã contra os israelenses. Hussein demitiu Glubb no final de fevereiro de 1956; porque Glubb, na formulação diplomática de Grove, "criara problemas". Então… o quanto Glubb sabia sobre a "Operation Musketeer"?

O que realmente criara "problemas", é claro, foi o próprio plano secreto dos ingleses de atacar o Egito, com França e Israel, depois do quê teve início a "Operation Musketeer" – o ataque a Suez –, a partir da "Operation Cordage", e os israelenses, inimigos potenciais dos britânicos… repentinamente tornaram-se seus aliados secretos. Mas isso, é claro, é o que se lê nos arquivos britânicos. Desgraçadamente, ainda passarão muitos anos antes de que se saiba o que Assad lê, ali, na calçada de sua biblioteca em Damasco, naquele livro de ferro.

© The Independent, UK, em http://www.independent.co.uk/opinion/commentators/fisk/
robert-fiskrsquos-world-arabs-have-to-rely-on-britain-and-israel-for-their-history-981765.html
[1] Armas Bren eram metralhadoras leves, que os ingleses usaram dos anos 30 até 1991. A palavra "Bren" é formada com as duas primeiras letras de "Brno", cidade tcheca onde as armas eram desenhadas, e de "Enfield", cidade inglesa onde as armas eram fabricadas (na British Royal Small Arms Factory) (da Wikipedia, em http://en.wikipedia.org/wiki/Bren_gun).

sábado, 1 de novembro de 2008

Reflexões de Fidel

O analfabetismo econômico

CHÁVEZ falou em Zúlia do "camarada Sarkozy", e o disse com certa ironia, mas sem ânimo de o ferir. Antes pelo contrário, quis reconhecer sua sinceridade quando, em sua condição de presidente rotativo da Comunidade de Países Europeus, falou em Beijing.

Ninguém proclamava o que todos os líderes europeus conhecem e não confessam: o sistema financeiro atual não presta e é preciso mudá-lo. O presidente venezuelano exclamou com franqueza:

"É impossível voltar a fundar o sistema capitalista, seria como uma tentativa de colocar a navegar o Titanic depois que está no fundo do Oceano."

Na reunião da Associação de Nações Européias e Asiáticas, em que participaram 43 países, Sarkozy fez confissões notáveis, segundo os telexes:

"O mundo vai mal, encara uma crise financeira sem precedentes por sua magnitude, rapidez, violência, e suas conseqüências sobre o meio ambiente põem em causa a sobrevivência da humanidade: 900 milhões de pessoas não têm os meios para se alimentarem.

"Os que participamos desta reunião representamos dois terços da população do planeta e metade de suas riquezas; a crise financeira começou nos Estados Unidos, mas é mundial e a resposta deve ser mundial."

"O lugar para uma criança de 11 anos não é a fábrica, mas a escola".

"Nenhuma região do mundo tem lição para dar a alguém." Uma clara alusão à política dos Estados Unidos.

No final recordou perante as nações da Ásia o passado colonizador da Europa nesse continente.

Se Granma tivesse subscrito essas palavras, diriam que se tratava de um clichê da imprensa oficial comunista.

A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, disse em Beijing que não se podia "prever a entidade e duração da crise financeira internacional em curso. Trata-se, nem mais nem menos, da criação de uma nova carta constitutiva das finanças." Nesse mesmo dia foram divulgadas notícias que revelam a incerteza geral desatada.

Na reunião de Beijing, os 43 países da Europa e da Ásia acordaram que o FMI deveria ter um papel importante assistindo os países gravemente afetados pela crise, e apoiaram uma reunião de cúpula inter-regional na busca da estabilidade a longo prazo e do desenvolvimento da economia do mundo.

O presidente do governo espanhol, Rodríguez Zapatero, declarou que "existia uma crise de responsabilidade em que uns poucos se enriqueceram e a maioria se está empobrecendo", que "os mercados não confiam nos mercados". Fez um apelo para os países fugirem do protecionismo, convencido de que a concorrência faria com que os mercados financeiros jogassem seu papel. Ainda não foi oficialmente convidado à Cúpula em Washington pela atitude rancorosa de Bush, que não lhe perdoa a retirada das tropas espanholas do Iraque.

O presidente da Comissão Européia, José Manuel Durão Barroso, apoiou sua advertência sobre o protecionismo.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pela sua vez, reunia-se com eminentes economistas para tratar de evitar que os países em desenvolvimento sejam as principais vítimas da crise.

Miguel D’Escoto, ex-ministro de Relações Exteriores da Revolução Sandinista e atual presidente da Assembléia Geral da ONU, demandava que o problema da crise financeira não fosse discutido no G-20 entre os países mais ricos e um grupo de nações emergentes, mas nas Nações Unidas.

