O monopólio da terra e a
produção de agrocombustíveis
A principal mudança na oligarquia rural no Brasil
tem sido a presença crescente do capital internacional na indústria dos
agrocombustíveis
Por Maria Luisa Mendonça na Caros Amigos
Os velhos usineiros, agora travestidos de
empresários “modernos”, em conseqüência da propaganda sobre as supostas
vantagens do etanol brasileiro, intensificam suas campanhas
internacionais para vender o produto. Recentemente, ganharam um reforço
especial com o anúncio do governo sobre acordos trabalhistas e de
zoneamento ambiental. Porém, um breve relato sobre as principais
tendências do setor é suficiente para mostrar que essas são apenas
medidas de fachada.
As características que historicamente marcaram a oligarquia rural no Brasil permanecem inalteradas. Ou seja, o monopólio da terra, a exploração do trabalho e de recursos naturais estratégicos. A principal mudança tem sido a presença crescente do capital internacional na indústria dos agrocombustíveis. Há alguns anos, verifica-se um aumento do ritmo de aquisições no setor sucro alcooleiro, com crescimento na participação de empresas estrangeiras e aumento na concentração do poder econômico de determinados grupos.
Dados do Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool e Açúcar de Minas indicam que a participação de empresas estrangeiras na indústria da cana no Brasil cresceu de 1% em 2000 para 12% na safra 2007/2008. Outro levantamento da Pricewaterhouse Coopers revela que existem cerca de 450 usinas no Brasil, controladas por 160 empresas nacionais e estrangeiras, e que o controle estrangeiro chegaria a 15%, incluindo participação acionária em grupos nacionais. De acordo com estudo do grupo KPMG Corporate Finance, de 2000 a setembro de 2009, ocorreram 99 fusões e aquisições de usinas no Brasil. Entre estas, 45 negociações aconteceram no período de 2007 a 2009 e em 22 casos ocorreu a compra de uma usina nacional por um grupo estrangeiro.
Maiores produtores
Em outubro de 2009, a empresa francesa Louis Dreyfus Commodities anunciou a compra de cinco usinas da Santelisa Vale, de Ribeirão Preto (SP), para aumentar sua produção de cana no Brasil. A fusão criou o grupo LDC-SEV Bioenergia, tornando-se o segundo maior produtor mundial de açúcar e etanol. O grupo pretende produzir 40 milhões de toneladas de cana-deaçúcar por ano e tem participação acionária das famílias Biaggi e Junqueira, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do banco Goldman Sachs. Essa fusão aumenta para 20% a participação de empresas estrangeiras no setor.
Uma nova característica da indústria do etanol, se comparada ao Pró-Alcool da década de 1970, é a aliança entre setores do agronegócio com empresas petroleiras, automotivas, de biotecnologia, mineração, infra-estrutura e fundos de investimento. Nesse cenário, não existe nenhuma contradição desses setores com a oligarquia latifundista, que se beneficia da expansão do capital no campo e do abandono de um projeto de reforma agrária.
Em 2009, a empresa petroleira britânica British Petroleum (BP) anunciou que irá produzir etanol no Brasil, com investimento de US$ 6 bilhões de dólares nos próximos dez anos. A BP irá atuar por meio da Tropical Bioenergia, em associação com o Grupo Maeda e a Santelisa Vale, em Goiás, que contam com uma área de 60 mil hectares para a produção de cana no estado.
Em julho de 2009, a Syngenta divulgou a aquisição de terras para produzir mudas de cana-deaçúcar na região de Itápolis (SP). O projeto inclui a produção de mudas transgênicas e pretende se expandir para outros estados, como Goiás, Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso do Sul.
Concentração empresarial
No início de 2010, ocorreram novas fusões. Em janeiro, a multinacional agrícola Bunge anunciou a compra de quatro usinas do Grupo Moema, incluindo a usina Itapagipe, que tinha participação acionária de 43,75% da empresa norte-americana Cargill. Com a negociação, a Bunge passará a controlar 89% da produção de cana do Grupo Moema,
estimada em 15,4 milhões de toneladas por ano.
Em fevereiro, foi anunciada a fusão da ETH Bioenergia, do grupo Odebrecht, com a Companhia Brasileira de Energia Renovável (Brenco), que pretende se tornar a maior empresa de etanol no Brasil, com capacidade para produzir três bilhões de litros por ano. Alguns dos acionistas da Brenco são Vinod Khosla (fundador da Sun Microsystems), James Wolfensohn (ex-presidente do Banco Mundial), Henri Philippe Reichstul (ex-presidente da Petrobras), além da participação do BNDES. Já a Odebrecht tem sociedade com a empresa japonesa Sojitz. O novo grupo irá controlar cinco usinas: Alcídia (SP), Conquista do Pontal (SP), Rio Claro (GO), Eldorado (MS) e Santa Luzia (MS).
O conglomerado ainda participa da construção de um alcoolduto entre o Alto Taquari e o porto de Santos, e pretende instalar usinas na África. A empresa pretende captar R$ 3,5 bilhões até 2012, dos quais pelo menos 20% virão do BNDES, além de outros R$ 2 bilhões que o banco já investiu anteriormente na Brenco.
Nessa mesma linha, em fevereiro de 2010, a gigante petroleira holandesa Shell anunciou uma associação com a Cosan para a produção e distribuição de etanol, com o objetivo de produzir quatro bilhões de litros até 2014. Ao divulgar a operação, a nota da Shell afirmava que pretende criar “um rio de etanol, correndo desde as plantações no Brasil até a América do Norte e a Europa”. Apesar da repercussão internacional da prática de trabalho escravo na Cosan, a empresa segue como líder no setor.
Seguindo essa tendência, a Vale anunciou que pretende produzir diesel a partir do óleo de palma na região amazônica a partir de 2014, por meio de uma parceria com a empresa Biopalma da Amazônia S.A. A intenção é produzir 500 mil toneladas de óleo de palma por ano. Parte do combustível será utilizada nas locomotivas da estrada de ferro e nas minas de Carajás, no Pará.
Monocultivo da cana
Em relação ao avanço territorial do monocultivo de cana, dados da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) mostram que, em 2006, eram 4,5 milhões de hectares e, em 2008, chegaram a 8,5 milhões de hectares. Na safra de 2009 houve um aumento de 7,1% em relação a 2008.
Essa expansão é estimulada por recursos públicos. Entre 2008 e 2009, estima-se que o setor sucroalcooleiro tenha recebido mais de R$ 12 bilhões do BNDES. Essa verba é extraída, em grande medida, do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Segundo a CONAB, 45,08% da safra foi destinada à produção de açúcar e 54,9%, à produção de etanol, que resultou em 25,87 bilhões de litros do produto. A expansão da área plantada foi de 6,7%, ou cerca de 473 mil hectares. A maior expansão ocorreu na região do Cerrado, principalmente em Mato Grosso do Sul (38,80%) e Goiás (50,10%).
Dados do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig), da Universidade Federal de Goiás, indicam que o ritmo atual de desmatamento do Cerrado poderá elevar de 39% para 47% o percentual devastado do bioma até 2050. A pesquisa demonstra ainda que a destruição do Cerrado coloca em risco a disponibilidade de recursos hídricos para o Pantanal e a Amazônia, pois esses biomas estão interligados.
Trabalho escravo
As usinas de cana se tornaram campeãs em trabalho escravo nos últimos anos. De acordo com dados da Campanha Nacional de Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2007, dos 5.974 trabalhadores resgatados da escravidão no campo brasileiro, 3.060 ou 51%, foram encontrados no monocultivo da cana-de-açúcar. Em 2008, dos 5.266 resgatados, 2.553, ou 48% dos trabalhadores mantidos escravos no país estavam em plantações de cana. De janeiro a junho de 2009, o número era de 951 trabalhadores, que representavam 52% do total. Ao final de 2009, o Ministério do Trabalho registrou a libertação de 1.911 trabalhadores nas usinas de cana nos estados de Goiás, Mato Grosso, Pernambuco, Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Em 2009, o Ministério do Trabalho inclui grandes usinas na chamada “lista suja” do trabalho escravo. Uma delas foi a Brenco, que tem participação acionária de 20% do BNDES. Entre 2008 e 2009, o BNDES liberou R$ 1 bilhão para usinas da Brenco em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás. Ao mesmo tempo, o Grupo Móvel expediu 107 autos de infração contra a empresa, que é presidida pelo ex-presidente da Petrobras, Henri Philippe Reichstul. Apesar da prática de trabalho escravo, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, anunciou a continuidade do financiamento para a Brenco.