Existem desacordos acerca do lugar e da reunião onde deve ser adotado um novo sistema financeiro que ponha fim ao caos e a ausência total de segurança para os povos. Existe grande temor de que os países mais ricos do mundo, reunidos com um grupo reduzido de países emergentes golpeados pela crise financeira, aprovem um novo Bretton Woods ignorando o resto do mundo. O presidente Bush declarou ontem que "os países que discutirão aqui, no mês próximo, sobre a crise global também devem voltar a se comprometerem com os fundamentos do crescimento econômico a longo prazo: mercados livres, livre empresa e livre comércio."

Os bancos emprestavam dezenas de dólares por cada dólar depositado pelos poupadores. Multiplicavam o dinheiro. Respiravam e transpiravam por todos os poros… Qualquer contração os conduzia à falência ou à absorção por outros bancos. Era preciso salvá-los, sempre a custa dos contribuintes. Fabricavam enormes fortunas. Seus privilegiados acionistas majoritários podiam pagar qualquer quantidade por qualquer coisa.

Shi Jianxun, professor da Universidade de Tongui, Shanghai, declarou em um artigo que publicou na edição exterior do Diário do Povo, que "a crua realidade tem levado a pessoas, no meio do pânico, a repararem que os Estados Unidos têm utilizado a hegemonia do dólar para pilhar as riquezas do mundo. Urge mudar o sistema monetário internacional baseado na posição dominante do dólar."

Com poucas palavras explicou o papel essencial das moedas nas relações econômicas internacionais. Assim vinha acontecendo há séculos entre a Ásia e a Europa: lembremos que o ópio foi imposto a China como moeda. Disso falei quando escrevi "A vitória chinesa".

Nem sequer prata metálica, com a qual pagavam inicialmente os espanhóis desde sua colônia nas Filipinas os produtos adquiridos na China, desejavam receber as autoridades desse país, porque se desvalorizava progressivamente devido a sua abundância no chamado Novo Mundo recém conquistado pela Europa. Até vergonha sentem hoje os governantes europeus pelas coisas que impuseram a China durante séculos.

As atuais dificuldades nas relações de intercâmbio entre esses dois continentes devem se resolver, segundo o critério do economista chinês, com euros, libras, ienes e iuanes. Não há dúvidas que a regulação razoável entre essas quatro moedas ajudaria o desenvolvimento de relações comerciais justas entre a Europa, a Grã-Bretanha, o Japão e a China.

Estariam incluídos nesse contexto o Japón e a Alemanha ―dois países produtores de sofisticados equipamentos de tecnologia avançada, tanto para a produção quanto para os serviços―, e o maior motor em potência da economia do mundo, a China, com ao redor de 1 400 milhões de habitantes e mais de 1,5 milhões de milhões de dólares em suas reservas de divisas convertíveis, que são em sua maioria dólares e bônus do Tesouro dos Estados Unidos. Segue-lhe o Japão, com quase as mesmas cifras de reservas em divisas.

Na atual conjuntura, incrementa-se o valor do dólar pela posição dominante dessa moeda imposta à economia mundial, justamente assinalada e rejeitada pelo professor de Shanghai.

Grande número de países do Terceiro Mundo, exportadores de produtos e matérias-primas com pouco valor agregado, somos importadores de produtos de consumo chineses, que soem ter preços razoáveis, e equipamentos do Japão e da Alemanha, os quais são cada vez mais caros. Mesmo quando a China tem tentado que o iuane não fique sobrevalorizado, como demandam sem cessar os ianques para protegerem suas indústrias da concorrência chinesa, o valor do iuane se incrementa e o poder aquisitivo de nossas exportações diminui. O preço do níquel, nosso principal produto de exportação, cujo valor atingiu mais de 50 mil dólares a tonelada não há muito tempo, nos últimos dias apenas ultrapassava os 8 500 dólares por tonelada, isto é, menos de 20 % do preço máximo alcançado. O do cobre se reduziu a menos de 50%; assim sucessivamente acontece com o ferro, alumínio, estanho, zinco e todos os minérios indispensáveis para um desenvolvimento sustentável. Os produtos de consumo, como café, cacau, açúcar e outros, para além de todo sentido racional e humano, em mais de 40 anos apenas incrementaram seus preços. Por isso, há bem pouco tempo eu advertia igualmente que, como conseqüência de uma crise que estava ao virar da esquina, os mercados se perderiam e o poder aquisitivo de nossos produtos se reduziria consideravelmente. Nessa circunstância, os países capitalistas desenvolvidos sabem que suas fábricas e serviços se paralisam, e só a capacidade de consumo de grande parte da humanidade já nos índices de pobreza, ou por debaixo deles, poderia mantê-los funcionando.

Esse é o grande dilema que coloca a crise financeira e o perigo de que os egoísmos sociais e nacionais prevaleçam por em cima das vontades de muitos políticos e estadistas angustiados perante o fenômeno. Não têm a menor confiança no próprio sistema do qual surgiram como homens públicos.

Quando um povo deixa atrás o analfabetismo, sabe ler e escrever, e possui um mínimo indispensável de conhecimentos para viver e produzir honradamente, faltar-lhe-ia vencer ainda a pior forma de ignorância em nossa época: o analfabetismo econômico. Só assim poderíamos saber o que está acontecendo no mundo.