Em 31 de dezembro de 2009, foi a vez do grupo Cosan – a maior empresa do setor sucroalcooleiro do país, com produção anual de 60 milhões de toneladas de cana. Apesar da prática de trabalho escravo, a Cosan recebeu R$ 635,7 milhões do BNDES em junho de 2009, para a construção de uma usina de etanol em Goiás. O BNDES manteveo financiamento para a Cosan, mesmo após a evidência de trabalho escravo. A Cosan possui 23 usinas, controla os postos da Exxon (Esso do Brasil) e teve um faturamento de R$ 14 bilhões de reais em 2008.
Em outubro de 2009, o Grupo Móvel libertou 55 trabalhadores escravizados na Destilaria Araguaia (chamada anteriormente de Gameleira), no Mato Grosso. Segundo o auditor fiscal Leandro de Andrade Carvalho, que coordenou a operação, os trabalhadores estavam sem receber salário há três meses. Essa foi a terceira libertação realizada em oito anos na mesma usina. A Destilaria Araguaia pertence ao Grupo Eduardo Queiroz Monteiro (EQM) – um grande conglomerado econômico com sede em Pernambuco. O grupo controla outras usinas em Pernambuco, Tocantins e Maranhão,
além de participar como acionista em veículos de comunicação, como o jornal Folha de Pernambuco, a Rádio Folha de Pernambuco, Folha Digital de Pernambuco e Agência Nordeste.
Em junho de 2009, fiscais do Ministério do Trabalho e do Ministério Público detectaram irregularidades em usinas fiscalizadas na região de Ribeirão Preto, em São Paulo, entre elas a Bazan, Andrade, Central Energética Moreno Açúcar e Álcool, e Nardini Agroindustrial. As usinas não forneciam equipamento adequado (como luvas, sapatos e caneleiras) e foram constatadas irregularidades no pagamento da jornada de trabalho.
Os trabalhadores declararam que cortam cerca de 20 toneladas de cana por dia. Os fiscais também registraram condições precárias de moradia, como superlotação, locais com risco de incêndio e falta de condições de higiene.
Ainda em 2009, o Ministério Público do Trabalho (MPT) conseguiu uma liminar que obriga a usina São Martinho, em Limeira (SP), a corrigir irregularidades trabalhistas. Durante fiscalizações nas safras de 2007 e 2008, o MPT constatou a falta de equipamentos de proteção, de segurança no trabalho, de cuidados médicos, de condições de higiene e de alimentação adequadas. A ação judicial inclui ainda a condenação da empresa ao pagamento de R$2 milhões aos trabalhadores por dano moral.
Para ler a reportagem completa e outras matérias confira a edição de abril da revista Caros Amigos, já nas bancas, ou clique aqui e compre a versão digital da Caros Amigos.
As características que historicamente marcaram a oligarquia rural no Brasil permanecem inalteradas. Ou seja, o monopólio da terra, a exploração do trabalho e de recursos naturais estratégicos. A principal mudança tem sido a presença crescente do capital internacional na indústria dos agrocombustíveis. Há alguns anos, verifica-se um aumento do ritmo de aquisições no setor sucro alcooleiro, com crescimento na participação de empresas estrangeiras e aumento na concentração do poder econômico de determinados grupos.
Dados do Sindicato da Indústria de Fabricação do Álcool e Açúcar de Minas indicam que a participação de empresas estrangeiras na indústria da cana no Brasil cresceu de 1% em 2000 para 12% na safra 2007/2008. Outro levantamento da Pricewaterhouse Coopers revela que existem cerca de 450 usinas no Brasil, controladas por 160 empresas nacionais e estrangeiras, e que o controle estrangeiro chegaria a 15%, incluindo participação acionária em grupos nacionais. De acordo com estudo do grupo KPMG Corporate Finance, de 2000 a setembro de 2009, ocorreram 99 fusões e aquisições de usinas no Brasil. Entre estas, 45 negociações aconteceram no período de 2007 a 2009 e em 22 casos ocorreu a compra de uma usina nacional por um grupo estrangeiro.
Maiores produtores
Em outubro de 2009, a empresa francesa Louis Dreyfus Commodities anunciou a compra de cinco usinas da Santelisa Vale, de Ribeirão Preto (SP), para aumentar sua produção de cana no Brasil. A fusão criou o grupo LDC-SEV Bioenergia, tornando-se o segundo maior produtor mundial de açúcar e etanol. O grupo pretende produzir 40 milhões de toneladas de cana-deaçúcar por ano e tem participação acionária das famílias Biaggi e Junqueira, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do banco Goldman Sachs. Essa fusão aumenta para 20% a participação de empresas estrangeiras no setor.
Uma nova característica da indústria do etanol, se comparada ao Pró-Alcool da década de 1970, é a aliança entre setores do agronegócio com empresas petroleiras, automotivas, de biotecnologia, mineração, infra-estrutura e fundos de investimento. Nesse cenário, não existe nenhuma contradição desses setores com a oligarquia latifundista, que se beneficia da expansão do capital no campo e do abandono de um projeto de reforma agrária.
Em 2009, a empresa petroleira britânica British Petroleum (BP) anunciou que irá produzir etanol no Brasil, com investimento de US$ 6 bilhões de dólares nos próximos dez anos. A BP irá atuar por meio da Tropical Bioenergia, em associação com o Grupo Maeda e a Santelisa Vale, em Goiás, que contam com uma área de 60 mil hectares para a produção de cana no estado.
Em julho de 2009, a Syngenta divulgou a aquisição de terras para produzir mudas de cana-deaçúcar na região de Itápolis (SP). O projeto inclui a produção de mudas transgênicas e pretende se expandir para outros estados, como Goiás, Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso do Sul.
Concentração empresarial
No início de 2010, ocorreram novas fusões. Em janeiro, a multinacional agrícola Bunge anunciou a compra de quatro usinas do Grupo Moema, incluindo a usina Itapagipe, que tinha participação acionária de 43,75% da empresa norte-americana Cargill. Com a negociação, a Bunge passará a controlar 89% da produção de cana do Grupo Moema,
estimada em 15,4 milhões de toneladas por ano.
Em fevereiro, foi anunciada a fusão da ETH Bioenergia, do grupo Odebrecht, com a Companhia Brasileira de Energia Renovável (Brenco), que pretende se tornar a maior empresa de etanol no Brasil, com capacidade para produzir três bilhões de litros por ano. Alguns dos acionistas da Brenco são Vinod Khosla (fundador da Sun Microsystems), James Wolfensohn (ex-presidente do Banco Mundial), Henri Philippe Reichstul (ex-presidente da Petrobras), além da participação do BNDES. Já a Odebrecht tem sociedade com a empresa japonesa Sojitz. O novo grupo irá controlar cinco usinas: Alcídia (SP), Conquista do Pontal (SP), Rio Claro (GO), Eldorado (MS) e Santa Luzia (MS).
O conglomerado ainda participa da construção de um alcoolduto entre o Alto Taquari e o porto de Santos, e pretende instalar usinas na África. A empresa pretende captar R$ 3,5 bilhões até 2012, dos quais pelo menos 20% virão do BNDES, além de outros R$ 2 bilhões que o banco já investiu anteriormente na Brenco.
Nessa mesma linha, em fevereiro de 2010, a gigante petroleira holandesa Shell anunciou uma associação com a Cosan para a produção e distribuição de etanol, com o objetivo de produzir quatro bilhões de litros até 2014. Ao divulgar a operação, a nota da Shell afirmava que pretende criar “um rio de etanol, correndo desde as plantações no Brasil até a América do Norte e a Europa”. Apesar da repercussão internacional da prática de trabalho escravo na Cosan, a empresa segue como líder no setor.
Seguindo essa tendência, a Vale anunciou que pretende produzir diesel a partir do óleo de palma na região amazônica a partir de 2014, por meio de uma parceria com a empresa Biopalma da Amazônia S.A. A intenção é produzir 500 mil toneladas de óleo de palma por ano. Parte do combustível será utilizada nas locomotivas da estrada de ferro e nas minas de Carajás, no Pará.
Monocultivo da cana
Em relação ao avanço territorial do monocultivo de cana, dados da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) mostram que, em 2006, eram 4,5 milhões de hectares e, em 2008, chegaram a 8,5 milhões de hectares. Na safra de 2009 houve um aumento de 7,1% em relação a 2008.
Essa expansão é estimulada por recursos públicos. Entre 2008 e 2009, estima-se que o setor sucroalcooleiro tenha recebido mais de R$ 12 bilhões do BNDES. Essa verba é extraída, em grande medida, do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Segundo a CONAB, 45,08% da safra foi destinada à produção de açúcar e 54,9%, à produção de etanol, que resultou em 25,87 bilhões de litros do produto. A expansão da área plantada foi de 6,7%, ou cerca de 473 mil hectares. A maior expansão ocorreu na região do Cerrado, principalmente em Mato Grosso do Sul (38,80%) e Goiás (50,10%).
Dados do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (Lapig), da Universidade Federal de Goiás, indicam que o ritmo atual de desmatamento do Cerrado poderá elevar de 39% para 47% o percentual devastado do bioma até 2050. A pesquisa demonstra ainda que a destruição do Cerrado coloca em risco a disponibilidade de recursos hídricos para o Pantanal e a Amazônia, pois esses biomas estão interligados.
Trabalho escravo
As usinas de cana se tornaram campeãs em trabalho escravo nos últimos anos. De acordo com dados da Campanha Nacional de Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2007, dos 5.974 trabalhadores resgatados da escravidão no campo brasileiro, 3.060 ou 51%, foram encontrados no monocultivo da cana-de-açúcar. Em 2008, dos 5.266 resgatados, 2.553, ou 48% dos trabalhadores mantidos escravos no país estavam em plantações de cana. De janeiro a junho de 2009, o número era de 951 trabalhadores, que representavam 52% do total. Ao final de 2009, o Ministério do Trabalho registrou a libertação de 1.911 trabalhadores nas usinas de cana nos estados de Goiás, Mato Grosso, Pernambuco, Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Em 2009, o Ministério do Trabalho inclui grandes usinas na chamada “lista suja” do trabalho escravo. Uma delas foi a Brenco, que tem participação acionária de 20% do BNDES. Entre 2008 e 2009, o BNDES liberou R$ 1 bilhão para usinas da Brenco em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás. Ao mesmo tempo, o Grupo Móvel expediu 107 autos de infração contra a empresa, que é presidida pelo ex-presidente da Petrobras, Henri Philippe Reichstul. Apesar da prática de trabalho escravo, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, anunciou a continuidade do financiamento para a Brenco.
Em 31 de dezembro de 2009, foi a vez do grupo Cosan – a maior empresa do setor sucroalcooleiro do país, com produção anual de 60 milhões de toneladas de cana. Apesar da prática de trabalho escravo, a Cosan recebeu R$ 635,7 milhões do BNDES em junho de 2009, para a construção de uma usina de etanol em Goiás. O BNDES manteveo financiamento para a Cosan, mesmo após a evidência de trabalho escravo. A Cosan possui 23 usinas, controla os postos da Exxon (Esso do Brasil) e teve um faturamento de R$ 14 bilhões de reais em 2008.
Em outubro de 2009, o Grupo Móvel libertou 55 trabalhadores escravizados na Destilaria Araguaia (chamada anteriormente de Gameleira), no Mato Grosso. Segundo o auditor fiscal Leandro de Andrade Carvalho, que coordenou a operação, os trabalhadores estavam sem receber salário há três meses. Essa foi a terceira libertação realizada em oito anos na mesma usina. A Destilaria Araguaia pertence ao Grupo Eduardo Queiroz Monteiro (EQM) – um grande conglomerado econômico com sede em Pernambuco. O grupo controla outras usinas em Pernambuco, Tocantins e Maranhão,
além de participar como acionista em veículos de comunicação, como o jornal Folha de Pernambuco, a Rádio Folha de Pernambuco, Folha Digital de Pernambuco e Agência Nordeste.
Em junho de 2009, fiscais do Ministério do Trabalho e do Ministério Público detectaram irregularidades em usinas fiscalizadas na região de Ribeirão Preto, em São Paulo, entre elas a Bazan, Andrade, Central Energética Moreno Açúcar e Álcool, e Nardini Agroindustrial. As usinas não forneciam equipamento adequado (como luvas, sapatos e caneleiras) e foram constatadas irregularidades no pagamento da jornada de trabalho.
Os trabalhadores declararam que cortam cerca de 20 toneladas de cana por dia. Os fiscais também registraram condições precárias de moradia, como superlotação, locais com risco de incêndio e falta de condições de higiene.
Ainda em 2009, o Ministério Público do Trabalho (MPT) conseguiu uma liminar que obriga a usina São Martinho, em Limeira (SP), a corrigir irregularidades trabalhistas. Durante fiscalizações nas safras de 2007 e 2008, o MPT constatou a falta de equipamentos de proteção, de segurança no trabalho, de cuidados médicos, de condições de higiene e de alimentação adequadas. A ação judicial inclui ainda a condenação da empresa ao pagamento de R$2 milhões aos trabalhadores por dano moral.
Para ler a reportagem completa e outras matérias confira a edição de abril da revista Caros Amigos, já nas bancas, ou clique aqui e compre a versão digital da Caros Amigos.